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Impertinência

A primeira impressão

Eduarda Teixeira.

Há quase duas semanas em São Paulo e não tive tempo de vir aqui, parada na porta do prédio eu ainda suspiro por achar que é a cara dele, meu precioso melhor amigo, Alexandre Montserrat, presidente das industrias Zaellis. São 4h42, quase a hora de sair e pretendo arrastar o Alex para jantar e beber pelos velhos tempos. Na verdade, em duas semanas tudo o que eu consegui foi trabalhar como uma louca, então eu preciso de tequila e uma boa companhia. Com a música do Bon Jovi gritando alto nos meus fones de ouvido, eu quase danço quando o refrão de Have a nice day  começa a tocar, então eu resolvo que devo subir logo e acabar com isso, mesmo sabendo que um sermão viria do homem que vou encontrar por não ter avisado que estava aqui.

Eu costumava vir aqui com frequência, por isso todos me conhecem, e eu modestamente não sou uma pessoa que consegue passar despercebida. Estou usando uma saia de couro sintético marrom caramelo que deixa minhas coxas a mostra e minha tatuagem de dragão que vai do meu tornozelo até dois dedos abaixo do meu seio esquerdo, foi a minha primeira tatuagem e o meu orgulho, 14 horas de trabalho e lá estava. Essa era eu tentando tirar de dentro a garotinha do interior de minas que habitava em mim. Claro, meus pais odiaram, mas por ser sempre a boa filha, eles fizeram um esforço para entender o que eu queria viver. Uma blusa de cashmere com gola rolê preta e botas de cowboy e para completar eu estava segurando uma jaqueta de couro preta, estilo motoqueira que herdei do Alex, e é como se fosse para mim uma farda. Um look que eu adorava, era sexy, selvagem e jovem. Como eu me sinto desde que terminei um longo relacionamento que acabaria em um casamento inconveniente se eu deixasse. Vocês já ouviram falar de casamento por conveniência, eu sei, mas casamento por inconveniência?

Retiro os fones de ouvido quando Bia abre um sorriso bonito e me cumprimenta. — Boa tarde, senhorita Teixeira — Por favor, Bia, só Eduarda. ok? — A garota sorriu novamente. Eu sei que não é normal para as pessoas ricas gostarem de ser chamadas por seus primeiros nomes, mas eu não sou uma das pessoas ricas, apesar de vir aqui sempre como “amiga do senhor Alexandre Montserrat” e já ter ouvido os rumores de que somos amantes por aí, eu não gosto de ser tratada como tal.

— Bia, boa tarde, eu vou subir, tudo bem? É uma surpresa, então não avisa! — Mando uma piscada de olho para ela e ela retribui em cumplicidade. Sigo para o elevador privativo do Alex e ninguém me interrompe, todos ali sabem que eu posso até xingar o homem que todos temem, e ainda assim eu não vou ser repreendida. “56 andares, quem é o megalomaníaco aqui?“ pensei encarando o painel depois de apertar o andar do presidente.

Celi, a secretária no gabinete na frente do escritório, sorri para mim — Olá, Celi! Ele está ocupado? Pergunto, apesar de saber que posso entrar ainda que esteja ocupado, mas prefiro esperar fora se for o caso. — Não, ele acabou de sair de uma ligação com a recepção, e não tem outro compromisso esperando. — Celi, você consegue algo muito gelado para beber? Perguntei com uma voz infantil para a senhora de quase 50 anos na minha frente que me conhece desde que o senhor Alencastro ocupava a sala e eu vinha aqui com o Alex.

— Claro que sim, sempre tem um suco fresco para você, querida. Você entra e eu já trago algo para vocês! — Suspirei em agradecimento, e rumei para a porta grande de madeira que é tão imponente quanto o resto do prédio. — Será que o senhor presidente tem tempo para uma visita? Ele solta o telefone e sorri para mim, aquele sorriso que já sou imune, mas que não ligo de admirar sempre.

Alex rapidamente se levanta e vem em minha direção por que há uma coisa que faço de lei, como uma criança eu pulo nos braços dele, com minhas pernas em volta da sua cintura, fazendo ele me segurar com ambas as mãos e enfio no seu pescoço o meu nariz — Você ainda tem o melhor cheiro do mundo, sabia disso? — Ele não pode evitar que eu faça isso, desde que ele ficou tão grande quanto uma porta, eu me jogo nele, claramente sabemos que não há componentes sexuais, e não nos importávamos com quem pensava diferente.

— Porque você não me disse que estava vindo? Eu teria ido te pegar;  — Oh, eu estou na cidade há quase duas semanas, me desculpa, mas estive com tanto trabalho que não consegui te ligar. — Claro, isso é uma desculpa esfarrapada. Eu ainda estou nos braços dele com meu nariz enfiado naquela curva, onde o pescoço vira ombro e aproveitando o cheiro dele enquanto ele ri da minha mentirinha sobre não ter tempo quando ouvimos um pigarro forte.

E lá está ele: O homem que parece ter saído de um livro onde a secretária transa com um ceo na mesa dele e pela Deusa, queria ficar de quatro naquela mesa e obedecer a todas as ordens desse homem.  Ele possivelmente tem o dobro da minha idade, mas os olhos dele são de um azul intenso e arrebatador, sua barba bem feita e cabelos que estão grisalhos nas têmporas não afetam em nada a escuridão da cabeleira negra que cai pelas orelhas ao melhor estilo Paulo Ricardo.

 Meu foco se voltou completamente ao homem na sala, que esqueci que ainda estava agarrada como um coala em Alex, que parou de sorrir reagindo a mesma pessoa.

Valério Fittipaldi

Estacionei meu carro no estacionamento subterrâneo quinze minutos antes do horário que combinamos. Eu queria comemorar com a minha garotinha, apesar de não estar plenamente feliz de ter minha filha trabalhando fora e para um empresa que não era a minha, a da nossa família, eu estava satisfeito com o que tinha ouvido durante essa sua primeira semana. Afinal não se pode esconder o orgulho de ter uma filha comparada ao pai. Mesmo acreditando que mulheres e homens têm papéis diferentes na sociedade, não posso fingir que não me sinto orgulhoso quando ouço alguém dizer

— A Virginia é implacável, ela se parece com você nos negócios. Sim, porque a beleza é toda da mãe, embora eu seja um homem que não se pode chamar de feio.

Uma prova disso é que a recepcionista sorriu ao me ver e cumprimentou com um olhar mais longo do que deveria, eu estou acostumado, olhares mais longos podem dizer algumas coisas diferentes. Mas vestindo um Giorgio Armani de três peças, eu sei que ela está admirando o porte e o homem, além é claro do bom gosto e do preço.

Essas mulheres mais novas só querem uma coisa de homens como eu, um casamento para desfrutar do glamour e do luxo que todo o meu dinheiro pode proporcionar, e depois de perder a minha esposa oito anos atrás, eu me limitei a mim mesmo e a Virginia.

Claro que trabalhando 12 horas por dia, 6 dias por semana, as coisas eram difíceis e solitárias, mas o simples pensamento de tocar em qualquer outra mulher que não fosse a minha, me deixava constrangido e um pouco abalado. — Eu sou Valério Fittipaldi  — Assim que ouviu o meu nome a mocinha voltou a si — A senhorita Virgínia está esperando pelo senhor no 56º andar — Eu apenas acenei com a cabeça, não é comum para mim sorrir, eu já não fazia muito, quando minha esposa estava viva, agora como o bom recluso que me dizem, eu não faço com frequência. Somente para Virginia.

Olhei as horas e passava um pouco das 4h40, então eu tinha tempo para ver o meu novo sócio — Senhorita, o seu presidente está disponível hoje? Eu gostaria de falar com ele por um minuto — Disse, ainda sério, a mulher que me encarava com olhos de quem obedeceria cada ordem minha.  Ela pegou o telefone ainda com o sorriso e dois minutos depois eu estava indo em direção ao elevador, Virginia e Alexandre tem passado muito tempo juntos, ela fala muito bem dele e gostaria que viesse jantar conosco.

Mas nada me preparou para o que eu veria, afinal eu estava prestes a elogiar a empresa, eram 56 andares, todos da Zaellis, esse era o corpo físico da indústria inteira. Até então Alencastro Montserrat era um homem admirável pelo feito, mas Alexandre Montserrat, seu neto, é quem está levando a empresa ao próximo nível, ao nível internacional. Mesmo sem uma secretária no birô para me anunciar a sua porta, eu fui entrando, já que a recepcionista avisou da minha chegada, imagino que não ache estranho que não vou ser anunciado.

A minha primeira visão são as pernas longas e grossas da mulher que tem uma tatuagem, que me parece ser um dragão, enroladas na cintura do homem que eu estava pensando em convidar para jantar. "Rum Rum" faço um barulho alto e Alexandre ainda segurando a moça pelas pernas para de sorrir imediatamente e a mulher que ele ainda segurava, mas quando seus olhos encaravam os meus que eu perdi um pouco o fôlego, segundo que pareciam uma eternidade analisando o rosto perfeito dela.

“Me põe no chão”  Ouvi a moça pedir com uma voz infantil e um sorriso encabulado, era linda de se ver, mas provavelmente não valia beleza que tem, afinal nenhuma mulher respeitável gostaria de ser pega daquela forma com um homem com o status que Alexandre Monteserrat tem. Como eu disse antes, mulheres como esta só querem uma coisa de homens como nós, e embora Alexandre seja mais novo do que eu, ele ainda é um dos maiores empresários do país, não entendo como pode se deixar levar por uma mulher como essa.

Penso mas não digo nada, afinal ele não é meu filho — Valério, eu estava esperando você — Alexandre disse se aproximando — É mesmo? Parece que você estava bem ocupado agora. A moça sorriu para mim e olhou para Alexandre com carinho, o que me fez levantar uma sobrancelha, porque até onde sei, ele não tem uma namorada ou Virginia teria me contado.

— Não, essa aqui não é uma visita de negócios. Eduarda, esse é o Valério Fittipaldi, meu futuro novo sócio. — Eu não entendi o que ele quis dizer com “visita de negócios", mas meus olhos desavisados correram para mulher que estendeu a mão para mim com um sorriso brilhante no rosto, e minha mente passeou com pensamentos que não tinha há muito tempo.

— É um prazer senhor Fittipaldi. — O tom de voz não era o mesmo que ela usou com o outro homem, o timbre era mais frio e formal, como se eu fosse um aluno, mas, eu estava tão hipnotizado que não consegui perceber quando apertei sua mão — Apenas Valério — O que eu disse não soava como eu mesmo, e quando voltei a mim, Alexandre estava me olhando com curiosidade. Então me apressei mesmo a contragosto a sair de lá, mesmo cheio de curiosidade sobre a mulher ao lado dele — Vim buscar a Virginia para jantar, mas passei aqui para saber se você gostaria de se juntar a nós.

 A medusa que estava em silêncio depois de me cumprimentar se jogou na frente dele segurando o pela gravata, de uma maneira que me fez odiá-lo e invejá-lo ao mesmo tempo — Oh, não não não, você é todo meu hoje à noite, certo? — Minhas entranhas se contorceram ao som manhoso e angelical da sua voz ao mesmo tempo em que eu me perguntava que tipo de bruxa era essa mulher.

— Desculpe, Valério, eu prometi minha noite a Eduarda e bom, acho que a Virgínia vai preferir jantar com você apenas.— Dei um sorriso amarelo por perceber o quanto eu estava curioso sobre o relacionamento deles, não querendo admitir de imediato, eu acenei o que me pareceu ser um “certo” para eles e me virei para ver a secretaria de Alexandre trazendo uma bandeja com suco de frutas e a mulher, Eduarda, correndo até ela — Você é mesmo um anjo não é? Acerola? — O sorriso da secretária me fez pensar que isso acontecia com frequência.

— Vou até Virginia, conversamos depois, ok?

Sai de lá seguindo a secretária que me mostrava o caminho a pedido de Alexandre, tentando arrumar um jeito de perguntar quem era a mulher no escritório dele. — Parece que a namorada do chefe vem sempre aqui — Perguntei sem jeito mesmo, quando percebi que estávamos na porta da sala da minha filha — Oh, a Eduarda vem aqui desde que o seu Alencastro era o presidente. — Essa resposta não me ajudava, mas tive a impressão de que são namorados desde a adolescência.

De alguma forma isso me deixou um pouco chateado, mas não tinha motivos para tal, nenhuma mulher poderia ocupar o lugar que foi de Amélia, minha esposa foi e ainda é a única mulher capaz de ser minha esposa. E mesmo quando vi o sorriso de Virginia eu me recriminei por apenas comparar aquela mulher com a minha esposa, uma era uma qualquer que não se dá o devido respeito enquanto a minha perfeita e amada esposa, era a mulher mais respeitável que eu já conheci depois da minha própria mãe.

Com esse pensamento eu me forcei a esquecer aquelas pernas, aquele sorriso e até mesmo aqueles olhos. Ela não merecia o meu tempo.

Ela está em toda parte

Valério Fittipaldi

Voltamos para casa depois do jantar naquela noite, o que deveria ser uma comemoração estava um pouco sem graça e triste, claro que depois de saber que Alexandre preferia sair com outra mulher e das condições dessa mulher quando eu entrei na sala, Virgínia também não estava tão animada.

Eu imaginei que talvez ela estivesse chateada com o fato de não conseguir jantar com o seu mentor. O fato de que Alexandre Montserrat entende e a ajuda com sua vontade de ser independente e de mostrar para mim que consegue ser a mulher de negócios que eu digo que ela não pode ser a deixou um pouco próxima demais e ao meu ver um pouco dependente das opiniões dele.

Talvez ela prove o contrário, mas até aqui percebo que ela apenas está fazendo isso para outro homem. Então de certa forma eu tenho razão, é tudo por causa do coração, seja por ele ou por mim, a questão é se provar para um homem.

Durante o fim de semana ambos trabalhamos em casa, ela converteu um dos quartos de hóspedes em seu próprio escritório e eu não fui contra, gosto das minhas coisas onde eu as deixo e meu computador é particular, assim como o dela, por serem empresas diferentes, é melhor que não se misturem as coisas, conseguimos fazer ao menos duas refeições juntos, mas em silêncio. Eu não estava no meu melhor humor, aquela maldita mulher ficou passeando na minha cabeça com suas pernas perfeitas e sua tatuagem que não vi por completo e me deixou curioso como um desgraçado apaixonado por uma figura mitológica que não pode alcançar.

Eu estava chateado por não ser capaz de esquecer e puto por que não era capaz de assumir que ela estava realmente ganhando terreno no meu cérebro.

A mulher que vi com Alexandre não saiu da minha cabeça, e por que eu não sou bom com coisas como redes sociais ou sabia sequer o sobrenome dela, era impossível saber mais. Ou pelo menos eu não sairia perguntando por aí, sobre a mulher que ocupa a cama de outro homem, e só esse pensamento já me deixava maluco.

Na semana seguinte estive na Zaellis em duas ocasiões, a primeira vez para conversar sobre o contrato e na segunda para assiná-lo, nas duas ocasiões me peguei desejando vê-la novamente, a imagem do sorriso dela não saiu da minha mente, mas eram as suas pernas que assombravam as minhas noites, meus sonhos e de repente eu queria perguntar ao Alexandre tudo sobre ela, mas como eu poderia sem parecer um completo idiota, estranho e o que a garotada diz hoje em dia “satlker”?

— Que tal uma festa para comemorar? É um contrato enorme e todos estão falando disso, podemos convidar alguns empresários e a imprensa especializada para dar uma coletiva e depois um coquetel? — A voz do meu agora oficialmente sócio me trouxe de volta a sua sala, e essa foi a sugestão de Alexandre, embora eu não seja um homem que gosta de festas ou de coletivas, gostava mais de ser um homem recluso, mas a festa talvez fosse a oportunidade que eu estava esperando.

— Acho que devemos sim, vai ser bom que essa parceria se transforme em manchete. — Claramente esse não era meu eu real falando, era o adolescente que se apossou do meu corpo quando eu pensava na possibilidade de vê-la novamente.

Decidimos os detalhes da festa e algumas outras coisas sobre o início dos transportes, claro que minha empresa tinha experiência no que faria para a Zaellis, mesmo em uma escala internacional, mas isso exigiria muito de mim, então eu estava pronto para sair quando a voz de Alexandre me parou

— Valério, eu espero que não se importe, eu tenho alguns convidados que não são funcionários da empresa que gostaria de receber na festa. — Era sutilmente um aviso, não um pedido e nem uma pergunta, era um aviso que eu em outras circunstâncias recusaria, mas só a possibilidade de que fosse ela a “não funcionaria” que ele falava, eu concordaria com meia São Paulo na festa — Tudo bem, mas vamos manter o foco.

Eduarda Teixeira

Alexandre e eu não temos conversado muito desde que ele e eu fomos para jantar e drinks, novamente são meus horários com as aulas que estou ministrando na USP que não me deixam fazer muitos passeios. Ele também estava um pouco irritado porque eu não quis ficar no apartamento dele e sim no hotel, mas as despesas eram pagas pela faculdade e o hotel é maravilhoso.

Também não queria que fosse fácil me encontrar, mas isso é outra história.

Depois de uma aula cansativa, eu precisava tomar alguma coisa e Layzza, minha assistente e fiel escudeira, estava lá para ir comigo, então fomos as duas para o The Bar que era um bar próximo do campus, mas era um pouco mais caro que o que os estudantes costumam frequentar.

Havia outro motivo para eu querer ir até um bar, eu não contei a Layzza sobre o homem que conheci, mas queria contar e desabafar para ter certeza de que eu não estava ficando louca, a intensidade dos olhos dele habitou minha mente durante muitos dias até agora, eu queria ouvir a voz de outra pessoa que não fosse a voz forte e viril dele na minha cabeça e Layzza talvez não fosse a melhor pessoa para isso, mas era com certeza uma das mais confiáveis.

Depois de Alexandre, Layzza era quem me conhecia melhor, estudamos juntas quando adolescentes e quando decidi fazer faculdade em São Paulo, eu ainda tinha 16 anos, por ser uma aluna que pulou duas séries, eu me mudei assim que consegui, Alexandre morava na capital de SP e para mim foi fácil me adaptar, mesmo assim, um ano depois de mim, ela também se mudou.

Durante alguns anos seguimos juntas. Até que tive que estudar fora e ela também.  De qualquer forma, a nossa cumplicidade nunca morreu e por isso, estamos sentadas aqui e eu estou contando a ela tudo que tem rondado a minha cabeça nos últimos dias. Sem reservas.

Depois de alguns drinks e os piores conselhos que alguém poderia dar e que apesar disso me dão alguma esperança de que existem pessoas mais loucas do que eu no mundo, o meu celular vibrou e eu nem me lembrava que ele ainda estava lá: “Oi, Trovão. Você tem um vestido bonito?”

Era uma mensagem do Alex — “Oi Bonitão, para onde vai me levar?” — “Cocktail, Zaellis às 19h. da quarta” — “Uau, o que vamos comemorar?” Eu tinha uma vaga ideia do que ele me diria. No dia em que saímos, ele me falou algo sobre o contrato com aquele homem que eu diria ser bastante interessante e que eu conheci no escritório dele: Valério Fittipaldi.

Era o nome do homem que tem pesadamente preenchido os meus pensamentos vagos, pelo menos duas vezes por dia eu penso naqueles olhos. E uma pesquisa rápida me permitiu algumas informações sobre o viúvo que era tão apaixonado pela esposa que depois de sua morte, se tornou um homem amargo e recluso que vivia apenas para sua empresa e única filha. A mídia tem falado bastante dele também, atualmente esse contrato era como um “encontro de gigantes” e meu melhor amigo era com certeza um gigante.

Tantas coisas novas estavam acontecendo nos últimos anos, desde que ele assumiu o comando, a Zaellis foi para estratosfera, — “Só me diga que vem?” — “Ok, A Layzza também vai” — Eu mandei a mensagem e encarei Layzza que estava sorrindo do outro lado da mesa, já que li para ela as mensagens em voz alta. É claro que ela não iria deixar de dizer “sim” para boa bebida e homens maravilhosos.

— “Tudo bem, vejo vocês na quarta à noite e lembre-se de vestido, é importante e vai ter imprensa" — Depois disso ele não disse mais nada, e eu nem esperava mais nada mesmo.

Na quarta-feira eu dispensei minha turma mais cedo, não era comum fazer isso, mas eles sempre gostam quando acontece. Esperei Layzza por 5 minutos depois de ficar pronta, ela assim como eu, não gostava de atrasos e saímos para pegar um táxi na frente do meu hotel quando Alex mandou uma mensagem — “Procure o motorista que mandei, ele deve estar na frente do hotel quando saírem “QJW 9145”” Sorri ao ver o motorista do lado de fora com um uniforme, a cara de Alexandre.

Me apresentei brevemente e entramos no carro chique, do meu hotel para a Zaellis, com o trânsito de São Paulo geralmente levaríamos 20 ou 25 minutos, mas o motorista se perdeu e quando chegamos lá a festa já estava acontecendo e a coletiva de imprensa já havia terminado.Eu não me importava por que ao passar pela recepção da festa, o primeiro homem que eu vejo é ele, não muito perto, ao lado do que sei ser a filha dele que trabalha com Alexandre.

Os olhos que tanto me assombravam fixos em mim, bonito, muito bonito, um terno sob medida preto de três peças, ombros largos e o que eu acho que devem ser mais de 1.80 de altura, os cabelos brancos nas têmporas, parecem um pouco mais curtos hoje, mas isso só o deixa mais interessante, eu não o vi sorrindo, mas espero que isso não me mate em algum momento, por que ele tem um ar de homem que vai acabar com sua ingenuidade, e embora eu não seja ingênua, eu deixaria que ele tentasse.

Valério Fittipaldi era mesmo uma espécie em extinção, o rosto aquilino, o nariz perfeito, e lábios finos, mas aparentemente deliciosos, a descendência italiana podia ser vista em tudo, desde a aparência até o temperamento, o comportamento e aqueles olhos. O homem me encarava e eu pude ver tudo isso em alguns segundos, antes de sentir os braços de Layzza me rodeando.

Esfreguei o nariz em sua bochecha com carinho e segurei a mão dela para ir até Alex e Bento, que estavam não muito longe da mesa principal. Era comum para mim; cheirar meus amigos, não qualquer pessoa, mas Layzza, Alex e Bento eram o que eu tinha de mais próximo fora da minha família. Obviamente o meu ex-noivo deveria estar nesta lista, mas falaremos disso em outro momento. Agora eu estava usando cada célula do meu corpo para ignorar os olhos que eu com certeza sabia estar acompanhando cada um dos meus passos e se isso é o que eu acho que é;

Eu tenho uma chance.

Nem nos meus sonhos

Valério Fittipaldi

No momento que ela entrou naquele salão, o tempo congelou e meus olhos não conseguiram deixar de se fixar na maldita criatura gostosa do caralho que me encarou e me fez sentir que não existia mais ninguém naquele lugar. Ela usava um vestido preto que parecia uma segunda pele delineava cada maldita curva que aquela mulher tem, seus seios estavam apertados em um busto sem alças, mas que sabia que não oferecia nenhum perigo de cair, por que estava tão agarrado ao corpo que um olhar mais atento e eu poderia jurar saber como se parece o contorno dos seus mamilos, e por Deus eu só posso estar ficando louco.

Ela desviou o olhar, quando uma mulher que eu só poderia dizer que é bonita estava muito perto e foi impossível não olhar uma segunda vez quando Eduarda como a desgraçada provocadora que é, fez um carinho no rosto dela com o próprio nariz. Sentindo cada nervo do meu corpo se contorcer para ir até lá e arrastá-la para um lugar onde só eu pudesse vê-la ou tocá-la, respirei fundo para voltar ao controle de mim mesmo e apenas segui observando quando ela foi até o meu maldito sócio.

Eu tentei me convencer durante toda a semana de que eles não têm um relacionamento, mas vendo ela se jogar nos braços dele como está fazendo agora, posso jurar que não é o caso. Eles se encaravam com um sorriso e seus olhos demonstravam um carinho que eu reconheço ser o de um homem por uma mulher, mas também tem outra coisa, como se fosse uma cumplicidade que eu não compreendi, mas eu vou.

Eles sussurravam coisas no ouvido um do outro e novamente aquela droga de um ciúme que não deveria existir, mas puta que pariu, só de pensar que não serei eu com ela no fim desta noite, eu já sinto o meu sangue ferver. “Calma, Fittipaldi, ela não é alguém que você deveria querer. Uma mulher assim, não busca nada além de status e você é muito velho para isso”.

Tento me convencer de que meus anos a mais me deixam em desvantagem, e de que eu não suporto esse tipo de mulher, mas a Afrodite na minha frente confunde os meus desejos e eu só paro de encarar quando, Virgínia vai ao banheiro e Teresa Bianco aproveita o momento, se aproxima e chama meu nome, a mulher está tão perto que tenho que dar um passo para trás até que eu me sinta confortável novamente.

É esse o tipo de abordagem que me irrita, elas se jogam como se eu fosse algum tipo de bilhete de loteria premiado, e essa mulher já fez isso mais de uma vez, suas conversas sempre cansativas me levam para o mesmo ponto onde eu tenho que recusar todo e qualquer convite com toda a educação de um cavalheiro, afinal eu nunca fui grosseiro com uma mulher na minha vida, nem mesmo se ela for uma interesseira com pedigree.

Teresa continuava a me contar do novo restaurante francês que foi inaugurado recentemente, e eu educadamente continuava ouvindo a baboseira que ela falava contando mentalmente os segundos até que pudesse me desculpar e dizer que preciso falar com meu sócio ou minha filha. Estou tão entediado ali que não percebo quando o furacão em forma de mulher se aproxima, mas o cheiro de Eduarda chega antes dela e eu fico embriagado imediatamente, sinto suas mãos rodeando meu pescoço e seu nariz acariciar minha bochecha onde a barba bem feita começa e termina.

Nem nos meus melhores sonhos eu fui capaz de descobrir o quão perfeito era o corpo da mulher que acaba de se jogar nos meus braços.

Eduarda Teixeira

Senti que cada movimento meu era observado e não precisava olhar para saber quem estava fazendo. Me vesti para ser observada, meu vestido tomara que caia, era um convite, meus cabelos longos estavam quase soltos em cascata, exceto por duas tranças raiz perfeitas nas laterais. Escolhi jóias douradas hoje, eu nunca gostei muito de jóias assim, era bastante amazona, na orelha um brinco a adornava quase completamente se agarrando do topo até se estender em uma asa de anjo pendurada ao longo da curva do meu pescoço e no pescoço eu usava ambas as asas, vendo de longe pareciam parte do vestido, mas de perto era apenas um acessório.

Eu sempre soube que não sou uma pessoa que passa despercebida, mas hoje eu fiz questão de saber que chamaria a atenção, principalmente, eu queria ter certeza de que chamaria a atenção dele, e foi quando deixei de sentir seus olhos em mim que vi algo que me deixou puta.

Valério sendo cercado por uma mulher que não estava longe o suficiente. A quem eu quero enganar? Longe o suficiente só seria se ela estivesse fora de São Paulo.

Tentei observar o mais discretamente possível, mas que se foda, era a tenção desse homem que eu vim buscar e eu não iria presenciar outra mulher roubando ela de mim, ainda por que pela cara que o homem estava ele não estava muito feliz com os avanços da mocréia. — Eu volto já! — Tomei um gole do meu vinho e respirei fundo, o que eu faria era no mínimo absurdo, mas que se foda, era também uma oportunidade de me aproximar dele e eu arriscaria o resto da noite e a possibilidade de passar vergonha, mas ele não expulsava aquela mulher de lá e eu tinha que fazer alguma coisa.

— Oi querido, quem é ela? — Eu me aproximei, cheia de segundas intenções e sob o olhar engraçadinho do Alex que se recusava a me dar qualquer informação sobre o homem que eu no momento desejava despir, joguei os meus braços envolta dele e aproximei o meu nariz, sentindo o melhor cheiro que eu já senti na vida, Alex era o homem mais cheiroso que já tive o prazer de agarrar.

Mas esse homem que agora estava muito perto de mim, tinha cheiro de paraíso, tive que usar todos as minhas forças para não agarrar ele naquele momento, principalmente agora que todo o meu corpo estava pressionado no corpo dele enquanto ele se segurava para não fazer o mesmo e por sorte, entrou no jogo passando um braço em volta de mim e sua mão que “pela deusa” era enorme e me faz desejar estar completamente nua, segurou a minha barriga na altura do meu umbigo.

Era elegante e educado não se aproveitar, mas eu desejei que ele se aproveitasse. — Meu doce... — chamou-me assim e eu senti meu céu da boca adoçado pelas palavras enquanto ele continuou apresentando a mulher — essa é Teresa Bianco, ela é filha do presidente da C&B Montadora… — A mulher que imediatamente focou em mim com nojo, estendeu a mão por educação com um sorriso sem graça quando interrompi Valério apresentando a mim mesma — Eduarda Teixeira, veterinária de animais de grande porte, caso precise.

Valério viu o que eu fiz, ele tentou segurar o riso e seu braço me apertou um pouco mais como reconhecimento. A mulher sem graça não fez nenhuma pergunta sobre o que ou quem eu era para Valério. Acredito que por estar tão perto do famoso homem mais recluso de São Paulo, o que tínhamos era auto-explicativo.

Percebendo que não conseguiria o que veio buscar a vaca (que eu insinuei ao me apresentar) se despediu e se retirou enquanto eu ainda abraçava o pescoço do homem com carinho, e minhas unhas acariciava a nuca dele com uma intimidade que não tínhamos, mas eu não deixaria de aproveitar o fato de que ele não me expulsou do seu lado imediatamente depois da minha chegada.

Nós nos encaramos e meu corpo reagiu a ele como eu sei que o dele também o fez, mas ele não pareceu feliz com isso e a tempestade que eu poderia jurar que vi nos olhos dele se apagou — Eu não imaginava o tamanho da sua ousadia. — Ele falou e eu sorri, mas logo percebi que isso não era um elogio, ele estava sério e se afastando de mim enquanto os olhos mais azuis que já vi na vida me examinavam dos pés a cabeça me deixando pela primeira vez um pouco constrangida.

Não senti isso nem mesmo quando ele me pegou com as pernas envolta do Alex — Bom, eu ajudei você a se livrar dela. — Retruquei sorrindo e me arrastando para longe dele. Claro que eu não iria deixar que soubesse o quanto aquilo me deixou brava, mas foi um bom balde de água fria quando o meu corpo esquentou de uma maneira quase febril.

— Bom, você não precisava, seu namorado deve pensar que você vai trocá-lo por um homem mais velho — Claro que ele se referia ao meu “relacionamento” com Alex, mas eu apenas sorri na cara dele e encarei o meu amigo do outro lado do salão que era o próprio Adônis em carne e osso na superfície terrestre.

— Alex e eu não somos namorados. — Eu disse levemente e não fiquei para ouvir qualquer coisa que ele disse depois disso, embora eu pudesse ver a confusão no rosto dele. Eu já estava puta com o fato de que ele não estava grato por que eu livrei ele daquela mocréia de cabelo loiro oxigenado. Voltei para os braços de Alex com o mesmo sorriso, por que eu não deixaria que Valério Fittipaldi estragasse o meu humor e com o se fosse um presente do universo “I had some drinks” começou a tocar e eu só sabia o que seria a melhor vingança agora.

— Dança comigo, bonitão!? — Pedi já arrastando Alex para a pista de dança. O som do estalar de dedos ditava o ritmo sexy e lento que a música tem e Alex sabia o que eu estava fazendo antes mesmo de eu chegar perto demais — O que meu sócio te fez? — Perguntou sorrindo e deixando que eu colasse o meu corpo no dele enquanto eu encarava os olhos dele como só eu sabia fazer, e se eu fizesse certo, até mesmo o Alex sentia a garganta seca, e sentiu — Ele não fez nada, o que um homem da idade dele pode fazer com uma mulher como eu? — Respondi com essa maldita pergunta, por que era tudo o que eu desejava saber quando coloquei esse vestido.

O que Valério Fittipaldi faria com uma mulher como eu?

Tentando evitar a resposta engraçadinha de Alex, fiquei de costas e rebolei sentindo as mãos dele passeando no meu corpo exatamente como deveria, eu não posso negar que usar Alex para fazer ciúmes em um homem com o qual eu não tenho nenhum tipo de relacionamento, era mais gostoso do que eu poderia imaginar, Alex segurava meu pescoço e controlava meu corpo como já fizemos tantas outras vezes, mas agora era tudo porque eu queria mostrar a um homem o que ele perdeu.

Os olhos de Valério naquele momento não desgrudavam de nós, por isso eu realmente me entreguei àquela música — Você tem que me levar embora, e isso não é um pedido — Sussurrei no ouvido do Alex. Sair de lá sem ele depois de toda essa demonstração de fogo no rabo que demos, era improvável.  Senti a risada do meu amigo no pé do meu ouvido sabendo que ele foi meu bode expiatório e que seu sócio o meu alvo.

— Só se você me disser o que pretende com o viúvo mais recluso de São Paulo. — Digo o que você quiser se for embora comigo para o meu hotel. — Ele levantou uma sobrancelha enquanto eu me pendurava ainda mais no pescoço dele e sorri — Tem um  bom bar no meu hotel, seu bobão! — Rimos e nos esfregamos até que a música acabou. Alexandre sussurrou uma ordem no ouvido de Bento e segurou minha mão me arrastando pelo salão e dando um aceno para o senhor que continuava sério como uma estátua no bar.

Eu poderia jurar que eu também acabei de ser usada, mas não fiz perguntas, ele me diria no momento certo.

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