Naquele dia, dirigia minha Ferrari como quem comanda um império sobre rodas. A cidade se abria diante de mim, como sempre faz. Dócil. Submissa. E eu gostava disso.
Sabia que teria um dia cheio: reuniões com tubarões de Wall Street, contratos para revisar, decisões para tomar… e o mais irritante de todos: o circo anual do programa de estágio.
Todo ano, centenas de estudantes de Direito se inscreviam com os olhos brilhando, como se trabalhar na Miller & Co. fosse um bilhete dourado. Para alguns, era. Para outros, era só um lembrete de que nem todos são feitos para sobreviver num reino onde só o mais forte respira.
Estacionei. Entrei.
E como sempre, o efeito foi imediato.
Funcionários se endireitaram. Celulares sumiram das mãos. Olhares se desviaram. Era sempre assim. Eles acham que se evitarem o contato visual, evitam o inferno. Mal sabem… o inferno observa mesmo quando ninguém o vê.
Atravessava o saguão quando a voz de Sienna ecoou com a pontualidade de um relógio suíço.
— Bom dia, Senhor Miller. Os candidatos para o estágio já estão chegando. O RH preparou a sala de avaliação conforme suas exigências. Os dossiês individuais estão prontos, organizados por mérito e perfil psicológico, como solicitado.
— Ótimo. — respondi, sem reduzir o passo. — Agora me traga meu café. Quente, sem açúcar, sem espuma… no ponto exato. Não quero ter que repetir.
— Entendido, senhor.
Ela permaneceu imóvel, profissional. Sienna sabia que não havia margem para erro comigo. Apenas resultados.
Dirigi-me ao elevador privado. O som dos meus sapatos ecoando no mármore preto como se anunciassem a chegada de um rei, ou de um carrasco.
Entrei. Apertei o botão para o último andar. O santuário.
As portas quase se fecharam, mas, então, uma mão surgiu entre as frestas, interrompendo o curso suave do aço.
Eu me virei, pronto para lançar um olhar que congelaria qualquer alma.
Mas o que vi foi...
Uma garota.
Cabelos castanhos. Roupas simples. Um jeans escuro, uma blusa branca sem nada demais. A postura? Apressada. Levemente ofegante. O detalhe curioso? Ela não parecia minimamente assustada.
Não desviou o olhar. Não abaixou a cabeça.
Talvez nem fizesse ideia de quem eu era.
— Ufa… consegui. — murmurou, entrando no elevador. Falava ao telefone, a voz baixa, mas audível. — Ethan, pelo amor de Deus, quase perdi a maldita entrevista. Eu? Sim, eu tô tremendo. Esse processo seletivo está me deixando fora de mim…
Sorri de canto. Internamente.
— Dizem que o dono dessa empresa é o próprio diabo. Frio, arrogante, uma lenda urbana em forma de terno caro. Tem até boatos de que ele nunca sorri. Nunca. — ela riu com um toque nervoso, afastando uma mecha do rosto. — Sim… me deseje sorte, Ethan. Porque se esse homem for metade do que falam… eu tô ferrada. Depois te conto. Tchau.
Desligou.
Meu olhar estava sobre ela o tempo todo. Mas ela só percebeu minha presença quando guardou o celular.
Virou-se devagar. E finalmente me notou.
— Ah… oi. — disse, educada, com um leve sorriso. Mas não havia reverência em sua expressão. Apenas gentileza distraída. Como se eu fosse qualquer um.
Virou-se de novo. Encostou-se na lateral do elevador como se o momento tivesse passado.
Insolente.
Eu poderia mandá-la de volta para casa naquele exato instante. Bastava uma palavra. Mas não.
Preferi fazer melhor.
Cruzei os braços. Permaneci em silêncio.
Observei.
A curiosidade era uma serpente que rastejava dentro de mim. Havia algo nela. Algo... diferente. Não era beleza estonteante. Era o contraste. O brilho nos olhos. A ausência de medo. Como se o lobo tivesse sido confundido com um cordeiro, e ela sequer percebeu os dentes à mostra.
O elevador parou com um sutil ding.
As portas se abriram.
Ela saiu apressada, sem olhar para trás.
E eu segui rumo ao meu trono.
Aquele dia foi uma verdadeira corrida contra o tempo. Trânsito, nervosismo, café frio derramado na blusa, e ainda assim… ali estava eu. No prédio imponente da Miller & Co., tentando manter a compostura como uma boa estudante de Direito.
Aquela oportunidade era única. Rara. Tão rara quanto respirar dentro de um tribunal sem ser esmagada. Estagiar ali era praticamente um passaporte direto para o futuro. Mas só para poucos. Para os que tinham algo a mais.
E eu... ainda me perguntava se realmente era uma dessas pessoas.
Fui levada com os outros candidatos para uma sala grande, toda em tons de cinza e preto, móveis minimalistas e um grande painel de vidro espelhado no fundo. Vidro escuro. Reflexo nenhum. Como se alguém pudesse estar observando, mesmo sem ser visto.
A ansiedade corroía meu estômago. Um por um, fomos nos apresentando. Currículos, conquistas, aquele teatrinho de mostrar que somos brilhantes, confiantes, preparados… mesmo quando tudo em mim gritava o oposto.
Então chegou a minha vez.
Respirei fundo.
Levantei-me e comecei a falar.
Minutos depois
Não sabia se tinha impressionado ou se todos estavam apenas tentando manter a cara de paisagem. Mas ao final da rodada, alguns candidatos foram dispensados.
Eu fiquei.
Junto com mais três.
Estávamos sentados em silêncio. Eu suava frio. O relógio parecia zombar de cada segundo. O ambiente, embora luxuoso, tinha algo... opressor.
Então a porta se abriu.
Uma mulher elegante entrou.
— Olívia Hale? — sua voz era firme, mas polida. Uma pergunta que soou quase como uma sentença.
— S-sou eu, sim. — minha voz saiu mais baixa do que eu gostaria. Engoli em seco. Endireitei os ombros, tentando parecer segura.
Ela me analisou rapidamente, como se decidisse algo ali, em milésimos.
— O nosso CEO solicitou uma entrevista pessoal com você.
O quê?!
Meu coração falhou uma batida. Ou duas.
— C-com… com ele? — repeti, quase tropeçando na própria língua. — O senhor Miller?
— Sim. Agora. Me acompanhe, por favor. — Ela se virou, sem nem olhar para trás.
Levantei num pulo, o coração martelando no peito. Tentei me lembrar de como andar com elegância sem parecer uma pata nervosa. Meus passos ecoavam pelo corredor, cada um deles me levando mais fundo na toca do lobo.
E então, a porta se abriu.
O escritório era um espetáculo à parte. Gigantesco. Frio. Intimidante. E uma cadeira de couro virada de costas para mim.
Tudo naquele lugar gritava poder.
Engoli seco. Eu queria correr.
— Sente-se. — a voz grave ecoou como um trovão abafado, mesmo antes da cadeira girar.
Obedeci. Rígida. O couro da poltrona sob mim parecia zombar da minha tensão.
E então a cadeira girou.
E eu congelei.
Não.
Não, não, não.
Era ele.
O cara do elevador.
Eu estava completamente ferrada.
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Atualizado até capítulo 31
Comments
Fefe🥰❤️
adorei esse capítulo, atualize logo autora, tô muito ansiosa 🙂
2025-04-10
8
Carolina Luz
até eu congelei quando ele girou a cadeira 💺 tô tremendo 🫨 😄
2025-04-11
1
Joselma Trajano
gente a Olívia e muito bonita, tem uma beleza natural que encantei, por isso que o todo poderoso vai cair ao seus pés , a mulher encanta com sua naturalidade .
2025-04-13
0