Clara estava concentrada em sua tela quando ouviu o som grave de uma risada no corredor.
Ele.
Só podia ser ele.
Desde que Caio Moretti pisou no escritório naquela manhã, o ambiente parecia mais… barulhento. Mais intenso. Como se a presença dele ocupasse um espaço que deveria ser neutro — mas nunca era, quando ele estava por perto.
Ela girou a cadeira de leve, apenas o suficiente para vê-lo passando pela porta de vidro da sala comum, falando com um dos sócios. O terno bem cortado realçava o porte mais largo, o andar confiante, o sorriso de canto de quem sabia exatamente o efeito que causava — e se aproveitava disso.
Clara apertou os olhos.
Arrogante até no jeito de respirar.
— Olhando tanto assim, vai acabar pagando aluguel pra esse traseiro, Monteiro — disse uma voz masculina, atrás dela. Era André, um colega de equipe, rindo baixinho.
Ela sorriu sem graça e balançou a cabeça.
— Por favor. Prefiro pagar aluguel em Marte. Ele só é bonito até abrir a boca.
— Então quer dizer que você acha ele bonito?
— André.
— Tá, tá. Já entendi.
Ela voltou a encarar a tela, mas a imagem dele insistia em voltar. O cabelo mais curto, os ombros largos, o perfume amadeirado que ela reconheceu de longe. O tempo não tinha sido cruel com Caio Moretti — infelizmente.
Ele tinha se tornado exatamente o tipo de homem que ela odiava achar atraente.
Caio cruzava o corredor com um café na mão e a certeza de que ela o estava observando.
Clara Monteiro.
Nevasca.
Ou, agora, a mulher de saia lápis preta e camisa branca impecável, com os cabelos presos em um coque que parecia feito sob medida para provocar.
Ela estava ainda mais afiada do que ele lembrava. A mesma postura ereta, os olhos que cortavam como bisturi, e aquela boca… aquela boca que sempre lançava palavras como lâminas — mas agora ele reparava o formato. Cheia. Precisa. Provocante.
E isso o irritava. Porque Clara sempre fora o espinho sob sua pele, mas agora parecia estar envenenado com algo que se aproximava perigosamente do desejo.
Merda.
— Moretti, posso te apresentar à equipe de contratos? — chamou um dos gestores, e Caio apenas assentiu, tomando outro gole do café.
Ao passar pela sala de Clara, ele fez questão de parar e encostar no batente da porta.
— Estão aceitando estágios na sua equipe, Nevasca? Ou é preciso passar por algum ritual de congelamento antes?
Clara nem ergueu os olhos.
— Para você, só se vier com selo de contenção de ego. E mesmo assim, teria que passar no teste psicológico. Que, aliás, você sempre reprovou.
— Ai. Estou sentindo o gelo daqui. — Ele deu dois passos para dentro. — Mas sabe o que é engraçado? Mesmo com toda essa frieza, você ainda fica corada quando me vê. Sinal de febre ou… frustração?
Ela se virou, calma, mas os olhos já estavam em chamas.
— A única coisa que me causa febre nesse lugar é a quantidade de perfume barato misturado com testosterona inflada. E, pasme, você está contribuindo com ambos.
Caio riu. E como sempre, não cedeu.
— Ainda afiada, Monteiro. Mas estou curioso… é só comigo ou todos os homens te deixam tão... defensiva?
Ela se levantou, cruzou a sala com passos elegantes e parou a poucos centímetros dele.
— Só os que tentam disfarçar insegurança com ironia. No seu caso, é quase comovente.
— Você adorava me provocar na escola — ele disse, com um olhar demorado que percorreu o rosto dela até o pescoço. — Agora parece ainda mais empenhada.
Ela respondeu com um sorriso suave, carregado de veneno doce:
— A diferença é que hoje eu posso processar você por assédio, Moretti.
Ele levantou as mãos, rendido — mas os olhos não a largavam.
— A senhorita Monteiro está certa. Peço desculpas... por perceber a presença mais intensa do escritório.
Clara voltou à sua mesa sem dizer nada, apenas o som do salto ecoando.
Mas quando se sentou, o coração estava mais acelerado do que deveria.
E Caio, do outro lado do vidro, demorou dois segundos a mais do que o necessário para desviar o olhar dela.
O dia seguiu com ambos se cruzando nos corredores, copiadoras, elevadores, reuniões rápidas — e todas as vezes havia aquela energia. Clara reparou nos braços dele ao dobrar as mangas da camisa. Caio não conseguia ignorar o modo como o quadril dela se movia mesmo quando estava parada.
Mas nenhum deles admitiria. Jamais.
Eles se odiavam. Era simples. Era prático.
O que acontecia ali era só… calor da batalha.
Pelo menos era isso que repetiam para si mesmos, enquanto a cada novo cruzamento de olhares, o campo de guerra começava a arder.
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Atualizado até capítulo 51
Comments
Marcia Emerich
É, o gelo queima tanto quanto o fogo....
2025-06-07
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