Capítulo 3

— Senhor! — respondo com firmeza, mesmo que por dentro meu peito esteja em chamas.

O timbre dele me obriga a endireitar a coluna, como se ainda fosse uma criança esperando por ordens. Mas eu não sou mais uma criança. E ele não deveria me tratar como se fosse.

Ele se aproxima com passos duros. Os olhos escurecidos e as mãos cerradas revelam o que ele ainda tenta controlar. Fúria. Culpa. Medo, talvez.

— Eu tenho orgulho da mulher que você se tornou, Isabelle. — Sua voz sai grave, trêmula. — Mas...

— Mas não é o suficiente, não é? — corto, com a voz tingida de raiva e decepção. — Eu poderia matar mil inimigos e ainda assim não seria o bastante. Eu enfrentei um ataque, dirigi uma metralhadora, protegi um dos seus homens e sobrevivi a uma emboscada como uma maldita guerreira... E ainda assim... ainda assim não sou digna do que é meu por direito?

Ele não responde de imediato. Seus olhos endurecem como pedra. Um silêncio gelado cai entre nós como uma neblina sufocante.

— Esse nunca foi seu direito de nascença, filha. — Ele diz, por fim. — Apenas homens assumem o trono da Comissão. É a tradição.

— Tradição? — cuspo a palavra como veneno. — Tradição é desculpa de covarde! É muleta de quem tem medo de ver uma mulher no topo! Eu sou mais inteligente, mais estratégica e mais corajosa do que qualquer homem ao seu lado! Eu estudei economia, aprendi a atirar com onze anos, fiz acordos com traficantes e mantive o nome Martinez intacto mesmo com metade da cidade querendo nos derrubar! Eu sou digna, pai. Eu sou mais que digna. EU NASCI PRA ISSO!

Meu peito sobe e desce rapidamente. Meu coração bate como tambor de guerra.

Mas ele apenas vira o rosto, como se não quisesse ver a mulher diante dele. Como se minha verdade o ferisse mais do que qualquer faca.

— Mas você não vai assumir. — declara. — E esse assunto está encerrado!

A voz dele explode como um trovão. Dura. Definitiva. Cortante.

Eu me enrijeço. Nunca o ouvi gritar comigo. Nunca... com tanta violência.

Meu corpo treme. Meus olhos ardem. Mas eu me recuso a recuar. Não dessa vez.

— Ruan... ela só está tentando... — Genaro tenta interceder, a voz baixa.

— Não, Genaro. Não interfira. Isabelle precisa entender seu lugar... e suas obrigações.

— Obrigações? — minha voz falha. A dor se infiltra nas minhas palavras como um veneno lento. — O senhor chama isso de obrigação? Ser entregue como uma ovelha ao altar da máfia? Casar com um homem que sequer se deu ao trabalho de me conhecer? Um que não me respeita, que me vê como um prêmio de guerra? É isso que espera de mim, papai?

Ele me encara. Frio. Imóvel. Cada ruga de seu rosto parece entalhada pela guerra. Mas naquele instante… é como se não houvesse espaço para o amor.

— Jean Ferrari é um homem de honra. — ele diz com rigidez. — Melhor do que muitos que conheci.

— Um homem de honra?! — minha risada é amarga, sufocada. — Estamos falando do mesmo Jean Ferrari que obriga suas vítimas a beber o próprio sangue antes de matá-las? Aquele que todos dizem ser um assassino disfarçado de lobo? Um homem de honra seria o Don da Camorra? Ou será que estamos falando do irmão dele, conhecido como o Diabo?

Ele fecha os olhos por um instante. Baixa a cabeça. Por um segundo — apenas um — vejo hesitação. É tudo o que preciso.

— O senhor deveria ter sido diferente. Eu sou sua filha! Seu sangue, seu legado! Eu queria sua bênção, sua orientação. Mas tudo o que recebi foi uma sentença. — minha voz agora treme com dor — O senhor preferiu me transformar em moeda, em aliança. Me tirou tudo... até o nome.

Ele fecha os olhos, respira fundo. E diz, com um nó na garganta:

— Foi assim com sua mãe… e será assim com você.

— Talvez por isso ela tenha morrido. — sussurro, antes de perceber o que disse.

O tapa não demora. É como um raio cortando o ar.

Estalado. Rápido. Quente.

O impacto me faz girar o rosto. A dor é mais emocional do que física. Genaro, chocado, se coloca entre nós.

— Ruan! — ele segura o ombro do meu pai, furioso. — Que porra você fez?!

— Nunca mais repita isso, Isabelle. Nunca mais. — ele diz, a voz falha. Os olhos, que antes me intimidavam, agora brilham com uma dor contida.

Silêncio.

Até que ele quebra o próprio orgulho:

— Sua mãe era a luz da minha vida. Quando ela morreu... tudo que havia de bom em mim morreu com ela. Você... — ele respira com dificuldade — ...é a única centelha que me resta.

Ele se aproxima. A voz rouca, como se quebrasse por dentro.

— Se precisar me odiar para sobreviver… me odeie. Já sou odiado por muitos. Mais uma... não fará diferença.

Eu quero dizer algo. Quero xingar, gritar, cuspir o rancor preso na garganta. Mas antes que consiga, ele solta mais uma bomba:

— Seu noivo também foi emboscado hoje.

Arregalo os olhos.

— Ele sobreviveu.

Meus lábios se apertam. O gosto da amargura sobe como fel.

— Claro que sobreviveu. — digo, sarcástica. — Nem pra morrer esse desgraçado serve. Ou talvez os incompetentes que falharam comigo sejam parentes dos que falharam com ele.

Meu pai fecha os olhos. Pela primeira vez, vejo decepção verdadeira estampada no rosto dele.

— Eu não sei mais o que fazer com você, Isa… Mas até descobrir, está proibida de sair desta casa.

— O quê?! — minha voz sobe, desesperada.

— Proibida até o dia do seu casamento. Depois disso, será responsabilidade de seu marido. Talvez ele consiga o que eu… não consegui.

A dor das palavras dele me perfura como lâminas de gelo.

Ele não é mais o Don.

Ele é o homem que desistiu da própria filha.

— Suba. Agora. E só volte quando for a Isabelle que eu criei.

Genaro me olha. Ele implora com os olhos para que eu não revide. Para que eu vá.

E eu vou.

Mas cada degrau que subo é como um punhal cravado nas costas. Cada passo é uma derrota amarga.

Eu não derramo uma lágrima.

Porque não vou chorar por esse sistema podre. Por essa tradição falida. Por um pai que teve medo de me escolher.

Ele acha que me quebrou.

Mas está redondamente enganado.

Eu vou me casar.

Vou vestir o vestido.

Vou jurar com os lábios o que meu coração jamais aceitará.

E quando Jean Ferrari achar que venceu…

…é quando o inferno vai começar.

E eu serei sua dona.

Todos os dias. Todos os segundos.

Até ele entender que o verdadeiro trono...

… era meu.

Olá minhas queridas, passando para deixar meu Instagram para quem quiser me seguir @silareis_. Vou adorar seguir vocês também.

Agora, mais um capítulo saindo do forninho.

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Comments

Alexandra Calheiros

Alexandra Calheiros

Já deixei um café pra autora.

2025-06-17

0

Andreia

Andreia

Aí vc arrasa Sila👏👏👏🥰

2025-06-14

0

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