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Fantasma Monocromático

Evento 0

A tristeza de se ter a chance de uma nova rota de vida era nítidos naqueles olhos. O azul marinho similar ao céu estrelado à noite estavam delineados de lágrimas, que trabalhavam arduamente para serem contidas e não escorregarem por sua pele branca.

Os dedos estavam fechados em punho, cerrado ao ponto de fazer nós brancos em suas juntas. Poderia sangrar diante da força que espremia as curtas unhas contra sua palma, mas seu corpo não funcionava assim.

Talvez, jamais funcionaria.

Afinal de contas, a pequena chama de esperança que tivera se fora. O momento em que havia sido feliz e acreditado ter encontrado a sua saída, foram trocados por sabe-se lá o que.

Por que havia acontecido aquilo consigo?

Por que o grande ministro havia lhe dado um presente tão falho?

Havia dito que queria se apaixonar? Certamente que não.

Havia dito que desejava ser feliz? Oras, sabia que havia perdido isso alguns anos.

Então... por qual motivo ela fora colocada em seu caminho?

Erguendo os olhos escuros para o céu, contemplara a lua branca e cheia. Pela primeira vez em anos, acontecia da lua ficar cheia sinalizando a catástrofe que poderia ocorrer. Por sua luz refletida fora possível ver aquilo que ele mesmo negara a si mesmo. Enxergara o sorriso brilhante e os olhos refletindo a felicidade plena de alguém que é livre. Por causa da luz da lua cheia ele vira além da conta, enxergara um caminho até ela.

E quando estava prestes a encostá-la... fora tomada de si. Dera-lhe as costas, sem mais e nem menos. Sem a chance de explicar.

Será que assim como ele, aquela garota também enxergara algo? Havia mostrado sua verdadeira face à ela? Não tinha a intenção, cumprira bem o seu papel por todos esses anos, e não haviam motivos para receber tamanho castigo.

A perdera.

Perdera aquela que fora uma mera ilusão.

Perdera aquela que acreditava ter sido a sua chance para uma rota diferente.

— Devemos retornar agora.

A voz baixa e cautelosa do amigo o fizera ter arrepios. Baixando a cabeça, respirou fundo e conteve suas lágrimas. Reparando em seus pés a máscara quebrada, agachou-se para segurá-la em seus finos dedos.

Analisou a máscara, tamborilando os dedos suavemente por sua textura levemente áspera. Virando-a posicionou em sua fronte e a vestira perfeitamente.

Somente usando sua máscara é que pudera dar as contas para o extenso jardim da escola, e seguir seu amigo para os dormitórios.

Cada passo dado era uma decisão tomada.

Não deixaria o seu dever de lado, fora o escolhido para cumprir tal papel.

Não permitiria que outros se envolvessem em sua história, carregaria o fardo sozinho.

E também, não se permitira apaixonar novamente. Pois ela seria roubada de si.

Seguindo esses passos, encontraria uma forma de acabar com o mal pela raiz. Por aquele que ousava em manter tudo daquele jeito, como sempre. O obrigaria a seguir em frente, nem que para tal fim tivesse de sujar suas mãos fantasmagóricas de sangue.

Uma garota que gosta de jogos

Em um quarto escuro cujo único foco de luz vinha de um monitor de computador, estava uma garota. Fones de ouvido, olhar vidrado na tela, postura curvada para frente, seus olhos amendoados liam ligeiramente as linhas que apareciam em sua tela. Depois de reler por cinco vezes a fala do personagem, a garota desvia o olhar para a direita onde seu caderno de páginas amareladas se encontrava aberto.

Depois de doze anos sem abrir aquele caderno, havia o feito para relembrar cada anotação contida ali garantindo o sucesso. O sucesso de ter o final romântico com os personagens paqueras do jogo.

Ah sim, ela era uma desvairada por jogos. Os personagens masculinos com belos traços e personalidades encantadoras foram seus grandes heróis nos primeiros meses em que se trancara no quarto. Quando a realidade parecera assustadora e perigosa demais, a garota ligava seu computador e jogava por horas.

Ponderando as respostas anotadas em seu caderno e relendo o diálogo pela sexta vez, a garota finalmente escolhia uma das alternativas de reposta. Desbloqueando assim a continuação do diálogo, ela ponderara as respostas por mais vinte minutos até que uma música baixa soasse em seu headset.

Ligeiramente ela arregalava os olhos, encostando suas costas doloridas na cadeira e suspirando aliviada. A imagem do personagem de cabelos platinados e comprido ao lado de uma mocinha de cabelos curtos e castanho aquecera seu coração. Finalmente conquistara o final romântico da terceira rota, o popular. Apesar que sua intenção originalmente não era essa.

Jogando a cabeça para trás, fechara os olhos por um instante os sentindo arder. Massageou suas pálpebras com as pontas dos dedos, ao longo que um suspiro pesado e cansado escapava de seus lábios. Abrindo os olhos novamente, piscara algumas vezes para o teto e então encarara o grandioso poster colado na sua parede, ao lado da mesa em que se encontrava.

Ali em uma pose estava o seu alvo. Com seus cabelos negros e olhos azul marinho. A seriedade e serenidade em seu semblante diziam que era um rapaz charmoso e fantasmagórico.

Pelas quatorze horas que passara em frente ao computador jogando “Monocohrome Ghost”, ela tentara encontrar a rota daquele infeliz. Quer dizer, depois de ter notado que sua personagem Mayla seguia para a rota do esquecido, optara em verificar se algo teria mudado nas demais rotas dos personagens. E de praxe, tentaria descobrir alguma coisa que levasse à rota do vilão.

Obviamente não dera certo. Não houvera uma pista sequer de onde a rota nova começava. Apesar de os diálogos novos parecessem bastante suspeitos, nenhuma resposta desbloqueara uma cena inédita. Parecia completamente inacessível e desafiador.

― Está bem escondido, não é? Mas não vou desistir, gastei toda a minha mesada só pra te ver.

Sorrindo motivada, a garota esticava os braços para cima e se espreguiçava. Movendo os ombros e o pescoço espantara qualquer sinal de sono, e mais uma vez se curvara para frente do computador. Salvara a imagem do final romântico da terceira rota, e clicara para recomeçar o jogo.

Enquanto a tela inicial carregava, aproveitara para se levantar depois de três horas sentada. Fora até o banheiro lavar o rosto, prendera os cabelos compridos em um coque frouxo antes de retornar à mesa. Colocando o headset mais uma vez sobre suas orelhas, ela se ajeitava na cadeira pronta para mais longas horas de jogo.

Puxando o caderno para mais perto analisara com extremo cuidado as rotas. Anotava os novos diálogos e as respostas corretas para cada paquera, evitando ao máximo de olhar na internet a resposta para a rota do vilão. Descobriria por conta própria, com sua astúcia.

E foram diante de tentativas e erros que ela conseguira encontrar.

Mas não era a rota tão desejada.

Cada personagem paquera tinham dois caminhos que eram determinados pelas respostas do jogador. O final desastroso que culminava em um trágico fim para ambos os personagens, ou o final romântico que trazia um casal feliz por ter passado pelos obstáculos.

Diferente da primeira versão do jogo, que haviam apenas três personagens paqueras, ou seja três rotas diferentes, o update trouxe uma nova rota para um velho personagem. O vilão finalmente tinha sua rota exclusiva, e segundo a empresa criadora do jogo, ela trazia novas informações sobre o enredo prometendo dar nó nas pontas soltas.

No instante em que percebera seguir um caminho que o vilão aparecia com maior frequência, a garota chegara a sentar sobre as próprias pernas sem piscar. Fora cuidadosa em cada resposta, levando em consideração que não sabia qual aumentaria a intimidade entre os personagens ou não.

Mesmo assim, depois de quatro horas jogando, ela alcançara um final...

Um final desastroso.

Nem ficara tão aborrecida, a cena era inédita. Prestara tamanha atenção no desfecho da história que seus olhos ardiam com a claridade do computador. E até mesmo chegara a lacrimejar de emoção, ou seria de tristeza pelo trágico final que o vilão levara? Ele apenas despedira dela como se fosse uma velha amiga e então desaparecera.

Desviando os olhos para o pôster em sua parede, ela sorria ao enxugar uma lágrima solitária.

― Como pode desaparecer sem me dizer uma palavra? Pensei que tínhamos algo de especial rolando entre nós!

Estando prestes a clicar para recomeçar o jogo pela trigésima vez, ela ouvira batidas na porta. Não desviara os olhos e nem baixara os fones, apenas clicara para salvar o final e recomeçar.

Quando a figura de sua irmã mais velha passara a porta carregando uma bandeja, a garota já tinha recomeçado o jogo.

― Está jogando de novo? Não se cansa, não? ― Sem respostas, ela apenas pousara a bandeja na cama desarrumada e olhara em volta soltando um suspiro ― Mas que chiqueiro isso aqui. Se tem tempo para jogar, porque não usa para limpar seu quarto?

― Se já terminou pode sair, está me atrapalhando.

― Ah, ganhei uma resposta dessa vez. ― Sorria abertamente a irmã, abaixando-se para ver a tela do computador ― Oh, é o bonitinho do seu pôster! Mas está diferente...

― O que quer?

― Eu não te disse mais cedo que almoçaríamos juntas? ― Sorrindo triunfante, a irmã pegara a bandeja e colocara um dos pratos na mesa do computador, empurrando o teclado para ter espaço. ― E também disse, caso tenha se esquecido, de que mais tarde iremos ao mercado.

― Eu não vou.

― Vai sim! É o seu aniversário de dezessete anos Ayla. Mamãe está ansiosa pra comer bolo de chocolate contigo.

Ah, o golpe baixo fora dado.

Era verdade que sua amada mãe sempre fora um golpe baixo, pois Ayla sabia que ela tentava exaustivamente lhe tirar do quarto. Com ela não poderia lhe dar respostas malcriadas, muito menos sentir raiva por ter seu espaço sagrado - vulgo quarto - invadido. Afinal, ela era compreensiva até certo ponto.

Negar celebrar o seu aniversário poderia magoá-la. E Ayla não queria isso.

― Eu espero aqui o bolo.

― Nada disso, as duas filhas amáveis irão acompanhar sua mamãe nas compras para fazê-la feliz. Pelo menos essa noite. ― A irmã olhara em volta do quarto e abria um sorriso gentil ― Podemos comer aqui mesmo, se é o que deseja.

Ponderou encarando o poster em sua parede. Depois de tantas horas focada no jogo, talvez comer um doce e ouvir a risada de sua mãe e irmã fossem dar um alívio para o seu cérebro. Talvez chegasse a espairecer o suficiente para desbloquear o final romântico com o seu personagem preferido.

E seria apenas por aquela noite.

Não deveria ser tão má assim com aquelas duas, certo?

― Tudo bem, eu vou. Mas depois comemos o bolo aqui.

― Está certo, prometido capitã ― Ria a irmã empolgada, puxando um puff para se sentar e comer junto da caçula ― Aliás, a última vez que entrei aqui você já estava jogando... Há quanto tempo começou?

― Desde que comprei o jogo.

― E quando foi isso?

― Ontem à tarde.

― E desde então está jogando? ― Questionava surpresa a irmã. ― Você foi dormir?

― Não. E não pretendo ― Apressara a dizer, apontando o indicador para a irmã que se calou imediatamente. ― Não até conquistar o final dele.

― Do bonitinho? O que ele tem de especial pra sacrificar seu sono, Ayla?

Dando uma garfada no arroz e feijoada, a garota ponderou pela segunda vez. Encarara o poster e não deixara de sorrir levemente ao lembrar da sensação que tivera ao jogar pela primeira vez Monochrome Ghost. Apesar que era mais nova, e aquele fora o primeiro jogo de simulação que experimentara.

Ainda assim, Ayla jamais se esqueceria do pensamento que viera em mente quando o vira pela primeira vez. “Tão bonito”. Poderia ser por conta de seu gráfico 2d bem desenhado, mas com o passar do tempo ela se tornara sensível aos nuances de sua personalidade. Tudo o que queria era que ele tivesse uma rota para ela conquistar e se projetar na personagem que controlava.

E lá estava ela com essa chance em suas mãos depois de três anos.

― Ele é especial por conta própria, não preciso destacar nada.

― É... Ele até que é bonitinho para um desenho. Mas ficar viciada no jogo apenas por sua aparência é bem terceira série.

Movendo o garfo em uma resposta muda, Ayla girou a cadeira para ficar de lado e olhar para a irmã mais velha.

― Concordo, mas eu gosto dele porque é bem misterioso e isso aumenta o seu charme visual.

― Misterioso... Certo. E você já desvendou os mistérios do bonitinho?

Enchendo a boca de comida, Ayla movia o garfo mais uma vez e espreitava os olhos antes de negar com a cabeça. A careta divertira a irmã mais velha, que abafara o riso com a mão. Ora essa, estava há mais de doze horas tentando desvendar os mistérios daquele infeliz, e até agora não encontrara nada.

Quando terminasse aquele prato de feijoada e arroz iria tentar de novo encontrar o final romântico com ele. E não haveria quem a parasse.

Tornando a comer do seu almoço, percebera o olhar caloroso da irmã sobre si. Estranhara o sorriso bobo que tinha em seus lábios.

― Por que está me encarando?

― Acho que essa é a primeira vez que conseguimos conversar direito desde que se trancou aqui. ― Percebendo que Ayla desviara o olhar, a irmã tratara de respirar fundo e mexer em seu prato ― Mas me diga, quem você prefere, eu ou o bonitinho?

― Certamente o Levi.

― Levi? Quem? Espera, você escolheu um personagem de jogo ao invés de sua irmã mais velha? Estou ofendida!

Ayla rira.

Pela primeira vez em seis meses, ela rira por causa de outra pessoa.

Um riso baixo e abafado, mas divertido.

Sua irmã chegara a alargar o sorriso desfazendo a carranca birrenta de outrora. Mas nada comentara, preferira manter a birra na tentativa de prolongar aquele riso.

― Vê se pode uma coisa dessas! Eu sendo substituída por um personagem de videogame. Vou comer todo o chocolate do seu bolo como vingança.

― Se jogasse saberia muito bem o porquê de Levi Belchior ser o número um. Até concordaria comigo.

― Diga-me, ó minha irmã avacalhona, por que o projeto 2d seria melhor que eu? Já que a reles mortal aqui não joga.

Encarando o pôster, Ayla mordia os dentes do garfo pensativa. Não deixara de sorrir em lembrar da rota que recém encontrara no jogo. E das novidades do mesmo.

Levi Belchior era o vilão do jogo, apesar de não ser claro o motivo. O cenário escolar o colocavam no cerne de situações assustadoras como causadoras dos mesmos. Somente seu amigo, o popular conquistado anteriormente, saberia o verdadeiro motivo de Levi ser chamado de fantasma.

Porém, essa era uma informação que Ayla ainda não desvendera. Chegara a conclusão de que as pontas soltas das quais a empresa tanto prometera estavam guardadas no final romântico de Levi.

No entanto, não eram as informações que desejava alcançar. Apenas queria conquistá-lo, agradá-lo, vê-lo sorrir para si. Pois, afinal de contas, Levi merecia.

― Levi é gentil, mesmo que o ofendam estará disposto a ajudar qualquer um. Seria como um... Anjo? ― Fazendo uma careta, Ayla olhara a irmã e então alargava o sorriso ― Apesar que o chamam de fantasma... Mas é melhor do que ter uma irmã vingativa e chocólatra.

― He... Sua sem graça.Já terminou de comer? ― Levantando-se logo após enfiar a última garfada na boca, a irmã mais velha recolheu os pratos na bandeja e logo se preparava para sair do quarto. ― Aliás... Se o bonitinho fosse real mesmo, o que ele seria: um fantasma ou um anjo?

― Isso faria diferença?

― Considerando uma situação hipotética da qual eu não estivesse ao seu lado para roubar seus amados chocolates, o bonitinho poderia lhe fazer companhia no meu lugar.

― E o que isso teria a ver com ser fantasma ou anjo?

― Ficar do seu lado e aguentar seu vicio em videogames... Só um anjo mesmo. ― Gargalhando, a irmã correra para porta antes que uma almofada fosse jogada contra si ― Vou te enviar um fantasma para assombrar seus sonhos!

Fazendo uma careta para a porta fechada, Ayla resmungava ao colocar o headset e girar a cadeira para o computador. Mesmo depois de retomar o jogo, estando concentrada em sua tarefa pessoal, ela sorrira diante do conforto.

Talvez, apenas talvez, não seria tão ruim assim sair do seu quarto e passar um tempo com sua mãe e irmã.

Fatídico assalto no mercado

Dentro do carro, Ayla não desviava os olhos da janela. Parecia capturar cada detalhe da cidade à noite em uma concentração invejável, se não fosse por seus lapsos de vez em quando. Arregalava os olhos amendoados como quem tivera uma geniosa ideia, e então puxava o celular para anotar algo no bloco de notas.

No entanto, tudo o que se passava em mente eram estratégias para encontrar uma mísera brecha. Aquela que serviria para desbloquear o final romântico com Levi Belchior em seu jogo.

Passara a tarde inteira buscando uma forma de conquistar o bendito final, sempre caindo no final desastroso. Sempre falhando. Clicara tanto no botão recomeçar, que seu mouse chegara a falhar algumas vezes, em outros momentos automaticamente dava uma resposta quando deveria testar outras.

As seis horas em frente de computador sem levantar, sem comer e até mesmo sem beber água resultaram em plena frustração.

Quando sua irmã mais velha lhe chamara para irem ao mercado, foi como um sinal de que ainda estava viva apesar da irritação. Sair até a garagem e respirar fundo a fizera se lembrar de que ainda estava viva.

E mesmo ao estacionar o carro na garagem do mercado, tendo ela descido do veículo e pegar o carrinho, Ayla continuava a matutar sobre as rotas.

― Desgruda desse celular ― Resmungava a irmã mais velha ao pegar o aparelho e bloquear a tela enfiando-o, em seguida, no bolso de sua calça ― estamos numa missão agora.

― E qual seria?

― O terror de todos aqueles que são desacostumados com a vida domiciliar. O pesadelo daqueles que desejam economizar seus salários ― Dramaticamente ela puxara um pedaço de papel do bolso, erguendo-o para a irmã caçula ― Lista de compras.

Segurando o riso, Ayla empurrava o carrinho sem desviar os olhos da irmã.

― E por acaso somos alguns deles? Dos que se sentem aterrorizados por esse meliante, quero dizer.

― Infelizmente, minha cara irmã desvairada, somos parte de todos eles. ― A irmã aproximara o rosto do ouvido da caçula, e apontara com o indicador discretamente para a mãe, que caminhava mais a frente ― nosso objetivo é verificar a data de validade e aproveitar as promoções. Assim, mamãe ficará feliz.

― Meninas, por onde devemos começar?

Quando a mãe virara para trás, as irmãs apenas desceram os olhos para os itens da extensa lista de compras.

― Deixe o bolo por último, se não vai estragar caso demoremos na compra.

― Tem razão, vamos começar pegando a caixa de leite?

Seguindo a sua função de empurradora de carrinho, Ayla se mantivera quieta três passos atrás de sua mãe. Mesmo que o seu celular estivesse no bolso com as anotações do jogo, sua mente trabalhava incessantemente na busca de uma solução.

Estava inconformada, certamente, em não ter encontrado a rota romântica de seu personagem preferido. Seu orgulho estava ferido, pois sempre se julgara conhecedora de seu perfil. Deveria saber, ou intuir, quais respostas aumentariam a intimidade com o infeliz.

Ainda que fosse do seu desejo fazer fumaças saírem de suas orelhas de tanto pensar, não dera continuidade. Quando bufara pela quarta vez recebera um olhar repreendedor de sua irmã, em uma mensagem clara de que seu chocolate seria roubado caso continuasse a bufar.

Pegando a lista de compras e anotando alguns itens no celular, Ayla caminhara pelos corredores do mercado para adiantar as compras. Só retornava para o carrinho quando seus braços estavam cheios de produtos, e os ajeitava antes de sair para o próximo item ou empurrar o carrinho para perto de sua mãe.

Quando se dera conta não deixara de sorrir, fazer compras parecia divertido até. Não pela busca de preços baixos ou produtos de boa qualidade, mas por espairecer. Pensar em outra coisa.

― Ayla, vamos para a fila da padaria!

― Estou indo.

Pegando o produto da prateleira, a garota correra até a padaria próximo aos caixas. Para a sua surpresa a fila estava grande, tendo sua mãe esperando exatamente no meio junto com o carrinho. Após arrumar os produtos e riscar os itens de sua lista, a garota sorria levemente para a mãe.

― Pegamos tudo? Falta algo?

― Da minha parte não. ― Puxando o papel com a lista completa, a irmã mais velha fazia uma checagem.

Enquanto a mãe e irmã mais velha estavam de costas para si checando a lista de compras, Ayla se apoiara no carrinho e soltara um suspiro cansado. Olhava em volta sem interesse algum particular, porém seu olhos se arregalaram no instante em que reconhecera os risos vindo atrás de si.

Não se virara. Tampouco conseguira esconder que as percebera ali. Seu corpo simplesmente enrijecera dando início a um suor frio.

― Olha só quem encontramos por aqui, meninas. Aquela que seduziu o professor está fazendo compras.

Lentamente Ayla erguera os olhos para frente, deparando-se com sua mãe e irmã a fitando de olhos arregalados. Por um instante prendera a respiração sem saber o que fazer. Os risos que vinham atrás de si apenas aceleravam seu coração, deixando-a sob pressão.

― Está fingindo que não nos conhece? Poxa Ayla, nós te ajudamos a ter um momento tão especial...

Não olharia. Não deveria olhar.

Finja que não as escutou.

Finja que não se trata de si.

Você não está sozinha.

No entanto, quando olhara pela segunda vez para sua mãe e irmã, encontrara a surpresa ainda presente em suas fisionomias.

Que cara ela estava fazendo para a sua família?

Estaria se declarando como culpada?

Teria algum tipo de banner em sua testa apontando para si como alvo de palavras tão malcriadas?

― Mamãe...

Sua mãe apenas aproximou-se de Ayla, segurou o capuz e o vestiu sobre sua cabeça e lhe dirigiu o mais gentil sorriso.

― Parece que sua irmã esqueceu de pegar um amaciante para roupas. É perto daqui, poderia buscar para mim?

Encarando os olhos de sua mãe, Ayla sentira vontade de chorar. Ela sabia, sua mãe sabia que aquelas palavras foram direcionadas como uma flecha para a sua filha mais nova. Palavras essas que davam indícios do que teria acontecido para que Ayla desistisse da escola e se trancasse no quarto por um semestre inteiro.

Aquilo que tentara esconder fora visto.

Mas sua mãe não parecera se importar. Ou pelo menos fingira melhor que si mesma.

Sem coragem e confiança em sua voz, Ayla apenas assentira e saíra da fila da padaria para ir até o corredor da lavandeira.

Sob passos apressados e cabeça baixa, fugira das palavras que traziam lembranças tão incômodas. Sufocantes, doentias, desesperançosas, essas eram as lembranças de seis meses atrás.

E mesmo quando estava de frente à prateleira de amaciantes, Ayla não conseguira focar como antes. Os risos ecoavam em seus ouvidos, as vozes e as palavras eram como sibilo de uma serpente enroscada em seu pescoço.

Seu corpo tremia, sua cabeça latejava, os olhos marejados tentavam segurar o rio prestes a inundar seu rosto.

― Ah que indecisão essa! Deveria ser mais simples fazer compras, mas cá estou completamente perdida!

Virando o rosto no capuz, Ayla encontrara alguém mais alto que si usando máscara. Estranhando, desviara o olhar para a prateleira questionando sua sanidade.

― Isso que dá não conhecer as coisas antes de viver. Qual devo escolher? ― A pessoa mascarada virou-se para Ayla, inclinando a cabeça infantilmente ― Né, moça, qual você acha mais válido? Eu pegar aquele que já conheço ou testar um novo?

Piscando algumas vezes Ayla dera um sorriso torto e envergonhado ao encarar a máscara novamente. Toda branca com dentes desenhados em 3D, e alguns detalhes em vermelho no lado esquerdo da face. Não enxergara os olhos, e tampouco o pescoço da pessoa. Porém conseguia ouvir de sua voz, baixa e rouca quase indecifrável.

― P-Perdão?

― Ah, eu te assustei não é? Uma pessoa não deveria ir fazer compras usando uma máscara como se estivesse se escondendo, mas sabe como é... Não queria ser reconhecido.

Pela segunda vez Ayla se questionava sobre que tipo de cara deveria estar fazendo naquele momento. Como aquele sujeito conseguia enxergar com aquela máscara? Até sua voz era abafada e difícil de escutar. Estava com medo, muito medo. A máscara em si era assustadora demais.

― E-Entendo.

― Então, o que prefere? O caminho conhecido ou desconhecido?

Pelo canto dos olhos Ayla notara que o sujeito encarava a prateleira dos amaciantes. Lembrando-se do pedido de sua mãe, a garota estendera a mão e pegara o único que reconhecera.

― Se o que costuma pegar lava bem as roupas, então continue com ele. É melhor do que experimentar e estragar suas roupas.

O sujeito rira por debaixo da máscara, balançando a cabeça enquanto pegava uma garrafa do amaciante.

― Tem razão! Por que raios iriamos para o desconhecido? Pode ser perigoso.

Ayla não olhara mais para o sujeito mascarado. Segurando o amaciante em suas mãos, ela suspirava em imaginar que naquilo ele estava certo. O caminho desconhecido era realmente perigoso, e ela sentira na pele isso.

Não que fosse completamente culpa sua o que acontecera. Não imaginava que deveria pensar no lado ruim de pessoas tão amáveis em sua volta. Mas não saber disso e agir de acordo com sua vontade lhe custara o preço.

O preço de sua liberdade.

Agora não poderia ir mais ao mercado? Por temer encontrar aquelas garotas, e ouvir suas vozes com palavras horrendas? Até isso deveria sacrificar?

Até quando aguentaria aquilo? Qual seria o seu limite?

― Talvez eu devesse apenas ir para outro lugar, onde ninguém me conheça...

O pensamento a pegara de surpresa, e chegara a rir de si mesma por tê-lo admitido com tamanha facilidade. Balançando a cabeça e respirando fundo, virou-se para sair do corredor. Só que seus pés pareciam ter criado raízes no chão.

Elas ainda estariam lá?

Teriam continuado a falar algo para sua mãe e irmã?

O que faria?

Não queria voltar. Simplesmente não queria. Só de saber que elas estavam lá, ou então que sua família poderia ter escutado algo que não deveria, fazia surgir dentro de si a imensa sede de fugir. Fugir para bem longe.

Coração acelerava na medida que o pavor aumentava.

Pelos céus, o que faria?

― Diga-me entre viver em um mundo onde tudo conhece mas ninguém a reconhece, ou permanecer no mundo onde tudo desconhece e todos a reconhecem, qual escolheria?

A voz do sujeito mascarado estava próxima demais. Soava como se estivesse em seu ouvido, apoiado em seu ombro em suas costas. Não se sentira confortável com aquela sensação, o suor escorria em seu rosto ainda coberto pelo capuz.

Quem era aquele sujeito?

O que queria de si?

Por que estava perguntando aquelas coisas? Mal conseguia pensar direito, não conseguiria ponderar uma charada daquelas.

― Né... Me diga a sua resposta.

Sem se virar. Sem pensar muito à respeito. Apenas desejando ir para perto de sua mãe o mais depressa o possível.

Um estrondo a fizera congelar no lugar, ou seriam os gritos que vieram logo em seguida? Ayla abraçava o amaciante contra o peito, olhando em volta em notar pessoas correndo desesperadas pelo corredor.

Já não sentira a presença do sujeito mascarado, e constatou sua ausência ao olhar para trás encontrando um corredor deserto.

― Todo mundo reunido aqui! Se alguém tentar alguma gracinha é bala na cabeça.

Encolhendo os ombros, Ayla não sabia o que fazer. Os gritos no mercado se resumiam à vozes masculinas dos assaltantes.

Onde estava sua mãe? E sua irmã? Estavam em perigo? Certamente, assim como todos os demais naquele mercado.

Em pleno desespero a garota sapateara quando uma das vozes parecia se aproximar do corredor em que estava. Na ponta do corredor de onde viera, tinha um maquinário repleto de caixas deixadas por um dos funcionários. Maquinário grande o suficiente para Ayla se agachar e esconder-se.

Encolhida atrás do maquinário e a estante, a garota tremia de pavor. Tentava enlouquecidamente evitar qualquer suspiro, ou outro som que denunciasse seu esconderijo. Também focara seus ouvidos nas vozes dos assaltantes para medir suas distancias.

Pareciam andar para lá e para cá, ordenando algo aos funcionários ou ameaçando algum cliente. Jugando que as vozes estavam mais distantes, Ayla esticara um pouco da cabeça e espiara o corredor da padaria e do caixa, onde haviam reunidos os clientes.

Reconhecera sua mãe, sendo amparada pela irmã mais velha. Estavam perto da padaria, mais à frente. Fazendo um ligeiro sinal, Ayla sorria levemente quando fora notada pela irmã mais velha, que apenas sussurrara algo discretamente no ouvido da mãe.

A senhora de cabelos acinzentados erguera os olhos para encontrar a filha caçula, e parecia sorrir aliviada em tê-la visto.

Porém a troca de olhares fora interrompida quando Ayla se encolhera em seu esconderijo ao ouvir as vozes dos assaltantes ficar mais alta e próxima.

― Quero todo o dinheiro e celular, podem passando aí! E se alguém fizer gracinha... Já sabem.

Certo, ela estava com o celular! Poderia ligar para a polícia, não é mesmo?

Quando pegara o aparelho em mãos e digitara o número da polícia, um alarme soara em todo o mercado. Alto e estridente, o som obrigava todos a tamparem os ouvidos. Desajeitada na hora de cobrir os ouvidos, Ayla deixara o celular cair no chão, fazendo barulho.

― Quem foi? Quem foi? Foi você? ― Berrava o assaltante, tendo em seguida o grito de uma mulher ― Foi você quem chamou os fardinha?

Antes que desse conta, ela o recolhera rapidamente. Imaginava que o alarme de segurança do mercado teria sido alto o suficiente para que seu pequeno acidente não fosse notado. Porém, não tinha visão do que acontecia atrás de seu esconderijo.

Com os dedos trêmulos tentando desbloquear a tela do celular, o desespero dera espaço para o pavor quando vira um par de botas pararem em sua frente.

Lentamente Ayla erguera a cabeça, tendo uma arma apontada em sua direção sendo segurada por um homem alto de máscara de tecido preta. Não conseguira dizer uma palavra sequer, sua mente simplesmente ficara em branco. Mas gemera quando seu braço fora brutalmente segurado a forçando a se levantar e sair do seu esconderijo.

― Temos uma escondida aqui, chefe!

― Ah, então foi você? Que malandrinha!

― N-Não fui eu, senhor, eu juro. E-Eu nem sei o que está acontecendo.

― E isso aí na sua mão, hein? ― O chefe da quadrilha, um homem de ombros largos e forte, arrancara o celular das mãos da menina e olhara a tela ― Ah, estava chamando a polícia? Que ousada.

― É um e-engano.

― Soltem ela! ― Ayla, assim como os dois assaltantes, viraram-se para onde a irmã mais velha gritava. Seu cenho cerrado mascarando o medo deixara a caçula em prantos. ― Ela não fez nada de errado, é apenas uma criança.

Os assaltantes riam ao dar suas respostas, mas Ayla tampouco dera atenção. Seus ouvidos não pareciam ser capazes de acompanhar o bate boca que se seguiu. Talvez fosse por conta da sirene que ainda tocava, ou então dos berros dos assaltantes mandando alguém ficar quieto, ou então das sirenes vinda do lado de fora.

Tudo parecia um caos caminhando em câmera lenta.

Mesmo quando fora jogada para os braços de sua irmã e mãe, Ayla não conseguia compreender a situação direito. Principalmente ao ver a arma sendo apontada para sua irmã.

Por que estava sentindo tanto medo em seu aniversário? Não deveria ser uma data feliz? Se não fosse por ser seu aniversário, sua família estaria em casa à salvo, e não sendo vitimas de um assalto.

Até que ponto a sua presença iria causar tantos desastres na vida das outras pessoas?

― Os fardinhas estão tentando entrar! Fudeu, fudeu de vez!

― Cale a boca, maldito! ― O chamado chefe virou-se novamente para irmã de Ayla, e a puxara pelo braço ― Será você mesmo o presentinho para os fardinhas.

Sua irmã estava em perigo por ter salvado-a. Para tê-la perto de sua mãe e garantir sua segurança. Então... Por qual motivo ela não estava sendo protegida naquele momento? Não seria em momentos como esses que um anjo ou herói deveria aparecer?

Afinal, isso existia?

Um pensamento viera até Ayla.

― “Vou te enviar um fantasma para assombrar seus sonhos!”

Se não viriam, então ela mesma seria o anjo.

Mesmo tremendo, com seu corpo pesado, e carregando nas costas o peso da imprudência, Ayla levantou-se e se jogou no braço do assaltante segurando a arma. Debatera-se na tentativa de fazê-lo soltar a maldita, e seu plano era ela ter em posse a arma e virar o jogo.

Aguentaria as represálias, desde que sua família ficasse à salvo.

Mas ao invés de ouvir o som da arma caindo ao chão, ela ouvira dois disparos.

E então, algo aquecera o seu corpo.

Os gritos e o desespero, agora também nos assaltantes, simplesmente não pareciam ser claros o suficiente para que Ayla compreendesse o que havia acontecido. E quando piscara, estava enxergando o mundo de outra posição.

Ora essa, havia caído? Por quê?

Sua mãe e irmã estavam chorando enquanto falavam consigo, mas não conseguira discernir com exatidão suas palavras. Movendo os dedos, percebera estar pressionando o peito com toda a força que conseguia, mas erguera os dedos lambuzados de carmesim.

O que era aquilo?

― Ah, veja só que desfecho mais triste. ― Ayla olhara para algo atrás de sua mãe, encontrando o mesmo sujeito mascarado do amaciante. ― Mas sabe... Você ainda não deu uma resposta.

Ironicamente Ayla apenas imaginara estar sonhando.

Resposta? Que resposta estava devendo?

― Devo clarear a sua mente?

O sujeito mascarado não se movera, porém Ayla lembrara-se da pergunta feita no corredor dos amaciantes antes que o assalto começasse.

Ah... Certo. Aquela pergunta estranha. Faria diferença alguma delas? Principalmente naquele momento? Justo no instante que se amaldiçoava por estar fazendo aniversário em um assalto, dando uma recordação tão amarga para sua família?

Pelos céus, seus olhos pesavam. Seu corpo doía, mas não havia voz para gritar. Queria dormir.

Mas estava devendo uma resposta, não é mesmo? Oh sim, deveria responder. O sujeito mascarado era assustador, realmente, mas a sua resposta lhe trouxera um pensamento engraçado.

Certamente ela preferia viver em um lugar que ninguém a reconhecesse. Assim não teria de perder sua liberdade, muito menos expor sua amada mãe e irmã mais velha à um assalto.

É... Não ser reconhecida poderia ser uma boa.

― Ah, entendo. ― O sujeito mascarado erguera a sua máscara, porém tudo o que Ayla enxergara fora uma esfera dourada brilhar para si ― Naquele lugar é lua cheia, deve dar para o gasto.

Sentira uma imensa necessidade de fechar os olhos e dormir. E então os sons se tornaram nítidos uma última vez.

― Fique comigo, Ayla! Não durma!

“Desculpe, minha irmã, mas parece que fiquei acordada demais jogando e agora estou realmente cansada. Prometo acordar ao som do primeiro alarme para tomarmos café da manhã juntas.”

Um vento suave lhe tocava a face como um toque gentil de uma mãe. Apertando os olhos e os abrindo lentamente, a garota estranhara a escuridão em sua volta e o frio que lhe arrepiava a pele.

― Está acordada? Tome cuidado, levanta-se devagar.. isso assim...

Uma voz doce e suave lhe cercava, assim como um toque gélido quase inexistente. Estando sentada sobre algo úmido, a garota voltara a fechar os olhos os coçando antes de averiguar onde estava.

O que havia acontecido?

Puxando o ar para dentro de seus pulmões, não sentira dor.

Deveria?

Em um estalar, lembrara-se do assalto. Imediatamente a garota tateara o próprio peito sem sentir absolutamente nada, nem um buraquinho, nem sangue, nem...

Não fora baleada?

Ora essa!

Olhando em volta a garota percebera árvores altas lhe cercando junto da escuridão da noite. De cenho cerrado, virou-se para a sua direita onde ainda sentia o toque gélido em seu braço, e ali encontrara alguém.

― O-Onde estou?

― Não se lembra de como veio parar aqui? ― A garota negava com a cabeça, e o rapaz ainda escondido nas sombras da noite pareceu suspirar ― Estamos na entrada do internato.

― Internato?

― Sim. Falls School. Você não é a aluna transferida? ― E então, a lua cheia saíra de trás das nuvens iluminando o rosto do sujeito desconhecido. Ayla arregalava os olhos em reconhecer os cabelos platinados e compridos, junto dos olhos brilhantes. ― Estava à sua espera, senhorita.

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