O café ficou pequeno demais. As paredes pareciam apertar, como se não coubessem mais os dois ali, nem aquele silêncio cheio de tudo que não tava sendo dito.
Duarte respirou fundo, puxou a mão que ainda segurava a de Luca, e, num impulso que nem ele sabia de onde veio, falou: — Vem.
Luca arqueou a sobrancelha, o sorriso escapando. — Pra onde?
Duarte levantou, ajeitando o casaco no ombro. — Não sei. Só... vem.
E ele foi. Sem pensar. Sem perguntar. Como se, de alguma forma, já soubesse que, dali em diante, qualquer caminho era melhor do que ficar parado.
Andaram lado a lado. Às vezes, as mãos esbarravam. Às vezes, ficavam tão perto que o ombro de um roçava no do outro. Mas nenhum deles puxou. Nenhum recuou.
Subiram ruas estreitas. Cortaram becos que só quem conhece Lisboa de verdade sabe onde dão. O vento batia leve, carregando o cheiro do rio misturado com pão recém-assado de alguma padaria esquecida no meio da cidade.
— E aí... — Luca quebrou o silêncio, ajeitando a mochila no ombro —... tu sempre sequestra desconhecidos assim?
Duarte soltou uma risada curta, olhando de lado, mordendo o lábio. — Só os que me olham como tu me olhou.
Luca riu, mas corou. Abaixou o olhar, chutando uma pedrinha na calçada. — E... como foi que eu te olhei, exatamente?
Duarte parou. Virou de frente. Olhou. — Como quem... me vê.
O sorriso de Luca sumiu. O peito apertou. O estômago revirou. Porque... ele entendeu. Entendeu bem demais.
Desviou o olhar, enfiou as mãos nos bolsos, respirou fundo. — Isso é... meio assustador, né?
— Muito. — respondeu Duarte, sem hesitar. — Mas... pior ainda é quando ninguém vê.
Ficaram em silêncio por alguns passos. O tipo de silêncio que não pesa. Só... existe.
Chegaram no miradouro. O mesmo onde, de vez em quando, Duarte se perdia pra tentar se encontrar. A vista dali parecia coisa de filme — os telhados vermelhos se empilhando até tocar o Tejo, que brilhava lá embaixo, com o céu tingindo em tons de dourado e azul.
— Uau... — Luca soltou, abaixando a mochila no chão e se sentando no parapeito, as pernas balançando pra fora —... isso é...
— Eu sei. — Duarte sentou ao lado, tão perto que os joelhos se encostavam, que o calor do corpo de um batia no outro —... é daqui que eu fujo... quando quero não sumir.
Luca olhou pra ele. De lado. De verdade. E aquele olhar tinha tanta coisa dentro. Coisa que doía. Coisa que queria. Coisa que tremia de medo... e de vontade.
Por alguns segundos, só ficaram olhando o horizonte. Fingindo que era sobre a paisagem, quando, na verdade... era sobre a coragem que um encontrava no outro, sem saber como.
Até que, num gesto quase automático, Luca encostou a cabeça no ombro de Duarte.
O corpo de Duarte travou. Por dois segundos. Depois... relaxou. E, devagar, passou o braço pelas costas dele, puxando pra mais perto.
Ninguém falou nada. Ninguém precisou.
O som do vento, o cheiro da cidade, o calor do corpo do outro... tudo dizia mais do que qualquer palavra.
Duarte fechou os olhos, encostando o queixo no topo da cabeça de Luca. E, pela primeira vez em muito tempo, pensou:
“Talvez... talvez eu não precise fugir dessa vez.”
E ficou.
E, naquele instante, Lisboa pareceu... menor.
Menor, mais segura. Mais deles.
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Atualizado até capítulo 36
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