A feira dos Elemantors

A segunda-feira amanheceu com o som animado da cidade em festa. Desde cedo, a praça central fervilhava de pessoas, barracas coloridas e banners brilhantes que dançavam ao vento.

Era o dia da Grande Feira dos Elemantors, um evento anual dedicado a celebrar os dons daqueles que usavam seus poderes não para lutar — mas para viver, criar, e ajudar.

Agatha observava a movimentação na rua, da janela da cozinha enquanto tomava café. O aroma do chá da avó Rose se misturava ao som das vozes distantes e risadas das crianças. Helena, como sempre, tentava convencer uma de suas plantas mortas a ressuscitar.

— Se você levantar hoje, Morte Sorridente, eu prometo te dar o vaso novo. De cerâmica importada. Ela cruzou os braços, olhando a planta com seriedade teatral.

— Ela não vai levantar, tia — disse Agatha, rindo e pegando sua mochila. — Mas a tentativa vale pontos.

Louise apareceu logo depois, penteando o cabelo e ajustando a jaqueta e disse:

— Se a Morte Sorridente reviver, quero estar presente. Vai ser um evento histórico.

Agatha balançou a cabeça, sorrindo.

— Duvido, ela só vai se fingir de viva por dois minutos pra te irritar.

As duas se entreolharam e caíram na risada. Depois de um beijo rápido e um último adeus à avó e à tia, saíram rumo à feira. O ar da manhã estava leve, repleto de cheiros doces e metálicos, algodão doce, ferragens encantadas e incenso das barracas místicas.

Valentim e Alex as encontraram perto da entrada principal, ambos com expressões entusiasmadas.

— Finalmente! — exclamou Valentim, erguendo uma sacola que parecia prestes a explodir de tanta comida. — Trouxe o essencial: empanadas elementais e suco de energia concentrada.

— Energia concentrada? — Louise arqueou a sobrancelha. — Isso é uma bebida ou uma ameaça?

— Depende da quantidade, né? — respondeu ele, abrindo o suco e dando um gole exagerado. — Três goles e você sente a alma vibrando. Quatro e começa a ver o tempo de trás pra frente.

Alex riu, batendo de leve no ombro do amigo. — A gente não quer ninguém viajando no tempo hoje, ok?

Enquanto caminhavam pela feira, Agatha ficou impressionada com o quanto os Elemantors se misturavam naturalmente à multidão. Um grupo de crianças brincava criando pequenas bolhas d’água que dançavam no ar; uma mulher manipulava vento para manter sua barraca fresca; um senhor idoso fazia pequenas esculturas de pedra se moverem sozinhas.

— É bonito ver tudo isso — comentou Agatha, olhando ao redor. — Ver como as pessoas usam seus poderes pro bem, pra coisas simples.

Louise assentiu, observando uma menina que congelava sucos em formato de estrelas.

— É. Às vezes a magia mais bonita é a cotidiana.

O grupo parou em frente a um palco, onde apresentações aconteciam. Um garoto alto, magro e de cabelo azul brilhante subiu calmamente, vestindo um terno elegante que parecia destoar da informalidade da feira. Ele ergueu as mãos, e uma fina névoa de gelo começou a se formar no ar. O público prendeu a respiração quando o garoto criou uma escultura de gelo translúcido: uma fênix com asas abertas, cintilando sob o sol.

— Esse é o Brian — disse Valentim com orgulho. — Amigo meu da Elemantor School. Moleque é um gênio. E também, irritantemente perfeito.

— Perfeito e de terno no calor? — brincou Agatha. — Isso é um poder à parte.

Quando a apresentação terminou, Brian desceu do palco sob aplausos. Ele avistou Valentim e acenou, aproximando-se com um sorriso contido e uma postura impecável.

— Valentim, não achei que viria antes do pôr do sol. Sua voz era suave, quase polida demais para um garoto de 14 anos.

— E eu não achei que você viria com o guarda-roupa do James Bond — retrucou Valentim, provocando risadas do grupo.

Brian sorriu de canto:

— A elegância é uma forma de poder. As pessoas subestimam quem sabe usá-la.

Agatha gostou dele de imediato. Havia algo intrigante na calma e no controle que o garoto transmitia. Enquanto conversavam, Brian criou distraidamente pequenos flocos de neve que giravam no ar como pétalas.

— Então vocês são os famosos amigos de Valentim — disse ele, olhando para Agatha e Louise. — Já ouvi histórias. Inclusive sobre o episódio do globo flutuante.

Agatha cruzou os braços:

— Valentim não sabe guardar segredos, eu percebo.

— Segredos são inúteis entre amigos poderosos. Respondeu Brian, com um sorriso sutil.

Louise riu. — Acho que gostei dele. É metido, mas de um jeito adorável.

O grupo passou o resto da manhã explorando a feira. Havia barracas de livros mágicos, instrumentos encantados, poções que mudavam o sabor conforme o humor do usuário, e um enorme espaço dedicado à demonstração de poderes. Alex mostrou um truque simples de manipulação de memória em um voluntário, apenas fez o homem acreditar que tinha esquecido o próprio nome por alguns segundos e o público riu, encantado.

Valentim e Brian decidiram fazer uma demonstração conjunta: fogo e gelo. O contraste entre os dois era fascinante. Valentim criava chamas em espiral, enquanto Brian congelava o ar ao redor, transformando as faíscas em pequenos cristais brilhantes. Quando terminaram, o público aplaudiu de pé.

— Vocês dois são incríveis — disse Agatha, batendo palmas. — Se continuarem assim, vão ganhar uma vaga em algum show de talentos místicos.

— Ou em uma zona de perigo — comentou Alex, divertido. — Isso foi bonito, mas quase incendiou o palco.

Brian ajeitou a gravata com tranquilidade:

— Cada obra-prima requer sacrifício.

Louise cochichou no ouvido de Agatha: — Ele é basicamente o oposto do Valentim. —

— Eu sei. É por isso que eles funcionam tão bem juntos. Respondeu Agatha, sorrindo.

Durante o almoço na praça, entre risadas e comida flutuando discretamente com ajuda da telecinese de Agatha, a conversa voltou ao assunto que não saía da cabeça dela: o livro Nefari.

— Eu ainda não consegui entender o selo — admitiu Agatha. — É como se ele reagisse aos pensamentos. Quando me aproximo, sinto algo… pulsar. Como se estivesse vivo.

Brian olhou para ela com interesse.

— Magia de selo viva? Isso é raro. Alguns feitiços antigos respondiam à presença mental de Elemantors poderosos. Talvez o selo reconheça quem tenta abri-lo.

— Então pode ser perigoso? Perguntou Louise, preocupada.

— Não necessariamente — respondeu Alex. — Mas se for uma magia antiga ligada às Entidades Primordiais, qualquer erro pode despertar algo.

Valentim cruzou os braços, pensativo.

— Então precisamos estudar isso com cuidado. Posso tentar detectar energia elemental residual no livro, ver se há alguma assinatura mágica conhecida.

— Eu posso ajudar — disse Brian. — O gelo pode revelar fluxos de energia ocultos. Se congelarmos o ar em torno do selo, talvez possamos ver como a energia se comporta.

Agatha sentiu um arrepio, não de medo, mas de expectativa. O grupo estava se formando de verdade, cada um com suas habilidades, suas personalidades, suas loucuras.

Enquanto o dia se encerrava, o sol alaranjado pintava o céu e as barracas começavam a recolher seus artefatos. A feira terminava em um clima de tranquilidade e leveza. Agatha e Louise andavam de mãos dadas, rindo das piadas ruins de Valentim e das respostas refinadas de Brian.

Foi então que, ao longe, Agatha sentiu algo. Uma vibração metálica, fria e cortante. Sua precognição formigou na nuca. Virou-se discretamente e o viu.

Entre a multidão, de terno escuro e olhar calmo demais, Orion observava as pessoas. Não fazia nada, não dizia nada. Apenas observava, com aquele sorriso quase gentil que escondia algo perigoso.

Agatha desviou o olhar rapidamente, o coração acelerado.

— O que foi? Perguntou Louise.

— Nada, achei ter visto alguém conhecido.

Mas o desconforto permaneceu. Algo na presença de Orion parecia ecoar dentro dela, como um presságio.

Enquanto voltavam para casa, Agatha olhou uma última vez para o horizonte. A feira ainda brilhava ao longe, mas em algum lugar, algo começava a se mover nas sombras da cidade.

E no sótão da Valthor’s Vintage, o livro Nefari pulsava, lentamente, como um coração adormecido, esperando para despertar.

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