Jade acordou com batidas fortes na porta. O sol mal tinha nascido, mas a favela não dormia — e os boatos também não.
— Tem um homem aí fora... tá de moto, com flor na mão — disse dona Cida, franzindo a testa como quem esperava um demônio à espreita.
Jade hesitou.
Vestiu uma camiseta larga e desceu as escadas de chinelo, sentindo o coração martelar no peito. E lá estava ele. Nero. O mesmo olhar sério, os braços cruzados, e um buquê de flores vermelhas que parecia fora de lugar naquele cenário cinza.
— Pra você. — A voz dele soava baixa, mas firme. — Aceita ou vou ter que invadir tua casa?
Ela engoliu seco. Pegou as flores, com dedos trêmulos. Queria dizer "não", mas disse "obrigada". E quando voltou pra dentro, viu dona Cida a encarar como se tivesse cometido um pecado.
— Esse homem não é de Deus, Jade.
Mas Nero não queria a bênção divina. Queria a dela. E não descansaria até ter.
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Na semana seguinte, ele passou a aparecer com frequência. Às vezes trazia comida, outras vezes só ficava parado, fumando e observando. As pessoas notavam. Cochichavam. Riam pelas costas.
E Jade começou a ouvir os apelidos.
— A mascote do chefe.
— A feiosa metida a primeira-dama.
— Ele só tá com pena.
Mas ela não ligava... ou tentava não ligar. Pela primeira vez na vida, alguém a fazia sentir que existia, que não era invisível.
Palavras que colavam feito tatuagem na alma.
Só que o que começou com doçura logo virou espinho.
Numa tarde quente, Jade decidiu sair. Vestiu um vestido simples mas que marcava levemente a cintura. Deixou os cabelos soltos, coisa rara. Precisava ir ao mercadinho e, no fundo, queria testar se os olhos de Nero a seguiriam. Queria sentir que era desejada.
No caminho, cruzou com Vinícius, amigo de infância, um dos poucos que nunca zombou dela.
— E aí, Jade. Tá diferente hoje. Ficou bonita — ele sorriu, sincero.
Ela riu. Riu de verdade, como não fazia há tempos. Conversaram por alguns minutos. Nostalgia boa. Mas estavam sendo
observados.
No mesmo dia, Nero apareceu na porta dela com os olhos em chamas.
— Tá rindo de quê com aquele otário? — perguntou, se aproximando rápido demais. — Tá achando que é quem agora, Jade?
— Ele e meu amigo, Nero. Agente cresceu junto!
Ele agarrou o braço dela com força. — Você é minha. Não esquece disso. Se eu te ver sorrindo pra outro, o morro vai ver sangue.
E pela primeira vez, Jade sentiu medo. Não do tráfico. Mas do homem que dizia que gostava dela.
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Naquela noite, chorou em silêncio no quarto, abraçada ao travesseiro. Estava confusa. Uma parte dela queria fugir. A outra... não sabia como. Ninguém nunca a queria antes. Ninguém nunca brigará por ela.
Mas será que isso era amor?
Ou só mais uma prisão disfarçada de flores?
O que Jade ainda não sabia... é que tudo aquilo era só o começo. E que o verdadeiro teste da sua força viria quando a traição batesse à porta — vinda de onde menos se espera.
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Atualizado até capítulo 81
Comments
Tsukasa湯崎
Estou tão triste que terminei de ler, quero mais desta autora!
2025-06-02
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