dois homens à deriva

Marselha, 03:47 da manhã

Viktor estava novamente de pé, a camisa suada colada ao corpo, as mãos trêmulas escondidas nos bolsos. O sangue já havia secado no punho, mas o gosto metálico ainda amargava sua língua.

Ele não procurou um médico.

Não pediu ajuda.

Não podia demonstrar fraqueza.

O império Salazar estava pendurado por fios — e o último fio era ele.

Reuniu os últimos chefes leais em uma videoconferência silenciosa. Corrigiu rotas. Cortou gastos. Ameaçou aliados com traição velada. Conseguiu que parte do tráfico da Ásia Central se redirecionasse, aliviando as perdas na Europa.

Fez o que sempre soube fazer: controlar, esconder, sobreviver.

Mas quando desligou a tela, ficou em silêncio por um longo tempo. Sentado. Sozinho. Com o rosto coberto pelas mãos.

O coração batia como se tentasse escapar do peito. A visão escurecia nas bordas.

Mas ele se recusava a parar.

“Só mais alguns dias. Só mais uma última reunião. Só até ele estar seguro...”

Itália, mesmo horário.

Enzo afundava em um sofá sujo de um bar decadente nos arredores de Palermo, onde ninguém ousava pronunciar o nome “Salazar”.

O copo de uísque já estava vazio. O quarto também. Mas o peito… esse estava cheio. De ódio. De memórias. De palavras que nunca foram ditas.

— “Pra ele foi fácil, né?” — disse ao garçom, que mal escutava. — “Me usar. Me amar. Me destruir...”

Riu, um riso bêbado e quebrado.

— “Eu o amava. Ele me desmontava só com um toque. E agora... agora eu só quero vê-lo morrer.”

Deu outro gole, mesmo sem nada no copo.

Olhou para a faca presa na bota. A mesma que Viktor uma vez tirou de suas mãos numa briga.

— “Eu juro... por tudo o que perdi… ele vai sentir o que é morrer por dentro.”

Enzo fechou os olhos. E por um instante, no fundo da mente destruída, ele viu o rosto de Viktor.

Sorrindo. Nu. Adormecido. Feliz.

Enzo afastou a imagem com um soco na mesa.

— “Cala a boca, coração.” — murmurou. — “Eu já te enterrei.”

Perfeito. Aqui está um capítulo longo retratando os cinco dias decisivos — Viktor afundando lentamente na própria ruína física enquanto tenta manter seu mundo de pé, e Enzo preparando o golpe final, com ódio frio e uma dor que não cessa.

Mal sabia ele que aos poucos Viktor estava correndo

Dia 1 —

Viktor acordou às 6h14 da manhã, como sempre. Passou o café com as mãos trêmulas, vestiu o paletó preto que não usava desde a primeira vez que negociou com a máfia ucraniana. Olhou-se no espelho.

As olheiras estavam mais fundas. A pele, mais pálida. Mas ainda havia algo nos olhos — algo que o mantinha de pé.

A reunião com os espanhóis foi tensa. Ele falava com firmeza, mas disfarçava os calafrios com goles de água. No final da tarde, em particular, teve outra crise de tosse no banheiro do hotel. O sangue estava mais escuro.

Ignorou.

Tomou três comprimidos sem receita. Paracetamol, codeína, algo antigo que achou em sua farmacinha. Nada ajudou.

Do outro lado da Europa, Enzo sentava diante de um mapa estendido sobre sua cama. Usava luvas pretas e uma caneta vermelha.

— “Esse é o armazém que restou na Bélgica,” disse a um subordinado. — “E essa é a última linha de transporte marítimo ativa. Quero fogo neles. Sem sobreviventes.”

Fechou o mapa. Acendeu um cigarro. E olhou para o alto.

— “E depois… eu vou buscar o coração.”

O de Viktor.

Dia 2 —

Viktor compareceu à festa de fachada de um aliado russo para manter aparências. Suportou três horas de bebida, música e mentiras. Sorriu para capos, abraçou assassinos e garantiu que “tudo está sob controle”.

No banheiro de mármore, vomitou sangue e fel. As pernas não o sustentaram por alguns segundos. Mas ele se ergueu.

Ele sempre se erguia.

— “Se cair agora, perde tudo,” murmurou. “Se cair agora... perde ele.”

Enquanto isso, Enzo observava imagens de satélite e escutas de um contato infiltrado. Tinha tudo: localização de Viktor, deslocamentos diários, padrões de reunião.

A ira dava lugar à precisão. A dor, à frieza.

— “Vamos atingi-lo no sexto dia. Ele estará sozinho em Marselha, finalizando o acordo com os turcos. É o único momento em que não haverá seguranças no perímetro externo.”

Enzo sorriu. Não havia alegria naquele gesto.

— “O fim dele começa onde a gente começou.”

Dia 3 —

Viktor tomou outro coquetel de remédios. Já não sabia o que fazia efeito ou não. O peito ardia como se algo dentro dele queimasse lentamente. Dormia por intervalos curtos, acordando sempre com a sensação de que estava se afogando.

Ainda assim, participou de três reuniões e enviou uma carta para seu advogado reorganizando suas contas bancárias. Elena tentou intervir.

— “Você precisa ir ao hospital, Viktor.”

— “Não posso. Enzo ainda está vivo.”

— “E vai continuar, mesmo se você estiver morto.”

Ele não respondeu.

No norte da Itália, Enzo fazia testes com armas silenciosas. Um rifle de longo alcance, uma faca recém-amolada, até venenos. Mas no fim, guardou tudo.

— “Vai ser pessoal.”

Sentia o coração pulsar de raiva, mas também de vazio.

E isso o deixava ainda mais perigoso.

Dia 4

A respiração de Viktor era irregular. Precisava se apoiar nas paredes para caminhar. Reuniu-se com os turcos mesmo assim, tropeçando duas vezes, mas disfarçando com piadas.

Nenhum deles sabia que ele estava morrendo.

Nenhum deles imaginava que ele estava sozinho no mundo, lutando para manter viva uma estrutura que ele mesmo desejava abandonar — se Enzo estivesse do lado dele.

Escreveu, em segredo, uma carta. Selou. Endereçou.

Mas não teve coragem de enviar.

"Se você ler isso, é porque eu falhei. E eu nunca quis falhar com você."

Dia 5 —

Viktor acordou em sua cama com a camisa encharcada de suor e o gosto amargo da morte na garganta. Olhou o relógio: 04:17.

Hoje era o dia.

O sexto.

O dia do encontro com os turcos no antigo galpão em Marselha.

O dia em que ele estaria vulnerável.

E ele sabia.

Sabia que Enzo viria.

Sabia que talvez aquela fosse sua última noite viva.

Ainda assim, arrumou o cabelo. Vestiu o terno. Guardou no bolso interno a carta. E saiu, com o mesmo olhar de ferro que usou na juventude.

No caminho, tossiu sangue no volante. Mas não parou.

No mesmo instante, Enzo preparava sua mala.

Um revólver, uma adaga, e o isqueiro novo.

O velho ele havia queimado.

Olhou-se no espelho e disse, sem emoção:

— “Hoje, eu acabo com tudo. Com ele. Comigo. Com essa história maldita.”

A dor ainda morava nos olhos.

Mas agora… só havia espaço para o fim.

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