Tenho trinta e quatro anos. Nasci em Palermo, cresci entre Roma e Milão, e hoje administro negócios que nenhum relatório fiscal ousa nomear com exatidão. Sou um homem de métodos discretos e cercados por números. Há quem diga que sou um fantasma. Prefiro pensar que apenas sei usar bem as sombras.
Na superfície, sou dono de duas empresas de investimentos, acionista em três vinícolas italianas e um consultor financeiro “reserva” para políticos que não querem perguntas. Nos bastidores, movo valores que fazem economias tremerem. Lavagem de dinheiro, importações fictícias, contratos forjados, ativos evaporados. O mundo financeiro me pertence. E o submundo me respeita.
Aprendi cedo que o poder não está na força, mas na informação. E ninguém sabe mais do que eu. Pelo menos, é isso que todos acreditam.
Hoje é noite de evento. Um dos tantos que frequento para manter aparências, renovar contatos, observar. Os ricos e corruptos adoram fingir que são artistas. Galerias de arte são, portanto, o cenário perfeito para negócios silenciosos. Dinheiro flui entre taças de vinho e olhares coniventes.
Estou em meu apartamento em Trastevere. Vista privilegiada, mas longe dos holofotes. Um lugar onde posso ser apenas Ezra. Ou o que sobrou de mim.
O relógio marca 19:15. O carro me espera às 19:30.
Caminho até o closet. Os ternos estão dispostos por cor e corte. Escolho o preto de lã italiana. Corte slim, lapela estreita, sob medida. Camisa branca, abotoada até o colarinho. Relógio suíço discreto, sapatos oxford em couro preto polido. Nada grita, tudo sussurra sofisticação.
Enquanto dou o nó na gravata, observo meu reflexo. Há sempre uma tensão contida nos meus olhos. Como se até o espelho soubesse que tudo o que construí pode ruir com um movimento errado. Mas isso nunca aconteceu. Ainda não.
Pego meu celular. Há três mensagens de Sérgio, meu consigliere. Uma delas menciona movimentações suspeitas em uma das contas “escondidas”. Outra cita o nome de uma Detetive que entrou em meu território. A terceira? Apenas confirma que “a mulher estará no evento”.
Franzo o cenho.
Uma investigadora? Possivelmente mandada pelo filho da puta do Richard. Aquele canalha não vai parar, não até acabar com a minha vida. Novamente envolvendo pessoas inocentes nas tramóias dele. Mas dessa vez, se trata de uma mulher, os que ele enviou antes, eram homens. Já sei o que ele pensa. Acha que mandando uma mulher, eu vá me deslumbrar e cair na rede feito peixe. Provavelmente ela vai me seduzir, tentar me levar pra cama, para conseguir o que ele quer.
Respondo a mensagem de Sérgio, digitando rapidamente.
"Levante um dossiê sobre ela, e me envia no email."
...✧ ✧ ✧ ✧ ✧ ✧...
O carro me deixou na porta da Galeria Vivanti às 19:55. O motorista, como sempre, se mantém em silêncio. É parte do contrato. Nada de conversas, nada de olhares no retrovisor. Apenas direção firme e pontualidade.
O segurança da galeria me cumprimenta com um aceno sutil. Ele sabe quem eu sou, mas jamais dirá em voz alta. Dentro, os convidados já circulam com taças nas mãos e poses estudadas. Olhos analisam obras que ninguém compreende. Riem de piadas que não têm graça. E sussurram nomes que não deviam ser ditos em público.
Eu caminho com passos tranquilos, mãos nos bolsos. Dou um aceno aqui, um cumprimento ali. Meu rosto é conhecido, mas não íntimo. Gosto assim.
Paramos sempre na mesma tela. Um quadro grande, vermelho com traços em preto. Caótico. Intenso. Caro.
É minha âncora nesses eventos. A desculpa perfeita para não precisar ficar em constante movimento. Sempre há alguém curioso o bastante para se aproximar da pintura e começar uma conversa.
Uma mulher sozinha, posicionada a cerca de dois metros da tela. Vestido preto, costas nuas, cabelo preso num coque limpo, elegante. Silenciosa. Sutil.
Mas é o olhar que me chama atenção. Ela não finge estar interessada como os outros. Ela realmente observa. Analisa. Como se tentasse entender a mente do artista, ou do anfitrião. Isso é raro. E perigoso. O que me leva a acreditar, que é ela, a investigadora. Confesso que ela é bem atraente, bonita e bem deliciosa.
Eu me aproximo. Sem pressa. Ignoro os dois empresários que tentam me atrair para uma conversa. Meus olhos estão nela.
Paro ao lado esquerdo, a uma distância respeitável, mas o bastante para fazer presença.
Olho para a tela e então falo, direto, como se o tempo entre nós já existisse há muito tempo.
— É uma peça de Enzo Petricelli. Um artista napolitano. Ele pintou isso após o suicídio do irmão mais novo. As cores representam raiva. O vermelho é descontrole. Os traços pretos, a culpa.
Ela vira o rosto na minha direção.
Pele clara, traços suaves, olhos inteligentes. Há algo de calculado nela. Mas ela esconde bem. É o tipo de mulher que sabe o que está fazendo. E faz parecer que não sabe.
— Interessante. — ela responde com um leve sorriso. — Achei que fosse apenas caos estético.
— É o que parece, à primeira vista. — retruco, ainda olhando a tela. — Mas nada que custa mais de cinquenta mil euros é realmente caótico. É sempre calculado.
Ela me encara por mais tempo do que a etiqueta social permite. Como se esperasse que eu dissesse mais. Como se me estudasse.
— E você? — pergunto com um sorriso que não mostra os dentes. — Entende de arte ou apenas veio beber espumante?
Ela sorri de leve.
— Depende de quem estiver perguntando.
Toque de desafio. Eu gosto disso.
— Ezra Ravelo. — estendo a mão, sem pressa. Eu sei que ela sabe meu nome, mas como uma perfeita mentirosa, vai apertar minha mão e fingir que é a primeira vez que ouvi meu nome.
Ela aceita o cumprimento, a mão firme e quente na minha.
— Camille Deneuve.
— Muito prazer, senhorita Deneuve — comento, ainda segurando a mão dela por um segundo além do necessário. Levo até os lábios olhando bem no fundo dos olhos dela, e beijo o costa da sua mão.
Ela retira a mão suavemente e volta a olhar para a tela, mas sei que agora sua atenção está dividida. Me tornei parte da equação. E ela da minha.
— Primeira vez na Galeria Vivanti? — pergunto.
— Sim. Cheguei há pouco na cidade.
— E já se envolveu com o lado mais pretensioso de Roma. Parabéns. Isso exige coragem, ou falta de opção.
Ela ri brevemente.
— Acho que é mais uma mistura dos dois.
A resposta me diverte. E me intriga. Há um equilíbrio perigoso nela. Um tipo de controle que geralmente só vejo em pessoas que não são exatamente quem dizem ser.
Mas não é o momento para brincar com ela. Ainda.
— Bom gosto em quadros. — digo, indicando a pintura. — E em vestidos, se me permite dizer.
— Obrigada. — responde ela, com polidez que não soa nem um pouco envergonhada.
Eu gosto disso também.
Já vi espiões, jornalistas, Detetives, investigadoras e até atrizes tentando se infiltrar nesse meio. Mas Camille é diferente. Ela se move como quem sabe que está sendo observada, mas não se importa. Isso a torna interessante. Ou perigosa.
Talvez os dois.
Ela volta os olhos para mim.
— E você? Veio admirar arte ou apenas desfilar seus ternos bem cortados?
A provocação é clara. Mas o tom é suave. Quase divertido.
— Eu vim ver o que aparece quando as luzes estão acesas. — respondo, sem desviar os olhos dela.
E, por ora, o que Richard me mandou, merece minha atenção. Toda minha atenção.
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Atualizado até capítulo 40
Comments
Katy Lee
Me julguem, mas tô na torcida por ele o gostoso do pedaço 😂
2025-06-21
3
Maria Sena
GENTE, eu amo esse jogo de gato e rato, mas sabemos que quem se dá muito mal é o rato. Agora, só nos resta descobrir no decorrer da trama quem vai ser o rato. Que comecem os jogos, ou melhor, a caçada.😅😅😅😜😜😋🥴
2025-06-25
2
Celma Rodrigues
Um Mafioso lindo, inteligente e um passo à frente. Gostei muito dessa mistura perigosa. Ele que vai cercar ela kkkkkkk.
2025-06-27
1