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ERIC E MAIY

One

MAIY

   Estou desperta, mais uma vez. Olho para a janela. Apesar do quarto fechado, posso sentir o calor de alguns raios solares atravessarem as cortinas e tocarem-me. Que dia é hoje? Estou confusa. Pego imediatamente meu celular.

   "Domingo, dia 25 de abril

                                        09:00 AM"

   — 09:00h — digo, deitando-me novamente na cama. Fecho os olhos e continuo: — domingo; fim de semana — faço uma breve pausa. — Não tenho aula. — permaneço na cama. Estou cansada; continuo com sono; quero voltar a dormir, mesmo sabendo que não posso.

   Depois de ter tomado banho e me arrumado, vou até à cozinha, tomar meu café da manhã. Detalhe: moro sozinha, não tenho pais.

   Estou à mesa. Vejo meu adorável amigo de quatro patas a me olhar.

   — Está com fome, Rick?

Ele apenas olha para mim e solta um miado. Faço de conta que disse “sim” e lhe dou um pedaço do meu pão. Alguns segundos depois, meu celular, que estava sobre a mesa, começa a vibrar.

   — Ligação? De quem? — me pergunto. — Pego o celular, olhando para a tela inicial de chamada, penso: quem mais me ligaria, se não ela? De imediato, atendo.

   — Bom dia, tia — digo assim que ela termina de falar “Bom dia, minha florzinha!”

   Depois de me encher de perguntas, diz para eu ir à sua casa, assim que possível.

   — Entendi… não vou demorar. Logo estarei aí.

“Chamada encerrada”

   — Por que ela tem que se preocupar tanto comigo? — sempre me pergunto. Talvez ela sinta pena de mim, por ter perdido meus pais? “Perdido”, como se fossem objetos que não estão à vista. Estão escondidos, preciso encontrá-los. O fato é: NÃO TENHO PAIS. NÃO ESTÃO PERDIDOS, ESTÃO MORTOS. Não voltarão mais, nunca mais.

   Recomponho-me.

   — Tenho que termina logo de tomar o café. Preciso limpar a casa.

Poucas horas depois, já estou pronta, terminei meus afazeres. Em frente a porta, me despeço do meu adorável amigo.

   — Fica aqui, Rick. Não vou demorar.

Ele fixa seus belos olhos negros nos meus, como se dissesse: “Tenha cuidado. Estarei a sua espera.”, com este pensamento em mente, me conforto. Tenho alguém que ficará esperando pelo meu retorno.

   Ao sair pela calçada, inclino minha cabeça, olhando para o céu.

   — Que lindo dia! — sinto-me tranquila, debaixo dessa imensidão azulada. Começo a caminhar, tenho um destino.

   Passo por uma rua com o fluxo de pessoas baixo, não vejo quase ninguém. Começo a me aproximar de um beco, onde até um surdo escutaria os gritos de fúria de alguém cuja voz me é familiar. Olho para o beco, não me surpreendo, tinha certeza de quem era aquela voz grotesca. Eric!

   — Aquele idiota, está arrumando briga de novo! — solto, de modo que apenas eu escute. A passos largos, saio do local. Não quero problemas com ele. Apesar de não querer arrumar briga, sei que ele mesmo fará isso, ele sempre arruma uma maneira de brigar comigo. Não tenho medo dele. Tento evitá-lo, mas quando ele começa a praguejar, não consigo ficar quieta. Infelizmente, estudamos juntos e tenho que aguentá-lo todos os dias. Deveria ganhar o Oscar de “pessoa que mais suporta o Eric”. Não entendo por que ele é assim. Sempre arruma briga, deve gostar de brigar. Deve se sentir o “rei da selva”. Talvez ele seja fraco, briga com os outros para tentar provar o contrário. Quer mostrar que tem força. Odeio ter que aceitar a realidade e admitir, ele é forte.

   — Por que será que desta vez ele estava brigando? — este pensamento ecoa em mim. Minha curiosidade aumenta e tento contê-la. — Não sei. Isso não me importa. Não quero saber por que ele estava brigando!

   Apresso-me mais. Logo consigo ver a casa da minha tia. Falta pouco para chegar à casa dela — penso. Poucos minutos depois, já estou em frente de sua casa. Um “ding-dong” e ela logo abrirá a porta. Toco a campainha. Como imaginei, depois de soar o “ding-dong”, a porta se abre. Uma mulher de trinta e dois anos, com uma orquídea tatuada no ombro esquerdo, que na maioria das vezes está exposto, como hoje, me recebe, com um enorme sorriso estampado no rosto.

   — Minha florzinha querida! — ela exclama, alegre. Como se fosse uma criança, admirando um exuberante arco-íris no céu, ela olha para mim. — Entra, florzinha!

“Florzinha”, ela me chamar assim sempre. Sendo sincera, eu não gosto desse apelido, mas não posso fazer nada, desde que a conheci, ela me chama assim. Não me importo.

   — Chegou na hora certa. Acabei de terminar o almoço. Você está com fome?

   — Estou — respondo.

   — Que ótimo! — ela exclama. — Sente-se aqui. Vou preparar um prato agora mesmo para você!

Pouco tempo depois, ela me entrega um prato absurdamente cheio de comida.

   — Isso é muito, tia!

   — Não, não, não! Você tem que comer tudinho, hein! Ainda está na fase de crescimento, deve se alimentar direitinho!

Com um prato desses, talvez ela queira me deixar obesa. E “fase de crescimento”? Eu tenho quase 17 anos. Não acho que posso crescer ainda mais.

   — A senhora irá viajar, não é mesmo? — pergunto, mesmo já sabendo a resposta.

   — Vou, sim. Por esta razão, quero que você passe o resto do dia comigo. Quero passar um pouco mais de tempo com a minha florzinha!

   Passamos bastante tempo juntas. Quando não estou trabalhando ou na escola, meu tempo é praticamente todo dela, apesar disso, ela sempre quer minha companhia.

   Algumas horas se passam. O sol já havia se posto. A noite já estava tomando conta de toda a cidade, com sua escuridão profunda, que não é tão profunda por causa do brilho prateado da lua que nos ilumina. Estou de partida. Minha tia me abraça.

   — Tenha uma boa viagem amanhã — digo.

   — Se cuida bem, minha florzinha! — ela diz, de forma doce e com certa preocupação.

    — Vou ficar bem! — tento convencê-la a não se preocupar. Ela me abraça forte, como se fosse nosso último abraço, como se não quisesse me soltar. Mas me solta e com um sorriso doce e triste na face, me diz:

    — Tchau, florzinha!

Despeço-me e saio pela porta, a caminho de casa, da minha casa. Olho para o céu, vejo nuvens escuras sobre mim, estão por toda a parte. Provavelmente, logo irá chover — concluo em pensamento.

   Momentos depois, chego em casa; abro a porta.

   — Finalmente... em casa! — suspiro, tranquila. Olho em volta, como se estivesse procurando algo perdido.

   — Rick? Onde você está? — pergunto, o procurando. Ele deve estar em algum lugar. Quando estiver com fome sei que vai aparecer.

Pela janela, olho para fora. Está chovendo. Começo a me sentir sonolenta. Quero dormir, preciso dormir. Vou para meu quarto. Algumas horas depois, quando desperto, vejo Rick deitado ao meu lado.

   — Rick — o acariciou e ele ronrona.

   — Você deve estar com fome, não é? - levanto-me, vou até à cozinha, Rick me acompanha e se mostra animado quando encho sua tigela com comida para gato. O observo comer.

   — Estou com fome também. Vou preparar algo. Após fazer minha refeição, pego meu celular e converso com meu melhor amigo, que mesmo distante, passa a sensação de que está ao meu lado. Quando termino de conversar com ele, deito-me do sofá e ligo a TV, mas não fico muito tempo assistindo, pois no dia seguinte terei aula. Preciso acordar cedo. Possuo uma rotina e não posso quebrá-la.

  No dia seguinte, hoje, no caso, como sempre, acordei cedo. Tenho que ir à escola. Começo a me arrumar, faço meu café da manhã e alguns minutos depois, me despeço do meu adorável amigo e começo a caminhar para a escola, que fica a alguns metros. Faço isso sempre. Minha rotina, ou até mesmo minha própria vida, poderia ser resumida com uma única palavra: “monótono”.  Como se estivesse presa no tempo, vivendo todos os dias, o mesmo dia.

   — Espero que o Eric não queira discutir hoje. - suspiro. Apesar de não gostar das brigas, elas fazem meu relógio do tempo se mover.

   Continuo a caminho da escola, em menos de dez minutos, já estou na sala. Não tem ninguém, a não ser aquele idiota que, todos os dias, arruma briga comigo. Chegou cedo — digo, em pensamento. Não nos damos bem. Ele é como uma espinha, indesejável e estressante. Meus olhos se atraem por algo e acabo fixando meus olhos nele. Machucados. Hematomas. A causa? Obviamente, a briga de ontem. Como um ato inconsciente, acabo o encarando.

   — O que foi? Está me achando tão atraente assim? — a fala sai com tom de ironia e convencimento. Isso me irrita.

   — Claro que não! — exclamo, sem exaltar minha voz.

   — Então por que está me encarando? — fala alto, querendo impor respeito.            

Começou.

   — Não estou te encarando, Eric! — bufo.

   — Certo. Para de olhar para mim, então! — pelo tom de voz, já sei que está irritado. Dou de ombros e sento no meu lugar. O dia mal começou e esse idiota já está caçando briga.

   Outras pessoas entram na sala, a maioria, rapazes, amigos de Eric.

   — Eric, o que aconteceu contigo, cara? — um rapaz chamado André, pergunta, tentando conter uma gargalhada.

   — Nada, idiota! — Eric exclama. — Não aconteceu nada! — percebo que não há irritação em sua voz. Se fosse comigo, ele já estava rugindo, feito um leão.

   — Se você está dizendo. — André diz. Sei que ele não tem interesse em saber o motivo dos hematomas de Eric.

    Segundos depois, uma garota aparece em minha frente, a conheço, estudamos juntas, afinal.

   — Bom dia, Maiy! — sorri e olha para mim, esperando minha resposta.

   — Bom dia — respondo, sem nenhuma animação na voz.

   — Que frio, né? — ela diz, querendo manter um bom diálogo entre nós.

   — É — respondo.

   Meus olhos a acompanha, enquanto ela procura um lugar para se sentar. Ouço risadas, vindo do fundo da sala, fico curiosa e olho para trás.

   — O que foi isso, Eric? — André pergunta, rindo.

   — Do que cê tá falando? — Eric diz, aparentemente intrigado.

   — Você aí, ficou olhando tão obcecado pra Maiy!

   — O quê? — sua voz sai exaltada. — Claro que não, seu idiota! Não fiquei olhando pra ela! — afirma.

   — Aham! — André gargalha. — Fala sério, cara, você estava, sim, olhando pra ela! — afirma, como se fosse a coisa mais óbvia.

   Começo a encarar Eric e ele me lança um olhar mortal.

    — O que foi? — fala, sem ao menos tentar esconder sua raiva. — Por que está me olhando?

   "Por que está me olhando?”, você que estava me olhando, não é? E agora, é eu que tenho que dar satisfações? Fala sério!

   — Idiota! — exclamo.

   — Idiota é você, garota! — retruca, de forma arrogante.

   Felizmente, não tem como continuarmos nossa “discussão matinal”. O professor entra na sala. Finalmente.

   As horas passam rápido, logo, a sétima aula chega ao fim. Já podemos sair, ir para casa. Começo a guardar minhas coisas na mochila. Mesmo não querendo, escuto os planos dos rapazes, depois que saírem da escola.

   — Bora pra quadra hoje? — André pergunta.

   — Tá! Pode ir indo na frente — Eric responde, como se a pergunta tivesse sido apenas para ele. Se ele se concentrar mais nos esportes, talvez me esqueça. Me ignore. Me torne invisível.

   Saio da sala. Quinze minutos depois, já estou em casa.

   — Rick, cheguei! — coloco minha mochila no sofá e olho em volta, o procurando. — Cadê você?

   Não tenho tempo para o procurar, preciso fazer meu almoço e depois, ir para o trabalho. Assim que termino de cozinhar, vejo que meu adorável amigo retornou.

   — Estava esperando eu terminar de cozinhar, não é? — me inclino para baixo, o acariciando.

Acordei, mais uma vez. Estou deitada na cama, ainda sonolenta. Quero dormir, mas...

   — Amanheceu... - balbucio.

   Mais um dia ou menos um dia? Não tem muita diferença, todos os dias são iguais...

   — O que estou fazendo da minha vida, hein? — sempre me pergunto. Não sei o que realmente quero. Vivo ou sobrevivo todos os dias? A resposta é simples. Sobrevivo. Preciso de um motivo para viver? Para continuar em frente? Sim, preciso. Estou presa no tempo. Há anos, não me sinto viva.

   Dou longos suspiros de desânimo. Sinto-me deprimida. Sem alegria. Sem vida. Estou sozinha. Olho para a janela, não sinto nenhum raio invadir o quarto. Está frio. Sinto algo estranho, algo desconfortante. O que poderia ser?

   Levo minha mão esquerda até meu peito, há algo estranho comigo, sinto isso.      — Esse... pressentimento de novo — fecho os olhos, respiro calmamente. — Não deve ser nada - tento me convencer. Porém, o melhor é encarar a verdade. — O dia será desagradável!

Two

MAIY

Ao invés de continuar me martirizando com esses pensamentos, me levanto. Começo a me arrumar; tomo meu café e dou comida para meu amiguinho. Abro a porta, deparando-me com uma cena que há dias não via. Dia escuro, frio, triste.

Se o dia já está começando assim, agora tenho certeza, não terei um bom dia. — concluo em pensamento.

   Sinto algo me tocar de uma forma brusca. Alguém esbarrou em mim. Para minha infelicidade, é alguém conhecido, alguém que me odeia. Que tem como maior prazer, me irritar, me deixar brava.

   — Hã? É você? - Eric diz, já irritado.

   Sabia!

   — Cuidado por onde anda, idiota! — ele diz, já interpretando seu papel como "o arrogante que me odeia". Não consigo manter a calma, meu sangue começa a ferver quando ele ativa seu modo babaca.

   — Hã? Você que esbarrou em mim! - afirmo, irritada.

   — Eu uma ova! - ele retruca. — Você precisa usar óculos, não está enxergando direito - afirma, dando de ombros.

   Imbecil, ele que esbarrou em mim!

   — Seu idiota, você que está precisando usar óculos! - não consigo disfarçar minha voz, estou furiosa com esse babaca.

   — O que você dis—

   — Ei, ei! — Gabriel diz, interrompendo Eric. — Logo de manhã cedo os dois pombinhos já vão discutir?

   O que Gabriel acabou de comentar deixa Eric mais irritado do que já estava.

   — Cala a boca, Gabriel! — sua voz sai como um rugido de leão enfurecido, fazendo Gabriel recuar. No momento em que Gabriel recua, Pedro, outro amigo do Eric, surge.

   — Pô, Eric, se acalma, aí!

   — O que foi? Quer brigar, é? — Eric se exalta, desafiando Pedro.

   Eric é um idiota!

   — Se acalma, Eric! — Pedro diz, mantendo uma voz firme e calma. — Brigar não vai levar a nada.

   De uma maneira milagrosa, Pedro consegue resolver “minha discussão” com o Eric. Ambos, retomamos nosso trajeto à escola. Chego na sala, escolho um lugar para sentar. Enquanto o professor não chega, os que estão na sala, pegam cola de quem fez a atividade de biologia que devemos entregar em breve.

   — Maiy, cê fez a atividade de biologia? — Gabriel pergunta.

   — Fiz — respondo, dando de ombros.

   — Pode me emprestar? — indaga.

   “Emprestar”, o fato é: ele quer cola. Quer pegar as respostas.

   — OK— digo, entregando meu caderno a ele.

   — Vou comparar nossas respostas, tá?

   — Tudo bem — respondo. Mesmo sabendo que ele não fez a atividade, que irá apenas colar, pegar minhas respostas. Isso não me interessa. Não me importo.

   Fico olhando para o movimento do lado de fora, pela janela. Até que alguém, que sempre está com os nervos a flor da pele, querendo brigar, se posiciona em minha frente.

   — EI! — Eric grita, percebo irritação em sua voz.

   — O que você quer? — a pergunta sai fria, acompanhada de um olhar mortal.

   — Por que você andou espalhando que levei uma surra? — sua voz é como uma cobra venenosa, que se eu deixar suas presas cravarem em minha pele, posso morrer.  A acusação me pega de surpresa, meu corpo estremece, pois lembro que o vi surrar e não pegar uma surra.

   — Não sei do que você está falando — respondo, mantenho a calma. Sou fria. Não tenho motivo para sentir medo de sua acusação.

   — Como assim, “não sabe”? — sua voz me lembra uma avalanche. Fria. Perigosa. Podendo matar quem estiver por perto.

   — Eu não andei comentando nada desse tipo — afirmo, em um tom de voz firme.

   — Hã? Não? É quem foi, então? — me questiona, como se eu soubesse. Não fui eu quem espalhou esse boato, imbecil!

   — E vou saber? — digo, irritada com seu questionamento.

   — Ah! Sua—

   — Ei, Eric! — Gabriel o interrompe. — Calma, cara! — diz, se esforçando para não falhar a voz.

   — CALA A MERDA DA SUA BOCA, GABRIEL! — Eric grita, exasperado. — NÃO ESTOU FALANDO CONTIGO! — acrescenta.

   — Ela não iria ficar espalhando isso, você sabe! — Gabriel diz, tentando o acalmar.

   — As meninas falaram que ela disse que me viu levando uma surra no domingo passado — explica. Sua voz sai furiosa. Fico inquieta. Quem meteu meu nome no meio desta confusão? Alguém que me viu observando Eric naquele beco. Alguém que, obviamente, me odeia.

   — O quê? Eu não falei isso! — retruco, defendendo-me.

   — Mentirosa! — Eric exclama, me olhando com nojo e desprezo. Sou impotente diante deste babaca.

   — Eric, para! — Pedro diz, mantendo uma voz firme e suave. — Ela não fez isso!

   — Hã? Agora vai querer se meter também, Pedro? — incrédulo, Eric pergunta. Suas palavras saem como facas, prontas para tirar a vida de quem se meter na frente. — Como você pode ter tanta certeza de que não foi ela? — indaga.

   — Eric, fala sério! — Pedro o encara. — Você sabe muito bem que não foi ela. Você só quer brigar!— afirma. — Seu covarde, idiota! — exclama, em um tom de voz enojado. — Assume logo que você só usou esse boato como desculpa pra discutir com ela!

   — Cala a boca, Pedro! — Eric grita. — Você não entende nada, imbecil!

   — Não entendo o quê? Que você é um covarde? — ironiza. — Entendo muito bem isso!

   Posso sentir o corpo de Eric ferver de raiva. Ódio.

   — AH! SEU FILHO DA PUTA! - furioso, grita.

   — O que foi, Eric? — sorrindo, Pedro pergunta. — Vai querer me enfrentar? — se inclina para frente, o intimidando.

   — Pode vir, seu lixo! — Eric diz, sem hesitação.

   — O único lixo aqui é você, Eric! — Pedro adverte. — Seu babaca!

   Não se trata mais de mim, Eric esqueceu completamente o motivo pelo qual está aqui. Agora, sei que o que ele mais quer é acabar com Pedro.

   — Ei, melhor vocês não brigarem! — Gabriel alerta.

   — Fecha a merda dessa boca, Gabriel! — Eric solta, sem dar a mínima para o aviso de Gabriel. Está concentrado em sua luta. Quer derrotar Pedro.

   — Agora você vai ver, seu babaca! — Eric exclama.

   — Vem. Pode vir! — Pedro responde, sem medo algum.

   Porém, sua luta nem chega a acontecer, o professor entra na sala. Fica perplexo ao ver que dois alunos iriam brigar. Os professores não toleram alunos problemáticos e Eric é um desses. Antes de o cronômetro marcar cinco segundos da entrada do professor, ele já expulsa Eric e Pedro, manda-os à diretoria, eles não protestam.

   Uma garota da sala, chamada Beatriz, que não gosta de mim, diz ao professor que eles iriam brigar por minha causa. O professor não quer saber disso, ignora o comentário dela e mantém sua decisão firme: somente Eric e Pedro, à diretoria. Não consigo conter um sorriso, quando o professor a manda ficar quieta, ele não tem o mínimo interesse em saber se sou a causa da briga ou não.

   — Maiy — Gabriel balbucia, entregando-me meu caderno. — Desculpa por não ter conseguido te ajudar

   — Não, tudo bem — digo.

   — Obrigado por me emprestar o caderno — diz, voltando para seu lugar.

   Depois que termina a aula, começo a ensaiar o que vou dizer para Pedro, no dia seguinte, quando o encontrar. Irei me desculpar, não consigo esquecer o que aconteceu. Me martirizo. Tenho culpa. Mas Eric também tem. Esse boato que inventaram é culpado também. O fato é: quem espalhou isso? Quem espalhou, com certeza viu quando passei perto daquele beco e vi o Eric. Era alguém conhecido. Alguém que possui conhecimento sobre minha relação com ele, o quanto somos estáveis. Eric me odeia e esta pessoa que espalhou o boato também. Querem me torturar, me matar lentamente. Não há necessidade de fazer isso, minha própria mente se encarrega disso, droga!

    No dia seguinte. Como sempre, acordei cedo para ir à escola. Não é atoa que eu nunca me atraso. Sou a primeira a chegar na sala.

   Escuto vozes, passos, alguém está vindo. Alguém abre a porta, de repente, a sala que estava silenciosa, se torna eufórica.

   — Bom dia, Maiy! — Larissa diz, encostada no batente da porta, me encarando. Sua voz sai um pouco rouca e cansada.

   — Bom dia — digo. Minha voz sai sem nenhuma emoção, como se estivesse respondendo por pura educação. E eu realmente só estou respondendo por isso.

   — Você sempre chega cedo — ela argumenta, ainda me encarando. Se aproxima de mim, percebo sua inquietação. Algo a está incomodando.

   — Sabe — introduz, mantendo seus grandes olhos castanhos em mim —, eu soube que o Eric brigou com o Pedro depois que saíram da diretoria.

  O quê? Brigaram?

   — Mesmo? — pergunto, demonstrando interesse no assunto.

   — Foi! — exclama — Quem viu a briga comentou que os dois estavam emanando ódio!

  “Emanando ódio”?  Vários pensamentos surgem em minha cabeça, a fazendo latejar. Tudo isso é minha culpa! — concluo, frustrada. Não sei o que fazer para resolver. Estou ciente dei que se não estivesse aqui, na mesma turma que eles, isso não teria acontecido… Eles se conhecem a tanto tempo, são próximos, e mesmo assim, sempre brigam, por minha causa. Culpo-me.

   — Maiy? — Larissa me faz sair do transe em que estava.

   — Sim? — respondo.

   — Sabe que não foi sua culpa, né? — ela diz, de forma que não consegue me convencer.

   — Na verdade — digo, de cabeça baixa. —, sei que é minha culpa — admito.

   — Não, claro que não! — Larissa afirma, inclinando-se para frente, chamando minha atenção.

   — Eric está sendo injusto com você, e o Pedro sabe. Por isso, sempre quer te ajudar, mas acaba brigando com o Eric, mas não significa que é sua culpa.

   Abaixo a cabeça. Não sei o que lhe dizer.

   — Você sabe que estou certa! — diz, retirando-se.

   Estou pensativa.

   Enquanto estiver aqui, sei que haverá discussões, e brigas, entre Eric e qualquer outra pessoa que queira me defender de suas garras. Preciso me defender sozinha. Não posso envolver ninguém. Primeiro de tudo: porque Eric me odeia afinal?

   Olho para fora, percebo que Pedro está a caminho da sala. Quero agradecê-lo por me ajudar. Saio da sala, quero conversar com ele a sós, sem ninguém por perto. Chego até ele.

   — Pedro — digo, demonstração minha inquietação.

   — Maiy… - balbucia.

   O que a Larissa me contou é verdade, Pedro está machucado, ele e o Eric brigaram.

   — Que incomum, você veio falar comigo… — ele diz, mantendo seus olhos em mim.

   — Vim agradecê-lo, por sempre estar ajudando-me — abaixo a cabeça, em reverência. — e - continuo: - me desculpar, por tê-lo envolvido em algo que não lhe diz respeito — digo, sincera.

   — Por que você está sendo tão formal? — indaga, erguendo meu queixo, fazendo-me o encarar. — Por que está se desculpando? Não foi sua culpa. — diz, de forma suave. — O Eric é um idiota, você sabe muito bem disso! — diz, sorrindo para mim. — Ele não te conhece direito. Fica implicando com você, sem nenhum motivo.

   — Ele tem motivo — argumento, o encarando. — Seu ódio por mim, é o motivo.

   Assim que termino de falar. Pedro dá um passo para trás, fica surpreso, incrédulo. Leva suas mãos até a boca.

   — Ele não te odeia! — afirma, sua fala sai por entre os dedos, baixa e fraca, como um sussurro.

   Percebo sua inquietação. Ele quer me dizer algo. Porém, antes dizer mais alguma coisa, meu fiel inimigo surge.

   — Olha só — Eric diz, conseguindo nossa atenção para si. —, esse casalzinho. Estam de namorinho aqui, é? — diz, franzindo o nariz. — Que nojo!

   Pedro o encara. Sinto o clima ficar tenso. Ambos olham um para o outro, com o olhar feroz, capaz de matar. Sinto que se der um movimento em falso, estarei em perigo.

   — Já quer brigar, Eric? — Pedro fala, como uma mãe vendo seu filho fazendo algo idiota. — Não foi o bastante a surra de ontem? — se vangloria de uma vitória que eu sei que não aconteceu. Eric está machucado, mas ele não perderia para o Pedro, e Pedro não perderia para o Eric.

   — Cala a boca, Pedro! — Eric grita, sua voz sai como o rugido de uma fera.

  Meus olhos o examinam. Podem começar a brigar a qualquer momento.

   — Sério, Eric, o que fiz para você? — indago, demonstrando minha súbita tristeza. — Por que você me odeia?

   Eric se contorce, seus olhos tremem. Posso sentir sua hesitação. Pedro mantêm seus olhos cravados nele, esperando sua resposta, que não vem.

   — Ele não quer encarar a verdade! — Pedro afirma.

   Verdade? Que verdade? — pergunto-me.

  Como se Pedro estivesse lendo meu pensamento, responde.

  — Ele gosta de você!

   Não consigo acreditar que Eric tem algum sentimento, que não seja ódio, por mim.

   — JÁ MANDEI CALAR A BOCA, IDIOTA! — Eric grita, exasperado.

   — E desde quando você manda em mim? — Pedro o provoca. — Acha mesmo que só porque você aumenta o tom de voz, vou te obedecer? — gargalha. — Que ingênuo!

   — O QUE VOCÊ DISSE, SEU IDIOTA?

   Tenho a impressão de que Eric vai explodir tudo. Sua raiva cresce ao extremo, em frações de segundos.

   — Ei! — ouço alguém dizer. — Melhor não começarem a brigar. — a voz demostra autoridade. Pedro e Eric recuam, ao verem William, amigo de infância de ambos, em sua frente.

   — Eric — William diz, impondo autoridade. —, se acalma!

   O que ele consegue fazer, me surpreende. Eric recua. Se acalma. Sei que Eric não tem medo dele, mas o respeita, isso é evidente.

   — Vai logo pra sala! — William diz, firme.

   — Tsc! — isso é tudo que escuto vindo de Eric. Ele está irritado, mas se retira, sem protestar.

   — Valeu, William! — Pedro o agradece.

  Imagino que Pedro o agradece por conter os dois. Nenhum deles iria recuar, se William não tivesse aparecido.

   — Sei bem que é difícil de lidar com ele - William admite.

   Pedro assente com a cabeça e diz:

  — É. Mesmo assim, ele te escuta, sempre te escuta!

  — Ele me respeita, só isso — William dá de ombros. Eric é uma pessoa difícil. É arrogante. Mandão. Impaciente. William deveria se sentir especial por ter seu respeito.

   Está na hora de ir para sala.

   As aulas não demoram, o tempo passa rápido. Logo, já estamos na última aula. Assim que a sétima, e última, aula termina, saio da sala. Não quero permanecer por muito tempo no mesmo local em que o Eric está.

   À noite, estou em casa, deitada no sofá. Distraída. Não consigo escutar nada, além dos meus pensamentos.

   Por que ele é assim? - pergunto-me. O que fiz a ele?

   Sinto minha cabeça latejar. Estou pensando demais, porém, não consigo parar.

   Ele realmente me odeia?

   Fecho os olhos. As palavras de Pedro invade minha mente. Suas palavras ressoam em mim.“Ele gosta de você!”. Não entendo porque Pedro disse isso. “Ele gosta de você!”. Talvez tenha dito apenas para provocar o Eric. “Ele gosta de você!” Mas não acredito que o Pedro falaria algo assim apenas para o provocar, o deixar irritado, ele não é assim. “Ele gosta de você!”

   — Ah! — suspiro. — Isto é cansativo! — exclamo, enquanto olho para o teto.

  Junto as minhas mãos, como se fosse orar, fecho os olhos e sussurro:

   — Que amanhã o sol venha para aquecer, não queimar.

Three

MAIY

   “Quinta-feira, dia 29 de abril

                                            07:14 AM”

   Estou na sala de aula. Observo o que acontece do lado de fora, pela janela. O dia está frio. Cinza. O sol não quer nos iluminar hoje.

   Não terei um bom dia! — concluo em pensamento.

   Poucos instantes depois, a sala já está lotada. A professora entra, é uma mulher relativamente baixa, cabelos longos, escuros e liso; pelo modo que está agindo, percebo que há algo, ela está contente, noto em seus olhos, algo irá acontecer.

   A professora se prontifica no centro da sala. Chama a atenção de todos os alunos para si. Ela irá anunciar algo — penso.

   Percebo a inquietação da maioria dos alunos, eles também sabem que algo irá acontecer. A professora quebra o silêncio e fala:

   — Alunos — sua voz ecoa. —, vocês realizarão um seminário.

   O silêncio que reinava, é substituído por gritos de reclamações.

   — Hã? Seminário? — um garoto chamado Kaio pergunta, irritado.

   — De novo, professora? — André reclama.

   — Droga! — Kaio esbraveja.

   — Pensei que nós não íamos mais fazer isso! — Gabriel diz, como uma criança birrenta.

   — Silêncio, turma! — protesta a professora.

   — O tema do seminário será sobre o que estamos estudando. Comentei com a diretora sobre isso e ela disse que seria uma boa ideia vocês apresentarem para os alunos das outras classes. Estaríamos ampliando o conhecimento dos mesmos e mostraríamos nossos brilhantes alunos do último ano, em ação — a professora nos encara, com grande expectativa nos olhos.

   — Quer dizer, então, que vamos apresentar nosso seminário para os alunos das outras turmas? — Kaio resmunga, em voz alta. — Esse seminário vai valer, pelo menos, cinquenta por cento da nossa nota, professora?

   A professora o encara e depois de um tempo, responde:

   — Valerá mais que isso. Se vocês se saírem bem, posso considerar como até setenta por cento da nota. Sei que vocês conseguiriam esses setenta por cento muito fácil — completa a professora, demonstrando confiança em seus alunos.

   A sala é tomada novamente pelo silêncio e a professora continua:

   — Vocês farão o seminário em duplas ou trios. Cada equipe apresentará e explicará um tópico do nosso assunto — ninguém diz nada, além da professora.      — Escolhi as duplas e trios. Já que não há problema, irei anunciar as equipes — a professora senta-se em sua cadeira, pega uma lista de nomes que estava em sua mesa e começa a falar, mantendo seus olhos fixos no papel e em nós:

   — Pedro e Camila — ninguém reclama. —; Júlia e Gabriel — sem reclamação. —; Júnior, Sofia e Vanessa — o silêncio permanece. — ; Augusto e Carol — a professora nos encara, achando que alguém abrirá a boca e protestará, mas ninguém faz isso e ela continua: -; Lauany, André e Laisa; Kaio, Cristina e Samuel; Vitor e Keila; Larissa e Beatriz — até o momento, o silêncio dominava a sala, mas no momento em que a professora anuncia que a Larissa fará dupla com a Beatriz; Beatriz com os punhos cerrados, soca a mesa e protesta:

   — Por que eu e a Larissa? Não posso fazer dupla com outra pessoa?

   A professora fixa os olhos em Beatriz; depois de um longo tempo, a responde

    — Beatriz, você terá que aceitar sua dupla. Decidi que você e a Larissa seria uma dupla e será assim. Não irei tolerar reclamações! — sua voz é firme, sombria e até arrepiante. Faz Beatriz ficar muda, não tem mais nada para dizer, apenas se senta em sua cadeira e permanece quieta. A professora continua:

   — Por fim, nossa querida dupla, que a própria diretora ordenou aos professores que sempre os mantivessem juntos: Eric e Maiy.

   Apesar de mim e o Eric sabermos o motivo dos professores sempre nos manterem como uma dupla, ele não aceita.

   — Por que tenho que ficar com aquela garota? — Eric pergunta, irritado, mesmo sabendo a resposta.

   — Você sabe muito bem o motivo de vocês serem uma dupla.

   O que a professora diz, ecoa em mim. A lembrança da nossa primeira semana de aula surge em minha mente. Nossa primeira briga.

   Era uma sexta-feira, nosso último dia de aula da primeira semana. Estava saindo do refeitório, quando o Eric passou, esbarrando em mim. Ele me encarou e depois começou a esbravejar, exasperado. Mesmo eu não tendo culpa, pedi desculpas a ele, o que o deixou ainda mais irritado. Ao nosso redor, todos os olhares estavam voltamos para nós, o que me deixou constrangida. Um garoto de uma outra turma, vendo a cena, veio até nós e tentou acalmar o Eric, mas em vão. Ele não escutava ninguém. Quando me desculpei novamente e tentei sair, o Eric segurou meu pulso, forte, o garoto que estava tentando o acalmar pegou sua mão, Eric recuou um pouco, o garoto disse algo que não consegui ouvir direito e, então, o Eric ficou furioso e deu um soco em sua cara, o garoto caiu no chão. Eu e o Eric fomos para à diretoria, essa foi a primeira vez que fui para a diretoria, estava frustrada. A diretora, que fora muito gentil e educada, disse que como punição ao que aconteceu, falaria aos professores que todos as atividades que devessem ser realizadas por mais de um indivíduo, faríamos juntos. Nunca poderiam nos separar. Desse dia em dia, passamos a realizar vários trabalhos juntos. Somos uma dupla eterna, pelo menos, até estarmos na mesma turma.

   — Vocês são uma ótima equipe, caso não saibam. Se vocês se esforçarem um pouquinho, já farão um seminário extraordinário — ouço a professora dizer, encarando o Eric.

   — Em uma equipe com ela, não vale a pena se esforçar — Eric retruca.

   — Pô, Eric. Você não sabe valorizar o que tem! — irritado, Pedro resmunga.

   — Cala a boca, Pedro! — esbraveja Eric.

   — Ei, ei. Nada de discussão — a professora diz, mantendo sua voz de autoridade.

   O tempo passa demasiadamente rápido, logo, a sétima aula termina e começamos a ir embora. Escuto os meninos conversando, enquanto guardo meus materiais na mochila.

   — Vamo pra quadra? — Kaio pergunta aos outros rapazes.

   — Vamo! — escuto André responder. — Gabriel, Eric, Pedro, cês também vão, né?

   — Opa! Vou, sim — Pedro responde. — Cê vem, Eric?

   — É. Vou! — Eric responde.

   E assim, os rapazes saem da sala. Eu saio em seguida.

   Ao me aproximar do portão, percebo que há alguém lá fora, alguém que eu conheço.

   — Lucas? — digo em forma de pergunta. Sei que é ele, então, por que estou perguntando?

   — O que você está fazendo aqui? — o indago.

   Os rapazes que saíram da sala primeiro que eu, ainda estão na escola, vindo em direção neste momento.

   — Desculpa por vim sem antes tê-la avisado — Lucas diz, demonstrando sinceridade. — Necessitava vê-la. — completa, sorrindo para mim.

   Os rapazes passam por nós. Eric para entre mim e Lucas, por um segundo, e o encara, cravando seus olhos, demonstrando ira. Lucas não se importa, apenas o analisa e depois, com um sorriso maldoso na face, direciona seus olhos para mim.

   — Poderíamos- — neste momento, Lucas é interrompido por seu celular, que começa a tocar. O atende.

   — Sim, é ele mesmo — Lucas abafa o celular com uma mão e olha para mim.

   — Desculpa, Maiy, a gente pode conversar depois?

   — Tudo bem — respondo, me retirando do local.

   Alguns segundos depois de ter me afasto de Lucas, escuto passos em minha direção, me inclino para trás, observando quem está vindo. Até que Larissa chega até mim. Ofegante, diz:

   — Maiy… pode me acompanhar até a quadra?

   — O que você irá fazer? — retruco.

   — Vou conversar com a Bia sobre nosso trabalho — responde, ainda ofegante. — Pode ir comigo?

    — Tá — respondo.

   Caminhos por alguns poucos minutos e chegamos até a quadra de futebol.

   Muita gente. Muito barulho. Quero ir embora — penso. Mas não posso ir embora, apesar de estar incomodada.

   — Está cheio, né? — Larissa diz, olhando para mim.

   — Sim — digo, desviando o olhar.

   — Você pode me esperar aqui? Vou conversar rapidinho com a Bia.

   — Tudo bem.

   Ela sorri e sai à procura de Beatriz.

   Estou perto da entrada à quadra. Enquanto Larissa está conversando com Beatriz, estou observando os rapazes, que conheço, jogarem.

   Eric! — o observo. Ele joga bem.

   Percebo que Eric para um instante e me encara. Posso imaginar o que ele quer dizer, me olhando daquele jeito: “O que aquela idiota está fazendo aqui?” — Não consigo conter um sorriso ao imaginar o que se passa pela cabeça dele. O imagino irritado. Posso ver sua expressão, nitidamente, em minha mente. Não nos damos bem, mas devo admitir que sua expressão é super fofa quando está irritado. Por alguns instantes, sinto os olhos de outra pessoa em mim. Pedro. Ele olha para mim e sorri, como se perguntasse: “O que você está fazendo aqui? Você nunca vem nos ver jogar.” Tento sorri para ele, mas é em vão.

   Ainda estou observando os rapazes jogando, quando sinto duas mãos geladas segurarem meus ombros. Quando me inclino para trás, vejo Lucas. Ele fixa seus olhos em mim, sinto desconforto. Ele me puxa para perto de si, encostando nossos corpos um ao outro. Tento ao máximo sair de suas garras, mas ele não deixa. Está com um sorriso maldoso nos lábios e um olhar que me deixa com náuseas. Posso sentir minha pulsação oscilar. Quero correr; gritar; sair dos seus braços, mas não consigo. As palavras não saem. Não consigo me mexer. Sinto que Lucas irá forçar um beijo a qualquer momento. Até que então, escuto Larissa gritando:

   — PEDRO! A MAIY ESTÁ EM PERIGO! AJUDA ELA, POR FAVOR!

   Posso sentir inquietude ao meu redor. Um segundo depois, Eric surge. Em frações de milésimos, já não sinto mais as mãos pegajosas de Lucas me segurando. Ele está no chão. Eric deu um soco em sua cara. Foi tão rápido, meus olhos não acompanharam a ação. Sinto-me extasiada.

   — O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO, SEU IDIOTA? — escuto Eric exasperar.

   Lucas levanta-se, cuspindo sangue. Revida contra Eric. Dá um soco em seu rosto, o fazendo se inclinar para baixo, mas não cai.

   — Sai da minha frente, seu trombadinha! — Lucas retruca.

   Eric está ainda mais enfurecido, como nunca tinha visto antes. Não demora quase nada para se recompor e acertar outro soco em Lucas.

   — CALA A BOCA, SEU BABACA!

   Antes que Lucas revide novamente, Pedro, William e mais três rapazes aparecem, seguram Eric e Lucas. Pedro olha para mim, preocupado, e pergunta:

   — Você está bem?

   — Sim — respondo, finalmente conseguindo falar.

   Escuto William pedindo para Eric se acalmar. Olho para eles, quando Eric começa a falar, suas palavras ecoam.

   — VOCÊ NÃO VIU, WILLIAM? — Eric está furioso, como nunca. — ESSE DESGRAÇADO ESTAVA AGARRANDO ELA! — percebo seu ódio emanando pelos ares.

   — Fica quieto, idiota! — Lucas diz, cuspindo sangue. Como se o que ele fez, não fosse nada.

   — Vaza daqui! — Pedro diz. Suas palavras soam em forma de ameaça.

   Lucas encara Eric. Posso sentir seu ódio e frustração, quando diz:

   — Isso não vai ficar assim, seu trombadinha! — e vai embora.

   — Mauricinho de merda! — Eric diz, cuspindo sangue no chão.

   Estou mais calma.

   Em poucos passos, fico defronte à Eric. Não consigo esconder minha preocupação com ele. Posso sentir seus olhos em fúria, mas desta vez, seu olhar não é pra mim.

   — Obrigada! — me curvo, o reverenciando. Demonstrando minha sincera gratidão.

   — Eu faria isso por qualquer pessoa! — retruca.

   — Mesmo assim, obrigada! — estou realmente grata a ele e tento demostrar isso. — Sua boca está sangrando, deixe-me cuidar disso.

   — Não precisa! — resmunga, porém, de forma gentil.

   Consigo sorrir, de modo genuíno e digo:

   — Você pode deixar seu orgulho de lado, apenas desta vez?

   Pedro sorri e diz:

   — Vai com ela, Eric!

   Me impressiono quando Eric assente e me acompanha para fora da quadra.

...****************...

ERIC

A acompanho até chegarmos em uma casa que está abandonada, ficamos no alpendre. Ela se senta em um banco que há no local e com os olhos, demonstra que quer que eu sente ao seu lado. Me sento e pergunto:

   — O que cê vai fazer?

   — Cuidar dos seus machucados. Pensei que já soubesse disso — responde, de modo gentil.

   — Tsc! — esse é o único som que sai da minha boca. Não sei o que dizer, afinal, estamos aqui para ela cuidar de mim, dos meus machucados e pergunto algo tão idiota. Que idiota! — digo a mim mesmo, em pensamento.

   Quando ela tira da mochila uma garrafa com álcool e algodão, me sinto no direito de perguntar por que ela carrega isso na mochila. Mas não pergunto. Estou curioso? Estou. Vou perguntar? Claro que não! Engulo minha curiosidade.

   Ela começa a desinfetar meus ferimentos.

   — Está doendo? — ela pergunta.

   — Ai, ai, ai, ai… — sinto minha pele arder, como se estivesse pegando fogo. — Agora doeu um pouco. Vê se presta mais atenção no que você está fazendo! — digo, irritado. Pela expressão que ela faz, sei que não gostou do modo como acabei de falar. Odeio quando ela me olha desse jeito, sinto ódio de mim.

   — Vou ter mais cuidado! — afirma.

   Percebo que ela está com seus olhos fixos em minha boca. Afinal, é onde meu ferimento se encontra. Mas isso, de algum jeito, me faz querer beijá-la. Nossas bocas estão muito próximas, mas não vou beijar ela. Não agora, pelo menos.

   Enquanto ela estava desinfetando meus ferimentos, seus olhos se voltam para mim. Ela me encara, com aqueles belos olhos castanhos. Me deixa constrangido. Fico com vergonha e percebo que ela também fica. Estamos corados.

   — Tá! Já está bom, me deixa agora! — digo, afastando-me.

   — Hã? — ouço apenas isso de seus lábios, enquanto me afasto.

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