Mudanças de planos

Na manhã seguinte, Vinícius chegou cedo ao prédio da Orizon Enterprises. No elevador, repassava mentalmente cada detalhe da reunião que havia convocado com todo o setor de Recursos Humanos. Era a primeira ação pública de seu novo mandato, e ele queria deixar claro: as coisas haviam mudado.

A sala de reuniões do 18º andar estava cheia. Olhares curiosos, alguns desconfiados, outros entediados. Letícia estava sentada ao canto, discreta como sempre, com uma prancheta em mãos. Vestia uma camisa social azul e o cabelo preso em um coque baixo. Apesar da postura serena, seus olhos estavam alertas.

Vinícius entrou e todos se calaram.

— Bom dia a todos. Serei direto: estamos passando por um processo de reestruturação. O setor de Recursos Humanos é uma das áreas mais sensíveis da empresa, e é por isso que estou aqui pessoalmente. A partir de hoje, Letícia Andrade assume como diretora interina do RH, em caráter de experiência. Todas as decisões devem passar por ela até segunda ordem — anunciou, firme.

Murmúrios se espalharam como fumaça.

Mas antes que alguém pudesse reagir, a porta se abriu com força. Verônica entrou com seu salto alto estalando no piso, seguida de um homem alto, de cabelo grisalho, terno alinhado e expressão severa.

Rômulo Fontes.

A presença dele cortou o ar da sala.

— Que história é essa de transferir a Verônica para Curitiba? — perguntou em voz alta, dirigindo-se diretamente ao filho, como se ninguém mais estivesse ali. — Mudanças administrativas são decisões sérias. E Verônica é a filha do meu melhor amigo. Ele morreu, Vinícius. Eu prometi a ele que manteria ela aqui. Essa foi a única condição que impus quando te entreguei essa cadeira.

Vinícius manteve o olhar firme, mas os punhos cerrados ao lado do corpo traíam sua tensão.

— Eu entendo sua promessa, pai. E honro o que fez por seu amigo. Mas estamos falando de administração. De resultados. De irregularidades gravíssimas. Eu ainda fui generoso transferindo Verônica. Poderia tê-la desligado do cargo.

— Pois eu quero ela de volta ao RH. Imediatamente. — Rômulo ordenou, como nos velhos tempos.

Vinícius respirou fundo, lentamente, antes de responder.

— Tudo bem, pai. Eu a recoloco. Mas com as minhas condições.

Rômulo arqueou uma sobrancelha, desconfiado.

— Que condições?

— Ela será mantida no setor, mas terá suas funções restritas. Não poderá alterar salários, nem autorizar promoções ou demissões. Essa atribuição está suspensa. Também já contratei um novo técnico de TI. Qualquer atraso ou falta não justificada chegará diretamente a mim. E, por fim, o salário dela será congelado. Sem aumento. E, por acordo seu, também não haverá redução.

Rômulo assentiu, impaciente.

— O importante é que ela permaneça. Como vai trabalhar, não me importa. Faça o que quiser com o resto.

Ele se virou e saiu da sala.

Verônica, agora de pé, riu com desdém e se dirigiu à porta também. Mas antes lançou um olhar venenoso para Letícia.

— Está dispensada, Verônica. Pode voltar às suas funções. — Vinícius a cortou, seco. — Você não foi convidada para esta reunião.

Sem dizer uma palavra, Verônica saiu.

Letícia abaixou os olhos. Ela sabia o que viria. Sabia que Verônica não perdoava desafetos. Ainda mais uma assistente que ousara revelar o que ela tanto escondera.

Vinícius olhou para ela. Um segundo de silêncio. Então disse:

— Letícia.

Ela ergueu os olhos, surpresa.

— A partir de hoje, você está sendo transferida para a presidência. Será minha assistente direta. A terceira no comando da empresa, depois de mim e do Eduardo.

Um silêncio absoluto tomou conta da sala. Então, começaram os sussurros.

— Assistente da presidência?

— Mas ela é só uma assistente comum...

— Isso é absurdo...

— Com licença — uma voz masculina se ergueu. Um gerente do setor de folha de pagamento, com ar arrogante e blazer escuro. — Senhor Vinícius, entendo sua boa vontade, mas... será mesmo sensato? A senhorita Letícia é uma simples assistente. Existem funcionários mais capacitados para essa função.

Vinícius riu de leve. Um riso seco, carregado de sarcasmo.

— É mesmo? Então me aponte agora um funcionário mais capacitado que Letícia. Um que tenha graduação, duas pós-graduações, e que em menos de um dia tenha desmontado o sistema corrupto que se instalou nesse setor.

Silêncio.

— E mais: não aceito comentários preconceituosos sobre a aparência física de ninguém. Porque ouvi cochichos, e ouvi bem. Imaginem uma "gorda" como assistente da presidência? — Vinícius imitou a voz do comentário em tom de desprezo. — Já chega. Isso é assédio moral. E se mais alguém levantar a voz com insinuações desse tipo, será imediatamente demitido. Sem aviso. Sem justificativa.

Todos silenciaram.

Letícia corava, mas mantinha a postura ereta. Um leve brilho de incredulidade nos olhos.

— Letícia, prepare sua mesa na presidência. E, antes de sair, entregue ao Eduardo o relatório final da auditoria.

Ela assentiu, levantando-se com dignidade, enquanto olhares mistos de raiva, inveja e respeito a seguiam.

Vinícius se voltou para o grupo:

— Se alguém ainda tiver dúvidas sobre minha liderança, pode entregar o crachá na recepção.

Ele saiu, deixando a sala em silêncio absoluto.

Letícia, atrás dele, segurava firme sua prancheta, com o coração disparado e uma nova missão batendo à porta.

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Comments

Marly G Vieira

Marly G Vieira

Ele é um excelente CEO justo e profissional .
parabéns autora ,mais um dia que não me levanto do meu sofá não consigo parar de lê..

2025-06-01

1

Erlete Rodrigues

Erlete Rodrigues

esperando ansiosa os próximos capítulos

2025-05-24

3

Irene Corrêa

Irene Corrêa

égua ele arrasou agora 👏👏👏👏❤️🌹

2025-06-01

0

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