Lucas começou a treinar em horários alternativos, sozinho. Queria aperfeiçoar o que aprendeu no torneio. Colocava música baixa no fone e se concentrava nos movimentos.
Certa noite, após todos irem embora, ele ficou mais tempo no tatame. A academia estava vazia, iluminada apenas pela luz amarelada dos refletores.
Parou em frente ao espelho.
— Quem é você agora? — perguntou, em voz baixa.
Os olhos que o encaravam refletiam mais do que cansaço. Havia algo novo ali: respeito por si mesmo.
Mas também dúvidas.
Ainda sentia medo antes de cada treino. Ainda tinha inseguranças. A força que buscava parecia uma miragem — sempre mais à frente.
Marco apareceu na porta, observando-o.
— A verdadeira luta é essa aí. Quando ninguém está vendo.
Lucas se virou, surpreso.
— Ainda me sinto fraco às vezes.
— E é por isso que está mais forte do que imagina.
Um sábado chuvoso trouxe algo inesperado.
Sofia o chamou para um treino improvisado no parque. Usaram o espaço coberto do ginásio municipal, vazio por causa do mau tempo.
— Vamos trabalhar a percepção hoje. Sem força, só resposta — disse ela, jogando uma bolinha de tênis na direção dele.
Lucas pegou.
— Isso é treino ou brincadeira?
— Os dois — sorriu.
Treinaram por horas, rindo, errando, improvisando. A chuva batia nas telhas com ritmo. Era como se o mundo ao redor tivesse desacelerado.
No fim, ficaram sentados no chão, exaustos.
— Você já pensou em competir de novo? — perguntou Lucas.
— Sim. Mas tenho medo. De me cobrar demais. De não ser boa o suficiente.
— Eu também.
— Então talvez… a gente enfrente isso juntos.
Os olhos dela encontraram os dele. Por alguns segundos, o tempo parou.
A chuva continuava lá fora. Mas ali, entre dois corações que começavam a confiar um no outro, nascia algo mais forte que qualquer tempestade.
Os dias seguintes ao treino no parque com Sofia foram marcados por uma intensidade nova. Lucas acordava mais cedo, dormia mais tarde. Seus treinos tornaram-se silenciosos e metódicos, quase meditativos.
Mas com o progresso veio também o peso.
— As pessoas estão começando a esperar coisas de mim — disse Lucas a Marco, entre um treino e outro. — E se eu decepcionar?
Marco sorriu com a serenidade de quem já enfrentou esse tipo de guerra.
— É natural que esperem. Mas o que importa é o que você espera de si mesmo.
— E se nem isso eu souber responder?
— Então você continua lutando, até saber.
Lucas refletiu sobre isso. Em casa, olhou para o celular e viu uma mensagem de seu pai: "Você vai passar o fim de semana conosco? Sua mãe sente sua falta."
Aquele era um peso diferente. A ausência de apoio sempre foi silenciosa, mas constante. Agora, o simples gesto de chamá-lo de volta mexia com ele.
— Talvez eles também estejam tentando — disse Lucas a si mesmo.
Sábado à tarde, Lucas decidiu visitar os pais.
O reencontro foi contido. A mãe preparou uma comida que ele gostava. O pai o observava de longe, como se não soubesse por onde começar.
— Vi umas fotos suas na internet. No torneio — comentou, enquanto tomavam café.
— Foi só uma participação. Nada demais.
— Já é mais do que eu teria coragem de fazer — respondeu o pai, com um meio sorriso.
Lucas se surpreendeu. Aquela era a primeira vez que ouvia algo parecido.
Mais tarde, o pai o chamou no quintal.
— Lembra quando você era pequeno e queria ser astronauta?
Lucas riu.
— Eu me lembro mais de vocês dizendo pra eu “manter os pés no chão”.
O pai assentiu, envergonhado.
— É. Acho que a gente errou nisso. Você sempre foi sonhador. E talvez... talvez a gente tenha tentado te proteger demais. E acabou apagando a sua chama.
Lucas se emocionou.
— Ainda dá tempo de reacender.
— Se você quiser, posso ir ver seu próximo torneio.
Lucas assentiu.
— Quero, sim. Muito.
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Atualizado até capítulo 53
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