A viajem mais divertida que fizemos nesse ano foi para Orlando. Foram mais de três horas de carro, saindo aqui de Weston rumo a muita diversão entre amigos.
Josh meu noivo, foi quem dirigiu, mesmo que sua mãe, a primeira dama, não tenha gostado nada da idéia. Foram também Milena, minha melhor amiga, Agatha e Andrew — os gêmeos que mais parecem estar na puberdade, mas que na verdade já beiram os trinta. Para completar Vicente, amigo de Josh, nos encontrou lá. Foi um final de semana regado a muitas guloseimas e brincadeiras infantis, como se tivéssemos voltado no tempo e esquecido todos os nossos problemas de adultos. Eu amo poder compartilhar momentos de diversão ao lado deles, mas infelizmente a correria do dia a dia suga nossa espontaneidade e acabamos nos tornando pessoas mecânicas, fazendo tudo igual todos os dias, como se já estivéssemos pré programados.
Meu noivado com Josh, após três anos de namoro, foi o que motivou nossa ida a Orlando. Após o jantar em que Josh pediu minha mão, enquanto todos conversávanos sentados à beira da piscina decididos a esvaziar uma garrafa de Domaines Ott, que decidimos fazer a viajem de carro.
Aquele fim de semana rendeu muitas fotos engraçadas e através delas era possível sentir a energia transmitida por cada um de nós. Até mesmo Vicente que costuma ser o mais sério parecia um menino em meio a magia que a aquele lugar nos envolveu. Olhando as fotos daquela viagem eu tinha certeza de ser uma mulher completamente feliz por ter aqueles amigos e meu noivo.
— Por que está sorrindo, tia? — perguntou Sarah, me fazendo desviar os olhos do celular e olhar para ela que estava sentada de frente ao meu birô.
— Algumas fotos de quando fui a Disneyland. Quer ver? — Ela sorriu confirmando e como a pergunta pôde ser ouvida por toda a sala, logo todos correram para trás de mim desejando ver também.
Eu ensino o segundo ano fundamental na escola particular Saint Anthony. A maioria das crianças, se não todas, já deviam ter ido a disney uma ou mais vezes, afinal são todos filhos de família de classe média alta e costumam viajar até mais que eu, uma jovem professora de vinte e poucos anos. Minha família é de posses e eu poderia ter escolhido qualquer outra carreira, assim como poderia viajar o quanto quisesse, mas sou o tipo de pessoa acomodada que ama o dia a dia, amo minhas crianças e tudo o que outras pessoas julgam pouco e sem valor.
Minha rotina é vir para a Saint Anthony no período da manhã, durante a tarde vou para a escola de idiomas de minha amiga Milena, onde dou uma ajudinha a ela, e durante a noite Josh sempre me leva para jantar na casa de seus pais.
Meu noivo é filho do prefeito de Weston, nos conhecemos há dez anos e nossos pais são muito amigos. Nos domingos, pontualmente, todos marcamos presença na St. Katharine Drexel Catholic e não é que nossas famílias sejam muito religiosas, mas elas gostam de manter as aparências.
Levo uma vida bem previsível, mas gosto disso. Dentro da sala de aula no entanto, é impossível prever o que as crianças vão aprontar.
— Voltem todos para seus lugares e terminem a tarefa antes que... — Nem pude terminar a frase, o sinal nos avisou sobre o fim da aula. — Amanhã continuamos.
Após me despedir de todos os alunos comecei a arrumar minhas coisas sem muita pressa. Era uma ensolarada terça-feira e eu iria almoçar com Milena em um restaurante japonês que ficava tão perto da escola que nem valia a pena me apressar. Esperar não é meu forte e principalmente sozinha em locais públicos, a ansiedade acaba me torturante um pouco. Durante esse tempo pedi um Uber pelo aplicativo — já que meu carro estava na oficina — e segui para a sala dos professores, onde fiquei atualizando algumas informações sobre a aula até Josh me ligar e desfazer todos os meus planos para um dia comum.
Logo, eu tinha um evento de boas vindas para organizar.
Jason, irmão mais velho de meu noivo, chegaria de Los Angeles. E como foi uma decisão repentina, depois de quase um ano sem pisar em Weston, Josh queria fazer uma festinha de boas vindas deixando para mim a responsabilidade de cuidar de tudo. Claro que eu teria ajuda de Milena e Agatha, mesmo assim seria cansativo fazer tudo de última hora.
— Não acredito que o Jason volta hoje — disse Milena. — Eu ainda não me recuperei da última vez que o vi.
— Faz mais de um ano que vocês transaram. — Ela quase engasgou e prendi o riso. — Lena, o que ele tem? Durante esse ano você saiu com inúmeros caras e ainda não superou aquele babaca.
— Foram muitos anos de paixão não correspondida e quando finalmente decidi esquecê-lo rolou algo pra lá de intenso. Não importa se estou beirando os trinta se meus sentimentos de uma idiota aos dezenove teimam em me deixar assim, nervosa sempre que imagino reencontrá-lo. — Sua entonação dramática demonstrava o quanto estava se esforçando para fazer aquelas palavras parecerem brincadeira, mas eu sabia que não eram, ela realmente sofria devido a aquele sentimento não correspondido.
— Mas agora você esta saindo com o Logan. — Apontei o hashi em sua direção e fiz meu melhor tom de ameaça. — Nem pense em se deixar abalar por causa daquele outro idiota.
— Eu e Logan estamos apenas saindo, não é nada sério. — Observei ela suspirar antes de enfiar o sushi dentro da boca. — Você devia entender o que os Rosenfeld tem, afinal, namora um deles. — Segurei o riso ao vê-la falando com a boca cheia, peguei um guardanapo e joguei para que limpasse. Aquele já era um sintoma de nervosismo, sua já conhecida reação à Jason.
— Eles tem um sorriso lindo e muito charme, mas não acho que ficaria sofrendo durante tantos anos por Josh, caso não desse certo entre a gente.
— Conte outra. — Milena revirou os olhos e sorri voltando a comer.
Depois do almoço fiz algumas ligações, tanto para o buffet que costumávamos contratar quanto para alguns amigos que poderiam ajudar. Em seguida fui com Milena para a escola e nossa tarde foi bem produtiva. Milena quando não esta agindo feito uma adolescente sofrendo por amor é uma mulher de fibra, uma administradora de mão cheia. Ela vem de família humilde e conseguiu com seus estudos, trabalho e esforço ter o próprio negócio.
Nem me dei ao trabalho de ir em casa, fui direto para o Weston Hills Country Club, onde acompanharia a chegada do buffet e as bebidas. Os Rosenfeld tem livre acesso aos salões de festas do lugar, afinal são filhos do prefeito. Agatha ligou afirmando que já havia convidado grande parte dos conhecidos e até mesmo os desconhecidos, bastava ter um sobrenome de peso que meu noivo fazia questão da presença para se exibir.
Esse é um dos pontos negativos em Josh e sua família, ser muito exibicionistas e se achar melhores que qualquer um que tenha menos aquisição. Eu já havia presenciado algumas situações desagradáveis onde tive que admitir internamente que eles estavam errados.
Depois das oito da noite deixei Vicente no Club cuidando dos últimos detalhes e fui para casa onde encontrei mamãe logo na sala lendo uma revista de moda, tomando seu chá enquanto esperava meu pai. Aquele era seu ritual sagrado, todas as noites esperava o marido diante da porta fingindo olhar aquelas revistas, mas contando no relógio em seu pulso cada minuto a mais e a menos que ele gastava da empresa até em casa. Dei-lhe um beijo na bochecha e segui para o quarto.
Optei por um vestido leve de cor clara que ia até abaixo dos joelhos, nos pés uma sandália nude e no rosto uma maquiagem marcando meus olhos castanhos. Meus cabelos — naturalmente ruivos — ficaram soltos.
Mal tive tempo de finalizar, Josh enviou uma mensagem avisando que já estava em frente a minha casa.
Como era de se esperar o salão ficou pequeno para a quantidade de convidados que não perderam a chance de levar acompanhantes. Os garçons carregando bandejas com bebidas para todos os gostos passavam de um lado para o outro e Josh não perdeu tempo, pegou logo duas taças de espumante e entregou-me uma. Eu sabia que ele não ficaria apenas naquela bebida.
Encontramos Agatha, Andrew e Milena, que por sinal estava um verdadeiro espetáculo de mulher, conversando animados e bebendo em um canto reservado.
— Cadê o Jason? — questionou Agatha.
— Calma, já deve estar chegando — afirmou Josh passando o braço ao redor de minha cintura, me puxando para perto de seu corpo. — Olha ele alí.
Todas as atenções se voltaram para a entrada do salão, por onde passava o filho mais velho dos Rosenfeld, mas não foi ele e seu estilo bad boy quem chamou minha atenção, e sim a mulher ao seu lado, baixa, mas tão notável que chegou a assustar o fato de meus olhos terem ficado presos a ela, seguindo seus movimentos entrando no salão. Talvez fosse devido as inúmeras tatuagens em seus braços e pernas, afinal não era todo dia que alguém tão cheia de estilo e atitude fazia parte de um dos eventos da elite jovem de Weston.
Jason ainda era o mesmo, cheio de graça dando encima de todas as mulheres que surgiam em sua frente. Percebi isso durante o pouco tempo em que ele transitou pelo salão até finalmente se aproxima de nós. Ao meu lado Agatha e Milena se questionavam sobre quem era a mulher com ele, assim como eu, que não comentei nada, mas estava curiosa.
Josh foi o primeiro a ser abraçado pelo irmão e levantado exageradamente, logo depois ele me puxou para seus braços como se fôssemos velhos amigos e tivesse toda aquela intimidade, mas Josh o fez me soltar rapidamente. Apenas depois de deixar todos desconfortáveis com seus abraços exagerados ele voltou-se para a mulher que apenas sorria observando a cena e finalmente nos apresentou.
— Pessoal, essa é a Amanda, minha nova melhor amiga. — Ela abriu mais o sorriso dando um breve aceno com a mão e dizendo um "oi".
— Amiga? — falou Josh. — Pensei que fosse namorada.
— Ela é uma garota difícil — afirmou Jason sorrindo de canto e coçando a nuca.
— Espero que apenas com idiotas feito você — murmurou Andrew e levou uma cotovelada da irmã.
— É um prazer conhecê-los — disse Amanda, passando os olhos por nossos rostos.
— O prazer é todo nosso. — A voz de Vincente nos surpreendeu e ele logo surgiu colocando uma taça diante do rosto de Amanda. — Aceita uma bebida? — Ela confirmou.
Jason falou o nome de todos nós e logo em seguida enfiou-se em meio aos convidados deixando a amiga para trás. Eu pude notar o olhar de Milena seguindo ele que cumprimentava todas as mulheres presentes, ela ficou em silêncio o tempo inteiro com o seu copo de whisky em mãos. Meus olhos voltaram para a tal Amanda que conversava de maneira animada com Vicente e não pude deixar de notar o quanto Andrew e todos os homens ao redor olhavam para ela. Não era para menos, o que faltava de altura ela parecia ter de corpo e seu vestido estampado apesar de ser de um tecido leve e não tão colado no corpo, marcava a cintura e descia rodado demonstrando o volume de sua bunda. Me peguei tentando decifrar todas aquelas tatuagens que havia em seus braços imaginando o quanto aquilo doeu.
— Até você? — Milena puxou levemente em meu braço e a encarei. — Já é suficiente todos os homens olhando para ela. — Me desfiz dos braços de Josh e puxei minha amiga para fora do salão.
— Você quer ir embora? — Ela negou.— Se continuar bebendo assim vai acabar ficando bêbada e fazendo besteira, vai ser pior.
— Você tem razão. Não posso fazer isso, não quero passar vergonha — afirmou me entregando o copo. — Nos vemos depois. — Ela saiu em direção ao estacionamento e suspirei observando.
Assim que voltei para dentro deixei tanto a minha taça quanto o copo de whisky em uma bandeja e segui a procura de Josh que não estava no mesmo lugar de antes. Segui pelo salão e o encontrei em uma roda de amigos onde Jason parecia dar um show fazendo todos rirem.
— Espera, essa gostosa vai ficar em nossa casa? — Ouvi Josh perguntar assim que me aproximei e meu sorriso sumiu.
Senti meu rosto esquentar, minhas pernas quase travaram, mas me obriguei a sair rapidamente não querendo olhar para ele. Não era uma traição nem nada, mas me afetou ouvi-lo falar daquela forma sobre outra mulher.
Sentei em um banco do lado de fora, próximo ao estacionamento onde não havia ninguém. Tentei conciliar as idéias, mas minha mente insistia em fazer aquilo parecer uma verdadeira traição.
— Tudo bem com você? — Virei rapidamente e vi Amanda se aproximar. Confirmei com a cabeça e ela sentou ao meu lado cruzando as pernas, me oferecendo o copo que tinha em mãos.
— Não, obrigada — recusei baixando a cabeça desconfortável por sua presença.
Pelo pouco que vi ela era uma mulher que realmente merecia ser chamada de gostosa, seu corpo não precisava aparecer muito para despertar a imaginação masculina, suas coxas eram tão grossas e a tatuagem que havia em uma delas chamava muito atenção.
Eu não devia me preocupar com a forma que Josh falou, ele tinha toda razão, Amanda era gostosa aos olhos de todos, mas aquilo não significava que eles iriam tentar alguma coisa com ela e até mesmo conseguir. Eu devia apenas confiar em meu noivo.
— Louise, seu nome, certo? — perguntou, retirando do decote um cigarro e um isqueiro. — Importa-se?
Na verdade eu me importava sim, pois nunca suportei cheiro de cigarro e ela já havia sentado alí contra a minha vontade, mas tudo que fiz foi negar esperando a melhor oportunidade para levantar e sair.
— Você é a noiva do irmão de Jason...— Observei ela tragar o cigarro com a cabeça um pouco inclinada para trás fitando o prédio a nossa frente e logo em seguida seus olhos encontraram os meus.
— Sim. A quanto tempo você conhece o Jason? — Eu sabia que aquela resposta seria útil para Milena.
— Um pouco mais de um mês, coincidentemente tinhamos planos de visitar Weston e decidimos vir juntos.
— Então, você veio a turismo?
— A trabalho. — Amanda soprou a fumaça que veio justamente para meu rosto e me esforcei para não reclamar.
— Com o quê você trabalha? — perguntei, começando a me recriminar por estar ficando curiosa demais.
— Com o meu corpo. — Meus olhos quase saltaram e virei a cabeça em outra direção para não permitir que notasse minha surpresa. Amanda é garota de programa? — Sou modelo. — respondeu minha pergunta mental e percebi que sorriu logo em seguida. — Tenho um amigo fotógrafo que vive aqui e vamos fazer uns trabalhos juntos.
— Oh, entendo...
— Tenho cara se prostituta? — Tentei negar, mas acredito que não consegui ser muito convincente. — E você, em quê trabalha?
— Sou professora.
Amanda demonstrou-se interessada em meu trabalho, segundo ela eu não tenho cara de professora. E mesmo que tenha ficado me perguntando de quê exatamente eu tenho cara, optei por não perguntar, me resumindo a apenas responder suas perguntas sobre como era a profissão.
Depois que as perguntas acabaram pedi licença e saí, pois não queria ficar a noite inteira alí conversando com ela. Na verdade desejava ir para casa. Todo aquele assunto sobre profissão me fez lembrar que no dia seguinte teria que dar aula.
Procurei Josh e pedi que me levasse embora e ele no mesmo momento despediu-se de todos sem nem questionar o motivo que me levou a desejar ir tão cedo. Durante o percurso pensei sobre o que ouvi e passou por minha cabeça falar sobre o assunto, mas decidi tentar esquecer. Nos despedimos com um beijo rápido, saí do carro e fiquei o observando fazer a curva, logo seguindo para longe.
Não saía de minha cabeça o fato de Amanda ficar hospedada na casa dos Rosenfeld. Por mais que não quisesse, eu precisava admitir que estava me sentindo ameaçada.
— Homem é muito nojento mesmo — disse Milena sentando em uma das cadeiras da cafeteria após eu ter contado sobre o que ouvi na noite anterior. — Essa vadia também não se toca? Como se faz de difícil para o Jason e aceita ficar hospedada na casa dele?
— Eu achei ela legal. — Dei um gole em meu café e a vi me encarar como se eu tivesse dito o pior dos absurdos.
— Você enlouqueceu? — Dei de ombros. — Está pedindo para levar chifres? Josh não vai segurar aquele pinto dentro das calças por muito tempo com aquela tatuada desfilando seminua pela casa dele. — Olhei ao redor sentindo-me constrangida pela forma que ela falou em alto e bom som.
— E por isso eu devo odiá-la? Não tem cabimento. — Milena revirou os olhos. Eu a conhecia muito bem, ela sabia que eu estava certa, mas estava cega por causa de Jason. Olhei o relógio em meu pulso e peguei a bolsa rapidamente. — Estou atrasada. — Mandei beijinhos e sai quase correndo.
Durante o intervalo da aula recebi uma ligação de Kathe — minha sogra — me convidando para passar em sua casa. Assim que saí da escola fui almoçar, sozinha, pois não queria ver Milena toda histérica por causa daquele idiota. Logo depois segui para a casa de Josh, me perguntando o que sua mãe queria.
Katherine é uma mulher muito simpática e exagerada, sempre me deixando em dúvidas se devo amá-la ou odiá-la.
Quando cheguei entrei sem problemas, afinal sempre fui de casa. Josh naquela hora estava trabalhando, fazia um pouco mais de um ano que ele havia começado na empresa de meu pai como gerente de vendas. Uma das empregadas me informou que Kathe estava na área da piscina, onde para minha surpresa encontrei ela sentada em uma espreguiçadeira usando um maiô vermelho, chapéu na cabeça e sorrindo de orelha a orelha enquanto Amanda a fotografava.
— Você veio? — A mulher acenou ao me ver a certa distância e decidi me aproximar, mas não conseguindo desviar o olhar de sua fotógrafa.
Amanda na luz do dia parecia ainda mais cheia de cores. Seu corpo rabiscado parecia chamar cada vez mais atenção de meus olhos, mais até do que eu gostaria. Nunca pensei em fazer tatuagens, mas estava começando a achar que sentia inveja dela.
— Venha, vamos conversar sobre seu casamento — disse Kathe levantando da espreguiçadeira, pegando um robe ao lado e o vestiu rapidamente, seguindo até as cadeiras embaixo do guarda sol. — Vem Amanda, junte-se a nós.
Ambas sentamos e uma empregada nos serviu suco de laranja. Kathe começou a falar sobre o seu desejo de que o filho casasse dalí a dois meses no máximo, pois ela já tinha tudo em mente. Segundo suas palavras eu não precisaria fazer absolutamente nada e se tudo desse certo até mesmo em um mês já poderiamos realizar a cerimônia.
— Kathe, nós acabamos de noivar e...
— Vocês já namoram há três anos — me interrompeu. — E mais uma coisa, após o casamento eu acho desnecessário que continue trabalhando como professora, isso não combina com você, querida. — Ela segurou minha mão e segurei a vontade que estava de dizer tudo o que realmente pensava sobre aquilo. Notei o olhar de Amanda em mim enquanto bebia o suco sem nada dizer.
— Eu gosto do meu trabalho — consegui afirmar ao menos isso.
— Querida, pense sobre o assunto e depois conversamos, agora está na hora de minha aula de pilates. Tchauzinho meninas. — Minha sogra saiu, animada como sempre, em direção a sua academia particular dentro da propriedade.
Suspirei pegando o copo com suco e bebi tudo de uma vez.
— Você sabe que não tem que fazer nada disso, não é? — Franzi o cenho encarando Amanda. — É a sua vida, seu casamento e carreira, ela não tem nada a ver com isso.
— Sim, mas... Bem, devo admitir que é complicado.
— Apenas diga o que quer e como quer, tome suas próprias decisões e ponto, ninguém pode te obrigar a nada. — Sorri baixando a cabeça. — O quê?
— Parece simples.
— Porque é. — Ouvi um clic, levantei a cabeça rapidamente e ela sorriu com a câmera em mãos.
— Você disse que é modelo, não fotógrafa.
— Eu posso ser o que quiser — afirmou levantando o queixo, me olhando fixamente e novamente tirou uma foto minha. — Você também.
Sorri desviando o olhar. Eu gostaria de ser como ela, de ter segurança e coragem, mas me sentia uma covarde que provavelmente casaria no tempo estipulado por minha sogra apenas para não ficar mal diante da família de meu noivo.
Tentei conversar com minha mãe sobre o que Kathe desejava fazer, mas tudo tudo que ela disse foi: ela está certa, vocês namoram há três anos e nada melhor do que a sogra fazendo tudo. Mamãe também nunca concordou que eu fosse professora, se dependesse dela eu já teria casado três anos atrás, já que no seu tempo, as mulheres casavam cedo. Frustrada, só me restou conversar com meu noivo. Liguei para Josh e ele ficou de ir me buscar para jantar com seus pais. Passei o resto da tarde focada em meus afazeres relacionados a escola e o tempo passou rapidamente. Vez ou outra lembrava do que Amanda disse e parava pensando em como as coisas pareciam fáceis ouvindo dela.
Quando a noite caiu, me arrumei e fiquei a espera de Josh, que acabou demorando mais do que o normal. Percebi que ele estava muito carinhoso, me recebeu com um beijo demorado e até abriu a porta do carro. No meio do caminho, me informou que iríamos jantar sozinhos em um de nossos restaurantes preferidos. Fiquei animada, fazia tempo que não saíamos para jantar fora, sempre indo para a casa dele.
Com Josh era tudo muito fácil, eu sempre me adaptava as suas mudanças de idéia repentinas e ele as minhas. Quando um pedia o outro aceitava e assim, nós nunca entrávamos em conflito. Eram raros momentos em que eu ficava mexida devido a alguma coisa relacionada a ele, talvez por isso fiquei tão afetada ao ouvi-lo chamar Amanda de gostosa. Nós conhecíamos muito bem um ao outro e tinhamos pensamentos iguais, nossa relação era muito estável.
— Você não vai acreditar — disse ele, então tomou um gole do vinho. — Lembra o Heitor? Aquele brasileiro que casou-se com Stephanie Morgan. — Confirmei com a cabeça. — Ontem na festa, estávamos conversando e ele contou que os dois decidiram fazer algo novo para apimentar o casamento. — Arqueei uma sobrancelha, mastigando o pedaço de bife lentamente até engolir.
— O quê? — Peguei a taça com água, vendo ele rir enquanto cortava o próprio bife.
— Eles farão um ménage. — Arregalei os olhos. — Já encontraram a garota e tudo.
— Por que tem que ser com uma garota? Nunca vi ninguém propondo um ménage e aceitando outro homem — falei aquilo apenas para provocá-lo, pois notei o quanto ele estava interessado naquele assunto.
— Que absurdo! Qual homem aceitaria dividir a própria mulher com outro homem? — Dei de ombros.
— Mas aceitam com outra mulher, pelo próprio prazer. Eu jamais faria isso. — Fiz uma careta tomando mais um gole d'agua.
— Você é muito certinha, mente fechada. A Stephanie é uma mulher completamente diferente — provocou.
— Continue pensando assim. — Bufei, voltando a cortar o bife e o assunto foi encerrado.
Decidi entrar no assunto nosso casamento e contei sobre a mãe dele, que claro, também não queria casar cedo e agradeci por isso. Mas quando se tratava de meu emprego ele concordava que era desnecessário continuar, mesmo antes de casar. Eu odiava aquele preconceito que todos tinham com minha profissão e já tinha que aguentar aquilo à nove anos.
Depois do jantar, nós fomos para a casa de Josh, onde encontramos Vicente e acabei sobrando. Enquanto os dois iam conversar e beber na beira da piscina, optei por ficar na sala com Kathe que estava rodeada por revistas de decoração, em busca de uma idéia para a mudança que faria em seu quarto.
Passava-se das dez da noite e eu já estava prestes a chamar Josh para ir me deixar quando Amanda e Jason chegaram, rindo alto, ele com o braço ao redor dos ombros dela. Os dois pareciam ter ouvido a melhor das piadas, o cheiro de álcool tomou o ambiente e Kathe logo reclamou.
— Desculpa, mamãezinha linda. — Jason, aos tropeços, aproximou-se da mulher e segurando seu rosto beijou-lhe a bochecha.
— Oh, que nojo. — Ela empurrou o filho. — Saia daqui!
Amanda apenas observava a cena, assim como eu, e Josh, ao ouvir a barulheira entrou com Vicente. Aproveitei para pedir que fosse me deixar, mas ele pelo visto tinha bebido algumas garrafas a mais também e Kathe logo o proibiu de dirigir. Eu já estava prestes a chamar um Uber quando minha sogra sugeriu que Amanda me levasse e ela nem pensou duas vezes foi logo aceitando, antes que eu pudesse dizer se concordava. Josh jogou a chave para ela e antes de sair me deu um rápido beijo. Me despedi de Kathe e Vicente, notando que Jason já havia dormido no sofá ao lado da mãe.
Quando saimos da casa perguntei o motivo de Amanda não ter bebido, já que Jason quase não ficava de pé.
— Fiquei trabalhando durante toda a tarde, acabei não pensando em bebida, mas esse louco me ligou e decidi ir buscá-lo — explicou enquanto entravamos no carro. — Eu estava olhando suas fotos e acho que seria legal se você aceitasse juntar-se a mim naquele projeto.
— O quê? Eu? — Sorri negando. — Sem chance, fotografia não é para mim.
— Por que não? Você é linda. — Eu apenas encarei ela que mantinha os olhos na pista mordendo o lábio inferior, algo que me pareceu um pequeno vício. — Ao menos aceite vir comigo e verá que não existe motivo para temer. — Pensei um pouco, pois estava curiosa para saber como seria, mas estava um pouco sem jeito. — Vamos Lou, isso pode mudar sua vida. — Amanda abriu um largo sorriso e suspirei, vencida.
— Ok, aceito ver como é.
Dalí em diante dei as coordenadas até chegarmos em minha casa, que nem ficava muito longe, e quando ela estacionou pediu meu número para enviar o endereço do lugar, logo depois agradeci a carona e sai do carro.
Ao entrar em casa ouvi meus pais discutindo no escritório, com certeza minha mãe havia descoberto mais uma traição, não seria novidade. Segui para meu quarto onde me livrei das roupas e coloquei um pijama, logo depois fui tirar a maquiagem, antes de me enfiar embaixo do edredom. O sono não estava presente e acabei ficando ansiosa pensando em como seria no dia seguinte. Perdida em pensamentos ouvi o celular vibrar e ao pegá-lo vi que era Amanda, ela enviou o endereço, logo depois outra mensagem perguntando se eu estava dormindo e respondi que não.
Começamos a falar sobre o ensaio, ela contou que era algo que eu iria gostar por ter mulheres para todos os gostos, de todos os tipos e cores, não era algo voltado apenas à modelos de pele e corpo supostamente perfeitos. Confesso que fiquei cada vez mais curiosa e nossa conversa se prolongou até tomar outro rumo. Amanda me perguntou sobre o casamento e depois de contar um pouco sobre eu e Josh termos pensamentos um pouco parecidos, ela questionou meus sentimentos.
Me senti incomodada por sua insinuação de que eu poderia não amá-lo como homen e sim como amigo. Afinal quem era ela para dizer tal coisa?
Com quantos homens você já dormiu? 00:15
Apenas Josh, claro! 00:17
E quantas mulheres? 00:17
Arregalei os olhos encarando o telefone. Que pergunta mais absurda, pensei comigo mesma, não sabendo como responder. Quem ela pensa que eu sou? Por acaso tenho cara de quem transou com uma mulher? Meu Deus, eu sequer pensei beijar uma.
Claro que nenhuma! 00:22
Por que a demora em responder? 00:22
Porque sua pergunta foi sem noção. 00:23
Haha não vejo nada demais. 00:23
E você... Já...? 00:23
Te darei o benefício da dúvida. Estou indo dormir, beijos e bons sonhos. 00:24
Permaneci encarando o celular nada satisfeita com aquela resposta. Fiquei tão curiosa que passei mais uma hora rolando na cama até finalmente dormir.
Na manhã seguinte, eu quase não ouvi o despertador devido a falta de costume em dormir tão tarde. Passei bastante corretivo para esconder minhas olheiras e fui trabalhar ainda lembrando sobre o tal benefício da dúvida que fui agraciada por Amanda.
A manhã pareceu passar mais lenta que nunca e meus alunos estavam especialmente inquietos naquele dia. Por sorte eu não tinha aula na escola durante a tarde e fui direto para casa, onde almocei e comecei uma verdadeira briga com meu guarda-roupa, por não ter nada aparentemente bom para vestir.
Decidi não usar vestido, optei por jeans, camiseta e uma jaqueta, já que iria frequentar um ambiente mais a cara de Amanda, eu não queria ir muito antiquada com meus vestidos até os joelhos. Não que eu não gostasse e não tivesse roupas de todos os tipos e tamanhos, mas os locais que costumava frequentar fizeram com que eu me acostumasse a vestir aquele outro tipo de roupa.
Eram duas da tarde quando o Uber parou na frente do prédio de quatro andares. Verifiquei novamente o endereço e toquei o interfone, uma voz feminina atendeu e quando falei meu nome e sobre ter ido a convite de Amanda, logo fui autorizada a entrar e subir até o ultimo andar.
Já lá encima, assim que uma garota abriu a porta me deparei com várias garotas passando de um lado para o outro. Era um espécie de salão grande e espaçoso, as janelas enormes na parede oposta proporcionava uma boa iluminação e havia todo aquele material utilizado em ensaios, desde o painel branco, a outras coisas, mas o que me chamou atenção foram as garotas que estavam espalhadas pelo lugar, todas usavam apenas lingerie. E eram exatamente como Amanda disse anteriormente; baixas, altas, gordas, magras. Com peitos duros siliconados, outros naturais caídos. Com ou sem estrias, muitas ou nenhuma tatuagem. Ruivas, negras, loiras. Havia uma linda diversidade e pelo que vi, todas muito bem consigo mesmas.
Havia um único cara segurando uma câmera, conversando e mostrando algo para algumas delas e eu não via nem sinal de Amanda, até sentir uma mão em minha cintura, ao virar me deparei com ela e seu sorriso aberto. Automaticamente passei os olhos por seu corpo, vendo que usava um short jeans e uma blusa curta deixando a barriga a mostra. Eu não costumava reparar a roupa das pessoas, nem mesmo o corpo, mas simplesmente o fiz.
— Fico feliz que tenha vindo. Olha, vai começar daqui a pouco uma sessão com dez garotas, você pode sentar alí no sofá e assistir, daqui a pouco vou lá ficar contigo, ok? — Confirmei, então fui para o sofá que ela indicou.
Ouvi o fotógrafo chamando a meninas — na verdade já eram mulheres feitas — que correram para suas posições. No mesmo momento notei uma loira, de cabelos curtos e tatuada, entrando no lugar carregando algumas sacolas, ela fez sinal para Amanda que estava do outro lado da sala e depois seguiu para o mesmo sofá em que eu estava.
O fotógrafo começou e achei muito interessante a forma espontânea que as modelos eram fotografadas, todas sorrindo e brincando entre elas, sem nenhuma vergonha de si mesmas, o que eu acreditava não ser meu caso se viesse a tentar fazer aquilo.
Notei que a garota que estava ao meu lado levantou e foi até Amanda que conversava com uma outra mulher, observei a estranha colocando uma mexa do cabelo de Amanda atrás de sua orelha e ela afastou-se um pouco sem graça. As duas conversaram durante um tempo até a outra sair deixando as sacolas que pareciam serem lanches. Apenas quando Amanda me olhou e sorriu, percebi que havia ficado tempo demais observando, ela então aproximou-se e sentou ao meu lado.
— Está chato aqui? — perguntou e virei o rosto para encará-la. Ela parecia ainda menor sentada ao meu lado naquele sofá.
— Não, pelo contrário, estou gostando. É algo completamente novo para mim. — Voltei minha atenção para as garotas sendo fotografadas.
— Quer tentar? Podemos vir um dia desses sozinhas e eu te fotografo até que você ganhe segurança suficiente para posar assim, como elas. — Voltei a olhar em seus olhos, não sabendo o que responder. — Você acha que elas já nasceram seguras, posando apenas de lingerie, ou quase nada?
— Ok, eu aceito — falei, com confiança. Eu queria ser como aquelas mulheres, queria me sentir bem comigo mesma.
— Não vale desistir, hein? Amanhã não terá ninguém aqui e você será minha modelo. — Sorriu e senti um certo frio na barriga, não sei se devido a sua animação ou apenas por imaginar fazer aquilo.
Amanda estava me desafiando a fazer algo que nunca imaginei, mas estava ficando cada vez mais empolgada com aquilo.
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