Capítulo 5

A sala estava silenciosa, com exceção do som ritmado do teclado e o zunido baixo da impressora. Isadora — ou melhor, Clara — concentrava-se em organizar os arquivos escaneados, quando ouviu uma voz suave atrás de si:

— Precisa de ajuda com isso?

Ela se virou devagar. Um rapaz de sorriso tranquilo e olhos atentos a observava, apoiado na divisória da baia.

— Sou Hyeon-woo. Comecei há pouco tempo, mas já vi que esses documentos antigos parecem multiplicar sozinhos.

Ela sorriu, um pouco tímida.

— Eu sou Isadora.

— Eu sei — respondeu ele, puxando uma cadeira ao lado. — Vicente vive falando que a nova auxiliar é extremamente organizada.

Ela arqueou uma sobrancelha, surpresa.

— Vicente?

— O pai do chefe. Ex-juiz. Um cara sério, mas... tem bom coração. Mesmo que escondido sob três camadas de rigidez.

Ela assentiu, tentando disfarçar o nervosismo. O olhar atento de Vicente naquela manhã ainda pesava em sua mente. Como se ele enxergasse através das mentiras.

Hyeon-woo começou a ajudar com as pilhas de papel, conversando com naturalidade.

— Não quero parecer invasivo, mas... você parece meio triste. Está tudo bem?

Isadora hesitou. A pergunta bateu fundo, como se tivesse aberto uma porta que ela trancava todos os dias ao acordar.

— Às vezes, a gente só... se sente fora do lugar, sabe?

Hyeon-woo a observou com cuidado, mas não insistiu. Em vez disso, falou com doçura:

— Se algum dia quiser conversar, ou só tomar um café longe desse cheiro de toner, estou por aqui.

Ela sorriu, grata.

— Obrigada, Hyeon-woo.

Quando ele voltou para a mesa dele, Isadora se pegou olhando para o reflexo no monitor desligado. O rosto ali não era estranho — era apenas desconhecido o suficiente para incomodar. Aquela imagem, moldada por cirurgias, era o retrato de uma farsa criada por outra pessoa.

Isadora estava digitando algo no computador da recepção quando sentiu a presença silenciosa de Vicente se aproximando. Ela ergueu os olhos e tentou parecer natural.

— Boa tarde, senhor Vicente.

— Boa tarde. — Ele olhou ao redor, como se examinasse o ambiente, antes de encará-la novamente. — Está se adaptando bem ao escritório?

Ela sorriu, sem hesitar.

— Sim, estou gostando. É um pouco movimentado, mas todos têm sido gentis.

— Gentis? — Ele ergueu uma sobrancelha. — Incluindo meu filho?

Ela riu de leve.

— O doutor Rafael é bem reservado, mas educado.

Vicente assentiu lentamente, cruzando os braços.

— Ele é mesmo... às vezes, parece carregar o peso do mundo nos ombros. — Fez uma pausa. — O que acha dele?

Isadora hesitou por um segundo, surpresa com a pergunta.

— Acho que ele é muito focado. E… talvez um pouco cansado.

Vicente soltou um riso abafado, quase nostálgico.

— Essa é uma boa leitura. — Depois olhou para ela com mais atenção. — Você costuma observar bem as pessoas?

Ela pensou antes de responder.

— Acho que sim. É um hábito. Quando a gente se sente meio perdida, começa a prestar mais atenção nos outros.

Vicente fixou os olhos nela por um instante silencioso, como se aquelas palavras tivessem dito mais do que ela própria percebera.

— Isso pode ser uma qualidade. Ou um alerta.

Ela franziu a testa, um pouco confusa.

— Como assim?

— Só digo que… às vezes, enxergar demais pode trazer lembranças que a gente não sabe que tem.

Isadora não soube o que responder. Ele sorriu, amigável, e deu um leve aceno de cabeça antes de se afastar pelo corredor.

Ela ficou ali, com os dedos imóveis sobre o teclado e um pensamento estranho se instalando: por que aquele homem sempre parecia enxergar além?

Depois da conversa enigmática com Vicente, Isadora voltou para o computador tentando se concentrar em suas tarefas. Mas a sensação de estar sendo analisada ainda pairava no ar, como um perfume que se recusa a se dissipar.

Pouco depois, viu Daniela passar apressada com uma pilha de pastas em mãos. Isadora hesitou por um instante, depois levantou-se.

— Daniela? Precisa de ajuda?

A secretária a olhou de relance, os olhos ligeiramente surpresos. Era raro alguém se oferecer.

— Se não estiver ocupada…

— Não estou — respondeu, já estendendo as mãos para ajudar com os documentos.

As duas caminharam juntas até uma mesa lateral, onde Daniela começou a organizar as pastas por ordem de data. Isadora observava com atenção, pronta para entender como funcionava a rotina ali.

— Está se adaptando? — Daniela perguntou sem tirar os olhos dos papéis.

— Estou, sim. Ainda estou pegando o ritmo, mas estou gostando.

Daniela assentiu, e por um momento pareceu prestes a dizer algo. Mas ficou em silêncio, até que finalmente comentou:

— Você tem um jeito calmo… diferente da maioria das pessoas que já passaram por aqui.

— Espero que isso seja bom.

— É. — A secretária encarou Isadora pela primeira vez desde o início da conversa. — E estranho também. Como se você estivesse... fora de lugar. Mas não de um jeito ruim. De um jeito que parece certo, mas fora do tempo.

Isadora franziu levemente o cenho, sem saber exatamente o que aquilo queria dizer. Daniela, no entanto, voltou a organizar as folhas, como se tivesse dito apenas um comentário qualquer.

— A esposa do doutor Rafael vem muito aqui? — Isadora perguntou, com cuidado.

Daniela apertou os lábios por um instante.

— Infelizmente.

Isadora engoliu seco. Daniela percebeu sua hesitação e suavizou um pouco o tom.

— Desculpa. É que… tem algo nela que nunca me desceu. E olha que trabalho aqui há anos. A gente aprende a sentir essas coisas, sabe?

Isadora assentiu devagar.

— Às vezes, eu também sinto... como se tivesse algo fora do lugar, mas não consigo entender o quê.

Daniela a olhou por mais alguns segundos. E, de repente, algo mudou em sua expressão: uma faísca de empatia.

— Se um dia quiser conversar, sem obrigação de explicar nada… pode contar comigo.

- obrigada!

[]

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