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Marcas Que Nunca Cicatrizam

O cheiro de terra molhada anunciava a aproximação da chuva, mas o céu ainda segurava as lágrimas. Isadora observava da varanda os campos dourados pelo fim do verão, o vestido leve balançando com o vento. Estava inquieta. Desde aquela noite no lago, algo nela havia mudado — ou talvez só tivesse despertado o que sempre esteve ali.

Vicente.

O nome ecoava como um pecado guardado sob sete chaves.

Ele foi seu primeiro tudo.

Primeiro beijo.

Primeira rebeldia.

Primeiro homem que a viu... realmente viu.

E também o primeiro que a fez sangrar por dentro.

Ela se afastou depois do escândalo do pai, depois que tudo desmoronou. Mas Vicente ficou. Ficou com o fardo, com a terra, com a mágoa.

Com a lembrança do corpo dela sob o dele, jurando amor eterno num estábulo mal iluminado.

Ela sabia que ele a odiava por tê-lo deixado.

Mas também sabia que o desejo dele não havia morrido. Nem o dela.

No final da tarde, decidiu ajudar nos currais. Queria ver Vicente, mesmo sem admitir para si mesma.

Ele estava de costas, camisa branca grudada ao corpo suado, cuidando de um bezerro recém-nascido. Quando se virou e a viu de botas, calça jeans justa e uma camiseta amarrada na cintura, a expressão dele endureceu.

— Você não precisa se meter aqui. Vai acabar sujando as mãos — disse, ríspido.

— E se for isso que eu quero?

Vicente arqueou uma sobrancelha. O olhar dele deslizou pelas curvas dela como uma carícia invisível.

— Cuidado, Isadora. Tem coisa que, quando a gente toca, não dá mais pra largar.

Ela avançou, ousada, parando diante dele. Os olhos verdes dela queimavam.

— E tem coisa que, se a gente não tocar, apodrece dentro da gente.

O silêncio entre eles era feito de respiração pesada e lembranças. Vicente deu um passo à frente, tão próximo que o calor dele invadiu a pele dela.

— Por que voltou?

— Porque a fazenda é minha também.

— Mentira. Você voltou por mim.

A frase caiu entre eles como trovão. Ela estremeceu.

— Você não sabe de nada.

— Sei. Sei que nenhuma noite sua foi inteira depois que você foi embora. Sei que o gosto da minha pele ainda vive na tua boca.

Ele roçou os dedos na cintura dela. Só um toque, mas fez Isadora prender a respiração.

— Vicente...

— Diz que não quer — ele sussurrou. — Só diz.

Ela abriu a boca. Quis negar. Quis jogar palavras duras e cortar o clima como sempre fazia. Mas não havia força pra mentira. E o corpo dela já dizia tudo.

Então ele a beijou.

Sem aviso, sem permissão. Um beijo bruto, de raiva, saudade e desejo. O corpo dela foi contra o dele com força. As mãos de Vicente apertaram sua cintura, colando os dois como peças que nunca deviam ter sido separadas.

Ela gemeu entre os lábios dele. Era como voltar no tempo e ao mesmo tempo descobrir algo novo. O gosto dele... quente, urgente, viciante.

Ele a ergueu pela cintura, a colocando sobre um monte de feno seco. As mãos dele desceram pelas pernas dela, abrindo caminho por dentro da calça apertada.

— Não temos tempo — ela sussurrou, arfando.

— A gente teve sete anos roubados. Eu vou tirar tudo de volta — ele respondeu, com a voz rouca.

O zíper foi aberto. A calcinha puxada de lado. E então ela sentiu a pressão dele contra si, o membro rígido roçando a entrada do seu corpo, a respiração pesada nos ouvidos.

O primeiro impulso foi de recusar. Mas o segundo... o segundo foi de abrir as pernas e se entregar.

Ele a penetrou com força, e ela soltou um gemido que ecoou no estábulo vazio. Era rude, cru, sem amarras. Mas era verdadeiro. Cada estocada era um grito de saudade que o tempo não apagou.

Isadora agarrava os ombros dele, arranhando a pele enquanto o sentia invadir seu corpo e desestabilizar sua alma. As bocas se chocavam entre beijos e mordidas. E quando ela explodiu em prazer, gritando o nome dele, soube que estava perdida de novo.

Vicente gozou logo depois, enterrando o rosto no pescoço dela, mordendo de leve como se quisesse marcar território.

— Isso não vai acontecer de novo — ela sussurrou, ainda tremendo.

Ele levantou a cabeça, os olhos escuros e intensos.

— Vai, sim. Porque você é minha. Sempre foi.

Ela voltou para casa com as pernas bambas e a alma em conflito.

Tomou banho, se vestiu e tentou ignorar a sensação de ser observada. Mas no espelho do corredor, havia um bilhete preso com um alfinete. Escrito à mão, em letras firmes:

“Algumas verdades nunca devem ser desenterradas. — V.”

Mas ela reconheceria aquela letra em qualquer lugar.

Não era de Vicente.

Era do pai.

E ele estava morto.

Ou... não?

Sinais Queimam Mais que Palavras

O bilhete ainda tremia entre os dedos de Isadora. A letra era clara, firme, com traços que ela reconheceria mesmo de olhos fechados — do pai. Mas como aquilo era possível? Ele estava morto. Ela viu o caixão descer à terra. Chorou sobre aquela cova. Sentiu o peso da perda como ferro quente em seu peito.

Mas ali estava a mensagem.

“Algumas verdades nunca devem ser desenterradas.”

A dúvida latejava como uma ferida aberta. E o mais estranho: a assinatura embaixo, um “V” solitário, a fazia estremecer. Vicente? Teria ele encontrado algo do pai e deixado para provocá-la? Para lembrá-la de que o passado não dorme, apenas esperar.

Com o coração disparado, ela saiu para o campo. Precisava respirar. Precisava fugir da pressão daquela casa, daquela cama ainda marcada pela lembrança do corpo de Vicente, das mãos firmes, do prazer selvagem que ainda palpitava entre as coxas.

Foi então que o destino decidiu brincar com ela de novo.

- Está fugindo de alguém ou de si mesma? — a voz de Leandro veio suave, carregada de um sarcasmo elegante, enquanto ele se aproximava montado em um cavalo negro, imponente como ele.

Isadora parou no meio do caminho de terra batida. A camisa dele estava aberta nos primeiros botões, revelando parte do peito bronzeado. O olhar, sempre calculado, parecia mais... interessado.

— Talvez das duas coisas — respondeu, com um meio sorriso. — Mas não esperava te ver tão cedo. Achei que os forasteiros dormissem até tarde.

— Só quando a noite é mal dormida — ele rebateu, desmontando com uma elegância irritante. — E a última foi... inquietante.

Ela o encarou, desconfiada. Havia um tom escondido ali, como se ele soubesse de mais do que devia.

— Inquietante por quê?

— Porque sons se espalham, Isadora. E estábulo não é tão longe da casa.

Ela sentiu o estômago afundar. Será que ele tinha ouvido? Visto?

— Cuidado com o que diz — retrucou, firme.

Leandro sorriu de lado, aproximando-se. O cheiro dele era fresco, com um toque amadeirado. Quando parou diante dela, sua presença era como sombra e luz ao mesmo tempo.

— Cuidado você — murmurou. — Vicente não é o único homem nessa fazenda com sangue nas veias. Ou com desejos.

Isadora sentiu o ar se comprimir nos pulmões. A proximidade dele mexia com ela. Era diferente de Vicente — mais contida, mais cerebral. Mas havia algo magnético em Leandro. Um perigo que não se mostrava logo, mas que crescia em silêncio.

— Você não é daqui — ela disse. — Não sabe do que está falando.

— Talvez eu saiba mais do que imagina — ele rebateu, entregando algo que tirou do bolso da calça jeans. Um papel dobrado. Outro bilhete.

Ela arregalou os olhos. A caligrafia... a mesma.

— Encontrei isso na cela antiga, perto do galpão. Estava escondido sob uma tábua solta — disse, sem tirar os olhos dela. — Quem está brincando com a sua cabeça, Isadora?

Ela pegou o papel, tremendo.

“Nem tudo que morre, descansa.”

De repente, um som de passos apressados cortou o momento. Ian surgiu, ofegante, com os olhos faiscando.

— Que porra é essa? — rosnou, olhando de Leandro para Isadora como um animal acuado. — O que vocês estão fazendo aqui, sozinhos?

— Conversando — Leandro respondeu, frio como sempre.

— E você sempre conversa tão perto assim? — Ian se virou para Isadora. — E você? O Vicente não foi o suficiente? Vai brincar com todos agora?

O tapa foi automático. Isadora não pensou. Só sentiu a raiva, a humilhação. O som seco da mão dela contra o rosto dele ecoou no campo aberto.

— Você não tem esse direito! — ela gritou. — Eu sou livre. Posso estar com quem eu quiser.

Ian a encarou, tocando o rosto. Os olhos dele estavam cheios de mágoa, mas também de algo mais profundo. Um ciúme irracional. Uma dor antiga.

— Não é isso... — ele murmurou. — Você é diferente, Isadora. Você não é como elas...

— Como elas? — ela cuspiu. — Eu não sou nada que você pense. E se estou aqui é porque tenho direito. Porque essa terra também é minha. Porque essa história também me pertence.

Ian a puxou pelo braço, sem força, mas com firmeza. Os olhos dele estavam marejados.

— Você não sabe o que é viver aqui. O que foi viver com seu pai... com o que ele fez com a gente.

— Então me conte, Ian. Porque eu estou cansada de segredos.

O silêncio caiu. Leandro os observava, braços cruzados, olhos atentos. Isadora sentia o coração disparar. Estava entre dois mundos. Dois homens. Três, se contasse Vicente. E nenhum deles estava em paz.

Mais tarde, ao entardecer, ela decidiu tomar um banho no lago. Precisava de silêncio. De ar. De afastar tudo.

Mergulhou nua, sem pensar duas vezes. A água gelada cortou sua pele, despertando os sentidos. Fechou os olhos, flutuando.

— Bela visão — disse uma voz masculina à margem.

Ela se assustou, virando-se.

Era Leandro.

— Você me seguiu?

— Não — respondeu, tirando a camisa devagar. — Mas não vou embora agora.

Antes que ela pudesse protestar, ele mergulhou. Quando emergiu, os olhos estavam cravados nela.

— O que você quer, Leandro?

Ele se aproximou, até que seus corpos se tocassem levemente sob a água.

— Quero entender por que você me tira o sono.

Ela sorriu, amarga.

— Talvez porque eu seja problema.

— Gosto de problemas — sussurrou, encostando a testa na dela. — E gosto de você.

O beijo veio como tempestade. Diferente do de Vicente. Leandro era controle. Era precisão. Os lábios dele exploravam os dela como quem desenha um mapa. As mãos a envolviam com calma, mas firmeza. Quando ele a agarrou pela cintura, fazendo os corpos se unirem sob a água, Isadora gemeu entre os dentes dele.

Não houve pressa. Só intensidade. As estocadas dentro dela eram profundas, ritmadas. E quando os dois chegaram juntos ao clímax, em meio ao brilho da lua no espelho d’água, souberam que nada seria igual depois daquilo.

Mais tarde, sozinha, Isadora chorou. Chorou de raiva, de confusão, de desejo. Chorou porque sentia estar despedaçando a si mesma entre três homens. Chorou porque algo nela dizia que todos eles estavam conectados... com um segredo que seu pai jurou levar para o túmulo.

Mas o túmulo estava começando a falar.

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Comments

Albertina Sacramento

Albertina Sacramento

que maravilha!!!

2025-05-26

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