O avião tocou a pista suavemente. Aurora abriu os olhos, endireitou-se na poltrona executiva e soltou um longo suspiro. Não sabia se o que pesava mais era o cansaço da viagem ou a decisão de ter aceitado a proposta de Noah Bastien.
Lisboa era linda mesmo vista de cima. O sol começava a descer no horizonte, pintando os telhados vermelhos da cidade com tons de ouro e laranja.
Um carro com motorista particular a aguardava na saída do aeroporto. Quando ela entrou, encontrou um envelope no banco.
“Apartamento 1912. Cobertura executiva. Primeiro andar reservado para escritório. O restante, para seu conforto. Sem câmeras. Sem obrigações fora do horário comercial. Mas, se quiser jantar comigo, há vinho no armário. — N.”
Aurora revirou os olhos.
— Arrogante até nos bilhetes.
Mas não conseguiu impedir o sorriso discreto que surgiu no canto da boca.
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O apartamento era de tirar o fôlego. Amplo, moderno, com janelas do chão ao teto e uma vista espetacular da cidade. Tudo branco, cinza e madeira clara. Um luxo discreto. Ela largou as malas no quarto e foi até a cozinha. E sim — lá estava o vinho, junto com duas taças já separadas.
“Presunçoso.” Ela pensou, mas abriu mesmo assim.
Na primeira noite, decidiu descansar. Ligou para Bianca, deu notícias e garantiu que estava bem. A amiga a provocou até que ambas acabaram rindo da situação.
Na manhã seguinte, às 8h em ponto, desceu até o andar inferior, onde já havia secretárias, técnicos e gerentes reunidos.
E claro, Noah estava lá.
Impecável.
Camisa branca dobrada até os cotovelos, calça social escura e aquele ar de superioridade que parecia vir com ele desde o nascimento.
— Bom dia, Aurora. — Ele disse seu nome como se saboreasse cada sílaba.
— Sr. Bastien. — Ela respondeu seca.
— Pensei que pudesse me chamar de Noah, agora que somos colegas de equipe.
Ela cruzou os braços.
— Colegas não se chamam por apelidos. E eu gosto de manter distância profissional.
Ele inclinou a cabeça, sorrindo.
— Então vai ser uma convivência interessante.
Eles passaram o dia em reuniões. Aurora liderava as estratégias com pulso firme, surpreendendo todos ao redor. Noah assistia de longe, de braços cruzados, como quem observa uma peça rara sendo leiloada e já sabe que vai vencer o lance.
Ao fim da tarde, ele a abordou no elevador.
— Jantar?
— Não. Tenho coisas para organizar.
— A cozinha está pronta. E prometo não ser intrusivo.
Ela o olhou de cima a baixo.
— Você não sabe não ser intrusivo.
— Me dê uma chance. — Ele sorriu. — Estou tentando ser gentil.
— Está tentando me amaciar. E não funciona.
— Talvez eu esteja tentando conquistar sua curiosidade.
Ela deu um meio sorriso.
— Conquistou meu desgosto. Já é algo.
O elevador chegou. Ele segurou a porta para que ela saísse primeiro.
— Uma hora dessas, Aurora, você vai parar de me resistir.
Ela parou de costas para ele e disse:
— E você vai perceber que eu não sou uma das suas conquistas fáceis.
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Na terceira noite, ela o encontrou na cozinha, descalço, camisa de linho meio aberta, cozinhando algo perfumado.
— Achei que estava sozinho no andar — disse, surpresa.
— A cozinha é do prédio. A comida é minha.
— Você cozinha?
— É uma das poucas coisas que faço sem planilhas. Quer provar?
Ela hesitou, depois pegou um garfo e experimentou o molho na panela.
— Está... bom.
— Só bom?
— Eu prefiro ser exigente. É um hábito.
Ele se aproximou, encostando a cintura na bancada onde ela estava.
— E o que mais você prefere? — A voz dele abaixou um tom.
Ela o olhou. Os olhos dele estavam mais escuros, intensos.
— Prefiro que respeitem meus limites.
Noah deu um passo para trás, erguendo as mãos.
— Claro. Você deixa claro onde estão.
— E você continua tentando empurrá-los.
— Admito. Mas só porque você é a primeira mulher que me olha como se não estivesse interessada.
Aurora bebeu o vinho que ele havia servido. Estava tensa. Mas não queria mostrar.
— Talvez porque eu realmente não esteja.
— Talvez. — Ele a encarou por um segundo mais longo. — Ou talvez esteja com medo de estar.
Ela se levantou, pegando a taça.
— Boa noite, Sr. Bastien.
— Boa noite, Aurora.
A tensão no ar era quase palpável. Mas nenhum dos dois recuava.
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Nos dias que se seguiram, a convivência se tornou um jogo não declarado. Pequenos gestos, toques acidentais, provocações veladas.
Na sexta-feira, ela saiu da reunião e pegou um documento na mesma hora que ele. Suas mãos se tocaram.
Rápido.
Mas quente.
Ela não tirou a mão imediatamente. Nem ele.
— Você sente, não sente? — ele murmurou.
— Sinto o papel entre nós. — Ela retrucou, mesmo com o coração acelerado.
— E o calor da minha pele. Não mente, Aurora. Você sente também.
Ela tirou a mão devagar.
— E você continua achando que tudo gira ao seu redor. Não se cansa?
— Só quando não vale o esforço.
— E eu valeria?
Ele a olhou como se a resposta fosse óbvia.
— Você vale mais do que qualquer mulher que já conheci. E exatamente por isso... ainda estou aqui.
Aurora desviou o olhar e saiu da sala, respirando fundo.
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Naquela noite, demorou a dormir.
O rosto dele vinha à mente. O cheiro. O toque. As palavras.
Ele era um problema.
E ao mesmo tempo, uma tentação.
Mas ela havia prometido a si mesma que não se envolveria com homens como Noah.
E agora, pela primeira vez em anos, sentia que estava começando a perder o controle que tanto prezava.
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Atualizado até capítulo 38
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