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Capítulo 3 — Coisas que o Corpo Guarda em Silêncio

O convite veio numa mensagem simples.

“Quer caminhar hoje à tarde? Sem café. Sem paredes.”

— Noah.

Lívia releu a mensagem três vezes antes de responder.

“Tá.”

Foi tudo o que conseguiu escrever. Mas por dentro… o coração batia como se estivesse reaprendendo a existir.

**

Encontraram-se em um parque quase vazio, o céu nublado acima deles, como se o tempo compreendesse a leveza sombria daquela tarde. Noah usava uma camisa cinza e o mesmo olhar de sempre — como quem escondia mais do que podia contar.

— Você sabia que o corpo guarda traumas como gavetas trancadas? — ele perguntou, caminhando ao lado dela, sem tocar, mas perto o bastante para sentir o calor.

Lívia apenas assentiu. Ela sabia. Sabia demais.

— E às vezes, do nada, a gaveta abre — ele continuou. — Um cheiro, uma frase, até uma música… e pronto. Tudo volta.

— Ontem eu chorei por causa de uma música de 17 segundos — ela murmurou. — Tocou num comercial.

Noah sorriu com melancolia.

— Parece loucura, né?

— Não. Loucura é fingir que não dói.

Caminharam mais alguns metros em silêncio. As folhas caíam ao redor, como pequenos lutos do outono.

— Posso te mostrar um lugar? — ele perguntou.

Lívia hesitou. Mas algo dentro dela dizia que sim.

**

Era um prédio antigo. De fachada descascada e janelas tortas. Noah abriu uma porta de ferro, subiu dois lances de escada e a guiou até o terraço.

Lá em cima, havia uma velha poltrona de veludo encardido, algumas plantas secas em vasos quebrados e um piano desmontado encostado na parede.

— É feio — ele disse. — Mas é meu esconderijo.

Ela sorriu pela primeira vez em dias. Um sorriso pequeno, mas real.

— É mais bonito do que qualquer coisa perfeita.

Ele sentou na poltrona. Ela se aproximou das plantas.

— Você vem aqui pra lembrar ou pra esquecer?

— Pra respirar — respondeu. — Nos dias em que o peso fica grande demais.

Lívia se sentou no chão, os joelhos junto ao peito.

— Você acha que algum dia isso passa? A dor?

Noah olhou para o céu nublado.

— Não. Mas acho que a gente aprende a dançar com ela. Como se fosse uma cicatriz que virou coreografia.

Ela fechou os olhos. Um vento frio passou, arrepiando sua pele.

Noah a observava. Aquela menina com olhos cansados e alma quieta. Havia algo nela… algo intocado, puro, como um campo de neve antes da primeira pegada.

Ele não a tocou. Mas quis.

Não com pressa. Não com desejo.

Com reverência.

Lívia ainda era virgem. Nunca havia deixado ninguém chegar perto o suficiente. Mas pela primeira vez, ela não sentiu medo. Só cuidado. Só um calor morno de alguém que não queria tomar — apenas estar.

— Obrigada por me mostrar seu refúgio — disse ela, com os olhos brilhando.

— Obrigado por não fugir — respondeu ele.

E então, o tempo ficou quieto.

E pela primeira vez, o silêncio entre eles não era sobre dor.

Era sobre presença.

Sobre um possível amor que ainda não sabia o nome que tinha.

Com prazer. Vamos continuar com o Capítulo 4 de "Enquanto Eu Não Me Despeço", aprofundando a conexão entre Lívia e Noah, mas também introduzindo mais tensão emocional e um vislumbre do passado dele — para prender o leitor e deixá-lo querendo mais.

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Capítulo 4 — O Nome das Cicatrizes

Fazia três dias desde que Lívia estivera no terraço de Noah, e a lembrança daquele lugar ainda a acompanhava como um segredo bom.

Mas naquela tarde, ao sair da cafeteria, viu algo que a fez parar.

Noah.

No outro lado da rua.

Com uma mulher.

Ela era bonita, usava casaco vermelho e segurava um envelope nas mãos. Falava com raiva, com pressa. Noah não respondia. Só ouvia.

Mas quando a mulher virou as costas e foi embora, ele ficou parado por longos segundos, com o olhar preso em algum lugar que Lívia não conseguia alcançar.

E então ele a viu.

Lívia fingiu que não o observava. Seguiu andando. Mas o coração já doía — e ela nem sabia por quê.

**

À noite, ele enviou uma mensagem.

“Foi só uma parte do meu passado me lembrando que ainda dói.

Mas se quiser saber, eu conto.”

Lívia ficou olhando a tela.

Doía admitir, mas ela queria saber.

“Só me diz a verdade.”

**

Encontraram-se no mesmo terraço.

Estava mais frio dessa vez. Lívia usava um cachecol e segurava uma xícara de chá quente que ele preparou.

— Ela era minha esposa — ele disse, direto, sem rodeios.

Lívia não se mexeu.

— A gente perdeu um filho. Ainda na barriga. Depois disso, a gente também se perdeu um do outro.

Ele encarava as estrelas. Ou tentava.

— Eu não fui embora porque deixei de amar. Fui embora porque não sabia mais como ficar.

Lívia sentiu o corpo estremecer.

Não de medo.

Mas de algo novo: empatia, talvez. Ou um espelho quebrado que ainda se encaixava ao lado do dela.

— Você ainda a ama? — perguntou.

Ele demorou a responder.

— Amo o que fomos. Mas não sou mais aquele homem.

E, se estou aqui, é porque alguma parte de mim quer ser outra coisa. Talvez… contigo.

Ela desviou o olhar. Aquele “contigo” ecoou fundo.

Noah se aproximou, devagar.

Parou diante dela.

— Eu não quero te consertar, Lívia. E não espero que você me salve.

Só queria… te acompanhar. Se me deixar.

Ela olhou para ele. Pela primeira vez, sem defesas.

— Eu ainda tenho medo.

— Eu também — ele respondeu.

E então ele estendeu a mão.

Não para segurar.

Mas para deixar que ela decidisse.

E Lívia, com o coração ainda ferido, mas pulsando de novo, encostou seus dedos nos dele.

Foi só um toque.

Mas ali havia promessa.

De presença.

De cuidado.

De tudo o que o amor deveria ser — mesmo quando ainda nem se chamava assim.

— Sabe o que eu mais odeio? — Lívia perguntou, com a voz baixa, os olhos fixos nas nuvens que se acumulavam no céu.

— O quê?

— Quando me dizem que vai passar.

Como se fosse uma gripe. Como se tudo o que eu perdi pudesse ser substituído com tempo e boas intenções.

Noah não respondeu de imediato. Apenas se levantou da poltrona e sentou no chão ao lado dela. As pernas cruzadas. O olhar voltado para o mesmo ponto no horizonte.

— Eu odeio quando fingem que entendem… só porque também sofreram — ele disse. — A dor não é uma competição. É uma língua diferente em cada pessoa.

Ela o olhou. Aqueles olhos cinzentos pareciam abrigar todos os invernos do mundo.

E ainda assim… havia neles um abrigo.

— Por que você me escolheu? — ela sussurrou.

— Eu não escolhi — respondeu. — Você apareceu no exato momento em que eu tinha esquecido como era ver alguém sem me sentir pequeno.

O silêncio que se seguiu foi carregado de tudo o que eles ainda não sabiam nomear.

Lívia apoiou o queixo nos joelhos.

— Eu nunca… — começou, e depois parou. O coração batia como se estivesse tentando sair pela boca.

— Nunca? — ele perguntou, com cuidado.

Ela assentiu devagar.

— Nunca deixei ninguém ficar. Nunca quis. E agora…

Noah esperou. Não pressionou. Não se moveu.

— …e agora você está aqui — completou ela, com a voz embargada.

— Eu só fico se você deixar — disse ele. — E mesmo que não me deixe, eu ainda vou te desejar luz. Mesmo de longe.

Ela virou o rosto na direção dele. As lágrimas ameaçavam cair, mas ela conteve. Porque era diferente dessa vez.

Não era dor.

Era vulnerabilidade.

Era entrega, ainda que em silêncio.

E então, num impulso tão leve quanto o vento que passava entre eles, Lívia encostou a cabeça no ombro de Noah.

Ele permaneceu imóvel, como quem segura o ar para não espantar um milagre.

Ficaram assim por longos minutos.

Dois mundos partidos, tentando descobrir como não se quebrar mais um no outro.

E, naquele terraço gasto pelo tempo, sem promessas e sem pressa, o amor começou a acontecer.

Não em forma de beijo.

Mas em forma de presença.

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Comments

Meire

Meire

para mim nem precisa disso, já me prendeu desde o primeiro capítulo!

2025-05-14

0

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