A casa dos Black era um refúgio de cheiros conhecidos: madeira encerada, ervas que a avó de Jacob colhia para chás e o aroma constante de algo cozinhando. Era um calor que ia além da lareira, um calor de lar. Algo que eu, uma órfã criada por uma tia distante, nunca realmente tivera.
Jacob me levou direto para a cozinha, onde Billy, seu pai, estava em sua cadeira de rodas perto do fogão.
— A floresta está agitada hoje — disse Billy, seu olhar sábio e pesado pousando sobre nós antes mesmo de Jacob abrir a boca. Ele não era um chefe da alcateia, mas sua percepção do mundo ao redor era aguçada como a de qualquer lobo.
Jacob soltou um som grave no fundo da garganta enquanto me puxava uma cadeira. — O Cullen estava lá. A filhote de vampiro.
A palavra "filhote" soou estranha e protetora saindo da boca dele.
Billy's expressão se fechou. Ele olhou para mim, e eu vi não a gentileza do pai do meu melhor amigo, mas a cautela de um ancião da tribo. — O que ele queria, Lilith?
— Eu... eu senti algo — expliquei, minhas mãos envoltas around a xícara de chá quente que Jacob colocou na minha frente. — Um cheiro de sangue. Fui investigar e o encontrei lá. Ele estava... olhando para o veado morto.
— Controlando a sede — Billy resmungou, assentindo com a cabeça como se isso confirmasse algo. — Os Cullen são disciplinados, é verdade. Mas a disciplina tem limites. E o seu sangue, criança... — Ele fez uma pausa, escolhendo as palavras com cuidado. — ...ele não é comum. Ele fala com o predador neles.
Uma frieza percorreu minha espinha. — O que quer dizer?
— Nossa história, a história dos Lobos de Quileute, é entrelaçada com os Frios (Cold Ones, vampiros). Mas a sua linhagem... — Billy olhou para Jacob, uma comunicação silenciosa passando entre eles. — A sua linhagem é mais antiga. Dizem que seus ancestrais não eram apenas caçadores de vampiros. Eram rivais. Um tipo diferente de poder. Um poder que os Frios sempre cobiçaram.
O queixo de Jacob estava tenso. — Ele a chamou de 'farol'. Disse que atrai coisas piores.
— E atrai — a voz de Billy era grave. — Não apenas os Cullen. Os outros... os verdadeiramente antigos e sombrios... eles também sentirão o seu despertar.
De repente, a cabana aconchegante parecia pequena e frágil. As paredes de madeira não eram páreo para os perigos que Billy descrevia. Eu não era apenas uma garota com um triângulo amoroso complicado. Eu era uma peça em um tabuleiro de xadrez ancestral, e as peças estavam se movendo.
— O que eu faço? — sussurrei, minha voz quase sumindo no estalar da lenha na lareira.
— Você fica perto da alcateia — a resposta de Jacob foi imediata e firme. Sua mão cobriu a minha sobre a mesa, e o calor era um bálsamo. — Nós a protegemos. Sempre protegemos os nossos.
O olhar dele era intenso, promissor. Era o Jacob que eu conhecia desde sempre, o menino que consertava carros velhos com o pai e que sempre me defendia dos valentões da escola. Mas agora havia uma fera pairando sob sua pele, uma fera que jurou me proteger de monstros.
E então, como um raio cortando a escuridão, uma voz suave e clara ecoou na minha mente.
"Eles vão te transformar em uma prisioneira, Lilith. Cercada por paredes de pelo e dentes. É isso que você quer?"
Eu estremeci, puxando minha mão da de Jacob. A invasão foi tão repentina e íntima que parecia uma violação.
— Lili? — Jacob franziu a testa, preocupado.
— É nada — menti, me levantando da cadeira. — Só... cansaço. Acho que preciso ir para casa.
O olhar de Billy era perspicaz, como se ele pudesse sentir o eco da voz na minha cabeça. — A estrada está segura. Jacob vai com você.
A caminhada de volta para a casa da minha tia foi silenciosa. Jacob caminhava ao meu lado, sua presença uma fortaleza viva, mas minha mente estava a quilômetros de distância.
A voz de Edward não era ameaçadora. Era... lógica. Sedutoramente lógica. Ele não oferecia as garras e os dentes da proteção de Jacob. Ele oferecia uma perspectiva. Uma pergunta.
Quando chegamos à minha porta, Jacob parou, seu rosto iluminado pela luz fraca da varanda.
— Você está seguro comigo, Lili. Você sabe disso, né? — sua voz era suave, vulnerável de uma forma que raramente ouvia.
— Eu sei, Jake — respondi, e significava cada palavra.
Ele sorriu, um sorriso que não alcançou completamente seus olhos, e se inclinou, pressionando os lábios contra minha testa em um beijo rápido e quente. Foi um gesto de afeto, de posse, de promessa. Um gesto que deveria ter me enchido de calor.
Mas quando ele se afastou e desapareceu na escuridão, a única coisa que consegui sentir foi o frio fantasma de uma pergunta pairando no ar.
E, como um eco, uma única palavra sussurrou na periferia da minha consciência, tão suave quanto o bater de asas de um morcego:
"Escolha."
CAPÍTULO 3: O CHAMADO DAS SOMBRAS
A tranquilidade da casa dos Blackwood era uma mentira confortável. Dois dias se passaram desde o confronto na floresta, e o mundo exterior não parecia se importar. O sol brilhava fraco por entre as nuvens, os pássaros cantavam. Mas a paz era uma fina película sobre uma corrente subterrânea de inquietação.
Para mim, o mundo tinha ganho uma nova camada de percepção. Agora, conseguia sentir a umidade no ar não apenas na pele, mas como uma vibração sutil. O cheiro da terra após a chuva era mais rico, quase capaz de distinguir cada raiz e minúsculo inseto em decomposição. Minha herança estava, de fato, despertando, e era ao mesmo tempo assustador e fascinante.
Jacob estava sempre por perto, um guardaão silencioso e caloroso. Seu toque era constante – um aperto de mão rápido, uma mão nas minhas costas para me guiar, um abraço rápido ao chegar e partir. Cada contato era uma afirmação, uma demarcação de território. "Ela está sob minha proteção", diziam esses toques. "Ela é minha." E parte de mim, a parte humana e assustada, agradecia por isso.
Mas a outra parte, a parte do sangue antigo, sentia falta do frio.
Foi na tarde do terceiro dia que o anúncio chegou. Não por carta, nem por telefone. Foi Billy, o pai de Jacob, quem o trouxe, sua face um mapa de preocupações profundas.
Ele entrou na nossa sala de estar com a pesada dignidade de sempre, mas seus olhos escuros, tão parecidos com os de Jacob, evitavam os meus.
— Jacob — Billy disse, sua voz grave ecoando na sala silenciosa. — Sam convocou a alcateia. Uma reunião urgente. É sobre os Caçadores Frios.
O ar pareceu sair da sala. Jacob, que estava descascando uma maçã para mim na cozinha, parou subitamente. A faca ficou imóvel em sua mão. Eu vi seus ombros se tensionarem, a linha de sua mandíbula ficar rígida.
— O que aconteceu? — a voz de Jacob saiu rouca.
— Eles deixaram uma mensagem — Billy respondeu, seu olhar finalmente encontrando o meu. Era um olhar de pena e de um profundo pesar. — Encontraram um lobo da alcateia de Sam. Não... não estava inteiro. E ao lado do corpo, eles deixaram um símbolo pintado com seu próprio sangue.
Billy estendeu um pedaço de papel onde ele havia esboçado o que vira. Era um símbolo geométrico e complexo, uma estrela de linhas agressivas envolta por um círculo serrilhado. Parecia antigo e profundamente ameaçador.
— O que é isso? — perguntei, minhas mãos tremendo levemente.
— A Marca dos Caçadores Frios — Jacob respondeu, deixando a faca e a maçã de lado. Seus olhos estavam faiscando com uma fúria contida que eu nunca tinha visto antes. — Um clã de vampiros. Dos antigos. Dos que não brincam de ser humanos. Eles... colecionam poderes. Caçam criaturas como nós por esporte. E por vingança.
— Vingança? — minha voz foi um fio de som.
Billy olhou para mim, e sua expressão era a resposta. — A última vez que eles apareceram na região foi há mais de um século. Foi quando sua bisavó, Eleanor, desapareceu. A que tinha o mesmo sangue que você, Lilith.
O chão pareceu ceder sob meus pés. A história de família, sempre tratada como uma lenda trágica, de repente se tornou horrivelmente real. Minha herança não era apenas uma curiosidade; era uma sentença de morte passada de geração em geração.
— Eles não estão atrás da alcateia — Jacob disse, sua voz um rosnado baixo. Ele se virou e seus olhos, cheios de um terror feroz, encontraram os meus. — Eles estão atrás de você, Lili. O anúncio deles... a morte do lobo... foi uma declaração de guerra. E um recado.
— Um recado para quem? — sussurrei, já sabendo a resposta.
— Para os Cullen — Billy finalizou, sua voz grave. — Para mostrar que eles falharam em proteger a linhagem da última vez. E que estão voltando para terminar o trabalho.
O silêncio que se instalou foi diferente de todos os outros. Era pesado, carregado de história sangrenta e da promessa de mais violência. A alcateia se reuniria. Haveria guerra. E eu, o prêmio, o farol, a causa de tudo isso, estava no centro.
Enquanto Jacob se preparava para sair, seu rosto uma máscara de determinação assassina, eu senti uma pontada de culpa tão aguda que quase me dobrou. E, no fundo do meu ser, uma pergunta insistente e perigosa surgiu: em uma guerra entre lobos e vampiros sombrios, de que lado estariam os Cullen? E, mais importante, de que lado eu queria estar?
O anúncio havia sido feito. As linhas de batalha estavam sendo traçadas. E o cheiro doce e metálico do sangue, que agora eu entendia tão bem, parecia impregnar o ar mais uma vez.
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Atualizado até capítulo 27
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