13 CAPÍTULO

– Ecos do Abismo

A chuva persistia em açoitar a cidade, como se o céu quisesse lavar todos os pecados que se acumulavam nas ruas escuras. Relâmpagos riscavam o firmamento, iluminando por breves instantes os prédios antigos e as avenidas desertas, enquanto trovões reverberavam pelas estruturas, sacudindo janelas e corações. Dentro do laboratório de Letícia, Isabela, Gabriel e Camila sentiam cada estrondo como uma contagem regressiva para algo inevitável.

A pesquisadora andava de um lado para o outro, consultando livros, rolos de pergaminho e arquivos de textos antigos salvos em seu computador. O ambiente, iluminado por lâmpadas fluorescentes, parecia um refúgio contra as trevas que se espalhavam lá fora. No entanto, até ali, o ar carregava uma tensão sufocante, como se as paredes pudessem desabar a qualquer momento.

— Aqui! — Letícia exclamou de repente, apontando para uma passagem em um livro de capa de couro desgastada. — Este texto menciona entidades que podem ser invocadas para proteger ou amaldiçoar alguém, dependendo do propósito do invocador. E, segundo as descrições, elas se manifestam através de vultos, sombras que parecem ter vontade própria.

Isabela, que estava sentada com os cotovelos apoiados na mesa, inclinou-se para ver melhor. O texto falava sobre rituais obscuros, pactos e oferendas a forças além da compreensão humana. Seus olhos percorreram as linhas, cada palavra parecendo acender uma faísca de lembrança em sua mente.

— Você acha que Rafael fez um pacto? — ela perguntou, a voz saindo num fio. — Ele não acreditaria em algo assim tão facilmente… a não ser que estivesse desesperado.

Camila se aproximou, observando as ilustrações de criaturas sem forma definida, figuras encapuzadas e símbolos estranhos. — Rafael sempre foi ambicioso, mas recorrer a algo tão sombrio? — Sua voz tremia de indignação e medo ao mesmo tempo. — Isso explica os vultos que encontramos, e aquele homem… ou seja lá o que for… que nos atacou.

Gabriel passou a mão pelos cabelos, em um gesto de impaciência contida. — Se isso for verdade, precisamos descobrir o ponto fraco dessa… coisa. Algo que impeça que Rafael a use contra nós.

Letícia fechou o livro com cuidado, olhando para cada um deles. — Há um ritual de selamento descrito aqui, mas não é algo simples. Envolve um amuleto especial, símbolos específicos e a presença de todos os envolvidos no pacto. Precisaríamos de tempo para preparar, e ainda assim, não é garantido que funcione.

Isabela fechou os olhos por um instante, recordando-se da morte trágica que sofrera na outra vida e da segunda chance que recebera. Se realmente existia algo além do humano ajudando Rafael, sua luta se tornava ainda mais perigosa. Mas a sede de justiça queimava em seu peito como nunca antes.

— Vamos tentar, — ela disse, abrindo os olhos e encarando Letícia com determinação. — Diga o que precisamos fazer.

No outro extremo da cidade, Rafael observava a tempestade através de sua janela panorâmica. As gotas de chuva deslizavam pelo vidro, refletindo as luzes amareladas dos postes. Beatriz estava sentada em uma poltrona próxima, mexendo no celular, inquieta.

— Algum sinal daquele homem? — ela perguntou, sem erguer o olhar.

— Não, — Rafael respondeu, sem desviar a atenção da paisagem lá fora. — Ele disse que me daria resultados, mas até agora…

Ele não terminou a frase. Na verdade, não conseguia pôr em palavras o temor que crescia dentro de si. Algo estava fora de controle. Quando decidiu eliminar Isabela, jamais imaginou que a própria morte dela pudesse trazer consequências tão estranhas e perigosas.

Beatriz notou o silêncio pesado e ergueu os olhos. — Você ainda está pensando nela?

— Ela não deveria estar viva, — Rafael murmurou, apertando os punhos. — E agora, surgem esses boatos de vultos e criaturas… Você acha que eu enlouqueci, Beatriz?

A mulher levantou-se, aproximando-se dele. — Eu acho que você subestimou Isabela. E se essas coisas são reais ou não, pouco importa. Precisamos agir.

Rafael virou-se, seus olhos escuros fixos nos dela. — Agir como? Temos dinheiro, influência… mas isso não é algo que se resolve com propinas e ameaças.

Beatriz respirou fundo, tentando manter a calma. — Há pessoas que lidam com esse tipo de assunto. Gente que negocia com o desconhecido em troca de vantagens. Talvez…

Ele ergueu a mão, interrompendo-a. — Você quer dizer… outro pacto?

— Se já estamos mergulhados nisso, por que não usar o mesmo tipo de poder contra ela?

Rafael cerrou os dentes. Sentia-se encurralado, como um animal ferido que não tem para onde fugir. Ainda que hesitasse em se envolver mais, a perspectiva de perder tudo o que conquistara o aterrorizava. Sua ambição e medo se misturavam em um coquetel amargo.

— Vou pensar, — foi tudo o que conseguiu dizer, voltando-se para a janela. Um relâmpago iluminou seu rosto, revelando uma expressão de desespero mal contido.

De volta ao laboratório, Letícia espalhava no balcão vários objetos que poderiam ser úteis no ritual de selamento: velas pretas, frascos com ervas secas, cristais de quartzo e um colar antigo com um pingente em forma de lua crescente.

— Precisaremos de um lugar isolado, preferencialmente ao ar livre, para realizar isso, — ela explicou, apontando para um diagrama desenhado no caderno. — E, acima de tudo, é necessário que a energia daquele que fez o pacto esteja presente.

Isabela franziu a testa. — Quer dizer que precisamos de Rafael ou… de quem quer que esteja diretamente envolvido com ele?

Letícia assentiu, séria. — Se o pacto foi feito por Rafael, então a ruptura exige sua presença. Se foi alguém próximo a ele, também serve. Mas sem o elo principal, o ritual não tem efeito.

Camila sentiu um arrepio percorrer-lhe a espinha. — Você está sugerindo que temos de atrair Rafael para esse lugar? Ele nunca concordaria em participar de algo assim de boa vontade.

Gabriel cerrou os punhos, pensativo. — Talvez não precise concordar. Podemos atraí-lo com alguma armadilha. Mas isso significa que teremos de encarar as criaturas que o cercam.

Um trovão sacudiu as janelas, lembrando-os de que o tempo corria contra eles. Isabela inspirou fundo, buscando coragem.

— Então vamos fazer isso. — Ela se voltou para Letícia. — Me diga tudo que precisamos preparar. Enquanto isso, Camila e Gabriel podem pensar em uma forma de atrair Rafael.

O olhar de Letícia era grave, mas havia um lampejo de admiração na forma como encarava Isabela. — Tudo bem. Mas estejam cientes de que estamos nos metendo em território perigoso. Se algo der errado, pode custar mais do que nossas vidas.

A determinação no semblante de Isabela não vacilou. — Já estive morta uma vez. E, se há algo que aprendi, é que há coisas piores do que a morte.

Aquela frase pairou no ar por um momento, carregada de significado. Todos sabiam que não havia mais espaço para recuos ou hesitações. O confronto final se aproximava, e cada peça no tabuleiro estava prestes a se mover em direção a um destino incerto.

Lá fora, a tempestade intensificava-se ainda mais, como se o céu refletisse a iminência do choque entre forças ocultas e vontades humanas. Raios cruzavam o firmamento, transformando a noite em dia por frações de segundo. No ruído ensurdecedor dos trovões, era possível imaginar ecos de vozes antigas, segredos que se perdiam na ventania.

No entanto, a maior tempestade acontecia nos corações daqueles que se preparavam para um confronto além da lógica, além do que a maioria das pessoas consideraria possível. E, na escuridão, uma presença observava tudo — uma sombra que se movia sem ser notada, esperando o momento exato de agir.

E assim, com cada lampejo de luz e cada estrondo no céu, o destino se aproximava de todos, anunciando que o verdadeiro embate entre a vida, a morte e o desconhecido estava prestes a começar.

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