A sala de jantar estava impecável.
Velas altas em castiçais dourados iluminavam a mesa longa, coberta por uma toalha de linho branco e taças de cristal perfeitamente alinhadas. Os convidados falavam entre si com sorrisos polidos e risadas contidas, como manda o protocolo da elite. Mas tudo parecia longe. Frio.
Riccardo estava ao meu lado, sua mão repousando sobre a minha coxa por baixo da mesa. Um gesto íntimo que antes me causava segurança, agora me trazia inquietação. Suas palavras doces ainda ecoavam na minha mente, mas não consegui esquecer o olhar de Mateo no jardim.
Ele entrou alguns minutos depois. E, com ele, o ar pareceu mudar.
Mateo usava uma camiseta preta, revelando parte das tatuagens que se espalhavam por sua pele como histórias não contadas. Os cabelos castanhos estavam levemente bagunçados, e seus olhos… ah, aqueles olhos castanhos encontraram os meus assim que cruzou a porta.
Eu desviei.
Não podia encará-lo com Riccardo tão perto.
— Então, Mateo — disse meu pai, puxando conversa no meio do jantar —, como é voltar para casa depois de tanto tempo?
Mateo ergueu a taça de vinho, girando o líquido com um sorrisinho torto.
Mateo-Interessante. As coisas mudam… mas os fantasmas continuam os mesmos.
Alguns riram. Outros trocaram olhares desconfortáveis.
Riccardo-Sempre tão dramático — murmurou Riccardo, ao meu lado, apertando minha perna com mais força.
Riccardo-Meu irmão tem esse talento de transformar uma simples refeição em cena de teatro.
Mateo-Talvez porque a vida aqui seja mais encenada do que verdadeira — retrucou Mateo, o tom leve, mas afiado. — Algumas pessoas sabem exatamente o que estão fazendo. Outras… apenas decoram seus papéis.
Havia algo naquela resposta que me fez prender a respiração.
Mateo estava se referindo a alguém. A nós?
— E você, Aurora? — indagou uma das convidadas, tentando quebrar o clima. — Está animada para o casamento? Está deslumbrante esta noite.
Aurora-Obrigada… estou — respondi com um sorriso forçado.
Aurora-É um momento importante.
Riccardo-Para todos nós — completou Riccardo, erguendo sua taça. — Um brinde à nova união entre as famílias Bellini e Valente.
Todos brindaram. Eu também. Mas meu coração… não acompanhou.
Mateo não ergueu a taça. Ele apenas me olhou. Sem sorrir.Como se enxergasse além do véu que eu tentava manter.
E pela primeira vez, me perguntei se alguém ali realmente estava brindando por mim… ou só pelo que eu representava.
Depois do jantar, a casa foi se esvaziando aos poucos. Os convidados partiram um a um, e o silêncio finalmente caiu sobre os corredores de mármore. Estávamos apenas nós.
Eu e Riccardo.
Ele me levou até a sala menor, ao lado da biblioteca, um ambiente mais reservado, com iluminação suave e aroma de madeira antiga. Me serviu uma taça de vinho e se sentou ao meu lado no sofá, uma das mãos deslizando pela minha cintura com a naturalidade de quem se sente dono.
Riccardo-Está linda esta noite, minha noiva — ele disse em voz baixa, roçando os lábios no meu pescoço. — Cada vez mais minha.
Sorri, mesmo que meu coração não respondesse da mesma forma. Tentei aproveitar o momento. Fingir que estávamos bem. Que aquilo era amor.
Foi então que a porta se abriu com força.
Bianca-Ai, me desculpem! — disse uma voz melosa, carregada de falsa surpresa.
Bianca.
Ela estava com um robe de seda branco… curto demais para qualquer desculpa aceitável. Os cabelos soltos.. E o robe, propositalmente entreaberto, revelava a renda preta por baixo. Era indecente. Quase cínico.
Bianca-Não sabia que vocês estavam aqui — disse ela, os olhos colados em Riccardo, ignorando minha presença por completo.
Bianca-Mas que bom… Ric, será que você pode me ajudar? A torneira do meu banheiro está vazando, e eu simplesmente não sei o que fazer. Está fazendo um barulho horrível.
“Ric.”
Ela só o chamava assim quando queria provocação.
Aurora-Bianca — murmurei, tentando manter o tom educado.
Aurora-Pode pedir para um funcionário verificar, ou ..
Bianca-Eu pedi, mas nenhum apareceu ainda. E sabe como é… — ela mordeu o lábio inferior, os olhos cravados no meu noivo.
Bianca-Riccardo sempre foi bom com as mãos.
O silêncio pesou como chumbo na sala. Eu encarei Riccardo, esperando que ele dissesse algo, qualquer coisa. Que recusasse. Que ficasse.
Mas ele se levantou.
Riccardo-Só vou dar uma olhada, não demoro — disse, como se aquilo fosse normal.
Aurora-Riccardo… — chamei, sem acreditar. Ele já estava passando por mim.
E antes que pudesse reagir… outra presença entrou na sala.
Mateo.
Parou na porta, o olhar se estreitando ao ver a cena. Observou o robe indecente de Bianca, o rosto pálido de surpresa ou fingimento e depois Riccardo, prestes a segui-la escada acima.
Mateo-Sério isso? — Mateo disse, a voz baixa, firme.
Mateo-Você vai mesmo deixar a sua noiva pra seguir a irmã dela com um robe transparente?
Riccardo parou, mas não se virou.
Riccardo-É só um problema com a torneira, Mateo. Não comece.
Mateo-O problema é outro, Riccardo. E você sabe.
O olhar que Mateo lançou ao irmão me fez estremecer. Era brutal. Cheio de fúria contida. Como se já estivesse pronto para derrubá-lo mas se contivesse por minha causa.
Riccardo riu sem humor.
Riccardo-Cuida da sua vida, irmão.
Mateo-Quando envolve ela — Mateo apontou para mim com o queixo —, passa a ser minha também.
Riccardo apertou os punhos e saiu, subindo com Bianca logo atrás. Ela me lançou um sorrisinho de canto, satisfeito. Como se tivesse vencido alguma batalha que eu nem sabia que estava acontecendo.
Fiquei ali. Sozinha. Humilhada. Confusa.
Mateo se aproximou, devagar. Me encarou com olhos sombrios, mas cheios de algo que me faltava: verdade.
Mateo-Você ainda acha que está apaixonada por ele?
Não respondi. Porque naquele momento, algo dentro de mim… começou a ruir.
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Atualizado até capítulo 52
Comments
Vanildo Campos
😢😢😢👍
2025-06-01
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