Capítulo 2: Fantasmas no Corredor

A semana seguiu seu curso, uma sequência de reuniões online, jantares em família, banhos de Benício e noites de histórias infantis. Letícia cumpria seu papel com uma eficiência que beirava o automático, mas por dentro, a inquietação plantada na segunda-feira começava a brotar com mais força.

Sexta-feira trouxe consigo uma energia diferente. Benício iria dormir na casa de um amiguinho, um raro evento que deixava Letícia com uma noite livre. A sensação era estranhamente libertadora e, ao mesmo tempo, vazia. O que ela faria com aquelas horas preciosas? Lavar o cabelo sem pressa? Assistir a uma série que não fosse animação? A simples pergunta era um luxo que ela raramente se permitia.

Foi seu pai quem, sem querer, cutucou o vespeiro.

— Elias (durante o jantar): E aí, Lê, planos para a noite? Vai sair com as amigas? — a pergunta era inocente, cheia da esperança de que a filha tivesse uma vida social fervilhante.

Letícia espetou um pedaço de brócolis. — Letícia: Ah, não sei, pai. Talvez netflix e relaxar sozinha mesmo. — a piada soou forçada.

Camila ergueu os olhos do prato, seu radar maternal sintonizado na frequência da filha. — Camila: Você devia sair, sim. Faz bem. Aquele novo bar na Rua das Flores parece divertido. A Márcia (uma das mentoradas do "Sementes") comentou que é bom.

— Letícia: Eu não tenho muito com quem sair, mãe. — a verdade saiu mais crua do que ela pretendia. — As amigas da faculdade estão todas em suas próprias vidas, casadas, com filhos... é complicado.

Um silêncio constrangedor pairou sobre a mesa. Benício, percebendo a mudança de clima, olhou para os adultos.

— Benício: Eu posso ficar, mãe. A gente vê filme de robô.

O coração de Letícia se partiu um pouco. — Letícia: Não, meu amor. Você vai se divertir na casa do Pedro. A gente vê filme de robô no sábado, prometo.

Elias limpou a garganta. — Elias: Você sabe que pode trazer alguém aqui, Lê. Sempre. A gente some, dá todo o espaço do mundo. — Sua oferta era genuína, mas carregada daquele constrangimento paterno de imaginar a filha tendo uma vida íntima sob o mesmo teto.

Letícia sentiu um calor subir pelo seu rosto. A ideia de trazer um homem para aquela casa, para o quarto ao lado do dos pais, com Benício dormindo no quarto ao lado... era impensável. Um território de vergonha e complicação que ela nem sequer se permitia explorar.

— Elias: Obrigada, pai. — ela disse, terminando o jantar. — Mas não preciso.

Mais tarde, após deixar Benício na casa do amigo, Letícia voltou para uma casa estranhamente silenciosa. Seus pais haviam saído para um jantar, respeitando sua "noite livre". Ela caminhou pelos cômodos vazios. A energia da conquista dos pais estava em cada objeto, na mobília que eles escolheram, nas fotos das viagens que fizeram. Era uma casa de amor, sim, mas também um espelho constante de tudo o que ela ainda não tinha conquistado por conta própria.

Frustrada, ela foi até o pequeno escritório da mãe – agora mais um centro de comando do "Sementes de Liberdade" do que qualquer outra coisa. Na estante, uma fileira de cadernos de capa dura chamou sua atenção. Eram os diários de planejamento dos seus pais, datados desde o primeiro ano do negócio.

Com um sentimento quase de voyeurismo, ela puxou o mais antigo. A letra era da sua mãe, meticulosa e firme. "Dia 15: Capital inicial quase zero. Elias desanimado hoje após dia de muitas portas fechadas. Conversamos e decidimos focar em condomínios. Vou pesquisar preços de distribuidor. Não podemos desistir."

Letícia virou páginas. Viu anotações sobre o preço do detergente, cálculos de combustível, rascunhos de logos. E então, a letra do seu pai, mais firme e menos organizada: "Vendi o kit mensal para o Seu Geraldo! Camila fez a planilha, deu um lucro de R$ 18,50. Melhor dinheiro da minha vida. Comemorei com ela até de madrugada."

Um sorriso involuntário surgiu em seu rosto. Eles tinham nada. E mesmo assim, tinham tudo. Tinham um ao outro. Tinham um sonho compartilhado. Aquele caderno não era só sobre números; era sobre a intimidade de uma parceria sendo construída na adversidade.

Ela se sentiu uma impostora. Reclamando de morar em uma casa confortável, com uma família que a apoiava incondicionalmente, enquanto seus pais começaram do zero, sem rede de segurança.

A culpa foi um peso frio em seu estômago. Ela fechou o caderno e o colocou de volta na estante. O silêncio da casa agora soava acusador.

Decidida a fugir dos próprios pensamentos, ela abriu um aplicativo de relacionamento. Era uma raridade para ela. Perfis de homens sorridentes passavam pela tela. "Procurando algo casual", "Ama viajar", "Sem drama".

Drama, ela pensou. Ela era uma mãe solteira que morava com os pais. Se isso não era classificado como "drama" para a maioria dos homens, ela não sabia o que era.

Cansada e se sentindo absurdamente sozinha, ela estava prestes a desligar o telefone quando uma mensagem surgiu. Era de um número desconhecido.

Número Desconhecido: Leticia? É você? Aqui é o Rafael.

O ar saiu de seus pulmões. Rafael. O nome ecoou em sua mente como um trovão em um dia claro. O pai de Benício. O fantasma que assombrava sua história há seis anos.

Seu coração disparou, uma mistura de raiva, curiosidade e uma pontada de algo que se parecia muito com velha mágoa. Por que agora? Depois de todos esses anos de silêncio?

Suas mãos tremeram levemente enquanto ela digitava uma resposta, sua mente um turbilhão.

Letícia: Como conseguiu meu número?

A resposta veio rápido demais.

Rafael: Uma amiga em comum me passou. Preciso te ver. Preciso falar com você.

Letícia jogou o telefone na cama como se ele estivesse queimando. A noite de liberdade transformara-se em uma armadilha de fantasmas.

Capítulos
1 Capítulo 1: Raízes e Asas
2 Capítulo 2: Fantasmas no Corredor
3 Capítulo 3: A Mensagem que Mudou Tudo
4 Capítulo 4: O Peso da Herança
5 Capítulo 5: O Refúgio no Trabalho e um Convite Inesperado
6 Capítulo 6: O Primeiro Passo Para Fora
7 Capítulo 7: O Sussurro e o Grito
8 Capítulo 8: A Quarta-feira que Virou Sexta
9 Capítulo 9: A Doce Agonia do Segredo
10 Capítulo 10: O Convidado Inesperado
11 Capítulo 11: O Porto Seguro e a Tempestade
12 Capítulo 12: A Primeira Ferramenta da Liberdade
13 Capítulo 13: A Mudança e a Nova Página
14 Capítulo 14: O Jantar e a Realidade
15 Capítulo 15: O Primeiro Encontro
16 Capítulo 16: O Ritmo do "Nós"
17 Capítulo 17: A Sombra e a Luz
18 Capítulo 18: A Primeira Viagem
19 Capítulo 19: A Herança que Floresce
20 Capítulo 20: O Anel e a Escolha
21 Capítulo 21: Os Preparativos e a Comunhão
22 Capítulo 22: O Dia "Sim"
23 Capítulo 23: A Lua-de-Mel no Apartamento
24 Capítulo 24: A Rotina do Corpo e da Alma
25 Capítulo 25: O Sabor do Poder
26 Capítulo 26: A Tempestade Perfeita
27 Capítulo 27: A Marca na Pele
28 Capítulo 28: O Corpo que Habito
29 Capítulo 29: O Sussurro do Futuro
30 Capítulo 30: A Semente do Amanhã
31 Capítulo 31: O Ninho
32 Capítulo 32: A Chegada da Luz
33 Capítulo 33: A Dinâmica do Quatro
34 Capítulo 34: O Reencontro Inevitável
35 Capítulo 35: A Herança que se Conta em Histórias
36 Capítulo 36: O Amanhecer de uma Nova Era
37 Epílogo: O Círculo que Nunca se Fecha
Capítulos

Atualizado até capítulo 37

1
Capítulo 1: Raízes e Asas
2
Capítulo 2: Fantasmas no Corredor
3
Capítulo 3: A Mensagem que Mudou Tudo
4
Capítulo 4: O Peso da Herança
5
Capítulo 5: O Refúgio no Trabalho e um Convite Inesperado
6
Capítulo 6: O Primeiro Passo Para Fora
7
Capítulo 7: O Sussurro e o Grito
8
Capítulo 8: A Quarta-feira que Virou Sexta
9
Capítulo 9: A Doce Agonia do Segredo
10
Capítulo 10: O Convidado Inesperado
11
Capítulo 11: O Porto Seguro e a Tempestade
12
Capítulo 12: A Primeira Ferramenta da Liberdade
13
Capítulo 13: A Mudança e a Nova Página
14
Capítulo 14: O Jantar e a Realidade
15
Capítulo 15: O Primeiro Encontro
16
Capítulo 16: O Ritmo do "Nós"
17
Capítulo 17: A Sombra e a Luz
18
Capítulo 18: A Primeira Viagem
19
Capítulo 19: A Herança que Floresce
20
Capítulo 20: O Anel e a Escolha
21
Capítulo 21: Os Preparativos e a Comunhão
22
Capítulo 22: O Dia "Sim"
23
Capítulo 23: A Lua-de-Mel no Apartamento
24
Capítulo 24: A Rotina do Corpo e da Alma
25
Capítulo 25: O Sabor do Poder
26
Capítulo 26: A Tempestade Perfeita
27
Capítulo 27: A Marca na Pele
28
Capítulo 28: O Corpo que Habito
29
Capítulo 29: O Sussurro do Futuro
30
Capítulo 30: A Semente do Amanhã
31
Capítulo 31: O Ninho
32
Capítulo 32: A Chegada da Luz
33
Capítulo 33: A Dinâmica do Quatro
34
Capítulo 34: O Reencontro Inevitável
35
Capítulo 35: A Herança que se Conta em Histórias
36
Capítulo 36: O Amanhecer de uma Nova Era
37
Epílogo: O Círculo que Nunca se Fecha

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