Um Espaço Só Meu

A semana seguinte parecia estar indo bem. Mia e Dulce Maria se viam todos os dias, mesmo que por poucos minutos. Era como se um novo mundo tivesse se formado só entre elas — um mundo com olhares mais demorados, mensagens de madrugada e sorrisos que só as duas entendiam.

Mas tudo mudou um pouco na quinta-feira.

Durante o intervalo, Dulce foi ao pátio esperando encontrar Mia como sempre. Mas quando chegou, a viu rindo alto com uma garota que ela ainda não conhecia. As duas estavam sentadas próximas demais, os ombros quase se tocando. Mia parecia… tão à vontade.

— Ah, Dulce! — Mia a chamou, acenando — Vem cá! Quero te apresentar uma pessoa!

Dulce sorriu, mas por dentro algo apertou.

— Essa aqui é a Rebeca Park, minha melhor amiga. Nós crescemos juntas. Ela voltou agora depois de um tempo estudando fora. Rebeca, essa é a Dulce Maria… a garota de quem eu lhe falei.

Rebeca sorriu de um jeito gentil, mas seu olhar demorou um pouco demais em Dulce.

— Então é você, né? Prazer. A Mia fala muito de você — ela disse com um tom leve, mas Dulce percebeu o subtexto.

— Prazer… — respondeu baixinho.

Enquanto as duas conversavam animadas sobre coisas antigas, piadas internas e lembranças de infância, Dulce sentia como se tivesse sido jogada para fora de um lugar onde antes era bem-vinda. Aquele espaço que era só dela e de Mia agora parecia invadido.

Ela tentou sorrir, fingir que estava tudo bem. Mas Mia percebeu algo no olhar dela.

Mais tarde, quando estavam sozinhas no portão da escola, Mia tocou o braço de Dulce com cuidado.

— Tá tudo bem?

Dulce hesitou.

— Você e a Rebeca… são muito próximas, né?

— Desde sempre. Ela é como uma irmã para mim. Mas... sabe que a senhora difere, né? Que com é outra coisa — Mia respondeu, olhando nos olhos dela.

— É que... eu me senti de lado. Como se eu fosse só mais uma amiga. Eu… — ela abaixou a cabeça — acho que senti ciúmes.

Mia sorriu com ternura e segurou a mão dela.

— Você pode sentir, Dulce. E pode me dizer também. Eu quero saber o que você sente. Eu quero cuidar disso com você.

Dulce a olhou por alguns segundos, com os olhos cheios de dúvidas… e também de coragem.

— Então, cuida de mim.

E, pela primeira vez, Mia se aproximou e encostou a testa na dela. O momento era silencioso, íntimo, intenso. Quase um beijo. Mas não foi ainda. Foi só a promessa dele.

O tipo de promessa que faz o coração acelerar.

Nos dias que seguiram, Dulce tentou agir como se nada tivesse mudado. Mas algo nela começava a ferver toda vez que via Rebeca se aproximando de Mia com tanta intimidade, como se ocupasse um lugar que ela também queria — mas ainda não sabia exatamente como nomear.

Na segunda-feira, Mia convidou Dulce para almoçar na cantina. Ela chegou animada, até ver Rebeca sentada com Mia, rindo de algo no celular.

— Oi… — disse Dulce, se aproximando.

— Oiê! — Mia sorriu — Vem, senta aqui com a gente!

Dulce sentou, mas o lugar ao lado de Mia já estava ocupado por Rebeca, que nem pareceu notar o desconforto.

— Mia, lembra quando a gente foi na exposição de arte e você chorou com aquela pintura da bailarina? — Rebeca comentou, rindo.

— Eu chorei nada! Foi só um cisco no olho! — Mia respondeu, rindo também.

Dulce ficou quieta, mexendo na comida sem fome. Ela não fazia parte daquele passado. Não conhecia aquelas histórias. E, o pior: começava a sentir que talvez nunca fosse se encaixar ali.

Quando Rebeca saiu para buscar sobremesa, Mia notou o silêncio de Dulce.

— O que houve? Você tá estranha.

— Eu só... tô me sentindo invisível do seu lado quando a Rebeca tá por perto — ela desabafou, com um tom mais duro do que gostaria. — Parece que ela quer te lembrar o tempo todo de que ela chegou antes.

Mia ficou em silêncio por um instante, tocando de leve na mão de Dulce por baixo da mesa.

— Mas quem ficou, Dulce… foi você. Quem eu espero todo o dia? Quem eu penso antes de dormir? Não deixe o passado apagar o que nós tá! Construindo agora.

Dulce respirou fundo. Queria acreditar. Queria confiar. Mas ainda sentia Rebeca como uma sombra constante.

Na saída, Rebeca as alcançou no portão.

— Mia, posso te levar até em casa? Preciso te mostrar uma coisa no meu caderno de esboços.

Antes que Mia respondesse, Dulce disse rápido:

— A Mia já combinou comigo. Nós íamos caminhar um pouco depois da aula, lembra?

Mia olhou de uma para a outra, surpresa. Dulce nunca tinha sido tão direta. Rebeca arqueou uma sobrancelha, como se percebesse que algo ali não era só amizade.

— Ah… entendi — disse Rebeca, dando um sorriso que não chegou aos olhos. — Divirtam-se.

Quando ela se afastou, Dulce soltou o ar devagar. Mia olhou pra ela com um sorriso pequeno.

— Você teve ciúmes de novo?

Dulce mordeu o lábio, tentando segurar um sorriso envergonhado.

— Talvez. Mas dessa vez… eu não quis esconder.

Dulce mordeu o lábio, tentando segurar um sorriso envergonhado.

— Talvez. Mas dessa vez… eu não quis esconder.

Mia parou, olhando nos olhos dela.

— Sabe… cada vez que você se abre comigo, eu tenho mais certeza de que eu quero te beijar.

Dulce congelou. O coração disparou.

— Então… por que ainda não fez isso?

Mia sorriu.

— Porque quando eu fizer, quero que seja do nosso jeito. No nosso tempo. E num lugar onde o mundo não atrapalhe.

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