capítulo 5

🖤 O Luto da Última Filha

Serysha’In não gritou mais.

Não chorou.

Não pediu.

Quando o corpo do pai caiu sem vida, algo dentro dela se partiu — mas não quebrou.

Ficou frio. Duro. Imóvel.

Havia uma última coisa a fazer.

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⛏️ A Cova Escavada Pelas Próprias Mãos

Ela não usou ferramentas.

Nem máquinas.

Nem drones.

Ela cavou com as próprias mãos.

A pedra viva de Kar’Zhun, resistente como aço, cedeu sob suas garras afiadas. Escamas negras cobertas de poeira e sangue. Unhas rachadas. Músculos tremendo. Ela cavou sem parar por um ciclo solar inteiro.

Duas covas. Lado a lado.

Quando terminou, não havia lágrima no rosto — só pedra no peito.

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🐍 O Ritual Fúnebre Naga

Os Naga não queimam seus mortos.

Eles os devolvem à terra, à serpente primordial.

Serysha limpou os corpos com água morna da fonte interna.

Colocou trajes cerimoniais — os mesmos que os pais usavam em festivais antigos.

Marcou os olhos deles com traços de cinza e óleo.

Deitou-os lado a lado, mãos entrelaçadas.

Em volta da cova, ela espalhou cristais de luz e fitas simbólicas — representando os quatro pilares naga: sangue, memória, honra e silêncio.

Então, sozinha, ela entoou o Canto dos Ciclos, uma melodia baixa, feita de sons guturais e notas longas, passada por gerações:

> "Do mar viemos, ao solo voltamos.

Pelos ossos dos antigos, pela cauda da mãe.

Voltem ao ciclo. Descansem no silêncio.

Hoje, o mundo chora por dois."

Ela cobriu os corpos com as próprias mãos, pedra por pedra.

Fez um círculo de escamas ao redor, retiradas do próprio braço — um juramento pessoal de eternidade.

Quando terminou, se ajoelhou diante das covas… e permaneceu ali até a próxima noite. Sem se mover. Sem respirar fundo. Só existindo.

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🌑 O Isolamento

Nos dias que seguiram, ela não falou com ninguém — porque não havia ninguém.

A caverna ficou silenciosa.

Ela apagou todos os sistemas de luz artificial.

Vivia sob o brilho fraco dos cristais, movendo-se como uma sombra.

Parou de se alimentar direito.

Dormia no chão.

Treinava em silêncio até os músculos rasgarem.

Escrevia nas paredes com sangue seco, frases do antigo idioma naga. Fragmentos de lembranças.

Kar’Zhun virou um mausoléu.

Mas em algum ponto da escuridão, dentro dela, uma semente germinava.

Não era esperança.

Não ainda.

Era propósito.

🌑 A Partida da Última Herdeira

O tempo em Kar’Zhun deixou de ser contado.

Serysha’In já não sabia se fazia semanas ou meses desde que enterrou os pais.

O luto não havia passado. Mas agora… tinha forma. Tinha direção.

Numa manhã silenciosa, como todas as outras, ela se levantou devagar.

Foi até o antigo arsenal que o pai mantinha escondido sob a pedra da sala cerimonial.

Lá, escolheu duas lâminas curvadas, uma pistola de pulso adaptada para suas mãos, e um manto preto, pesado, com fibras refletoras.

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🕶️ A Preparação

Frente ao espelho opaco de cristal fosco, Serysha se cobriu.

Colocou o manto negro, longo, com capuz largo.

Ajustou a máscara sobre o nariz e a boca, cobrindo até a mandíbula.

Escondeu o cabelo negro sob o tecido, enrolado firmemente.

Por fim, passou uma venda escura sobre a testa, deixando apenas uma fresta para os olhos.

Mesmo assim, o capuz projetado bloqueava quase toda a visão de fora. Quase ninguém notaria que havia olhos ali. Apenas um vulto silencioso.

Ela escondeu os braços sob as dobras do tecido, camadas grossas para ocultar as escamas.

A cauda serpentina, símbolo do seu sangue, foi contida: ela usaria as pernas humanas.

Mais discretas. Mais comuns.

A cauda só emergiria em combate — em forma bestial.

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🎒 A Partida

Ela reuniu suprimentos básicos:

Cápsulas de energia.

Filtros de água.

Armas leves.

Kit médico.

Fragmentos cerimoniais dos pais, guardados num compartimento secreto.

Guardou tudo em uma bolsa sintética de ombro, firme, ajustada ao corpo.

Antes de partir, caminhou até a parede onde gravou os nomes dos pais.

Passou a mão sobre as letras.

Fechou os olhos.

Então disse, num sussurro quase inaudível:

> — “Eu vou. Mas um dia… eu volto.”

Virou-se sem hesitar.

Ativou a escada de camuflagem.

A passagem se abriu. A luz fria do mundo exterior penetrou a caverna pela primeira vez em anos.

E assim começou a jornada de Serysha’In.

Não mais filha.

Não mais protegida.

Agora, sombra. Vagante. Legado vivo de um povo em ruína.

O mundo lá fora não sabia…

Mas algo havia acordado.

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