Cena: Escritório de Reuniões – Casa Mancini, Nápoles
A sala era escura, ampla, com paredes de pedra e cheiro de couro e fumaça. Ao centro, uma mesa de mogno polido refletia a luz baixa dos lustres antigos. Domenico Mancini estava sentado à cabeceira, o olhar fixo em dois capos que discutiam rotas e dinheiro com o nervosismo de quem sabe que um erro custa a vida.
E então a porta se abriu com um estalo leve, fora de hora.
— Domenico! — Chiara De Luca entrou como se fosse dona do lugar. Sorridente, saltitante, com um vestido justo demais para o ambiente, carregando nas mãos um folheto dourado do baile anual da máfia.
A sala congelou. Os capos baixaram os olhos. Um deles tossiu. Domenico ergueu os olhos devagar, e o silêncio virou gelo.
— Por que você está aqui? — A voz dele saiu baixa, grave. Contida. Fria.
— Amore... — ela se aproximou, ignorando o clima. — Eu sei que você está ocupado com esses assuntos de homem, mas é sobre o baile! Eu já escolhi meu vestido. Vermelho. A imprensa da máfia vai surtar com a gente juntos. Finalmente vão me ver ao seu lado como deve ser...
Domenico respirou fundo. As mãos sobre a mesa se fecharam. A caveira tatuada em seu pescoço parecia ganhar vida com o pulsar da veia.
— Chiara. — Ele se levantou. Alto, imponente, sombra sobre todos. — Você entrou sem ser chamada, interrompeu uma reunião de segurança, e está falando como se este lugar fosse uma vitrine de loja. Quer ser vista? Vá ao espelho. Lá talvez alguém te admire.
Ela recuou meio passo, o rosto corando.
— Você vai se arrepender de me tratar assim! — gritou, a voz tremendo. — Sou sua futura esposa! É assim que trata a mulher que vai dividir o trono com você?
— Eu não divido nada, Chiara. — Ele não gritou. Mas cada palavra veio como uma lâmina. — E o que você é ou não é... ainda está em aberto.
Chiara saiu batendo o salto, os olhos úmidos, resmungando ameaças infantis entre soluços contidos.
Domenico voltou à cadeira. Os capos não ousaram comentar.
Poucos minutos depois, o secretário entrou com uma pasta e um olhar profissional.
— Don Mancini. Confirmação final do evento. O Baile será no Palazzo Nuccio. Todos os nomes de sempre. Mas este ano... um destaque novo.
— Diga logo. — Ele serviu-se de uísque, sem emoção.
— A viúva. Isadora Bellini Vitale. Ela confirmou presença.
Domenico parou. Olhou por um instante para o copo.
— Essa ainda está viva? — murmurou. — Achei que tinha virado lenda ou cadáver.
— Viva. E, dizem, mais bonita do que nunca. Mas ninguém sabe ao certo. Ela se isolou por cinco anos.
Domenico deu um leve sorriso irônico, gelado.
— Vai aparecer pra chamar atenção. Viúva rica e carente. Acha que o mundo ainda gira ao redor dela.
Deu um gole no uísque.
— Vamos ver no que essa encenação dá.
Villa Bellini – Quarto Principal, Final de Tarde
O quarto era amplo, clássico, com cortinas pesadas, móveis antigos e cheiro de lavanda e história. Espelhos dourados, vestidos pendurados em cabides de veludo, caixas de joias abertas sobre a cama.
Isadora estava diante do espelho, de braços cruzados, um robe de seda preta caindo sobre os ombros como um manto. O olhar entre irritado e resignado. A luz do entardecer batia nos olhos verde-azulados, revelando o cansaço de quem não queria mais se mostrar ao mundo — mas tinha sido forçada a voltar.
— Ridículo. Isso tudo é ridículo, — murmurou, franzindo o cenho. — Cinco anos sumida e agora esperam que eu apareça como se nada tivesse acontecido. Como se eu fosse... entretenimento.
— Você é muito mais do que isso, menina, — respondeu Grazia, a governanta. Baixinha, firme, cabelos grisalhos presos num coque. Ela a acompanhava desde a infância. — Você é uma Bellini. Uma Vitale. E ninguém esquece uma mulher como você.
— Pois eu bem que tentei. — Isadora bufou, puxando um vestido do cabide. — Olha isso. Seda francesa. Trinta mil euros pra que meia dúzia de homens engravatados tentem adivinhar o que tem por baixo. Patético.
— Ainda assim, vai usar. — Grazia colocou as mãos na cintura. — Vai erguer esse queixo e lembrar quem você é. Aqueles salões foram construídos por sangue da sua família. Você não está pedindo permissão pra entrar. Está tomando seu lugar de volta.
Isadora riu, sem humor.
— Não quero lugar nenhum, Grazia. Só quero que me deixem em paz. Não quero olhares, nem sorrisos falsos, nem perguntas sobre o Luca. Sabe o que vai acontecer? Vão cochichar. "A viúva voltou". "Ela está acabada". "Deve estar desesperada".
Grazia se aproximou, segurou o rosto da moça com carinho.
— Eles que cochichem. Deixe que falem. Mas quando te virem atravessar aquele salão, com essa postura, com esse olhar... vão se lembrar porque você era temida mesmo sem levantar um dedo.
Isadora fechou os olhos por um momento, respirou fundo, depois abriu a gaveta e pegou um par de brincos de safira.
— Se eu for, vou brilhar. Mas que fique claro: isso não muda nada. Não vou voltar pra esse jogo. É só uma aparição. Nada mais.
Grazia sorriu de lado.
— Veremos, bambina. Veremos.
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Atualizado até capítulo 45
Comments
Renata
a Grazi tá certa ela tem que chegar brilhando e poderosa
2025-06-09
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