"Laura, você está neste mundo?", a voz da mãe a despertou de seus devaneios, com um tom que misturava divertimento e preocupação. Laura piscou, um pouco atordoada, e viu os olhos inquisidores de Dona Fátima fixos nela, enquanto o pai e os tios riam baixinho. O rosto de Laura corou.
"Estou sim, mãe", ela respondeu, tentando parecer o mais natural possível, mas sentindo o calor nas bochechas. "Só estava pensando... em como é diferente aqui. E no calor."
Dona Fátima sorriu, não totalmente convencida, mas deixou o assunto de lado por enquanto. "É diferente mesmo, minha filha. Mas logo você se acostuma. O sertão tem seus encantos."
Laura forçou um sorriso, pegando um pedaço de macaxeira. Encantos, pensou ela, definitivamente. E um deles tinha aboio e cabelos negros. Ela olhou discretamente para a janela, desejando ver a poeira levantar novamente no curral, e o vaqueiro surgir como uma miragem. Aquelas férias seriam inesquecíveis, de um jeito que ela jamais poderia ter previsto
Laura terminou o almoço com uma rapidez incomum, a mente ainda nas palavras da mãe e, mais intensamente, na figura do vaqueiro. Levantou-se da mesa, desculpando-se com a família, e disse que iria tomar um pouco de ar na área externa.
A brisa quente do sertão a recebeu. Laura caminhou até a varanda, seus olhos perscrutando o horizonte na direção do curral. A esperança de ver o jovem aboiador novamente era palpável em cada passo. Ela sentou-se em uma cadeira de balanço, o olhar fixo, como se pudesse materializar a imagem do vaqueiro com a força do seu desejo. O sol já começava a pender para o oeste, pintando o céu com tons alaranjados, mas o movimento no curral ainda era intenso. Vaqueiros iam e vinham, mas o de **cabelos negros e aboio marcante** não aparecia.
Será que ele já foi embora para o almoço? Ou estaria em outra parte da fazenda? Laura suspirou, um misto de frustração e expectativa.
Dona Fátima sentou-se ao lado de Laura na varanda, observando a filha com carinho.
— E então, minha filha? O que você está achando daqui, depois de tanto tempo sem vir? — perguntou a mãe, já acostumada à rotina da fazenda.
Laura suspirou, desviando o oar da entrada do curral.
— Ah, mãe... Eu acho que vou entrar para o meu quarto.— Ela sabia que a mãe entendia a sua aversão. — **Eu sei que a senhora não gosta daqui, eu sei que aqui não é um lugar que te agrada. Não tem internet, não tem amigos...
Dona Fátima assentiu, um leve amargor em sua voz.
— Eu também não gosto daqui não, Laura.— disse a mãe. — Mas seu pai tem essa fazenda, gosta de estar aqui, e eu tenho que estar junto dele. Por mim, eu iria morar no Sul. Lá é bem melhor. Mas ele não larga esse local.**
Ela fez uma pausa, olhando para a filha.
— Eu já me acostumei aqui, mas eu gosto de estar lá na nossa casa, na nossa maravilhosa cidade... Mas já que o papai gosta tanto, a gente vem.
Quando estavam prestes a entrar, de repente, Laura viu João. Ele ia passando com outros vaqueiros, e ela ficou acompanhando cada movimento dele com o olhar. Foi quando a mãe, notando o interesse fixo da filha, segurou seu braço.
— Filha, não quero você conversando com os peões aqui, entendeu? Por favor, vamos entrar.
Laura puxou o braço, indignada com a mãe.
— Oxe, mamãe! A senhora sabe que eu gosto de conversar! Deixe de ser preconceituosa, são pessoas como nós!
Dona Fátima fechou a cara, a voz mais dura.
— Não, Laura, eles não são pessoas como nós. Eles são empregados do seu pai. Eu não quero você conversando com esse tipo de gente, entendeu?
Laura cerrou os punhos, mas tentou manter a calma.
— Claro, mãe, eu entendi. — Ela fez uma pausa, o olhar desafiador. — Mas, mais uma vez eu reafirmo: eles são gente. Eles são igual a nós.
O ar ficou pesado entre as duas. Dona Fátima lançou um último olhar de advertência antes de se virar e entrar na casa, deixando Laura sozinha na varanda, com seus pensamentos e o resquício da imagem de João.
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Atualizado até capítulo 58
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