Fim de Ciclo, Início de Tudo

Fim de Ciclo, Início de Tudo

— Acabou. — Bianca disse em voz baixa, olhando o pátio da escola iluminado pelas luzes amareladas. — A gente terminou o ensino médio, Tainá. A gente conseguiu.

Tainá abriu um sorriso largo e abraçou a amiga com força.

— Eu tô tão orgulhosa de você, Bia. Se alguém visse tudo que você passou...

— A gente passou — corrigiu Bianca, emocionada. — Porque cê tava aqui, sempre.

O último dia de aula tinha um gosto agridoce. As carteiras já estavam vazias, os corredores ecoavam os passos dos poucos alunos que ainda circulavam, sem pressa de se despedir. Algumas lágrimas, muitos sorrisos nervosos. O tempo tinha voado. E ali estavam elas, duas jovens mulheres com cicatrizes internas, sonhos pendurados e a sensação de que o mundo finalmente se abria.

No caminho pra casa, Tainá foi dirigindo sua bicicleta velha enquanto Bianca ia ao lado, de mochila nas costas e cabeça cheia.

— E agora? — Tainá perguntou. — Faculdade direto?

— Quero. Mas também quero respirar um pouco. Trabalhar mais horas, juntar grana, fazer um cursinho bom. Entrar com tudo. Quero Direito, Tainá. Quero ver meu nome num processo. Quero ajudar gente que nem a gente. Que sofre calada, que apanha da vida e ninguém vê.

Tainá sorriu com os olhos cheios d’água.

— Vai ser a melhor advogada da cidade. A doutora Bianca.

Bianca riu, tímida. Mas gostou de ouvir. Tinha algo bonito naquilo.

Não era só um diploma. Era uma prova de que ela sobreviveu.

As semanas seguintes foram de ajustes. Ela começou a trabalhar em horário integral na papelaria, agora com mais responsabilidades. O dono confiava nela, e Bianca se mostrava cada vez mais eficiente, madura. Juntava cada centavo com disciplina.

À noite, começou a frequentar um cursinho pré-vestibular gratuito. Era puxado, mas ela se sentia viva ali. Debruçada sobre livros de Direito Constitucional, devorando apostilas de Redação e resumos de Filosofia. Sua mente pulsava.

E mais do que isso: ela se sentia inteira.

Num fim de tarde chuvoso, cansada de tanto estudar em casa, decidiu ir até a biblioteca pública do centro. Precisava de silêncio, foco, e talvez uma inspiração. Pegou um casaco leve, prendeu o cabelo num coque e partiu com sua mochila.

Não sabia que aquele passo pequeno seria o início de algo muito maior.

As portas da biblioteca se abriram com um rangido antigo. O cheiro de papel e madeira encerada invadiu seus sentidos, trazendo uma calma imediata. Escolheu uma mesa perto da janela, ajeitou seus livros e mergulhou num artigo sobre direitos fundamentais.

Estava tão concentrada que não percebeu quando ele entrou.

Ricardo a reconheceu primeiro. Aquela menina da palestra... a que lhe agradeceu com olhos decididos e postura firme. Agora mais madura, dona de si, com um olhar que misturava determinação e doçura.

Ele hesitou por um momento, mas se aproximou com gentileza.

— Eu lembro de você — disse, com um leve sorriso. — A garota da escola que queria cursar Direito.

Bianca ergueu os olhos, surpresa. Por um instante, o coração acelerou — mas não de nervoso. Era uma sensação boa. Familiar.

— Doutor Ricardo... não esperava te ver aqui.

— Eu também não esperava. Mas parece que temos o hábito de nos cruzar em lugares que respiram conhecimento.

Ela sorriu. E dessa vez, sem vergonha.

— Estou estudando pra tentar uma vaga na Federal. Preciso passar.

Ele puxou uma cadeira.

— Se quiser, posso te ajudar com algumas matérias. Tenho alguns materiais, posso te emprestar. E... gosto de conversar com gente que quer mudar o mundo pela justiça.

Bianca o observou com mais atenção. Ele não parecia um homem de 45 anos. Era bonito, sim, mas era mais que isso. Havia firmeza nos gestos, e um jeito respeitoso que faltava em muitos garotos da sua idade. Pela primeira vez, ela não sentiu medo. Sentiu... curiosidade.

— Eu aceito. Mas só se você não pegar leve comigo.

Ricardo riu, e estendeu a mão pra selar aquele novo acordo.

— Jamais.

Ali, no meio de livros e silêncio, nascia algo novo. Não era um amor repentino, nem uma paixão adolescente. Era uma conexão. E como toda boa história, começava com palavras, olhares e um respeito mútuo.

Bianca tinha virado adulta. Tinha se reerguido, sobrevivido ao pior.

E agora, finalmente, o destino começava a lhe sorrir de volta.

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