Capítulo 5. Memória

Minhas perguntas eram genuínas, pois eu não era a pessoa real que habitava este corpo, não fazia a mínima ideia do que aconteceu e creio que ela também não saberia. Porém, o marido olhou para mim desesperado pensando que eu havia perdido a memória.

— O que está acontecendo com ela, doutor?

O médico fez o sinal para ele se acalmar e respondeu o que eu perguntei.

— A senhora é Mariana Morgan, este é seu marido Philip Morgan e vocês sofreram um acidente provocado pelo furacão, o carro capotou e desde então a senhora ficou em coma. Isso aconteceu há seis meses atrás.

— Õuh, então…— olhei para ele assustada e passei a mão na barriga. — Ele ainda está aqui… — chorei e Philip aproximou-se.

— Sim, querida, ele resistiu e já está próximo de nascer. — disse Philip parecendo bem aliviado por eu não ter perdido a memória.

— Sim, Sra. Morgan e digo mais, acho que foi ele quem salvou a sua vida. — disse o médico.

— Então, pelos meus cálculos eu estou com oito meses de gestação. Óh, meu Deus, estou com tudo atrasado, não preparei nada para a chegada do bebê.

Tentei sentar e a enfermeira me ajudou, levantando a cabeceira da cama e colocando travesseiros nas minhas costas.

— Não se preocupe, querida, já está tudo pronto.

Lembrando do plano da Mariana, olhei para ele com os olhos cheios de lágrimas e falei:

— Desculpe, amor, mas quero tanto fazer o quartinho do nosso bebê, inclusive já fiz até o modelo de decoração, está tudo no meu computador.

Notei que ele franziu a testa, com certeza pensando em tudo que já fez com a ajuda da amante. Então, ainda com lágrimas escorrendo dos meus olhos, fiz aquele teatro dramático.

— Desculpe, amor, sei que a culpa é minha por ter ficado tanto tempo em coma, também sei que, provavelmente, foi Drucila que te ajudou a arrumar o quartinho. Não quero me desfazer da bondade dela, mas é o nosso filho, eu sou a mãe. Quero fazer tudo do meu jeito.

Ele segurou a minha mão e abaixou a cabeça, pensativo. Com certeza, devia estar analisando todos os fatos que nos trouxeram a este momento, tendo optado por nosso filho e não por uma aliança civil com a destruidora de lares.

— Doutor, quando o senhor acha que ela poderá ter alta?

— Só preciso confirmar que ela está bem, fazer alguns exames e verificar como o organismo dela reagirá a alimentação. Se confirmarmos que tudo está funcionando de acordo, creio que uns dois ou três dias, o mais tardar, ela estará deixando o hospital.

— Então, querida, vou trazer o seu notebook e você confirmar a decoração e fará a lista de materiais, poderá até comprar pela internet e mandar entregar em casa, Isaura cuidará de tudo.

— Ah, Isaura… peça a ela para vir me visitar e trazer um caldo de galinha. Estou com saudade, sinto fome também. — lembrei que ela é nossa governanta.

Os dois homens sorriram e a enfermeira falou:

— O doutor já passou uma dieta leve para você, daqui a pouco estará chegando. Você passou meses sem comer nada sólido e por isso, vamos testá-la com um mingauzinho e uma gelatina leve.

— Acho que estou com fome de seis meses, um mingauzinho não vai me satisfazer, mas eu compreendo.

Todos riram, novamente. Minhas mãos estavam pousadas na barriga volumosa e senti o bebê mexer, não consegui conter as lágrimas e mais uma vez elas rolaram abundantes pelo meu rosto. Senti meu peito palpitar em gratidão ao milagre que Deus me deu.

Realmente, essa foi a melhor escolha, pois se eu tivesse voltado como Mary, talvez eu não chegasse ao ponto de engravidar. Agora, tenho um marido, um filho, uma casa grande e luxuosa e ele não é pobre. Preciso cumprir a minha missão e espero ser feliz.

\*

Mark

Durante os últimos meses desde a passagem do furacão, tenho tentado estabilizar a empresa. O dinheiro que tinha aplicado, sumiu. Nenhum dos hackers que contratei, conseguiu rastrear o paradeiro do dinheiro e com isso, perdemos a nossa vantagem financeira, estamos mal, principalmente agora, sem a presença de Mary para consertar as coisas.

Fui um tolo ao pensar que Sonja daria conta de criar os desenhos como Mary fazia, confiei demais na nossa competência, descartando a capacidade e inteligência da minha esposa. Agora, estamos quase decretando falência, já que a maioria dos contratos foram cancelados e os que restam, os contratantes não estão satisfeitos.

Fiz uma pesquisa entre os amigos, comentando que preciso de um desenhista gráfico devido à morte de minha esposa e consegui, finalmente, um profissional competente o suficiente para consertar os erros que fizemos.

— Nossa, foi por um triz. — comentou Sonja e eu suspirei.

— Creio que esse problema está resolvido, mas precisamos de fluxo de caixa e o único que se comprometeu em nos ajudar está com a esposa em coma no hospital e sem cabeça para os negócios.

— E se nós fizéssemos uma visita ao hospital e falássemos com ele.

— Não seria conveniente. Ou fazemos a visita ou tratamos de negócios, vou ligar mais uma vez para o assistente dele e pedir que entre em contato.

Fiz a ligação e recebi uma notícia boa, finalmente a esposa de Philip acordou e está lúcida e bem. Soube que ela está grávida e se Mary estivesse viva, nosso bebê estaria com o mesmo tempo do bebê de Philip.

— É interessante como as coisas são, Philip foi pego pelo furacão quando fugia com sua esposa e os dois sobreviveram. Ela está no hospital, acabou de acordar do coma e o bebê está crescendo em seu ventre, normalmente.

— Está se lamentando, Mark? — perguntou Sonja com um ar crítico.

— Não, só fazendo uma comparação. — Na verdade, lamento o fato de ter iniciado um romance com Sonja e traído Mary sem um preparo para uma futura separação.

— Com a morte da Mary, compreendi que fui muito precipitado e não analisei corretamente a separação do casamento e da sociedade. Quase fui à falência e agora, terei que começar tudo de novo.

— Você é engraçado, fala tudo na primeira pessoa, se esquecendo que eu sou sua companheira e sócia em tudo. Espero que não esteja pensando em fazer comigo, o mesmo que fez com a Mary.

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