Capítulo 5

Mía adormeceu esperando o regresso de Ariel, aconchegada entre os lençóis de algodão que ele lhe tinha oferecido no seu último aniversário. A luz tênue da lua filtrava-se pelas cortinas de gaze, projetando sombras dançantes sobre o seu rosto sereno.

Ela dormiu tão profundamente naquela noite que os seus olhos não se abriram até que os primeiros raios do sol matinal acariciaram o seu rosto, e o canto dos pássaros anunciou que um novo dia tinha começado.

Com preguiça e alguma desorientação, espreguiçou-se como todos os dias, deixando que os seus músculos despertassem depois de tantas horas de imobilidade. No entanto, ao estender a sua perna, uma dor aguda e lancinante atravessou o seu músculo, provocando que um grito lancinante escapasse da sua garganta.

A dor era tão intensa que por um momento lhe pareceu ver pequenas estrelas a dançar frente aos seus olhos.

O seu grito, potente e alarmante, atravessou as paredes da casa de dois andares, desceu pelas escadas de madeira polida e chegou até ao rés do chão, onde Ariel acabava de entrar pela porta principal, com o peso de uma noite sem dormir sobre os seus ombros e a gravata desapertada ao redor do pescoço.

Perante aquele grito que lhe gelou o sangue, Ariel subiu a correr as escadas de dois em dois, com o coração a bater descontroladamente no seu peito.

Os seus sapatos italianos ressoavam contra os degraus enquanto a sua mente se enchia dos piores cenários possíveis.

O medo apoderou-se dele enquanto pensava que alguém poderia ter entrado na casa, ou que Mía poderia ter-se magoado gravemente. As suas mãos tremiam enquanto alcançava o puxador da porta do quarto.

Ao entrar precipitadamente no quarto, a cena que encontrou desconcertou-o por completo: Mía estava a rir, um riso cristalino e contagiante que enchia o quarto. Depois daquele estiramento e da repentina dor, o que lhe tinha acontecido era um riso incontrolável pela cãibra que lhe tinha dado, como se o seu corpo tivesse decidido converter a dor em alegria.

Ariel, ainda com o pulso acelerado, não encontrou no seu coração a força para repreendê-la pelo susto que lhe tinha provocado, especialmente quando notou o hematoma violáceo que se estendia pela sua perna como uma aguarela escura sobre a sua pele clara.

Com passos cautelosos, aproximou-se e acomodou-se ao lado da cama, os seus olhos fixos na marca que manchava a pele de porcelana da sua esposa.

—Ainda te dói? —perguntou com voz suave, enquanto observava Mía que continuava a sorrir, exibindo aquele sorriso tão bonito que lhe tinha roubado o coração desde o primeiro dia. Era o mesmo sorriso de Zoe, só que em Mía brilhava com uma luz especial, como se tivesse sido melhorado.

—Um pouco —respondeu ela, enquanto se afirmava com os seus cotovelos e se recostava no encosto da cama, adornado com almofadas de penas.

Os seus olhos escrutinaram o rosto de Ariel, notando as marcadas olheiras sob os seus olhos e o cansaço evidente na sua expressão. A pergunta dançou na sua mente antes de ousar formulá-la: —Estiveste a trabalhar? —inqueriu, consciente de que talvez já não tinha o direito de questioná-lo sobre as suas ausências noturnas, não depois de lhe falar de divórcio que agora pesava entre eles como um muro invisível.

Ariel, tentando proteger o coração puro e confiante de Mía, assentiu em silêncio, carregando com o peso daquela pequena mentira que se somava às muitas que ultimamente tinha começado a acumular.

—Pedirei que tragam o teu pequeno-almoço —mudou de tema enquanto se punha de pé, alisando as rugas do seu fato que delatavam a noite fora de casa.

—Não é necessário, posso caminhar —protestou ela, minimizando a sua dor com um sorriso valente. Embora o golpe a incomodasse, não era algo que a incapacitasse completamente. Era só um golpe na sua coxa, forte sim, mas nada que não pudesse gerir com dignidade. Afinal, a vida tinha-lhe ensinado a ser resiliente, e este não era nem de longe o primeiro golpe forte que tinha tido de suportar.

—É sim, fica na cama, eu mesmo prepararei o teu pequeno-almoço —insistiu Ariel com uma determinação que não admitia réplicas, recordando aqueles dias felizes quando a cozinha era o seu território partilhado e preparar o pequeno-almoço para ela era o seu ritual favorito de amor.

Ariel desceu as escadas em direção à cozinha, decidido a preparar um pequeno-almoço especial como tantas outras vezes o tinha feito nos seus anos de casamento.

A rotina de a mimar tinha-se tornado uma segunda natureza para ele: os pequenos-almoços elaborados, o serviço à cama, inclusive o prazer de lhe dar de comer bocado a bocado enquanto partilhava risos e planos para o dia.

No entanto, Mía, sempre independente e com aquele espírito que a caracterizava, não seguiu as instruções de permanecer na cama. Mal ouviu os passos de Ariel a afastarem-se, levantou-se com cuidado, coxendo ligeiramente até à casa de banho. Tomou um duche revitalizante, deixando que a água quente aliviasse os seus músculos tensos, e escovou os dentes meticulosamente, antecipando o momento em que Ariel regressasse com o seu pequeno-almoço e, especialmente, com o seu adorado pastel de nata, querendo estar fresca e apresentável.

Quando Ariel retornou ao quarto trazendo a bandeja do pequeno-almoço, encontrou uma Mía transformada: recém-banhada, com o cabelo húmido envolvido elegantemente numa toalha branca, sentada na cama com as pernas cobertas pelos lençóis de seda. O contraste entre a situação e a formalidade dos seus papéis de divórcio pendentes criava uma tensão quase palpável no ar.

O aroma sedutor do café acabado de fazer e das torradas douradas inundou o ambiente do quarto, criando uma atmosfera caseira que contradizia a realidade da sua situação matrimonial. Ariel colocou com delicadeza a mesinha de cabeceira sobre as pernas de Mía, que imediatamente começou a procurar com olhos ansiosos o seu tradicional pastel de nata.

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Atualizado até capítulo 74

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