(Capítulo 4)
Enquanto Hawkins tentava voltar à normalidade em 1984, Alex sentia que algo estava terrivelmente errado. A cidade exalava segredos, escondidos sob uma fina camada de subúrbio pacato. As histórias sobre o desaparecimento de Will Byers no outono passado, a trágica morte de Barbara Holland, e o incidente confuso na escola no final do ano letivo – oficialmente um "acidente envolvendo materiais perigosos" que resultou na morte de alguns agentes do governo – simplesmente não batiam. Havia buracos, contradições, uma sensação esmagadora de que a verdade estava sendo escondida.
Alex, por natureza, desconfiava de histórias oficiais que não faziam sentido. Sua própria vida o ensinara que as coisas raramente eram o que pareciam na superfície. Ele começou a prestar atenção, a ligar pontos. Não era uma investigação formal; era mais uma curiosidade mórbida e um desejo de entender a dissonância entre o que era dito e o que parecia ter acontecido.
Passava tempo na biblioteca, folheando jornais antigos, notando como certas matérias sumiam rapidamente ou eram vagas demais. Ouviu conversas pela cidade. E começou a observar as pessoas que pareciam estar no centro de tudo. O pequeno grupo de crianças – Mike Wheeler, Dustin Henderson, Lucas Sinclair, e agora Will Byers, que voltou estranhamente mudado. E o grupo um pouco mais velho: Nancy Wheeler, Jonathan Byers e, sim, Steve Harrington, o Rei Steve, que parecia ter descido do pedestal, mas ainda carregava um ar de quem viu coisas.
Alex os notava juntos, cochichando, parecendo tensos, lançando olhares nervosos ao redor. Havia uma cumplicidade secreta entre eles, um conhecimento compartilhado que os isolava do resto da cidade. O comportamento deles só alimentava as teorias de Alex.
Uma tarde, Alex estava sentado no parque perto da biblioteca, fingindo ler um livro enquanto observava discretamente Nancy Wheeler e Jonathan Byers conversando seriamente no coreto. Eles pareciam preocupados, trocando papéis que pareciam anotações ou recortes. Alex rabiscava em um pequeno caderno, anotando datas, nomes, inconsistências das histórias oficiais. A "morte" dos agentes na escola era um ponto central; a versão oficial era risível para quem pensasse um pouco.
Foi então que ele sentiu a presença.
Não era apenas alguém passando. Era um olhar fixo. Alex ergueu os olhos, e lá estava ele, escorado em uma árvore a uma distância que ele claramente pensava ser discreta. Billy Hargrove.
O mullet loiro inconfundível, a pose relaxada demais que gritava tensão contida. Billy o observava, os braços cruzados sobre o peito, uma expressão ilegível no rosto – não pura raiva como antes, mas aquela mistura perturbadora de curiosidade e desafio que Alex notara em seu último encontro.
Alex suspirou internamente. Ótimo. O obcecado resolveu aparecer. Ele fechou o caderno com um clique suave, sem desviar o olhar de Billy.
Billy desencostou-se da árvore e começou a caminhar lentamente na direção de Alex. Não com a pressa ameaçadora do corredor, mas com uma lentidão predadora, como um gato observando um rato antes de atacar.
Parou a poucos passos de Alex, olhando para ele com aquele olhar penetrante que parecia querer desvendá-lo. Alex apenas esperou, os olhos fixos nos de Billy, sem medo, apenas uma leve impaciência.
"O que você tá bisbilhotando, Aberração?", Billy finalmente disse, a voz baixa, mas sem o rosnado furioso de antes. Era mais... questionadora.
Alex arqueou uma das sobrancelhas (a da direita, com o piercing). "Já disse, não te interessa, Hargrove. O que você quer? Veio me dar mais uma aula sobre como não ser original?"
Billy pareceu ignorar o sarcasmo. Seus olhos varreram Alex – seu cabelo, os piercings, o estilo das roupas. "Continua se vestindo como se tivesse saído de um filme de vampiro barato."
"E você continua com esse visual de gigolô de filme B dos anos 70", Alex retrucou imediatamente, a ponta de sarcasmo voltando. "Pelo menos o meu é intencional."
Uma centelha de raiva passou pelos olhos de Billy com a alfinetada, mas ela não se incendiou completamente como antes. Ele quase pareceu... impressionado? Com a rapidez da resposta. Ele deu um passo mais perto.
"Vi você andando por aí. Perto da biblioteca. Perto do centro. O que você tá procurando?" A curiosidade de Billy era palpável agora, superando a necessidade de apenas provocar.
Alex hesitou por um segundo. Talvez pudesse usar isso. A curiosidade de Billy. "Só notando como essa cidade é... estranha."
"Estranha?", Billy riu sem humor. "Você que é estranho."
"Talvez", Alex concedeu, dando de ombros. "Mas coisas estranhas acontecem aqui, você não acha? Pessoas desaparecem, voltam... acidentes bizarros que matam meia dúzia de agentes do governo na escola e a cidade inteira apenas aceita a história oficial fajuta?" Alex inclinou a cabeça. "Falando em patético, a forma como todo mundo simplesmente engoliu a história oficial do que aconteceu no ano passado... isso sim é patético."
As palavras de Alex atingiram Billy de uma forma inesperada. A história oficial... ele não tinha parado para pensar muito nisso. Acidentes acontecem. Pessoas morrem. Mas a forma como Alex disse, com aquele tom de certeza... E Billy tinha estado na escola naquele dia. Longe da ação, mas sentiu o pânico, viu as sirenes, os agentes. A história que contaram depois não parecia... completa.
A curiosidade no rosto de Billy se aprofundou. Ele franziu a testa. "Que história fajuta?"
"A do 'acidente' na escola", Alex respondeu, observando a reação de Billy. "Acha que um monte de caras do governo morre assim do nada com um 'vazamento'? Ninguém viu nada? Ninguém ouviu nada? É ridículo."
Billy ficou em silêncio por um momento, pensando. Ele tinha pensado que aqueles caras eram apenas seguranças chatos. Mas eles morreram. Na escola. E a explicação foi... vaga. Ele não tinha questionado na época, muito ocupado com Max, Steve... mas agora, com Alex apontando isso, parecia óbvio.
"E as outras coisas?", Billy perguntou, quase a contragosto, a curiosidade vencendo sua resistência em admitir que Alex tinha um ponto. "O garoto que desapareceu e voltou? O que diabos foi aquilo?"
Um pequeno, quase imperceptível, sorriso apareceu no rosto de Alex. Billy estava mordendo a isca. "Exato", Alex disse suavemente. "O que diabos foi aquilo? Ninguém parece saber, ou querer saber." Ele olhou para Billy, um olhar que parecia convidar a uma cumplicidade estranha. "Há algo muito errado acontecendo em Hawkins, Hargrove. E a maioria das pessoas está cega para isso. Ou escolhe estar."
Billy encarou Alex, não mais com raiva primária, mas com uma intensidade focada. A raiva agora era dirigida à sensação incômoda de que Alex estava certo, de que ele próprio não tinha percebido. E havia a irritação de ter que admitir, mesmo que apenas para si mesmo, que Alex, o cara que o irritava e intrigava tanto, talvez fosse mais esperto do que ele.
Mas, mais do que isso, havia o começo de uma nova curiosidade, não apenas sobre Alex, mas sobre os segredos que Alex estava desenterrando. O tédio e a frustração de Billy com Hawkins ganharam um novo foco potencial. E havia a estranha... atração? Que ele sentia pela calma desafiadora e pela inteligência inesperada de Alex. Ele não entendia o que estava sentindo, e isso o deixava irritado, mas não conseguia se afastar.
"Você... você tem alguma teoria?", Billy perguntou, a voz mais baixa, quase relutante.
Alex apenas sorriu, o sorriso não sarcástico dessa vez, mas misterioso e convidativo. Ele voltou a sentar nos degraus, pegando o caderno.
"Algumas", Alex respondeu, folheando as páginas. Ele olhou para Billy, que ainda estava de pé, a poucos passos de distância, parecendo incerto sobre o que fazer a seguir. "Mas são só teorias. Por enquanto."
O sol se pôs completamente, e as luzes da quadra de basquete se acenderam, lançando um brilho artificial sobre os dois. A tensão ainda existia, mas havia mudado de forma. Não era mais apenas pessoal; agora, um mistério compartilhado e relutante pairava entre eles. Billy sabia que precisava saber mais, tanto sobre os segredos que Alex estava descobrindo quanto sobre Alex ele mesmo.
Ele não foi embora. Apenas ficou ali, olhando para Alex, a escuridão começando a engolir a borda da floresta atrás deles, uma floresta que guardava seus próprios segredos.
[Continua no próximo capítulo...]
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Atualizado até capítulo 66
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