Ganhei uma segunda chance?

Instantaneamente dei um pulo, arfando, como se o ar tivesse sido arrancado dos meus pulmões. Olhei ao redor, confusa, sentindo o corpo leve demais… familiar demais.

Estava naquele maldito quartinho minúsculo da academia do império, com a mesma cama dura, os lençóis ásperos e as paredes descascadas que nunca me deixaram esquecer meu lugar: inferior, descartável, mesmo sendo a descendente direta de um ducado.

Meus olhos arregalaram, e instintivamente levei as mãos ao rosto. Meus dedos estavam pequenos. As articulações, delicadas.

— Que…? — sussurrei, olhando para minhas mãos, virando-as de todos os ângulos.

Saltei da cama e corri até o espelho trincado no canto do quarto. A imagem refletida me fez dar um passo para trás.

Cabelos menos volumosos, rosto ainda redondo, sem as marcas do tempo ou das batalhas… olhos mais inocentes, mas carregando o mesmo vermelho vivo que sempre denunciou minha origem.

— Eu tô… sonhando? — murmurei, incrédula.

Sem pensar duas vezes, dei um tapa forte na minha própria bochecha. A dor veio imediata, quente, pulsante.

— Agh! — esfreguei o local com raiva. — Não… não é um sonho.

Me encarei no espelho por mais alguns segundos, tentando processar o que estava acontecendo. Era o início da minha vida na academia… eu devia ter uns doze ou treze anos nessa época. Os dias em que a humilhação era servida no café da manhã e o desprezo no jantar. Quando os instrutores mal lembravam meu nome, mas nunca esqueciam meu sobrenome.

Meus punhos se fecharam.

Se isso for algum tipo de segunda chance…

Se o destino decidiu brincar de novo comigo…

Dessa vez, quem vai rir por último sou eu.

— Vamos ver quem é que vai cair dessa vez. — sussurrei, com um meio sorriso nos lábios.

Depois de alguns minutos encarando meu reflexo, respirei fundo. Eu podia entrar em colapso, chorar, gritar... ou podia aproveitar essa oportunidade. E, sinceramente, o segundo parecia muito mais divertido.

— É fim de semana — murmurei ao notar que a escola estava vazia nesse horário, um sorriso começando a se formar nos meus lábios. — Acho que mereço um passeio... e alguns mimos.

Me vesti com calma, escolhendo uma roupa que combinasse com a jovem dama que eu era nessa época, mas com um toque de imponência. Um vestido vermelho escuro, quase vinho, com detalhes prateados no corpete e uma capa leve, longa, que dançava atrás de mim. Prendi o cabelo em um coque elegante, deixando apenas uma mecha solta cair ao lado do rosto. Um par de botas finas e discretas completavam o visual.

Peguei a insígnia da família LeRouge — o símbolo do ducado — e prendi na roupa, bem visível. Essa coisinha tinha mais poder do que uma espada, em certos lugares.

— Vamos lá, essa é a primeira vez que faço isso. — sussurrei, saindo do quarto.

As ruas do império estavam movimentadas como sempre, com nobres andando em carruagens luxuosas, comerciantes gritando ofertas e soldados patrulhando com ar de importância. Mas bastou a insígnia LeRouge brilhar no meu peito para que os olhares mudassem. Todos me notavam. Todos se curvavam, mesmo que por obrigação.

— Senhorita LeRouge, um prazer vê-la aqui! — disse o dono da boutique mais cara do centro imperial, quase tropeçando nas próprias palavras.

— Quero vestidos novos. Nada do estoque antigo — respondi com um sorrisinho arrogante. — Quero tecidos importados, e... ah, inclua aquele colar de ametista que vi na vitrine. Ficaria lindo com meus olhos, não acha?

— C-claro! E quanto ao pagamento?

— Encaminhe a conta para o Ducado LeRouge — disse, girando nos calcanhares sem sequer olhá-lo nos olhos. — Eles adoram bancar meus caprichos.

(Sabendo que isso vai doer no bolso deles, e isso me faz sorrir ainda mais.)

Depois, passei por uma livraria luxuosa, uma casa de chá nobre e até um empório de especiarias raras. Tudo em nome da família.

Cada item que eu mandava entregar nos aposentos reais da academia era como uma pequena vingança, silenciosa e deliciosa. Cada moeda gasta por mim era uma migalha do castelo desmoronando.

E o melhor? Eu sabia exatamente o quanto eles odiavam que eu usasse o título para “brincar” de nobreza.

Mas eles subestimaram-me uma vez. Não vão fazer isso de novo e nem vou dar essa oportunidade a eles.

Depois de fazer minhas compras e praticamente esvaziar metade dos cofres do ducado, parei em frente ao famoso Café d'Étoiles, um lugar que, na minha vida passada, eu sempre sonhei em visitar — mas, claro, nunca fui “digna o suficiente” aos olhos da minha família. Hoje, com doze anos e a insígnia dos LeRouge brilhando no peito, ninguém ousaria me impedir.

Escolhi uma mesa perto da janela, pedi um croissant amanteigado com geleia de frutas vermelhas e um chocolate quente espesso — exatamente como eu tinha lido nas resenhas do futuro — e, com toda a calma do mundo, peguei um jornal dobrado sobre a mesa ao lado.

Hora de entender o presente para reescrever o futuro.

Folheei as páginas com atenção. As manchetes falavam de política, de novos decretos do imperador, de feiras comerciais e de uma onda de pequenos crimes cometidos nos arredores do território LeRouge. Nada explícito, nada que chamasse atenção… Mas eu sabia ler nas entrelinhas. Sabia o cheiro da podridão antes que ela apodrecesse por completo.

— Já começou… — sussurrei, franzindo as sobrancelhas. — Provavelmente testes… ou acertos de alianças.

Fechei o jornal e deixei algumas moedas generosas sobre a mesa. A comida mal havia sido tocada, mas minha cabeça já girava rápido demais para saborear qualquer coisa.

"Não posso perder tempo."

A biblioteca imperial teria informações demais, mas também olhos demais. E se eu aparecesse lá, cedo ou tarde algum LeRouge ficaria sabendo. Já a Guilda Luminaris… bem, no presente ela ainda estava dando os primeiros passos. Mas no futuro se tornaria uma das organizações mais influentes do império — cheia de magos, mercenários e investigadores independentes. Um lugar onde informação corre mais rápido que qualquer boato de corte.

— É pra lá que eu vou — disse, mais para mim mesma, puxando o capuz para cobrir o rosto e me misturar à multidão da rua.

Se eu quisesse começar minha vingança, precisava de dados. Precisava de nomes, de datas, de provas. E quem melhor para isso do que aqueles que vivem às margens da lei?

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Comments

Silva Writer

Silva Writer

E a Amaya segue com sua segunda chance.
Muito bom ver o lado estrategista da personagem e como ela se preocupa em se situar para poder agir.
Ótimo capítulo! ⚔️

2025-05-27

3

Joelma Oliveira

Joelma Oliveira

muito bom. voltou cheia dos planos 😈 agira é A menina má 😎

2025-06-12

1

Silva Writer

Silva Writer

Certíssima, tem que luxar mesmo kkk

2025-05-27

2

Ver todos
Capítulos
1 A queda da Família LeRouge
2 Ganhei uma segunda chance?
3 Guilda Luminaris
4 Bruce D’Arment e Adrian Valemont
5 Duelo.
6 Eliot
7 Uma carta do papai
8 Treinando com o titio
9 Outro duelo?
10 Presente de aniversário.
11 Caninos Sangrentos.
12 Uma vitória e um ego ferido
13 Um momento de diversão
14 Surpresa inesperada
15 Missão especial
16 Você está pronta para o Torneio.
17 Dia do Torneio
18 Vai se arrepender disso!
19 Ela cresceu
20 Almoço em família
21 A quase morte do príncipe herdeiro
22 Houve baixas?
23 Estranhamente familiar...
24 Você me salvou.
25 Garotinha intrometida...
26 Sorria, Amaya
27 Lealdade é admirável...
28 Ainda volto aqui.
29 Eu só... dei uma volta
30 Ela não gritava...
31 Eles não vão me matar de novo!
32 Isso não vai ficar assim!
33 Você ousaria?
34 Uma tragédia mesmo.
35 A senhorita... caçou isso?
36 Eu só... tive sorte.
37 Fica de repouso.
38 Ravi, mais rápido!
39 Era parte do plano!
40 Essa é minha menina.
41 É hora do chá.
42 Olá, Amaya.
43 Você é tão jovem...
44 Você pensou em tudo.
45 Eu prometo.
46 Vou sentir falta dele.
47 Adeus, Amaya LeRouge
48 Você trouxe o gato?
49 Ela matou aquela vila
50 Os planos mudaram!
51 Aila Winter
52 Parassonho
53 O Muralha
54 O pesadelo
55 Guerreira da lua
56 Agora é com você.
Capítulos

Atualizado até capítulo 56

1
A queda da Família LeRouge
2
Ganhei uma segunda chance?
3
Guilda Luminaris
4
Bruce D’Arment e Adrian Valemont
5
Duelo.
6
Eliot
7
Uma carta do papai
8
Treinando com o titio
9
Outro duelo?
10
Presente de aniversário.
11
Caninos Sangrentos.
12
Uma vitória e um ego ferido
13
Um momento de diversão
14
Surpresa inesperada
15
Missão especial
16
Você está pronta para o Torneio.
17
Dia do Torneio
18
Vai se arrepender disso!
19
Ela cresceu
20
Almoço em família
21
A quase morte do príncipe herdeiro
22
Houve baixas?
23
Estranhamente familiar...
24
Você me salvou.
25
Garotinha intrometida...
26
Sorria, Amaya
27
Lealdade é admirável...
28
Ainda volto aqui.
29
Eu só... dei uma volta
30
Ela não gritava...
31
Eles não vão me matar de novo!
32
Isso não vai ficar assim!
33
Você ousaria?
34
Uma tragédia mesmo.
35
A senhorita... caçou isso?
36
Eu só... tive sorte.
37
Fica de repouso.
38
Ravi, mais rápido!
39
Era parte do plano!
40
Essa é minha menina.
41
É hora do chá.
42
Olá, Amaya.
43
Você é tão jovem...
44
Você pensou em tudo.
45
Eu prometo.
46
Vou sentir falta dele.
47
Adeus, Amaya LeRouge
48
Você trouxe o gato?
49
Ela matou aquela vila
50
Os planos mudaram!
51
Aila Winter
52
Parassonho
53
O Muralha
54
O pesadelo
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Guerreira da lua
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Agora é com você.

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