A Madrugada e o Marido

(Ponto de vista de Bianca)

Não consegui dormir.

O relógio marcava quase duas da manhã e, por mais que eu tentasse, o sono não vinha. Fazia dias que eu estava de volta à Villa Moretti, e ainda assim me sentia uma estranha dentro das próprias paredes que um dia chamei de casa. O som do vento contra as janelas, o cheiro da madeira antiga... tudo parecia sussurrar o nome dele.

Dante.

Cinco anos. Cinco longos anos sem vê-lo. E, ainda assim, bastava lembrar da forma como ele dizia meu nome para que algo dentro de mim se desfizesse.

Desci as escadas devagar, segurando o robe de seda com as mãos trêmulas. A casa dormia. Cada passo ecoava no mármore frio, denunciando minha inquietação. Eu só queria um copo d’água — era o que eu dizia a mim mesma — mas no fundo, sabia que esperava por ele.

E quando empurrei a porta da cozinha, lá estava ele.

De costas, diante do balcão, vestindo uma camisa branca com as mangas arregaçadas, o cabelo levemente bagunçado, o corpo curvado sobre uma xícara de café. A luz amarela da luminária o envolvia, e por um instante, fiquei sem ar.

Ele parecia mais maduro, mais firme… mas o mesmo Dante que meu coração reconhecia.

Um sorriso atrevido escapou antes que eu conseguisse impedir.

— Marido… — sussurrei, deixando a palavra dançar no ar.

Ele se virou devagar, e quando nossos olhares se encontraram, senti o chão sumir sob meus pés. Os olhos dele — aqueles olhos intensos, tão escuros e serenos — percorreram cada traço do meu rosto como se tentassem reencontrar a menina que um dia partiu.

— Achei que estivesse dormindo — disse ele, num tom rouco, como se temesse quebrar o silêncio.

— Não consegui — respondi. — A casa parece diferente… ou talvez eu seja a diferente agora.

Ele me observou em silêncio. Aquele olhar me queimava e me fazia tremer ao mesmo tempo. Eu sabia o que via ali: surpresa. Talvez até um pouco de confusão. Me aproximei devagar.

Quando ele finalmente falou, eu estava a menos de um metro de distância, o som da voz dele me atingiu como uma lembrança.

— Você cresceu, Bianca. Está mais alta.

Sorri. — E você continua o mesmo. Só parece mais cansado.

Por um instante, achei que ele sorriria também. Mas Dante desviou o olhar, como quem procura abrigo dentro do próprio silêncio.

— Eu trabalho demais — murmurou.

Olhei para ele, sem medo. — Eu sei. É assim que você tenta me evitar.

As palavras escaparam antes que eu pudesse contê-las.

E o silêncio que veio depois foi tão pesado que quase me arrependi. Quase.

— Não estou aqui pra te incomodar, Dante. Só… queria ver o homem com quem me casei. — Falei baixo, como quem confessa algo que não devia. Me aproximei mais, agora estava tão perto que podia ouvir sua respiração fica irregular. Ele ergue o corpo ficando ereto me permitindo envolver a sua cintura com meus braços — senti saudades. — disse ao fechar meu olhos sentindo o calor do corpo dele e ouvindo seu coração acelerado em meu ouvido que repousava em seu peitoral firme. Ele não corresponde ao meu abraço e isso doeu então me afastei.

Ele ficou me olhando por alguns segundos, e naquele olhar havia algo que eu não via há muito tempo: saudade. Ele não disse nada mais eu pude ver.

Saí devagar, o coração acelerado. Antes de atravessar a porta, olhei por cima do ombro e sussurrei:

— Boa noite, marido.

Ouvi a resposta dele, rouca e breve:

— Boa noite, Bianca.

Subi as escadas com o coração leve e pesado ao mesmo tempo.

Porque, pela primeira vez em anos, ele me olhou.

E eu percebi que ainda existia algo ali — adormecido, mas vivo.

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