Acordar cedo já era um desafio para Miguel. Mas acordar cedo com uma galinha empoleirada na janela do quarto... isso ele jamais imaginou.
O sol mal começava a desenhar as primeiras cores no céu quando um barulho seco, seguido de um cacarejo alto, ecoou bem do lado da cama.
— Aaah! — Miguel, tropeçando no lençol e quase caindo de costas no chão. — O que é isso?!
A galinha, impassível, o encarava com aquele olhar fixo de quem julgava o mundo inteiro.
Na confusão, derrubou o copo de água da noite anterior, chutou uma sandália para debaixo da cama e quase derrubou o abajur improvisado com garrafa de vidro. O quarto, pequeno e com cheiro de madeira antiga, parecia agora um cenário de guerra rural.
Do lado de fora, alguém ria.
— Tá tudo bem aí dentro? — perguntou Ana, com a voz abafada pelo vidro da janela.
Miguel abriu uma cortina de supetão e viu o rosto dela do outro lado, iluminado pela luz suave da manhã. Ela segurava o riso com as duas mãos, mas seus olhos denunciavam a diversão.
— Você deixou isso aqui de propósito?! — ele designado para a galinha, ainda impassível no parapeito.
— Quem, a Rosinha? — Ana fingiu espanto. — Ela gosta de observar. Acho que simpatizou com você.
— Ela quase me matou de susto!
— Considere isso um batismo rural. Agora você é oficialmente hóspede da fazenda.
Ela riu alto, e Miguel, apesar do susto, não conseguiu conter o sorriso. Aquilo tudo era estranho, sim. Mas também era... engraçado. E Ana tinha essa capacidade curiosa de transformar desconforto em leveza.
— Da próxima vez, me avisa que as visitas batem com o bico. — ele disse, sarcástico, pegando uma toalha para ir ao banho.
— Pode deixar. E cuidado com o banho. Se demorar muito, a água esfria. Aqui é aquecido no fogão a lenha.
— Claro que é. — ele murmurou, resignado.
Enquanto dirigia ao banheiro externo, Miguel observava a paisagem: um terreiro com roupas no varal, galinhas ciscando despreocupadas, um cachorro deitado à sombra e um silêncio quebrado apenas pelos filhos naturais do lugar. Tudo era tão... simples. Mas havia algo reconfortante nessa simplicidade. Algo que faz o tempo andar diferente.
Mais tarde, já com o susto passado e de roupa limpa, ele encontrou Ana no canteiro de ervas, ajoelhada na terra, replantando mudas de alecrim. O cheiro fresco invade o ar com força.
—Posso ajudar? — ele disse, se aproximando devagar.
— Sabe plantar?
— Não. Mas sigo as instruções.
— Então pega essa muda aqui. — ela estendeu a planta pra ele — E cava um buraquinho com a mão. Assim, ó.
Ela mostrou, com paciência. Miguel imitou o gesto, meio desajeitado, mas conseguiu.
— Agora aperta a terra em volta, com carinho. A planta sente.
— Sente?
– Claro. Tudo sente. Até quem diz que não sente.
Eles trabalharam em silêncio por alguns minutos, lado a lado. Ana de vez em quando lançou um olhar de canto para Miguel, como se avaliasse se ele era mesmo tão de cidade quanto dizia.
Ele, por sua vez, começou a perceber que havia beleza em pequenos gestos. E que Ana, com seus jeitos simples e firmes, era muito mais do que parecia à primeira vista.
Quando terminaram, Ana se levantou, batendo a terra das mãos.
— Parabéns. Sua primeira muda tá viva.
— Uma vitória rural. Posso comemorar?
— Pode. Mas sem galinhas na festa, por favor.
Eles riram juntos. E pela primeira vez, o riso não veio de um estranhamento.
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Atualizado até capítulo 49
Comments
Laci Assis
kklkkkkkkk
2025-06-08
1