capítulo 2

Os dias na fazenda correram rápidos, como as águas do riacho que cortava os fundos do terreno. Léo, que mal sabia a diferença entre um arado e um trator, aos poucos aprendeu a lidar com a lida da roça. Era desajeitado, reclamava do sol, mas sorria. E João... João sorria também, ainda que tentasse esconder.

À noite, às vezes dividiam a varanda, os dois sentados em cadeiras de palha, o silêncio confortável entre eles. Era como se o tempo ali obedecesse outras regras. Mais lentas. Mais leves. Mais perigosas.

Foi numa tarde abafada de sábado que a poeira subiu na estrada de terra, anunciando a chegada de um carro preto, reluzente demais pro tom do campo. João, de chapéu na testa e camisa aberta até o peito, parou o que fazia e franziu os olhos.

O carro parou na entrada da fazenda. Dele saiu um homem de terno cinza claro, óculos escuros, e um celular na mão.

— Boa tarde! — gritou ele, sem se aproximar muito. — Desculpe incomodar. Estou procurando por uma pessoa. Léo Andrade. Jovem, vinte e poucos anos, cabelo claro. Deve estar por essas bandas.

João sentiu o estômago revirar.

— Quem é o senhor?

— Sou da família dele. Enviado pelo pai. O garoto desapareceu há alguns dias. Estamos preocupados.

Antes que João pudesse responder, a porta da varanda rangeu. Léo estava ali, parado, pálido como farinha, encarando o homem como se tivesse visto um fantasma.

— Sr. Diniz... — murmurou ele.

O homem tirou os óculos, revelando olhos frios e impacientes.

— Léo. Que bom te encontrar. Seu pai está à sua espera.

— Eu não vou voltar — respondeu Léo, firme, mas com a voz trêmula.

João se aproximou devagar, como quem protege um bezerro assustado.

— Ele fica aqui enquanto quiser. Essa terra é minha, e você não manda em nada por aqui.

Sr. Diniz mediu João de cima a baixo. O silêncio que se seguiu foi tenso como corda esticada demais.

— Isso é um sequestro, sabiam? — disse ele. — Estão impedindo um jovem de voltar pra casa.

Léo deu um passo à frente, agora mais firme.

— Ninguém me sequestrou. Pela primeira vez na vida, eu escolhi ficar em algum lugar. E esse lugar é aqui.

O homem bufou, irritado.

— Você vai se arrepender disso, Léo. Seu pai não aceita “não” como resposta.

— Talvez ele precise aprender a aceitar, então.

Sr. Diniz entrou no carro sem outra palavra, levantando nova nuvem de poeira. Quando o carro sumiu na curva da estrada, João olhou para Léo, que tremia levemente.

— Ele vai voltar — disse Léo, com a voz embargada. — Eles não vão parar tão fácil.

João assentiu e colocou a mão no ombro dele.

— Então a gente fica pronto. Ninguém te tira daqui à força. Não enquanto eu estiver aqui.

Léo o olhou como se quisesse dizer mais. Como se o medo e a gratidão estivessem misturados com algo mais profundo, que ainda não tinha nome. Mas em vez de palavras, foi um silêncio terno que se instalou entre eles.

E naquela tarde morna, sob o céu vasto e vermelho do interior, os laços entre os dois se apertaram um pouco mais.

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