O Vaqueiro e a Filha do Fazendeiro.
A poeira fina avermelhada de Serra Talhada grudava na lataria do Jeep Renegade assim que ele cruzou o portão da fazenda. Laura, com seus óculos de sol de aro gatinho e fones de ouvido sem fio, suspirou. Trocar o asfalto liso de Recife pelo estradão de terra batida já era um choque, mas a vastidão seca e silenciosa que se estendia até onde a vista alcançava parecia de outro planeta. "Férias revigorantes", seu pai havia insistido ao telefone. Revigorantes, talvez, para quem precisava de um detox digital forçado, pensou ela, enquanto o sinal do celular desaparecia preguiçosamente.
A casa grande, com sua arquitetura colonial e varanda espaçosa adornada por redes coloridas, até tinha seu charme rústico. Mas nada ali lembrava seu apartamento moderno com vista para o Capibaribe, os cafés estilosos da Rua da Moeda ou as noites agitadas de Boa Viagem. Laura era uma criatura da cidade, do Wi-Fi veloz e das notificações constantes. O máximo de contato que tinha com animais eram os vídeos fofos de gatinhos no Instagram.
Enquanto descia do carro, abafada pelo calor seco que a envolvia como um abraço quente demais, um som grave e melodioso cortou o silêncio. Vinha de longe, um canto de trabalho, acompanhado pelo ritmo constante de um casco de cavalo na terra. Curiosa, Laura se afastou da sombra da varanda e caminhou em direção ao som, seus tênis brancos levantando pequenas nuvens de poeira.
Foi então que ela o viu. Na mangueira, um grupo de vaqueiros tangia o gado. Mas um deles se destacava. Montado em um cavalo preto lustroso, ele guiava os animais com uma desenvoltura impressionante. O chapéu de couro abrigava um rosto jovem e marcado pelo sol. Era um vaqueiro moreno, com cabelos negros escorrendo pelas laterais, que lhe davam um ar quase indígena. Ele cantava um aboio antigo, a voz grave ecoando pela paisagem, e a forma como ele manejava o laço, com precisão e elegância, era hipnotizante.
Laura parou, fascinada, observando a cena como se fosse um filme. Ele parecia parte daquela paisagem árida e imponente, tão diferente de tudo que ela conhecia. Seus olhos se encontraram por um breve instante. O vaqueiro parou de cantar, um leve sorriso curvando seus lábios. Naquele momento, entre o mugido do gado e o calor do sol, Laura sentiu uma fisgada curiosa, um despertar para algo completamente novo e inesperado naquelas suas "revigorantes" férias no sertão. Ela não sabia, mas aquele era João, o filho do gerente da fazenda, e o encontro casual sob o sol escaldante de Serra Talhada era apenas o prelúdio de uma história que cruzaria as fronteiras entre a cidade e o campo, o asfalto e a poeira, e talvez, dois corações de mundos tão distintos.
O Reencontro com as Raízes
Absorta em seus pensamentos, Laura finalmente se virou e caminhou para a casa grande. Ao entrar, o aroma familiar de café coado e bolo de milho invadiu seus sentidos, misturando-se ao cheiro de cera e madeira antiga. Lá estava a Dona Josefa, sua antiga babá, com os braços abertos e um sorriso que enrugava os olhos.
"Minha menina! Que saudade! Chegou, finalmente!" exclamou Josefa, apertando Laura em um abraço caloroso.
"Josefa! Que bom te ver! Que saudade da sua comida, do seu cheiro!", Laura respondeu, retribuindo o carinho. As lembranças da infância na fazenda, das histórias de assombração contadas por Josefa à luz da lamparina, inundaram sua mente.
Ela cumprimentou os outros funcionários da fazenda, trocando abraços e risadas. O cansaço da viagem, no entanto, começou a pesar. "Vou subir rapidinho, Josefa. Preciso de um banho e descansar um pouco antes do almoço", Laura disse, sentindo os olhos pesarem.
No quarto, ela jogou a mochila na cama e ligou o ar condicionado, um luxo que seu pai, o Fazendeiro Luís, havia providenciado para o conforto da filha. A água fresca do chuveiro lavou não só a poeira da viagem, mas também um pouco da tensão dos últimos dias. Ao sair, enrolada na toalha, Laura se jogou na cama e fechou os olhos por alguns minutos, imaginando o vaqueiro de cabelos negros e sorriso fácil.
Pouco depois, o chamado para o almoço a despertou. Na ampla sala de jantar, seu pai, o Fazendeiro Luís, já a esperava. Ao seu lado, com um sorriso acolhedor, estava sua mãe, Ana.
"Filha, que bom que você chegou! Estávamos morrendo de saudades!", disse Luís, levantando-se para abraçá-la.
"A viagem foi longa, mas valeu a pena pra ver vocês", Laura respondeu, beijando o rosto do pai e depois o da mãe.
"Como foi a viagem, meu amor? Está muito cansada?", perguntou Ana, passando a mão nos cabelos de Laura.
"Um pouco, mãe, mas já deu pra dar uma descansada. A fazenda está igualzinha, só a internet que insiste em me abandonar!", Laura brincou, fazendo os pais sorrirem.
Enquanto se sentavam à mesa, servidos por Josefa, o cheiro da comida caseira preencheu o ambiente. Laura tentou prestar atenção às conversas sobre o gado e a chuva que demorava a vir, mas sua mente continuava voltando para a imagem do vaqueiro de cabelos negros e o som de seu aboio no meio do curral. As férias no sertão prometiam ser muito mais interessantes do que ela imaginava.
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Atualizado até capítulo 58
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