Capítulo 3

O sábado se arrastava. Eu estava sentado na sala, fingindo que lia alguma coisa no celular, mas, na verdade, cada passo de Shamantha pelo corredor me feria mais do que o anterior. O som do salto batendo no piso era como um lembrete cruel: ela sempre tinha tempo para sair — nunca para ficar.

Ela surgiu na porta com aquela pose de sempre: bolsa discreta pendurada no ombro, cabelos soltos, maquiagem leve, mas impecável. O mesmo perfume doce que um dia me encantou preencheu o ambiente por um segundo. E, naquele segundo, tudo o que eu senti foi distância.

— Vai sair? — perguntei, mesmo já sabendo a resposta.

— Vou. Preciso resolver umas coisas com a Sílvia — respondeu sem olhar nos meus olhos. E sem esforço algum para parecer convincente.

Apenas assenti. Não tinha mais força para discutir. As palavras tinham perdido o sentido. As desculpas, o peso. Ela saiu sem nem se despedir.

Fiquei ali por alguns minutos, tentando decidir se ficava preso naquele silêncio ou se dava um jeito de escapar de mim mesmo. Peguei as chaves e saí. Eu precisava respirar. Pensar. Ou talvez apenas dirigir, sem rumo, como quem tenta fugir de um incêndio interno.

Depois de um tempo rodando, parei em uma cafeteria no centro. Era um dos meus lugares preferidos antes de me casar. Um lugar onde o tempo parecia desacelerar. Assim que entrei, senti o cheiro de café fresco e uma música instrumental suave. Por um instante, quase senti paz.

Mas durou pouco.

Congelei.

Ali, no canto do salão, estava ela. Shamantha. Com Rodrigo.

Eles não estavam apenas conversando. Estavam próximos demais. Os olhos grudados, os gestos íntimos demais. Rodrigo segurava a mão dela, e ela acariciava os dedos dele com uma naturalidade que nunca vi nos últimos meses.

O ar me faltou. Tudo ao meu redor sumiu. O chão, o som, o cheiro de café… tudo desapareceu. Só restou aquela cena. A traição estampada. A confirmação do que meu coração já gritava há tempos, mas que minha mente insistia em negar.

Rodrigo se inclinou e sussurrou algo no ouvido dela. E ela sorriu.

Ela sorriu. Com um brilho que não usava comigo há muito tempo.

Naquele momento, pensei em ir até lá. Encará-los. Gritar. Dizer tudo o que estava entalado na minha garganta. Perguntar por quê.

Mas não.

Dei um passo para trás. Depois outro. E saí. Saí com o coração em cacos e a dignidade costurada por um fio. Saí como se nunca tivesse entrado. Ninguém percebeu. Ninguém notou o homem despedaçado que atravessava a porta.

Lá fora, o sol já não brilhava como antes.

E ali eu entendi: o fim não viria com uma explosão. Ele estava vindo aos poucos. Em silêncio. Em cada manhã fria. Em cada desculpa. Em cada beijo negado.

E agora… naquela cafeteria.

(Shamantha)

Dirigi de volta para casa com as mãos firmes no volante, mas o pensamento longe. Ainda sentia na pele o toque de Rodrigo, o riso fácil, a leveza do nosso encontro. Há quanto tempo eu não me sentia assim? Livre. Desejada. Viva.

Mas quando olhei o relógio e vi que passava das dez, senti o frio conhecido no estômago. Leonardo.

Já conseguia imaginar a cena: ele no sofá, semblante fechado, braços cruzados, pronto para me interrogar. Sempre igual. A tensão crescia entre nós como uma bomba prestes a explodir.

Estacionei na garagem, respirei fundo, peguei a bolsa e entrei. Entrei devagar, como quem já se sente culpada mesmo antes de ser acusada.

Mas, para minha surpresa, tudo estava em silêncio. A casa escura. Nenhuma luz acesa. Nada.

— Leonardo? — chamei, baixinho, tirando os sapatos.

Silêncio.

Verifiquei a cozinha. O quarto. Até o banheiro. Nada.

Soltei um suspiro. Um alívio amargo.

Pela primeira vez em muito tempo, ele não estava ali. Não estava esperando. Não estava reclamando. Não estava… em lugar nenhum.

Sentei no sofá com uma xícara de chá. Liguei a televisão, coloquei em qualquer canal só para abafar o som dos meus pensamentos. E fiquei ali, imóvel. Por fora, tranquila. Por dentro… inquieta.

Onze e meia.

Meia-noite.

Nada.

Me levantei e comecei a andar de um lado para o outro. Peguei o celular. Liguei. Caiu na caixa postal. Tentei de novo. E de novo.

— Atende, Leonardo… — murmurei, com a garganta apertada.

Tentei lembrar se ele havia mencionado alguma saída. Algum compromisso. Nada. O silêncio dele naquela manhã tinha sido diferente. Mais pesado. Como se já tivesse desistido de mim e eu não tivesse percebido.

À uma da manhã, liguei mais três vezes. Nada. Nenhuma mensagem. Nenhum sinal.

Às duas, cansada e com o coração acelerado, me deitei. Mas o sono não veio.

O travesseiro ao meu lado estava frio. Intocado. Um aviso silencioso de que algo estava realmente errado. Leonardo sempre voltava. Sempre.

Meu peito doía. A mente acelerada. Pela primeira vez em muito tempo, eu não sentia raiva… eu sentia medo.

E se tivesse acontecido alguma coisa?

E se...

Me virei, abracei o travesseiro e fechei os olhos com força. Mas era inútil. A culpa já estava ali, sentada na beira da cama, sussurrando tudo o que eu evitei ouvir por tanto tempo.

E naquela madrugada silenciosa, eu percebi: por mais que eu tivesse acreditado que não o amava mais, a ausência dele me doía num lugar que eu nem sabia que existia.

E talvez… só talvez…

Eu estivesse percebendo isso tarde demais.

Nota da autora:

Cada curtida sua é muito importante para mim. Não deixe de curtir

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Comments

Elisete Rodrigues de Jesus

Elisete Rodrigues de Jesus

Desejo de verdade q ele ache uma mulher q o ame e eke corresponda, q não seja mais uma história clichê, onde ela se arrepende e faz de tudo para conquistar ele, e é perdoada. Q ele fique com alguém bem legal e ela com o Rodrigo ou sem ninguém.

2025-06-22

1

LEIDIMAR Alves de Jesus

LEIDIMAR Alves de Jesus

e perdeu e foi tarde que Leonardo arrume outra e só mandei os papéis do divórcio

2025-06-20

1

Erika Kinha

Erika Kinha

Samantha agora é a sua vez de sofrer! Pior coisa que existe é perder a confiança na pessoa em que amou.💔

2025-06-21

1

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