Capítulo 5- Limites e Desejos

Os dias que se seguiram à caminhada noturna com Adrien foram como um sopro morno nas costas de Beca: constantes, inquietantes, presentes. Havia algo em sua nova rotina que a fazia sentir-se viva, como se os tons da cidade tivessem ganhado intensidade. A Torre Eiffel parecia brilhar mais à noite. Os cafés pareciam mais acolhedores. E, no meio de tudo isso, havia ele.

Adrien não forçava proximidade. Não ligava fora do horário. Mas havia mensagens ocasionais, discretas, que surgiam como pequenos convites à lembrança:

“Ouvi Debussy hoje. Pensei em você.”

“Amanhã teremos uma reunião importante. Mas antes disso, quero ouvir sua opinião sobre a campanha.”

Pequenos gestos que misturavam o profissional ao pessoal de forma sutil, porém magnética.

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Na terça-feira, a reunião que ele mencionara aconteceu numa das salas envidraçadas do prédio da Gauthier & Co. Beca estava sentada entre os diretores de marketing, com sua pasta organizada e a mente tentando fingir normalidade. Mas então Adrien entrou. E o mundo pareceu encolher.

Ele estava impecável, como sempre. Terno azul-marinho, cabelo penteado de forma casual, olhar calmo e direto. Quando seus olhos cruzaram os dela, houve aquele segundo de silêncio. Aquela faísca muda que dizia tudo o que nenhum dos dois ousava dizer em público.

Durante a apresentação, Beca mostrou sua proposta final para a campanha de verão. Fotos de jovens nas ruas de Paris, arte urbana misturada à elegância clássica da marca. Coragem, diversidade, movimento. Falou com clareza, mostrando segurança, mesmo com o coração acelerado.

Quando terminou, houve alguns segundos de pausa. Então Adrien disse:

— Excelente trabalho, senhorita Leclair.

Ela apenas assentiu, controlando o sorriso. Por dentro, sentia-se em chamas.

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Após a reunião, ele a chamou discretamente ao seu escritório.

— Fechamos a campanha — disse, oferecendo-lhe um copo d'água. — O cliente adorou. E boa parte disso é mérito seu.

— Obrigada. Mas a equipe toda ajudou.

Ele se aproximou levemente, mantendo a distância respeitosa, mas com a intensidade de sempre nos olhos.

— Você sempre foge do reconhecimento.

— Acho que... prefiro não chamar atenção demais.

— Talvez porque sabe o poder que tem quando chama.

O ar pareceu ficar mais denso. Beca desviou o olhar, mas ele continuou:

— Eu disse que iríamos devagar. E estou tentando. Mas há momentos em que é difícil manter os limites.

Ela levantou os olhos, desafiando-o com a mesma intensidade:

— Quem disse que estou pedindo pra manter?

Por um instante, ele ficou em silêncio. Então se aproximou, sem tocar nela, mas tão perto que ela podia sentir o calor do seu corpo.

— Preciso saber até onde posso ir, Beca.

Ela respirou fundo.

— Pode ir até onde o respeito continuar presente.

Ele sorriu, levemente. Um sorriso que mesclava desejo, admiração e algo mais... perigoso.

— Respeito é algo que você me inspira. Mas confesso que é difícil manter apenas isso, às vezes.

Ela se afastou com delicadeza, o rosto levemente corado.

— Então talvez seja melhor não ficarmos sozinhos por enquanto.

— Justo. Mas não me peça para fingir que não quero você.

Ela sorriu de leve, virando-se para a porta.

— Eu não vou fingir. Mas também não vou me apressar.

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Naquela noite, Beca foi jantar com Camille num bistrô escondido no Marais. Contou sobre a reunião, mas omitiu os detalhes mais íntimos. Mesmo assim, Camille a encarou com olhos semicerrados.

— Tem alguma coisa aí. Eu sei.

— O que te faz pensar isso?

— Você anda diferente. E não é só por causa da campanha. Tem a ver com aquele CEO incrivelmente sexy e misterioso.

Beca riu, desconversando.

— Nada aconteceu.

— Ainda.

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Nos dias seguintes, Adrien respeitou a distância que ela pedira. Mas suas presenças pareciam se atrair como ímãs mesmo quando distantes. Em um evento da marca, no terraço de um hotel de luxo, os dois circularam entre convidados, profissionais e fotógrafos. Mas seus olhos se encontravam a cada dez minutos. E em cada um desses encontros, o mundo parecia desacelerar.

Em um momento, Beca estava próxima à varanda, observando Paris lá de cima. Sentiu sua presença antes mesmo de vê-lo. Adrien parou ao seu lado, sem dizer nada por alguns segundos.

— Você parece feita para esta cidade.

— E você parece feito para o mistério.

— Talvez seja hora de revelarmos menos máscaras.

Ela o olhou, sorrindo com os olhos.

— Algumas máscaras também nos protegem.

— Mas em algum momento, a pele precisa respirar.

Ela desviou o olhar, sentindo a respiração falhar. A cidade brilhava abaixo deles, mas o que ofuscava era o que havia entre os dois.

---

Na manhã seguinte, ele não estava no escritório. Um e-mail informava que estaria ausente por dois dias, resolvendo questões da filial de Londres.

Beca tentou se concentrar, mas sentia a ausência dele como um vazio concreto. Ao sair para almoçar, recebeu uma mensagem:

“Não consegui parar de pensar em você. Isso é normal?”

Ela sorriu, sozinha, no meio da calçada.

“Acho que sim. Ou pelo menos, reconfortante.”

“Não se assuste com o que vou dizer, mas… você é a primeira pessoa, em muito tempo, que me faz querer parar.”

Ela demorou a responder. Parar? Parar o quê?

“Parar o quê, Adrien?”

A resposta não veio de imediato. Mas, horas depois, quando estava voltando para casa, outra mensagem:

“Parar de fingir que não sinto.”

---

A confissão ficou martelando em sua mente o resto da noite. Adrien era um homem com uma reputação irretocável, mas com um passado envolto em especulações. Sabia-se que ele tivera relacionamentos, mas nenhum duradouro. Era conhecido como discreto, fechado, até mesmo frio.

E agora, ele dizia isso a ela?

---

Dois dias depois, ele retornou. E no fim do expediente, a chamou para sua sala com um convite inesperado:

— Amanhã é sábado. Quero te mostrar algo.

— O quê?

— Uma parte de Paris que pouca gente conhece. Um lugar só meu.

Ela hesitou.

— Adrien, não sei se...

— Não é um encontro. É só... um passeio. Sem promessas. Sem pressões.

Ela o olhou por alguns segundos. Depois assentiu.

— Está bem.

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Na manhã de sábado, ele passou para buscá-la de carro. Ela usava jeans escuro e uma blusa de tricô azul-marinho. Nada que chamasse atenção. Mas ele a olhou como se fosse uma pintura.

— Pronta?

— Sempre.

Dirigiram até Montmartre, mas não pararam nas áreas turísticas. Subiram por ruas pequenas, ladeiras escondidas, até chegarem a uma antiga casa de pedra, cercada por heras. Ali, havia um jardim quase secreto, com um piano antigo no centro.

— Este lugar pertenceu a um amigo da minha família. Ele me deixava vir aqui quando eu era criança. É o único lugar onde me sinto... inteiro.

Ela olhou em volta, encantada. A vista de Paris era ampla e silenciosa dali. Era como ver a cidade através de um segredo.

— Posso tocar algo pra você?

— Claro.

Ele sentou-se ao piano e, com delicadeza, começou a tocar Clair de Lune, de Debussy. A melodia suave parecia dissolver todas as tensões do mundo. Beca sentou-se na grama, ouvindo como se cada nota tocasse sua alma.

Quando terminou, ela aplaudiu baixinho.

— Foi lindo.

— Eu toco quando quero lembrar quem sou. Às vezes, me perco em tanta formalidade.

Ela se aproximou, sentando-se ao lado dele no banco do piano.

— Aqui você não precisa de máscaras.

Ele virou-se lentamente. Seus rostos estavam próximos, mas havia uma calma diferente agora. Um silêncio que não pedia urgência, só verdade.

— Beca...

— Sim?

— Eu ainda não sei onde isso vai dar. Mas quero descobrir. Com você.

Ela sorriu, o coração disparando.

— Então vamos devagar. Mas juntos.

Ele tocou a mão dela, entrelaçando os dedos.

— Devagar. Mas sem desistir.

E ali, naquele refúgio escondido de Montmartre, onde apenas a música testemunhava, os dois começaram, finalmente, a cruzar a linha entre desejo e sentimento. Uma linha que, agora, não parecia mais tão proibida.

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Comments

Beerus

Beerus

Me identifiquei demais com a personagem principal, emocionante!

2025-05-24

1

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