O luto no internato era silencioso. As paredes do castelo absorviam o choro, os gritos e as perguntas não respondidas como um poço sem fundo.
O corpo do aluno encontrado no jardim interno foi enterrado sem cerimônia. Ninguém ousava dizer o nome dele em voz alta, como se isso pudesse atrair o mesmo destino. Os alunos sabiam a verdade, mesmo que o reitor insistisse em mentiras polidas.
Mas Lua... Lua não sentia medo.
Ela sentia raiva.
E curiosidade.
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Na biblioteca proibida — uma ala trancada atrás de feitiços antigos e portas encantadas — Lua encontrou o que precisava. Um encantamento de abertura sussurrado por Eliza a levou até os arquivos enterrados.
"Arquivo 013 - Valentine Corven."
A ficha amarelada contava pouco no início. Data de admissão: 1896. Data de expulsão: 1902. Retorno: 1904. Expulsão: 1905. Retorno: 1923. Expulsão. Retorno. Expulsão. E assim por diante, até a ficha perder a razão.
Mas o mais importante estava escondido em anotações à mão:
> “Paciente apresenta descontrole emocional severo. Diagnóstico inicial: transtorno de vínculo e personalidade. Apresenta fortes traços de psicose romântica. Obcecado por um padrão específico de alunas: vampiras de sangue puro com traços físicos similares.”
Lua fechou a ficha. Sardas. Olhos vermelhos. Frieza. Sarcasmo.
Ela não era a primeira.
Mas pretendia ser a última.
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Na noite seguinte, o Clube das Sombras se reunia de novo. Os olhos estavam voltados para Lua. Ela havia vencido um duelo, enfrentado Valentine e ainda assim permanecia intacta. O que, para alguns, era intimidador. Para outros, irritante.
E para Valentine... era excitante.
Ela entrou no salão e o encontrou no centro, como sempre. Sentado numa espécie de trono improvisado feito de cadeiras viradas e ferro retorcido, com um cálice de sangue entre os dedos. Os olhos dele pousaram nela como garras afiadas.
— “Estava te esperando”, disse com um sorriso lânguido.
— “Infelizmente, eu vim.”
Valentine se levantou devagar. Havia algo animalesco em seus movimentos, como se o controle fosse uma performance cuidadosamente ensaiada.
— “Você sabe por que gosto de você, Lua?”
Ela cruzou os braços.
— “Porque eu ainda não te cortei ao meio?”
— “Porque você não tem medo de mim. Nem de você mesma.”
Ele se aproximou e colocou a mão no rosto dela. Lua não se mexeu, mas os olhos vermelhos queimavam com desafio.
— “Você não vai quebrar. Mas vai me deixar tentar, não vai?”
Lua o afastou com um empurrão seco.
— “Você é só um erro antigo que se recusa a morrer. E eu sou a consequência de tudo que você não consegue controlar.”
Os membros do clube ficaram em silêncio. Foi a primeira vez que alguém o desafiou abertamente. E ele... riu.
Mas por trás do riso, havia uma fissura. Uma fragilidade escondida.
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Mais tarde naquela noite, Raven encontrou Lua no jardim interno.
— “Você está louca, sabia?”
— “Sempre fui. Só agora vocês estão percebendo.”
Raven se sentou ao lado dela, o capuz cobrindo parte do rosto.
— “Valentine se apega. Quando se apega... ele mata. É a forma dele de manter o que ama perto. Pra sempre.”
— “Então ele vai ter que me amar viva. Ou me enterrar com os dentes arrancados.”
Raven riu, mesmo sem querer. Era estranho rir ali, onde sangue havia sido derramado. Mas Lua era assim: um terremoto que trazia ruína e respiro ao mesmo tempo.
— “Precisamos fazer algo”, disse Raven. “Você, eu, Eliza... até Cleo. Ele está fora de controle. E o reitor não vai agir. Talvez ele nem possa.”
Lua concordou com um aceno.
— “O Clube das Sombras é uma piada. Uma desculpa pra ele manipular os outros. Mas se a gente virar o jogo...”
— “Você quer tomar o controle do clube?”, Raven perguntou, chocada.
— “Quero. E vou.”
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Na manhã seguinte, Cleo Astor a confrontou no corredor.
— “Ouvi dizer que você quer brincar de líder agora. Não sei se é ousadia ou burrice.”
— “Depende. Você prefere ser uma seguidora doentia de um vampiro obcecado ou ajudar a derrubá-lo?”
Cleo arqueou uma sobrancelha, surpresa com a proposta. E, pela primeira vez, pareceu verdadeiramente interessada em Lua.
— “Você é mais do que aparenta, Nightsshade. Isso é... intrigante.”
— “E você tem mais medo do que deixa transparecer. Isso é... previsível.”
Cleo sorriu de lado. Era o começo de uma aliança incômoda.
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Naquela noite, quatro garotas — Lua, Raven, Cleo e Eliza — se reuniram nas catacumbas da ala abandonada. A entrada do antigo Santuário das Bruxas, fechado por séculos.
Lá dentro, sob velas roxas e espelhos manchados de sangue antigo, elas firmaram um pacto.
Uma nova aliança. Uma nova liderança. Um novo clube.
A Noite Ascendente.
— “Ou a gente toma Las Cumbres das sombras. Ou seremos devoradas por elas”, disse Lua, cortando o dedo e deixando o sangue pingar na pedra do altar.
Uma a uma, as outras fizeram o mesmo.
E em algum lugar nas torres do castelo, Valentine estremeceu.
Ele podia não saber ainda...
Mas havia começado a perder o controle.
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