A chuva caía fina naquela noite, quase silenciosa, como um véu que cobria a cidade e diluía seus contornos.
Elena apertou o cachecol ao redor do pescoço, os dedos frios, o corpo trêmulo, mas não sabia se era apenas o frio… ou aquela sensação incômoda que carregava há dias:
como se alguém a seguisse.
Como se alguém soubesse demais.
O rosto dele — aquele homem — surgia involuntariamente em sua mente, entre sonhos e devaneios, sempre envolto numa névoa, a respiração quente tão próxima que chegava a estremecer sua pele mesmo quando sozinha.
Aquele sorriso discreto…
Aquela voz profunda, que ela sentia, e não apenas ouvia.
“Somos vizinhos, Elena…”
A lembrança daquele momento, da chuva, do guarda-chuva compartilhado, da mão dele tão perto da sua, ainda fazia seu estômago revirar — de medo ou desejo, ela não sabia mais distinguir.
Do outro lado da rua, no apartamento escuro, Dante a observava.
De onde estava, conseguia vê-la perfeitamente através da fresta mal fechada da cortina do quarto dela.
O ritual noturno começava, como sempre.
E para ele, era mais do que um espetáculo:
era a confirmação silenciosa de que ela pertencia a ele, mesmo que não soubesse.
Elena se desfez lentamente do sobretudo molhado, revelando a pele clara, ainda marcada pelo frio da rua. A camisola de tecido fino colava-se às curvas, deixando à mostra o ombro nu, a clavícula delicada…
E então ela parou, encarando-se no espelho com aquele olhar melancólico e vulnerável que Dante conhecia tão bem.
Ela não via beleza ali.
Mas ele…
Ele via tudo.
Cada traço, cada detalhe, era perfeição pura, ainda que moldado pelas inseguranças dela.
Dante apertou os dedos contra a madeira da janela, contendo a vontade quase incontrolável de atravessar aquela rua, de arrombar aquela porta, de invadir aquela vida que já considerava sua.
Mas ele sabia:
tudo precisava acontecer no tempo certo.
E ele esperaria.
Como sempre soube fazer.
Elena virou-se de perfil diante do espelho, observando o próprio corpo com olhos críticos, puxando a alça da camisola, soltando-a com desdém, como quem despreza a própria imagem.
Não fazia ideia de que, do outro lado, alguém a via como a coisa mais linda e desejada do mundo.
E era exatamente esse abismo entre o que ela via e o que ele sentia que tornava a obsessão ainda mais intensa, ainda mais inevitável.
Na manhã seguinte, a cafeteria estava mais cheia que o habitual.
Elena servia os clientes automaticamente, tentando ignorar o torvelinho interno que não a deixava em paz.
Foi então que ele entrou.
Dante.
Como sempre, de preto.
Como sempre, sóbrio, impecável, mas com aquele olhar de quem carrega segredos demais.
E, pela primeira vez, Elena percebeu que ele não estava sentado no fundo do salão, como antes.
Ele se aproximou do balcão.
Lenta, pausadamente, com aquele andar controlado, como um predador que reduz a distância até sua presa, não para devorá-la, mas para fazê-la se render, para fazê-la desejar ser devorada.
— Bom dia… — disse ele, a voz baixa, aveludada, como uma carícia.
Elena ergueu os olhos e, por um segundo, esqueceu como se respirava.
— Bom dia… — respondeu, quase num sussurro.
Dante sorriu, inclinando-se levemente sobre o balcão, fazendo questão de diminuir ainda mais o espaço entre eles.
— Um café, como sempre… sem açúcar.
Ela assentiu, tentando manter as mãos firmes enquanto preparava a bebida.
Podia sentir o olhar dele… percorrendo cada movimento, queimando sua pele mesmo sem tocá-la.
Ao entregar a xícara, os dedos se roçaram.
Um choque.
Sutil, elétrico, cortante.
Ela prendeu a respiração, e ele… ele apenas sorriu, como quem sabia exatamente o que estava fazendo.
— Gosto desse lugar… — disse ele, casualmente, mas os olhos diziam outra coisa: “gosto de você.”
Elena sorriu, tímida, insegura, e ele se afastou, indo sentar-se à mesma mesa de sempre, mas agora… ela sabia que ele estava ali por ela.
Do lado de fora, a chuva voltava a cair, fina, silenciosa, envolvendo a cidade numa espécie de transe.
Elena olhou pela janela e, por um instante, sentiu aquela sensação familiar:
não estava sozinha.
Alguém… a observava.
Virou-se bruscamente para trás.
Mas só viu os clientes, o som de xícaras, conversas abafadas.
Nada além disso.
Ou quase nada.
Horas depois, ao sair do expediente, notou que havia algo preso na grade do parapeito da cafeteria, exatamente na altura da porta de saída: uma pequena flor branca, ainda molhada pela chuva.
Franziu a testa, pegou-a entre os dedos delicados, e olhou em volta.
A rua vazia.
Nada.
Mas não percebeu que, na calçada oposta, sob a sombra projetada pelo toldo de um prédio antigo, Dante a observava mais uma vez, silencioso, imóvel, como uma estátua feita de pedra e sombras.
Ele viu quando ela prendeu a flor no bolso do casaco, sem entender de onde viera.
E então, pela primeira vez, ele sorriu… satisfeito.
O jogo estava avançando, lenta e inexoravelmente.
E agora, não importava mais o tempo que levasse.
Ela já começava a sentir.
Não podia mais negar.
Estava sendo observada.
Desejada.
Possuída…
mesmo que ainda não soubesse.
E Dante?
Ele tinha a paciência e a obsessão necessárias para fazer aquela história ir até o fim.
Do jeito dele.
No tempo dele.
No limite dela.
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Atualizado até capítulo 51
Comments
Jaildes Damasceno
Espero que ele ao conquista-la nao seja um psicopata violento. Que a trate com carinho que ela merece
2025-05-27
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