Sua mão é macia

“Antônio”

Ela é arisca, foi criada para se manter pura para mim, mas sinto uma tristeza nela e não gostei.

Fui olhar o canteiro e ela fez um excelente trabalho, destruindo tudo, não ficou um pé de rosa em pé, trabalhei até escurecer, tirei os pés de lado, mexi a terra e preparei para plantar de novo.

Quando escureceu, fui para o chalé, minha refeição já estava lá me esperando, tomei banho, jantei e fui dormir.

“Lara”

Acordei com minha mãe me chamando porque minha professora de piano está me esperando.

— Filha, vamos levantar-se, que sua professora de piano está te esperando.

— Já vou indo, peguei uma saia jeans e uma regata laranja, roupa que posso usar só em casa, e desci para minha aula de piano.

Minha professora é uma senhora muito simpática e, quando me vê, abre um sorriso. Das professoras que tenho, essa e a de culinária são as melhores.

— Lara, você está muito bonita hoje.

— Muito obrigado, D. Ana, vamos fazer nossa aula? Sentei-me no piano e ela me colocou a partitura com uma música clássica. Acho que nem vou perguntar porque, já sei a resposta, seu noivo gosta, Lara.

— Não podemos tocar alguma coisa mais moderna?

— Sua mãe falou que você tem que ensaiar essa porque seu noivo está para chegar e você deve tocar para ele.

Comecei a tocar com maestria.

“Antônio”

Estava saindo do chalé e ouvi um piano sendo tocado, uma das músicas de que eu mais gosto. Segui o som e vi minha ragazza tocando, fiquei ali imaginando aqueles dedos tocando meu corpo como tocavam as teclas do piano, de repente ela olhou para o lado e piscou para a professora.

Começou a tocar Brasileirinho, eu fiquei desacreditado da agilidade dela no piano, nisso entra a mãe dela e fica brava e olhando para os lados.

— Lara, não é essa música que você deve ensaiar.

— Mãe, sei a música “decor”, gosto de inovar, os clássicos são chatos.

 — Se, o dia em que você tiver que tocar para seu noivo, você fizer isso, seu pai infarta.

— Não, para aquele chato, vou ser a mulher sem graça que ele quer tanto.

Vi a mãe dela rir e balançar a cabeça.

 — Ele não sabe a mulher esquentada que ele arrumou para ele, acha que você vai conseguir esconder dele essa mulher cheia de vida que você tem dentro de você por quanto tempo?

— Talvez a vida toda, pelo que sei dele, adora uma puta e eu vou ser a mulher mais fria e certinha que eu conseguir. Vi também que, se ele não estiver satisfeito, pode arrumar uma concubina. 

— Filha, mostre para ele que você tem sangue brasileiro e faça seu casamento dar certo. Pela lei da máfia, ele não vai poder te trair, se você satisfazer ele na cama. 

— Não sei se consigo fazer isso, não sei nem beijar, quem dera fazer outra coisa.

— Pede para ele te ensinar, te garanto que ele vai ficar emocionado de poder te ensinar tudo o que ele gosta.

“Antônio”

Ela não sabe beijar? Nossa, minha ragazza vou te ensinar a ter prazer em meus braços, com aqueles lábios carnudos. Em pouco tempo, vai saber beijar como uma profissional. E pode ficar tranquila que minha concubina será você. 

“Concubina” para os mafiosos é a mulher que vai com o homem para as tarefas do dia, participa dos negócios ativamente, não precisa ser exatamente a esposa, essa pode ser só do lar se assim preferir. Quem resolve se a mulher serve ou não para essa parte das atribuições é o marido.

Se Lara não servir, deixo minha mãe cuidando dos negócios e Lara fica só em casa cuidando de mim.

Saí dali antes que ela ou alguém me visse.

Cheguei no canteiro de rosas e o calor desse país me assola. Abri a parte de cima do macacão e tirei as mangas, deixando-as caídas do lado do meu corpo.

“ Lara”

Acabei minha aula de piano, peguei meu livro, um lanche, um suco e fui ao meu lugar predileto.

Passei a avisar minha mãe que está de cochicho com meu pai, eles estão estranhos. Por que será?

 — Mãe, vou ao jardim, cadê a minha sombra?

Meu pai me dá uma olhada feia.

— Seu segurança está doente, estou escolhendo outro, vê se não faz nenhuma bobagem no jardim.

— O que eu poderia fazer no nosso jardim tem segurança por todo lado, já destruí seu canteiro de rosas, agora perdi a graça.

— Só não faz nenhuma loucura.

— Tá bom, pai, não vou tentar pular o muro para fugir ou sei lá nadar na sua fonte chique.

— Me respeita, menina, só quero o seu bem.

— Sei, pai, mas às vezes o meu bem me sufoca.

Virei e fui saindo, quando fui chegando perto, vi o canteiro de rosas quase todo restaurado, e no meio um Deus sem camisa, parei porque perdi o ar, nunca havia visto um homem sem camisa.

 Nossa, que corpo, eu não sei se é impressão minha, mas parece que ele brilha ao sol em cada movimento que faz, como se meu olhar o tivesse atraído. Ele olha para mim e abre um sorriso.

 Agora, em vez de perder o ar, comecei a respirar, acelerado, parou o que estava fazendo e veio em minha direção.

Eu automaticamente olhei para trás e lembrei que meu segurança não está comigo, pelo menos meu pai não vai ficar sabendo que vi um homem seminu no jardim, parece que meu pai estava pressentindo.

— Bom dia! Beatrice.

Me controlei para que minha voz saísse o mais normal possível.

— Bom dia! Tony. Você fez um excelente trabalho com as rosas do meu pai.

— Elas não têm culpa das maldades das pessoas, já quase acabei de salvá-las logo vão florescer de novo.

— Que bom, minha mãe vai adorar.

Fui em direção ao meu banco e Tony me seguiu, resolvi mandá-lo fazer seu serviço antes que alguém o veja falando comigo.

— Tony, é melhor você voltar ao trabalho antes que te vejam falando comigo.

— Beatrice, você é muito bonita, seus olhos me deixam fascinado.

— Para…. Por favor, eu sou prometida do Capo italiano e se virem você falando comigo, vão te matar.

Fiquei olhando para ela, está preocupada comigo, perguntei:

 — Está preocupada comigo?

Ele foi se aproximando e eu fui me afastando até encostar no banco e não ter para onde ir.

— Quer tocar para ver se sou de verdade.

— O quê?

— Você não tira os olhos do meu peito, quer tocar?

— Você não tem medo de morrer?

 — Beatrice, deixa que eu me preocupo se vou morrer ou não.

Ele tirou as coisas que eu estava segurando, colocou no banco, pegou minha mão e colocou no peito dele.

— Se você quiser mexer, a mão vai te auxiliar a me sentir melhor.

Fechei os olhos e desci a mão até o abdômen dele, voltei a mão até o bíceps, abri os olhos e vi a respiração dele diferente. Falei a primeira coisa que me veio à mente.

— É tão firme.

— Gostou, Beatrice?

— Posso tocar no seu braço?

— Fique à vontade, toque onde você quiser.

Senti-a apertar meu braço, deslizar os dedos até a minha mão e olhar a palma.

— Você não tem calos.

Fiquei tão fascinado por ela que demorei um pouco para entender o que ela falou.

— O quê?

Em dois movimentos, aquela mulher que deveria ser bem mais fraca que eu me derrubou no chão e virou minha mão para trás, segurou dois dedos com uma mão e dois com a outra, virou ao contrário e assim dobrou meu pulso. A dor era tanta que não consegui me levantar. Me perguntou.

— Quem é você? O que faz aqui? Fala antes que eu quebre o seu pulso.

— Beatrice, eu não sei do que você está falando, sou o jardineiro.

— Sem calos nas mãos, como pode ser isso? Sua mão parece de uma pessoa que trabalha em um escritório, não com serviço braçal.

— Uso luvas, por favor, não quebre meu pulso, se você fizer isso, vou ser mandado embora, eu preciso do emprego.

Ela soltou minha mão, mas me olhou muito desconfiada, que mulher esperta.

 — Volte ao seu trabalho, e não se aproxime de mim senão conto para meu pai, e você vai perder bem mais que o emprego.

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