Pedro estava no mar há um bom tempo, tentando pescar pelo menos alguns peixes para alimentar a sua família, que já devia estar quase sem nada para comer a essa altura, talvez já estivessem até morrendo de fome, Pedro pensava. Ele queria voltar para casa, mas não tinha coragem de ir sem nada, ele preferia morrer no mar, do que chegar em casa e observar a sua família definhando.
Em casa, Joana, mulher de Pedro, estava a orar, pedindo à Deus que trouxesse o seu marido de volta, são e salvo. Ela e a sua filha Maria Rita não se alimentavam bem há meses, faziam só uma refeição por dia, para assim, economizar a comida, que já estava quase acabando. Após tanto tempo, a pobre Joana se perguntava se o seu velho vivia ou se já estava morto. Se não fosse por Maria, ela já teria se entregado à morte de bom grado, talvez assim ela pudesse ver o seu amado de novo, ela pensava; porque a saudade que ela sentia doía mais, muito mais... que a fome.
Maria ficava horas a fio na porta de casa, diariamente, aguardando ansiosa, pelo momento que o seu querido pai aparecesse. Ela não costumava fazer isso, mas percebendo que o seu pai estava fora há tanto tempo, ela começou a ficar preocupada e ansiosa pelo seu retorno e passou a observar a estrada todos os dias, esperando que o mesmo surgisse para que ela pudesse correr para os seus braços e abraçá-lo forte. O seu pai já havia saído para o mar muitas vezes, em busca de alimento para a família, mas era a primeira vez que ele demorava tanto. Os peixes não serviam só de alimento, era também a única fonte de renda da casa. Ao chegar, o seu pai separava os melhores e mais bonitos peixes, para vender na cidade mais próxima dali, que na verdade era muito distante, ficava à quase 5 horas de carroça. E Maria ia com o seu pai quase sempre, para ajudar nas vendas. Todas às vezes que ela ia, eles vendiam muito bem, pois Maria era dona de uma beleza extraordinária, quase que de outro mundo, é difícil descrever e isso chamava a atenção dos clientes, principalmente dos homens, que ficavam fascinados com tanta formosura e tentavam de todas as formas ganharem a afeição da jovem, mas em vão, porque ela sempre parecia indiferente a todos eles, não dando importância às lisonjas que lhe faziam, alguns eram muito ousados, pois desesperados pela atenção da moça, até a pediam em casamento, oferecendo-lhe mundos e fundos. Mas isso só lhe causava repulsa por tais homens, por julgarem que por ela ser podre, estaria à venda.
No mar, Pedro já estava prestes a desistir da pesca e voltar para casa de mãos vazias, ele chegou a cogitar a possibilidade de tirar a sua vida, mais ele não poderia abandonar a sua família daquela forma tão covarde. Ele já ia virar o barco, quando ouviu uma voz vindo não sei de onde e chamando pelo seu nome, ele pensou está a ficar louco, pois olhou de um lado para o outro e não viu nenhuma viva alma. Ele estava em mar aberto, seria impossível ter alguém vivo ali, talvez fosse um fantasma, mas Pedro não acreditava em fantasmas, mas mesmo assim ele atreveu-se a tentar indagar aquela voz.
— Quem está aí? E o que quer de mim?—perguntou Pedro, receoso.
— Quem eu sou não vem ao caso, mas o que quero de você é muito simples, se você me der o que eu pedir, te darei o que você precisa. — disse a voz no mar.
— Não creio que eu tenha algo que possa lhe interessar, mas o que você quer afinal?—perguntou Pedro desconfiado.
— Eu quero que você me traga a primeira coisa que ver no seu caminho de volta para casa. — disse a voz no mar.
Pedro estava a pensar no percurso que fazia para chegar em casa. Na sua memória, a primeira coisa que ele via, sempre no caminho, era um papagaio velho que ele tinha há um bom tempo. Ele até era apegado ao papagaio, mas mesmo assim aceitou a proposta que aquela voz lhe fez.
— Tudo bem, negócio fechado. — disse Pedro confiante.
— Agora pegue a sua rede e jogue no mar e você vai ter o que precisa. Te dou 2 dias para trazer o que me pertence, mas se você não trouxer, eu destruo você e a sua família. — disse a voz no mar.
Ao ouvir àquelas palavras, Pedro estremeceu de medo, mas depois se consolou a pensar que nada daria errado, já que o que ele traria àquela voz era um papagaio velho. Talvez a sua filhinha ficasse triste, porque gostava muito dele, mas era melhor que passar fome.
O pescador jogou a sua rede, mas a que outrora vinha sempre vazia, estava cheia em abundância, era tanto peixe, que mal coube no barco de Pedro.
Então o velho pescador pôde enfim voltar para casa de cabeça erguida, pois ele estava ansioso para rever a sua amada família.
Depois de vários meses no mar, o pescador estava finalmente na velha estrada de terra, que ele conhecia muito bem, pois ela o levava para a sua casa.
Faltando poucos metros para chegar no seu lar, ele viu o que não queria ver, o pobre Pedro olhava, mas não queria acreditar. Ele começou a chorar desesperado, por não saber mais o que fazer. Não, ele não estava a ver o velho papagaio, pois o mesmo havia morrido a semanas atrás, de velhice. O que os seus olhos estavam vendo era algo infinitamente mais precioso para Pedro, algo que ele não trocaria nem por toda a riqueza do mundo. Era a sua linda filha, que corria para o abraçar.
— Papai, eu quase morri de saudades! — disse Maria euforicamente e abraçando Pedro apertado.
Pedro estava completamente atordoado, pois, se lembrava do trato feito com aquela voz. Ele teria que entregar a sua preciosa filha nas mãos de algo desconhecido, por ela ter sido a primeira coisa à ser vista por ele, nesse momento o pobre homem se martirizava por ter, irresponsavelmente, feito este acordo com a tal voz. Ele não queria entregar a sua única filha. Ela não merecia isso. Pedro se perguntava porque não pensou que algo do tipo poderia acontecer, ele estava se achando um grande idiota no momento. Enquanto isso, Maria o observava, ela acreditava que o seu pai ficaria feliz em vê-la, mas ele parecia muito triste e preocupado, as lágrimas que o seu pai derramava não parecia de felicidade, muito pelo contrário.
— Está tudo bem Papai? Por que o senhor está chorando tanto? Não está feliz de me ver? Aconteceu algo? — Questionava Maria ao seu pai, confusa e preocupada. — Por favor papai, fale comigo!
— Eu irei te contar filha, mas vamos entrar antes, está bem?!— disse Pedro, com a voz embargada.
Entrando em casa, Pedro abraçou e beijou sua esposa. Ele chorava inconsolavelmente. Mãe e filha se entreolharam, sem saber o "porque" de Pedro está naquele estado. Depois que o pescador acalmou-se, ele relatou todo o ocorrido as duas mulheres e ambas ficaram chocadas. E ele estava envergonhado, por ter vendido a sua própria filha, mesmo que por acidente, ainda assim, o pobre homem se sentia terrivelmente culpado.
— Tudo bem papai! Eu irei entregar-me a essa voz, seja lá a quem ela pertença. Vou agora mesmo para o mar! — disse Maria. — Se essa voz teve poder de fazer um mar que não tinha peixes de repente ter e em demasia, é muito provável que ela nos destrua facilmente, como baratas.
— Não querida, você não vai!— disse Pedro. — Nós vamos encontrar outro jeito. Não vou deixar você se sacrificar por conta de um erro meu.
— Não existe outro jeito papai, ou eu vou, ou todos morreremos! —disse Maria, convicta. — Se eu for, pelo menos vocês ficarão bem...
Pedro queria convencer a filha a não ir, mas ela estava decidida. E não havia tempo para discussões. Sendo assim Maria fez uma trouxa com as poucas roupas que tinha, se despendiu dos pais, que choravam, implorando para que ela não fosse. Mas que outra escolha ela tinha. Ela jamais assistiria a morte dos seus pais, sabendo que ela poderia ter feito algo para impedir, ela amava-os tanto, mais que tudo e ela faria o possível para protegê-los, mesmo que tivesse que dar a sua própria vida para isso. E ela partiu para o mar, acreditando que nunca mais veria a sua família.
— Olá, tem alguém aí? — gritou Maria, ao chegar no mar. — Eu sou a filha do pescador Pedro, vim honrar com o trato que o meu pai fez com você!
Já fazia quase 1 hora que Maria esperava uma resposta vinda do mar, mas não veio nenhuma, ela sentiu até um certo alívio, acreditando que a tal voz não a queria e que talvez ela pudesse voltar para casa. Ela estava prestes a ir embora.
— Entre no mar agora! — disse a voz misteriosa.
Ao ouvir aquela voz, Maria ficou assustada e, ao mesmo tempo fascinada. Era uma voz tão profunda e linda, a voz mais linda que ela já havia ouvido em toda a sua vida. A voz era masculina, Maria não tinha dúvida, mas quem ou o que poderia ser ela não sabia, o que ela sabia era que estava com medo, mas mesmo assim desejava saber à quem pertencia àquela voz, que fez o seu coração bater descontroladamente apenas com algumas poucas palavras. Um coração que ela julgava ser seu, mas que de repente queria saltar do seu peito para pertencer ao dono daquela voz. Maria sentiu que o seu coração deixou de pertencer a ela naquele momento. Ela só podia estar louca, por se apaixonar por uma voz que ela não sabia de quem era.
— Você não me ouviu? Eu disse para você entrar no mar agora! — disse a voz no mar.
Maria estava perdida em seus pensamentos, quando ouviu novamente a voz lhe dizer para entrar no mar. Ela se perguntava se a tal voz queria que ela se afogasse, pois ela não sabia nadar. Mas que importância tinha isso, ela veio mesmo disposta à entregar à sua própria vida para que seus pais pudessem viver, mas ela ainda tinha esperança de que não precisaria fazer isso, no entanto, ela obedientemente entrou no mar. Seu pequeno e lindo corpo estava completamente submerso nas águas, ela se sentia sonolenta, então ela decidiu se entregar ao sono, acreditando assim, que a morte doeria menos, então debaixo da água, Maria fechou os olhos esperando que o sono a roubasse. O estranho era que ela já estava alguns minutos submersa e não estava se afogando, mas a moça estava com sono demais para perceber. De repente ela sentiu algo ou alguém segurar sua cintura firmemente e lhe puxar para baixo. Maria tentou abrir os olhos para ver, mas não conseguiu, eles estavam muito pesados e então, sem lutar, ela se deixou levar, a garota não sentiu que era seu fim, ela se sentiu muito segura nos braços de quem a carregava, como nunca antes havia se sentido. Então ela se abraçou àquele ser que a levava não se sabe para onde. Foi uma sensação maravilhosa para Maria. Aquele ser que ela abraçava só poderia ser humano, ou não? A jovem se perguntava, até perder a consciência e dormir profundamente.
Quando Maria acordou, ela estava numa cama muito confortável. Maria nunca tinha se deitado sobre algo tão macio. Ela olhou ao seu redor e notou que estava num quarto luxuoso. Parecia o quarto de uma princesa de tão lindo e organizado que ele era. Mas ela se perguntava como veio parar ali. A última coisa que ela se lembrava era de está prestes a se afogar. Não fazia sentido nenhum. Então ela decidiu sair do quarto e procurar por alguém que lhe desse uma explicação razoável.
Saindo do quarto, Maria andou pela enorme casa, que mais parecia um palácio, de tão grande e luxuosa que era. Mas a pobre moça não saberia dizer que tipo de lugar era aquele em que ela estava. Porém, ela com certeza achou tudo muito lindo. Maria estava encantada. E após andar por um bom tempo, ainda não tinha chegado ao fim da casa e nem tinha se encontrado com ninguém.
— Que lugar é esse? Parece que estou sozinha aqui! Não aparece ninguém.
Maria decidiu desistir de encontrar alguém e voltar para o quarto. Ela pensou em deixar para procurar outra hora. No caminho ela se assustou ao ver um vulto de alguém passar para o quarto no qual ela acordou mais cedo. Mesmo com um pouco de medo ela resolveu entrar e ver de quem se tratava. No entanto, ao entrar, Maria não viu ninguém. E isso a fez ficar com mais medo ainda.
— Oi Maria, como você está? Espero que tenha gostado do seu quarto.
Quando Maria ouviu aquela voz de novo, ela assustou-se à princípio. Mas depois se acalmou.
— Oi! Eu estou bem, obrigada por perguntar. E quem é você? Porque não estou te vendo? Você é um fantasma?
— Eu me chamo Gabriel, e não, eu não sou um fantasma hahaha...
— Então você é invisível, porque não estou te vendo.
— Não se preocupe Maria, na hora certa você irá me ver. Agora vamos jantar, você deve estar com fome.
Quando Gabriel passou por Maria, ela conseguiu ver o seu vulto, mas estava longe de ser algo nítido. Isso fez surgir uma curiosidade na moça. Quando Maria se sentou a mesa para jantar, ela pôde sentir que ele estava sentado ao seu lado, mas a garota não conseguia vê-lo. Era tão frustrante. Então Maria tentou tocá-lo, para saber se ele realmente estava lá. Mas antes que ela conseguisse, ele repreendeu-a.
— Pare com isso Maria, não tente me tocar jamais, exceto se eu permitir, caso contrário, você sofrerá às consequências.
Aquilo deixou Maria bastante irritada.
— Até parece que eu vou ficar tentando te tocar, seu grosso. O que você é afinal? Você não parece humano... você é um monstro por acaso?
Gabriel sentiu-se ofendido.
— É claro que eu não sou um monstro! Sou humano... assim como você.
— Então, porque não posso te ver nem te tocar? Você é deformado? Se você for, não se preocupe, eu não me importo, na verdade, a sua aparência é o que menos importa para mim.
Maria estava sendo sincera, ela não se importava com a aparência, desde que ele fosse bom para ela, a jovem também seria boa para ele.
A garota já nutria um sentimento inexplicável por aquele homem, por isso queria poder ver e, tocar nele. Não era pedir muito.
— Não pense muito nisso Maria. Na hora certa você irá entender tudo. Agora é melhor você ir se deitar, já está tarde. Tente descansar.
— Mas Gabriel eu...
Gabriel corta Maria.
— Por favor Maria, não toque mais nesse assunto, não quero falar sobre isso. Agora vá dormir de uma vez!
O jeito que Gabriel falou deixou Maria muito magoada, ela se segurou para não chorar na frente dele. Então resolveu ir se deitar sem desejar boa noite.
— Seu grosso!!
[...]
No meio da madrugada Maria sente Gabriel se deitar ao seu lado na cama.
— Maria, você está acordada?
Maria o responde sonolenta.
— Estou. O que você faz aqui? Saia já!
Na verdade, Maria estava nervosa, ela nunca estivera com um homem daquele jeito. Ainda mais na cama.
— Me perdoe por ter sido rude com você, por favor! Eu não queria ter falado com você daquele jeito.
— Mas falou!
— Eu sei. Fui um estúpido!
— Foi mesmo haha...
Maria olhou para o lado da cama, onde Gabriel estava. Ela não podia ver nada mesmo. Tudo escuro, sem nenhuma luz. Mas ele estava tão perto, que ela podia sentir sua respiração, ofegante.
— Tudo bem Gabriel, eu te perdoou. Agora acho melhor você sair daqui, antes que eu tente te tocar de novo, com você tão perto assim, não vou conseguir controlar-me hahaha...
Gabriel gostou de ouvir Maria dizer aquilo. Que ela desejava o tocar, assim como ele também desejava tocá-la.
— Na verdade, eu vim para dormir aqui, com você, Maria.
A voz de Gabriel saiu tão baixa e rouca, que Maria não acreditou nos seus ouvidos.
— Repete o que você disse... acho que não ouvi direito.
— Eu disse que vim para dormir contigo. Ou você não quer?
Maria estava tão nervosa. Ela não sabia o que ele pretendia com aquilo. Ela se perguntava se ele tentaria fazer amor com ela. Mas não poderia ser isso, porque ele mesmo disse que ela não poderia tocá-lo. Será que ele mudou de ideia? Era o que Maria se perguntava, enquanto Gabriel aguardava uma resposta.
Para mais, baixe o APP de MangaToon!