Capítulo 5 - Noite Fria, Coração em Chamas

Com Aria Duarte...

A porta do Solar Bellucci se fechou atrás de mim com um estrondo abafado — como se selasse algo que nunca deveria ter sido reaberto.

O vento de Sierra era cruel à noite, carregando lembranças com cheiro de jasmins mortos, silêncio pesado e saudade molhada.

Desci os degraus com passos rápidos, os saltos batendo contra o mármore com força. Por fora, firme. Por dentro, tremia.

Leon.

A forma como ele me olhou… como se todos aqueles anos não tivessem passado.

Como se eu ainda fosse a garota que corria descalça na chuva e dizia que o amor podia curar qualquer coisa.

Mas também… como se ele soubesse que aquela garota tinha morrido.

“Você sempre teve talento pra desaparecer e reaparecer do nada, Aria Duarte.”

As palavras dele ainda ecoavam dentro de mim, quentes, irônicas… e perigosamente doces.

Entrei no carro e bati a porta com mais força do que queria. Encostei a testa no volante. Respirei fundo. Uma. Duas. Três vezes.

Por que eu fui até lá?

Eu estava me odiando por isso. Me odiando por ainda sentir.

Por ter me deixado levar por um nome num envelope preto. Por ter aceitado reviver fantasmas.

Queria gritar. Queria voltar no tempo.

Queria apagar o nome dele da minha história.

Mas acima de tudo… queria entender por que, mesmo depois de tudo, ele ainda mexia comigo daquele jeito.

Como se a presença dele puxasse todos os fios soltos do que restou do meu coração.

 

O caminho até a casa do meu pai foi mergulhado num silêncio espesso. As ruas de Sierra pareciam desertas — como se até a cidade sentisse a tensão da noite.

Ao estacionar, vi as luzes acesas.

E o cheiro de pão de queijo queimado escapava até pela varanda.

Na cozinha, Dona Iolanda abanava fumaça com um pano de prato.

— Eu só virei as costas por cinco minutinhos!

— Minutinhos que mais pareciam um episódio inteiro de novela! — reclamou Naldo, tossindo de propósito. — Esse forno virou arma química.

— Cuidado com a língua, rapaz! — disse a governanta, batendo o chinelo no chão. — Aqui só queima comida, não a esperança!

Soltei um riso fraco. Frágil. Do tipo que vem só pra não transbordar em choro.

Atravessei a sala e vi Isabelle dormindo na poltrona, com o coelhinho nos braços, a testa suada, os pés pendendo do estofado.

Ajoelhei ao lado dela, ajeitei a coberta e beijei sua testa com delicadeza.

— Você é a única coisa que me ancora — sussurrei.

A pequena resmungou algo como “chocolate” e voltou a dormir.

 

No meu quarto, tirei os sapatos. Depois os brincos. Depois… a coragem.

Sentei na beira da cama, o corpo tenso demais pra relaxar. Ainda sentia o perfume de Lúcia no travesseiro. Como se ela estivesse ali. Observando. Cuidando. Ou… alertando.

Meu celular vibrou.

Mensagem anônima.

> “Agora você sabe. Mas ainda não sabe tudo.”

Franzi a testa. O sangue gelou nas minhas veias.

Antes mesmo de a tela apagar, vibrou de novo.

> “Cuidado em quem confia. Nem todo passado está morto.”

Soltei o celular como se queimasse minha pele.

Corri até a janela, puxei a cortina com força.

Lá fora, o jardim dormia em penumbra. As sombras dançavam sob o vento.

E então eu vi.

Uma silhueta. Imóvel. Observando.

Estava ali. Esperando. Sabendo.

Mas no segundo seguinte… sumiu.

Como um fantasma.

 

Com Leon...

Eu estava na sacada do segundo andar, com um copo de uísque na mão e os olhos perdidos na escuridão. A noite estava fria, mas eu mal sentia. Meu corpo estava ali — mas a cabeça? Na porta que se fechou atrás dela.

Aria Duarte.

A garota que nunca saiu da minha história.

A mulher que agora parecia ainda mais forte.

E ainda mais perigosa.

O salto vermelho, a forma como ela ergueu o queixo, como se desafiasse o mundo só com o olhar…

Mas eu vi.

Nos olhos dela, ainda havia marcas do que deixamos pra trás.

Eu tentei me convencer de que era só curiosidade. Só orgulho ferido.

Mentira.

Era mais. Sempre foi.

Desde o dia em que ela foi embora, eu me prometi que, se algum dia ela voltasse, eu saberia. E hoje, quando vi aquele nome no papel… era como se o tempo tivesse desafiado a lógica.

Ela voltou.

E agora, nada em Sierra vai continuar igual.

— Pensando nela? — disse uma voz atrás de mim, doce como veneno.

Virei devagar.

Rafaela Torres.

Vestido justo demais, perfume forte demais, sorriso treinado na frente do espelho. A mulher que um dia foi amiga da Aria… e que hoje fazia de tudo pra apagar esse passado.

— O que você está fazendo aqui, Rafaela?

Ela caminhou até mim como se tivesse todo o direito do mundo de estar ali.

— Acabei de voltar de viagem. Nem desfiz as malas… mas quando soube que ela estava de volta, vim correndo.

Não podia perder essa cena, né? — disse ela, com um sorriso torto nos lábios.

Dei um gole no uísque, encarando o fundo do copo.

— Você não muda, não é?

Ela sorriu, se aproximando ainda mais.

— E você também não. Sempre gostou de problemas, Leon.

— E você sempre foi um deles.

Ela riu, sem vergonha nenhuma.

— Vai me expulsar, ou vai fingir que não sente falta de mim?

Fiquei em silêncio.

O vento soprou forte pela sacada, e por um segundo, tudo ficou quieto demais.

Silêncio antes da tempestade.

E eu sabia: ela não tinha vindo só pra ver o estrago.

Ela veio pra causar mais.

Continua...

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