Elena acordou com um sobressalto, o peito arfando e o corpo coberto de suor. A respiração era pesada, como se tivesse corrido uma maratona enquanto dormia. Jogou os lençóis para o lado e se sentou na cama, tentando recuperar o fôlego. O quarto estava escuro, exceto pela luz prateada da lua cheia que entrava pela janela e pintava o chão de branco pálido.
Mais um sonho.
Ou melhor, mais um fragmento do que parecia ser uma lembrança de algo que nunca viveu. Corria por entre árvores, mas não com os próprios pés. Sentia as patas afundarem no barro úmido, o vento cortando o rosto, os músculos pulsando com uma força que não era humana. E atrás dela… ou ao lado dela… havia olhos cinzentos que a seguiam. Protegiam. Chamavam.
Era sempre o mesmo sentimento. Liberdade. Poder. Medo.
Levantou-se com dificuldade, sentindo as pernas trêmulas. Caminhou até o espelho e acendeu a luz do abajur. Por um segundo, não reconheceu o reflexo. Seus olhos estavam mais claros, puxando para um dourado que cintilava sob a luz fraca. A pele parecia mais sensível, viva, como se houvesse eletricidade correndo por baixo dela.
O que estava acontecendo?
Voltou a se deitar, mas o sono não voltou. Pela primeira vez em muito tempo, ela sentia medo de fechar os olhos.
Nos dias que seguiram, os sintomas aumentaram.
A audição parecia apurada demais — conseguia ouvir uma discussão entre vizinhos mesmo com a janela fechada. Cheiros familiares ficavam insuportáveis, como o perfume doce demais da tia ou o café forte da manhã. E então havia o calor. Um calor interno, nascido no peito e irradiando por todo o corpo, como se algo ali dentro estivesse se agitando, tentando emergir.
E em meio a tudo isso… a lembrança dele.
Liam.
Desde aquele breve encontro na floresta, ela não conseguia tirá-lo da cabeça. Havia algo nele que a atraía, mas de uma forma diferente de qualquer outra coisa que já havia sentido. Não era só aparência — embora ele fosse de uma beleza crua, masculina, quase primitiva. Era o jeito como a olhava. Como se soubesse.
Ela tentava racionalizar. Dizer a si mesma que estava apenas impressionada com aquele homem misterioso, que tudo o mais era estresse ou imaginação. Mas uma parte dela — a parte que sonhava com uivos e corridas noturnas — sabia que não era só isso.
Na livraria, os livros começaram a parecer diferentes também. Ela se pegava abrindo volumes antigos sobre mitologia, lendas de criaturas que mudavam de forma, histórias de lobos que caminhavam entre humanos. Lia compulsivamente, como se procurasse por si mesma dentro daquelas páginas.
E numa tarde nublada, enquanto organizava livros na sessão esquecida dos fundos, encontrou um caderno antigo, de capa de couro desgastada. Não tinha nome. Não tinha número de prateleira. Era como se estivesse ali apenas esperando por ela.
Abriu com cuidado e encontrou anotações à mão — palavras fortes e desenhos de lobos em meio à floresta. Havia símbolos, fases da lua, descrições de dores parecidas com as que ela vinha sentindo. E então, uma frase sublinhada em vermelho:
“A transformação se inicia no corpo, mas é a alma quem desperta primeiro.”
Elena sentiu o estômago virar. Tudo dentro dela gritava que aquilo não era coincidência.
Naquela noite, resolveu voltar à floresta. Não sabia o que esperava encontrar. Talvez o silêncio a ajudasse. Talvez... ele estivesse lá.
Seguiu a trilha já quase no escuro. A lua cheia nascia por entre as copas das árvores, e cada passo parecia mais pesado que o anterior. O ar cheirava diferente — mais forte, mais denso. O vento carregava um murmúrio que ela não sabia se era real ou só dentro da própria cabeça.
E então, de repente, o corpo cedeu.
Uma dor lancinante atravessou seu peito. Caiu de joelhos, arfando. As mãos tocaram a terra úmida enquanto o mundo girava. Sentia os ossos tensionarem, a pele latejar, como se quisessem se romper.
E em meio ao caos… uma voz ecoou. Firme. Familiar.
— Elena.
Ela ergueu o rosto e viu Liam emergindo das sombras. Os olhos dele brilhavam sob a luz da lua. Mas havia algo mais. Algo selvagem. Instintivo.
Ela abriu a boca para falar, mas só conseguiu dizer uma palavra:
— Me ajuda.
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Atualizado até capítulo 45
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