Não vou deixar você estragar a vida dela

Olhei para aquele menino teimoso e balancei a cabeça. Ele vai ver só, ele é esperto, mas sou mais experiente, virei as costas e segui meu caminho. Fiz a entrega e agora, com a cabeça fria, tracei outra rota. Vou gastar mais um pouco de diesel, mas vai valer a pena.

Vou testar durante a semana e ver se consigo me livrar dele. Preciso falar com a Meg, ela deve estar brava porque não passei para pegá-la. Liguei e, no primeiro toque, ela atendeu.

— Oi, pai, por que me largou para trás? Não me venha com aquela história esfarrapada de que não ia passar aqui perto, e a tia também está querendo entender.

“João”

Fiz uma careta, nossa, como vou explicar para a Ema que não quero que minha filha namore um caminhoneiro?

— Ela está aí com você?

— Não, pai, mas sei que ela está brava.

— Filha, há coisas na vida que não têm explicação, e hoje é um destes dias sem explicação.

— Não vai me dar um motivo? Então, esta semana não vou à faculdade, passa me pegar amanhã cedo, senão vou de ônibus até o posto e te espero lá.

— Não faça isso, Meg, espera por mim aí, eu passo te pegar. Não vai naquele maldito posto, entendeu?

— Tá bom, mas se o senhor não passar, eu vou lá e acampo até o senhor aparecer.

— Vou passar, fica com a mala pronta, amanhã lá pelas 04:00 eu passo.

— Ok, vou te esperar, pai.

Mas que menina teimosa, para quem será que ela puxou e comecei a rir sozinho, é, vou ter que testar a nova rota na prática.

— Tia Ema, a senhora não vai levantar para dar um oi para meu pai?

— Não, se ele não quis me ver, quer dizer, ver você, eu também não quero ver o João.

— Tá bom, estou indo e volto no domingo. Dei um beijo nela e fui encontrar meu pai.

Quando sai, ele está na porta.

Todo nervoso, tentando ver dentro, olhei nele e disse:

— Ela não vem, quer ir lá no quarto falar com ela.

— Ficou louca, menina, se eu entrar no quarto da sua tia, ela me mata, vamos embora, domingo falo com ela.

— Então vamos. Subimos no caminhão e, quando passamos pelo posto, ele não parou

— Pai, não vamos tomar café da manhã?

— Mudei algumas coisas, este posto está muito contaminado, vou parar em outro.

— Contaminado com o quê? O senhor está me escondendo alguma coisa?

— Claro que não, o que eu poderia estar te escondendo?

O dia vai passando e vejo que ele modificou toda a rota. Fiquei chateada porque não vou ver mais a Scania azul e seu dono, mas se ele quiser me encontrar, vai me achar. Vou avisar meu pai que vou tirar carta e vou guiar caminhão.

— Pai, agora que tenho 18 anos, quero tirar carta.

— Está certo, vai à autoescola e faz sua inscrição, eu te dou a carta de presente.

— Vou tirar a carta E

Ele fica em silêncio, será que não me ouviu? De repente, ele dá um suspiro.

E fala:

— Eu não quero esta vida para você, não vou permitir.

— O senhor não vai conseguir me impedir, vou guiar caminhão, é minha escolha.

— Vamos fazer assim, te ajudo a tirar a carta e você me promete que vai fazer faculdade de direito. Após formada, você escolhe qual profissão seguir.

— Combinado, mas o senhor vai me deixar guiar o caminhão ocasionalmente?

— Prometo, filha.

“João”

Viajamos a semana inteira e minha rota nova deu certo, não encontramos nenhuma vez com o Gabriel.

Se ele descobrir, eu mudo de novo, quase uma briga de gato e rato, e desta vez sou o rato e fujo mesmo, vejo minha filha chateada e sei por quê, mas estou fazendo isso para o bem dela.

“Meg”

Voltei para casa e minha tia vem nos receber na porta, me dá um abraço e olha feio para meu pai. Estou chateada com ele e não vou ajudar, que se vire com minha tia, entrei e fui direto para meu quarto.

** Não te vi esta semana, mas teremos outras semanas pela frente e tenho certeza de que você vai me achar.

“Biel”

Uma semana sem ver o caminhão do João deve ter quebrado, perguntei para alguns amigos estradeiros e ninguém o viu na rota.

Vou continuar procurando porque, em todos estes anos, nunca vi ele ficar uma semana inteira sem trabalhar e outra coisa, não tem outro caminhão fazendo o transporte dos produtos que ele leva.

Tem coisa estranha aí, será que ele desistiu? Só para tirar ela da linha, mas vou achar, não importa onde você esconder, João, eu vou achar. Mais uma semana começa, é segunda-feira, estou no posto esperando para ver se ele vem tomar o café da manhã como de costume, mas o tempo passa e nada, fui tomar meu café e segui meu caminho.

“João “

Consegui acalmar minha cabelos de fogo, tivemos uma noite maravilhosa e agora voltei para a rodovia, passei em frente ao posto e vi a Scania parada. “Espera sentado, colega”

Se depender de mim, você não vai ver mais minha menina, segui meu caminho feliz da vida, estou bem com minha mulher…

“Nossa, chamar ela assim é estranho” Minha filha está a salvo do caminhoneiro pilantra, só a parte dela tirar carta E que me tira um pouco o sossego, mas ela tem mais 4 anos de faculdade, então tá tranquilo.

“Biel” (Predador)

Já é sexta-feira e não consegui encontrar nenhuma vez com o João, vou acionar meus amigos, liguei o rádio amador aqui todos temos apelidos o meu é predador, porque sou isso um predador caço mesmo e no momento estou caçando um peixão e ninguém vai conseguir me impedir.

falei com os parceiros de estrada:

QRA- PREDADOR QRA(nome do operador)

QAP? (na escuta?)

“ Estou procurando um amigo de estrada que sumiu do trecho, se alguém o ver, me avisa. É o João Ricardo transporta perecíveis”

Vários me dão (QAP)

Fique tranquilo, João, você pode até se esconder de mim, mas de vários vai ser difícil.

Não demorou muito e comecei a entender o que aconteceu.

QRA-(MINHOCA) Respondendo (QTC)(mensagem)

* Predador, vi ele no posto 75.

QRA-(Formiga) Respondendo(QTC) QAP?

QAP(na escuta) Formiga, pode falar.

*Predador vi, a sua caça na parada 321.