Capítulo 2 – A Promessa de Ir Embora

A carruagem balançava de forma mais suave que a carroça anterior, mas meu corpo ainda doía em cada ponto. Eu me sentia como uma folha presa no meio de um rio turbulento.

Pelo menos agora, minhas mãos estavam soltas.

Ainda havia grades do lado de fora, claro. E guardas. Mas era diferente.

Limparam nossos rostos com panos mornos e jogaram mantos por cima das roupas rasgadas. O príncipe não voltou a falar com ninguém. Apenas montou e sumiu com os soldados.

A menina da focinheira estava sentada do meu lado, agora com o pano fora da boca.

Ela ficava olhando pela fresta da madeira como se o mundo ainda fosse perigoso demais pra encarar de frente.

Foi ela quem falou primeiro.

— De onde você veio?

Virei um pouco a cabeça na direção dela.

— Fronteira sul de Hwa-guk. Uma vila pequena... sem nome grande o suficiente pra alguém lembrar. E você?

— Oeste de Xiyuan. Meu pai trabalhava em caravanas. Um dia não voltou. Depois vieram me buscar.

Ela engoliu seco e esfregou os pulsos, ainda marcados pelas cordas.

— Você acha mesmo que... vão deixar a gente ir embora?

A pergunta ficou no ar como fumaça.

Olhei pela janela também. O céu já estava alaranjado, e podíamos ver o contorno dos muros do palácio se aproximando à distância. Dourado, imponente. Uma prisão bonita ainda era uma prisão.

—Eu não sei — respondi com honestidade. — Eles falaram em contrato, em pagamento... mas se somos só servas, talvez tenhamos alguma chance. Talvez.

—“Alguma” não é certeza — ela murmurou.

Ficamos em silêncio por um tempo. A estrada fazia barulho sob as rodas. Os guardas falavam baixo lá fora, como se esse momento fosse o único de paz que nos permitiam.

—Meu nome é Lifen — ela disse de repente. — Esqueceram de trocar o meu ainda. Acho que não fui importante o bastante.

—Eu sou Hua Lian — falei baixo, como se dizendo em voz alta fosse me fazer perder de novo.

Lifen me olhou de lado, surpresa.

—Hua? Tipo... flor?

Assenti com a cabeça.

Ela sorriu pela primeira vez desde que nos jogaram juntas naquela carroça.

—Bonito. Combinou com você.

Pela primeira vez em dias, senti que ainda havia algo meu aqui dentro.

Mesmo que o nome fosse a única coisa que me restava, pelo menos era verdade.

—Acha que vão nos tratar bem lá dentro? — ela sussurrou, quando os portões começaram a se abrir.

—Não sei — repeti.

Mas dessa vez, minha voz tremia menos.

Porque mesmo sem certeza… eu queria descobrir.

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A carruagem parou com um solavanco, e os guardas abriram as portas sem dizer uma palavra. O portão do palácio era alto demais para que eu visse o céu.

Por um instante, parecia que o mundo tinha sumido — só existia aquele muro, as grades… e a gente.

Fomos levadas para um pátio coberto de pedra cinza. As colunas eram altas, de mármore gasto pelo tempo. À frente, uma mulher muito velha, com o cabelo preso em um coque apertado e a postura rígida como uma espada, já nos esperava.

—Novas? — a velha perguntou, sem tirar os olhos do pergaminho em mãos.

—Sim, madame — respondeu uma das servas de uniforme azul, que nos escoltava. — São resgatadas da patrulha imperial, todas aguardando registro.

—Tsc. Sempre mais bocas pra alimentar — resmungou a mulher, e só então levantou os olhos. Eram pequenos, fundos, e pareciam atravessar a gente como se quisessem encontrar sujeira escondida por dentro da alma.

Ela caminhou devagar, nos observando uma a uma. Passou por mim, por Lifen, e por outras meninas que eu ainda nem tinha reparado. Havia pelo menos umas oito ao todo, algumas bem mais jovens, outras com olhares já endurecidos.

—Essa aí está pálida demais — apontou para uma menina que tremia. — Acha que vai durar no Setor das Lavagens?

—Essa parece esperta — apontou Lifen. — Vai para as cozinhas. As da fronteira têm faro bom.

Quando chegou em mim, parou. Me encarou por longos segundos.

—Linda demais pra ficar no estoque comum. Vai dar problema. — Ela bufou. — Setor dos Refeitos.

—O quê...? — Lifen murmurou ao meu lado.

—Silêncio. — A velha estalou os dedos, e logo outras mulheres mais jovens, com roupas simples e o brasão bordado no ombro, se aproximaram.

—Vocês serão designadas a setores diferentes. A partir de agora, seus nomes podem ser alterados para registro interno. Os antigos não têm valor aqui. — Ela bateu o pergaminho com força na tábua ao lado. — Recebam as roupas. Troquem. Banho no pátio da ala leste. Depois disso, cada uma vai com sua tutora.

Uma pilha de tecidos dobrados foi jogada sobre uma mesa.

Nos separaram por pares e nos levaram para dentro. O palácio por dentro era ainda maior do que parecia. Paredes de madeira escura com entalhes refinados, corredores limpos como se ninguém pisasse ali. Mas era tudo silencioso.

Assustadoramente silencioso.

Nos despiram sem gentileza, jogaram água quase fria com ervas no corpo e esfregaram até minha pele arder.

Quando terminaram, me deram um quimono bege simples, com um laço escuro na cintura e os cabelos presos com um cordão de linho.

—Agora parece gente — murmurou uma das mulheres.

Voltamos ao pátio, onde a velha nos esperava de novo.

Haviam mulheres ali — muitas. Usavam hanfus longos, tecidos bordados, e o perfume que deixavam no ar era mais forte do que o cheiro das ervas que esfregaram na minha pele.

Elas estavam sentadas sob um toldo branco, tomando chá enquanto nos observavam como se fôssemos frutas em exposição.

As Damas-Chefes do Harém.

Cada uma era responsável por um setor, e agora… elas queriam novas servas.

Mas não bastava escolher a mais limpa ou a mais forte.

Elas queriam testar.

—Você. Lê isso — disse uma dama de vermelho, jogando um pedaço de papel para uma menina assustada. A garota gaguejou, tentou decifrar os traços simples, mas não conseguiu.

—Próxima. Essa aí só serve pra esfregar chão.

Mais uma, e mais uma. Algumas não sabiam ler. Outras sabiam, mas não conseguiam pronunciar bem. Uma foi mandada embora só por dizer "nobreza" com sotaque da fronteira.

As damas riam.

Não alto — mas com aqueles sorrisos contidos, venenosos.

—Essa tem olhos bons, mas vai virar isca de imperador se chegar perto demais.

—Cabelo bonito demais. Bota no turno noturno das cozinhas.

—Essa aí não tem chance, olha a cara de tonta...

Tudo era julgamento. Tudo era ameaça.

Quando chegou minha vez, uma dama de azul escuro me olhou de cima a baixo, segurando o leque fechado entre os dedos.

—Nome?

—Hua Lian — respondi.

Ela sorriu, debochada.

—Ainda acha que vai manter nome de flor aqui dentro?

A outra dama ao lado dela, mais jovem, de amarelo, sussurrou algo no ouvido da que usava roxo. A mulher de roxo nem se mexeu, mas seus olhos pousaram em mim.

Fria. Precisa. Como se estivesse calculando algo.

Ela se levantou lentamente. O silêncio se espalhou em volta.

Todas as outras pareceram dar um passo mental para trás.

O tecido roxo do vestido arrastava no chão como névoa enquanto ela se aproximava. Seus olhos eram escuros, sem calor. Sem pressa, ela tirou um pequeno leque de dentro da manga e o abriu diante de mim.

—Leia.

As palavras eram caligrafia antiga. Difícil. Mas eu… reconhecia.

Tinha aprendido com a velha da vila que me criou. Ela dizia que "quem sabe ler, sabe se proteger".

—"Servir com recato é a virtude da água, que se molda mas não quebra." — recitei.

Ela fechou o leque com um estalo.

—Sabe escrever?

Assenti. Ela não pediu prova.

—Você. Comigo.

Sem mais uma palavra, ela se virou e foi embora.

A dama de amarelo sorriu, quase como quem sente pena.

—Ela é do Setor Violeta. Provavelmente nunca mais volta.

Me puxaram para fora da fila. Lifen ainda estava lá, me olhando com olhos aflitos.

—A gente se vê? — ela sussurrou.

Não respondi.

Porque não sabia.

Capítulos
1 Capítulo 1 – Hua
2 Capítulo 2 – A Promessa de Ir Embora
3 Capítulo 3 – Setor Violeta
4 Capítulo 4 – O Olhar que Reconhece
5 Capítulo 5 — O que eu faço agora?
6 Capítulo 6
7 Capítulo 7 – O Príncipe, o Servo e os Segredos do Destino
8 Capítulo 8 – O que ele tá fazendo aqui?!
9 capítulo 9 - Do inferno ao Labirinto
10 Capítulo Especial – Antes do Chá
11 Capítulo 11 — Uma Entrada Silenciosa
12 capítulo 12
13 Capítulo 13 — De volta ao Pavilhão Violeta
14 Capítulo 14 – Flores no Pavilhão Violeta
15 Capítulo 15 Tempestade Violenta
16 Capítulo 16 — Ansiedade com Nome e Cabelos Escuros
17 Capítulo 17 – Abaixo da Cidade
18 Capítulo 18 — Entre fumaças e verdades
19 Capítulo 19
20 Capítulo 20 – Entre Sangue e Escolhas
21 Capítulo 21 – Nome e Sangue
22 Capítulo 22 – Sob o Céu da Manhã
23 Capítulo 23 – Sob o Céu da Manhã part2
24 Capítulo 24 - Segundas intenções alteza?
25 Capítulo 25 – Entre Espadas e Suspiros
26 Capítulo 26 – Fios de Sangue e Ciúmes Maternos
27 Capítulo 27 – Vozes de Seda e Veneno
28 Capítulo 28 – Tempestades Internas
29 Capítulo 29 – Chamado Materno
30 capítulo 30
31 Capítulo 31 – Febre e Verdades Suaves
32 Ainda Capítulo 32 – Passos na Madrugada
33 Capítulo 33 – O Fantasma no Corredor
34 Capítulo 34 – Jogada de Mestre
35 ESPECIAL
36 Capítulo 36 – Consequências e Sorrisos Idiotas
37 Capítulo 37 – Adeus com Gosto de Alívio (Ou Não)
38 Capítulo 38 – As Portas da Montanha
39 Capítulo 39 – Até Comer Tem Manual?
40 Capítulo 40 – Nova Amiga, Nova Vida (Ou Nova Prisão?)
41 Capítulo 41 – A Prova Final (Literalmente)
42 Capítulo 42 – Jantar de Cobras
43 Ainda Capítulo 43 – Três Problemas em Hanfu
44 capítulo 44 - Hua e Lan?
45 capitulo 25 - Esse vai ser meio extenso
Capítulos

Atualizado até capítulo 45

1
Capítulo 1 – Hua
2
Capítulo 2 – A Promessa de Ir Embora
3
Capítulo 3 – Setor Violeta
4
Capítulo 4 – O Olhar que Reconhece
5
Capítulo 5 — O que eu faço agora?
6
Capítulo 6
7
Capítulo 7 – O Príncipe, o Servo e os Segredos do Destino
8
Capítulo 8 – O que ele tá fazendo aqui?!
9
capítulo 9 - Do inferno ao Labirinto
10
Capítulo Especial – Antes do Chá
11
Capítulo 11 — Uma Entrada Silenciosa
12
capítulo 12
13
Capítulo 13 — De volta ao Pavilhão Violeta
14
Capítulo 14 – Flores no Pavilhão Violeta
15
Capítulo 15 Tempestade Violenta
16
Capítulo 16 — Ansiedade com Nome e Cabelos Escuros
17
Capítulo 17 – Abaixo da Cidade
18
Capítulo 18 — Entre fumaças e verdades
19
Capítulo 19
20
Capítulo 20 – Entre Sangue e Escolhas
21
Capítulo 21 – Nome e Sangue
22
Capítulo 22 – Sob o Céu da Manhã
23
Capítulo 23 – Sob o Céu da Manhã part2
24
Capítulo 24 - Segundas intenções alteza?
25
Capítulo 25 – Entre Espadas e Suspiros
26
Capítulo 26 – Fios de Sangue e Ciúmes Maternos
27
Capítulo 27 – Vozes de Seda e Veneno
28
Capítulo 28 – Tempestades Internas
29
Capítulo 29 – Chamado Materno
30
capítulo 30
31
Capítulo 31 – Febre e Verdades Suaves
32
Ainda Capítulo 32 – Passos na Madrugada
33
Capítulo 33 – O Fantasma no Corredor
34
Capítulo 34 – Jogada de Mestre
35
ESPECIAL
36
Capítulo 36 – Consequências e Sorrisos Idiotas
37
Capítulo 37 – Adeus com Gosto de Alívio (Ou Não)
38
Capítulo 38 – As Portas da Montanha
39
Capítulo 39 – Até Comer Tem Manual?
40
Capítulo 40 – Nova Amiga, Nova Vida (Ou Nova Prisão?)
41
Capítulo 41 – A Prova Final (Literalmente)
42
Capítulo 42 – Jantar de Cobras
43
Ainda Capítulo 43 – Três Problemas em Hanfu
44
capítulo 44 - Hua e Lan?
45
capitulo 25 - Esse vai ser meio extenso

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