Mas graças ao bom Deus, o tempo foi passando e os dois acabaram se acalmando.
Víctor, ainda sentado ali, com a cabeça enfiada entre as mãos, do lado do carro da Maya, respirou fundo, tirou o capacete devagar, meio sem jeito, e soltou:
— Olha, moça… me desculpa, tá? Por tudo isso aí… eu juro que não queria que você ficasse assim, desse jeito…
Ele deu uma risada fraca, meio sem graça, e ficou encarando o chão, procurando palavras, mas a cabeça parecia uma confusão só.
— É que… quando eu fico com raiva… me dá um troço aqui — ele levou a mão à cabeça, fechou os olhos, como se lembrasse de alguma coisa —... um negócio que nem eu consigo explicar direito. Parece que trava tudo, sabe? Só vem aquele impulso de fazer besteira…
Ele fez uma pausa, respirou fundo de novo e, do nada, veio aquele flash, aquela lembrança que ele sempre tentava enterrar, mas nunca conseguia. Seu passado angustiante.
Veio a imagem do pai, Alberto.
Aquele homem… machista, egocêntrico, totalmente controlador, dono de tudo, achando que podia mandar em todo mundo. Empresário rico, daqueles que só sabem falar grosso e impor. Aquele tipo de cidadão que acha que o mundo gira em torno de si.
E do outro lado… a mãe dele, Dalilla. Tão diferente… tão doce, tão sonhadora, acreditando nessas coisas de conto de fadas, e de doramas achando que o príncipe encantado ou seu oppa ia aparecer e fazer ela feliz. Mal sabia ela…
Víctor suspirou, e sem perceber, falou meio baixo, mais pra ele mesmo do que pra Maya:
— Sabe… se tem uma coisa que aquele traste me ensinou… é que, apesar de tudo, um homem nunca… nunca deve levantar a mão pra uma mulher.
Ele levantou o olhar pra Maya, com os olhos meio vermelhos, meio cansados:
— Eu decorei isso. Tá gravado em mim. Eu juro… eu nunca seria capaz…
Ficou em silêncio. Nem conseguiu terminar.
Ele fez uma pausa, respirou fundo de novo e, do nada, veio aquele flash, aquela lembrança que ele sempre tentava enterrar, mas nunca conseguia.
Quando Dalilla conheceu Alberto… , pronto, foi amor à primeira vista. Pelo menos… da parte dela, né?
Dalilla, com aquele jeitinho tão doce, o olhar cheio de brilho e esperança… ficou completamente hipnotizada. Se perdia nos olhos dele, terrivelmente azuis, tão intensos que pareciam prometer o mundo inteiro. Ela sentia o coração acelerar, as mãos suarem… parecia cena de conto de fadas.
Mas Alberto… ah, Alberto… assim que viu aquela moça, nem pensou duas vezes. O olhar dele, meio estreito, meio demorado… não se prendeu nos olhos dela, não. Desceu direto, sem pudor, traçando cada curva do corpo dela com aquela malícia descarada.
Enquanto Dalilla se encantava, sonhando com o amor da vida dela, Alberto só conseguia pensar no quanto queria aquela mulher, ali, agora, do jeito mais intenso possível…
Para ele, era só isso: uma noite, um corpo, um prazer. E depois? Depois que se dane… quem liga?
Dalilla não era como as outras mulheres que Alberto encontrava por aí, fáceis, submissas, sem resistência. Com ela, o negócio era na rédea. Era uma mulher humilde, de poucos recursos, mas cheia de princípios. E, por ser romântica e delicada, acreditava que o amor tinha um percurso certo: primeiro conhecer, depois namorar, então noivar… só então casar. Não era como diziam por aí: "ou fica ou muda, ou se acaba".
Ela sonhava com um casamento abençoado pelos pais, sendo conduzida até o altar pelo irmão mais velho, cercada pelos familiares, todos torcendo pela sua felicidade. Imaginava aquele vestido branco simples, mas bonito, as flores colhidas do quintal, a praça da igreja enfeitada… enfim, todo aquele lance sonhador, típico das garotas do interior. Ela sempre sonhou com isso e parece que estava mais perto desse sonho virar realidade.
Mas a realidade foi bem diferente.
Depois de muitas idas e vindas, conversas intermináveis, promessas quebradas e até algumas brigas, Alberto se rendeu aos encantos singelos da moça. Ele dizia:
— "Você é diferente, Dalilla… nunca conheci ninguém como você. Você é a mulher da minha vida a quem quero passar todos os dias da minha vida até meu último respiro.
E ela acreditava, com o coração acelerado e as mãos suadas, que aquilo era amor.
Então, mesmo com a reprovação dos pais dele, dos amigos e conhecidos — todos achando absurdo ele se envolver com “uma pobrezinha” Uma mera atendente de mercado que usava todo seu salário com os gastos da Universidade e com seus pais. — Alberto pediu a mão dela em casamento.
Dalila hesitou. Sabia que os pais não aprovavam, que estavam magoados, mas… aquele era seu momento de ser feliz. Rebelou-se pela primeira vez: a menina obediente que seguiu sempre as regras decidiu seguir o que julgava ser amor. Ela acreditava que os pais estavam enganados que eles não conheciam Alberto como ela conhecia.
Casaram-se, contra todas as expectativas.
Por sorte… ou azar… os primeiros meses foram de pura paixão. Alberto, por um breve tempo, foi o homem que toda mulher gostaria de ter. Chegava em casa com flores todo bobo.
— "Lembrei de você quando vi essas margaridas."
Acordava Dalila com beijos, preparava café, fazia questão de andar de mãos dadas na praça aos domingos. À noite, ele abraçava-a apertado, sussurrando:
— "Você é minha… só minha."
E ela sorria, acreditando que havia encontrado seu príncipe, seu protetor, com quem iria construir uma vida, realizar o sonho de terminar a faculdade de enfermagem, ter filhos,
envelhecer.
Mas, aos poucos, a máscara caiu.
O homem carinhoso deu lugar ao controlador.
— "Não precisa mais estudar… pra quê? Agora você é minha mulher. O que eu posso te dar nunca que esse diplomasinho poderia lhe proporcionar.
Proibia que ela visitasse os próprios pais. Se ela insistia:
— "Eles não gostam de mim… não preciso deles na sua vida! Como é que você continua gostando de umas simples pessoas que não gosta do seu marido".
Dalilla, confusa, começava a se calar. Queria agradá-lo, evitar discussões… Afinal, casamento não era sobre sacrifício?
Mas não parou por aí. Vieram as agressões. Primeiro, verbais:
— "Você não serve pra nada!"
— "Se eu quisesse, tinha qualquer uma… mas escolhi você. Meu Deus quão burro eu fui, chegar da nojo de mim mesmo"
Depois de todos os tipos de agressões imagináveis: ele a isolava, dizia que ninguém gostava dela, que só ele a amava de verdade.
Alberto achava que, por terem se casado, ela era sua propriedade. Abusava de Dalilla sempre que queria, do jeito que queria. Ela chorava em silêncio, olhando para o teto do quarto, pedindo a Deus que aquilo acabasse logo.
Até que, depois de muitos abusos, Dalilla engravidou.
Quando descobriu a gestação, chorou. Não sabia se de medo, de dor, ou de esperança. Acariciava a barriga ainda pequena, tentando convencer a si mesma:
— "Com um filho, talvez ele mude… talvez ele volte a ser aquele homem… aquele… que me dava flores… Afinal criança é bênção"
Mas não.
Alberto, ao saber da gravidez, riu:
— "Esse filho nem deve ser meu! Tá me achando otário? E outra eu não quero tranzar com uma mulher com uma barriga imensa. Trate de tirar essa coisa daí de dentro o mais rápido possível, se não eu mesmo tiro".
E passou a agredi-la ainda mais. Mesmo grávida, a espancava sem piedade. Dalilla, frágil, muitas vezes ficava de cama, sem forças nem para levantar.
Mas continuava amando aquele homem… ou pelo menos a ideia dele, o que ele foi, ou o que ela acreditava que ele poderia voltar a ser.
Sua gravidez, marcada pelo sofrimento, comprometeu a saúde do bebê. Victor nasceu com um problema muscular e precisou ser internado logo após o parto.
Dalilla passava horas ao lado da incubadora, segurando a pequena mão do filho, pedindo desculpas:
— "Me perdoa, meu amor… eu falhei com você… Eu só tinha uma missão ,que era cuidar ainda mais de voçe quando estava dentro de mim"
Não conseguia amamentá-lo: não produzia leite suficiente. Isso a fazia se culpar ainda mais, sentir-se ainda menos mulher, menos mãe.
Enquanto enfrentava essa barra sozinha, Até porque seu marido impedia qualquer mínimo contato dela com a família. Alberto também simplesmente… não estava. Não aparecia, não ajudava, não perguntava. Simplesmente ignorava a situação como se nada tivesse acontecido.Dalilla era uma mulher humilde, que acreditava nos princípios do casamento. Sonhava com aquele casamento perfeito, com a bênção dos pais, a caminhada até o altar conduzida pelo irmão…
Mas eles não aceitavam sua escolha. Não aceitavam Alberto.
E aquela menina doce, que sempre obedeceu aos pais, que sempre fez tudo certinho… achou que, pela primeira vez, valia a pena se rebelar e dar uma chance ao amor.
Mal sabia ela que o amor, às vezes, é só um nome bonito que as pessoas dão para o seu próprio sofrimento.
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Atualizado até capítulo 40
Comments
Vó Ném
Quanto sacrifício por um homem que não lhe dá valor !!
2025-06-05
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