Ela caminhava em direção à doceteria com o coração apertado no peito e os pensamentos girando ao redor de um único nome: Gabriel.
O papel com a frase “Você vê o que os outros esqueceram” ainda estava dobrado no bolso do casaco.
Ela o relia todas as noites, como se pudesse encontrar outra mensagem escondida ali.
Ao destrancar a porta da doceteria, algo a fez parar.
Um cheiro familiar — sutil, entre o aroma do açúcar e da chuva.
Ela fechou os olhos por um instante.
E então ouviu.
— Está bonita hoje.
Melissa se virou tão rápido que quase deixou cair a chave.
E lá estava ele.
Gabriel.
De pé, encostado ao batente da porta do fundo, os braços cruzados, o cabelo dourado bagunçado e os olhos azuis mais intensos do que nunca.
Parecia recém-saído de um sonho… ou de um pesadelo.
— Você… sumiu — disse ela, com a voz presa na garganta.
— Não costumo ser lembrado por muito tempo.
— Eu me lembro.
Ele sorriu de lado, como se isso o intrigasse mais do que qualquer outra coisa no mundo.
— Eu sei.
— Por quê? Quem é você?
Gabriel deu alguns passos à frente.
Melissa recuou sem perceber. Havia algo nele que misturava o fascínio ao perigo.
Ele parou, respeitando a distância.
— Eu sou... o que resta quando tudo está prestes a terminar.
— Isso não responde nada.
— Eu não vim para dar respostas.
— Então por que está aqui?
Gabriel hesitou. Pela primeira vez, seus olhos pareceram vacilar.
— Porque você me viu. E isso… não deveria acontecer.
Melissa se calou. A respiração estava trêmula, os batimentos descompassados.
— As pessoas te esquecem? — perguntou.
— No momento em que viro as costas — ele confirmou. — Como se nunca tivesse existido.
— Mas eu não.
— Não… você não.
O silêncio entre eles cresceu como uma onda.
Gabriel abaixou o olhar por um momento e depois levantou novamente, encarando-a com intensidade.
— Você não devia conseguir. Algo em você está... quebrado.
— Talvez seja o tumor no meu cérebro.
Ele ficou imóvel por um instante.
— Você sabe, então.
Melissa assentiu. Um nó subiu pela garganta.
— Tenho menos de cem dias. Talvez muito menos.
— Então é por isso — murmurou ele, quase para si mesmo.
— Por isso o quê?
Gabriel a olhou de uma forma diferente agora. Não como alguém curioso, mas como quem olha para uma vela prestes a se apagar.
— Porque está entre os mundos. Nem viva, nem morta.
— Está dizendo que eu... vejo o que não pertence mais a esse mundo?
— Estou dizendo que você me vê porque está… perto demais da escuridão.
Melissa deu um passo à frente, desafiando o medo.
— E você é a escuridão?
— Talvez — respondeu ele com um sorriso melancólico. — Talvez eu seja o que vem depois dela.
Ele começou a se afastar.
— Espere. Vai sumir de novo?
— Sim — respondeu. — Mas agora que me vê... vai me ver de novo.
— Quando?
Ele parou na porta, com a luz cinza da manhã refletindo nos olhos azuis.
— Quando você estiver mais próxima da última luz.
E então se foi.
Como uma sombra que o sol não consegue alcançar.
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Atualizado até capítulo 41
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