...Sofia ...
Depois de deitar Luna, fui buscar um copo de água e um comprimido para a terrível dor de cabeça que tinha. Estava prestes a levar o copo à boca quando alguém bateu na porta. Isso me chamou a atenção, já que ninguém além do senhor que me cobrava o aluguel da pequena casinha vinha. Eu não tinha amigas. Depois do que aconteceu, compreendi que a amizade não existia, só te usam por seu status social e nada mais. Depois que meu pai me expulsou da grande mansão, todas se negaram a continuar falando comigo, pobres idiotas.
Olho pela janela e quase me engasgo com o comprimido que estava tomando. Cuspi tudo, inclusive a água, quando vi quem estava do outro lado da porta: minha mãe, segurando com força sua bolsa de marca enquanto olhava com terror para todos os lados. Não sei se tinha medo do bairro de má fama onde vivo ou de que alguém a visse e contasse ao meu pai.
Estava sozinha, sem o motorista ou os guarda-costas. Não entendia como me encontrou ou como chegou sozinha até aqui.
De má vontade abri a porta, ela me olhou por alguns segundos antes de tirar os óculos de sol que lhe cobriam quase todo o rosto.
- O que você está fazendo aqui? - perguntei irritada. Parece que é um pouco tarde para se lembrar de que tem uma filha.
- Eu, eu vim te trazer isto - disse, tirando um envelope com dinheiro da bolsa.
Olhei para ela sem entender o que pretendia. Depois de tantos anos, vir como se nada à minha casa para me trazer dinheiro? Não pensava em aceitá-lo, não depois de todo o dano que me causaram. Por mais que precisasse, também tinha dignidade.
- Não quero sua esmola - disse e tentei fechar a porta, mas Ana Lucia, minha querida e distinta mãe, impediu.
- Não seja orgulhosa, Sofia, ambas sabemos que você precisa. Não sei como pode estar vivendo neste chiqueiro - disse com uma careta de nojo. - Você é minha filha e, por mais que tenha nos decepcionado dessa maneira, quero te ajudar. Por favor, pegue o dinheiro.
- Eu decepcionei vocês? Vocês, como pais, me decepcionaram. Me jogaram na rua como um cachorro sem sequer me ouvir, me maltrataram e abandonaram quando mais precisei e eu sou a orgulhosa? Para mim, vocês não existem mais. Depois de ontem à noite, já entendi que não tenho pais, vocês morreram para mim.
- O que você queria que seu pai fizesse se o fez ficar tão mal diante de seu sócio e melhor amigo? Já estava tudo dito há anos, terminava o ensino médio, ia estudar em Londres e, ao voltar, se casava com o mais novo dos Marqués. Mas você arruinou tudo.
- Sabe que, Ana Lucia, não pretendo continuar falando sobre isso com você. Está claro que sempre vai defender seu esposo, não sei por que o faz quando ambas sabemos que ele não merece sua lealdade, mas esse não é mais meu problema - fechei a porta e me apoiei nela, soltando todo o ar que meus pulmões estavam guardando. Olhei pela janela e pude ver como quem foi minha mãe entrava em seu carro de alta gama e ia embora.
Ana Lucia de Zambrano é uma mulher sumamente bela, alta, loira de olhos azuis iguais aos meus. À primeira vista, qualquer um poderia acreditar que é minha irmã mais velha. Apesar de ter quase cinquenta anos, aparenta ter uns trinta e poucos, suponho que seja devido à dezena de cirurgias que meu pai a obriga a fazer e aos centenas de tratamentos de beleza que faz diariamente. Minha mãe estudou arquitetura, mas nunca exerceu, já que ao se casar, ele não a deixou trabalhar. Segundo meu pai, não é bem visto que a mulher trabalhe, para isso tem um esposo.
Metade das mulheres a admira e deseja ser como ela, enquanto a outra metade a inveja de morte. Todo aquele que a vê pensa que é a mulher com a vida mais perfeita e feliz do mundo, rodeada de luxos, joias, serventes e a melhor roupa de estilista, mas o que não sabem é que Ana Lucia é a melhor atriz do mundo com a vida mais triste que possa existir.
Ainda me lembro de quando era criança, ouvi-los discutir durante horas e, na manhã seguinte, minha mãe costumava aparecer com óculos escuros ou incontáveis hematomas, sempre dizendo que havia escorregado no chuveiro ou batido em algum móvel. Era óbvio que esses golpes eram dados por seu esposo. Outras vezes, nem sequer conseguia levantar da cama por dias, mas ainda assim jamais o deixou...
- Mamãe, em que você está pensando? - pergunta minha pequena, me tirando de meus pensamentos.
- Em que logo tudo estará bem e você terá tudo o que quiser, meu amor.
- Eu não quero nada caro, mamãe, eu só quero que você seja feliz e não chore quando acha que estou dormindo - diz Luna, me deixando em choque. De verdade, essa menina tem seis anos? Meus olhos se enchem de lágrimas e só posso levantá-la do chão para abraçá-la e enchê-la de beijos.
Depois de fazer algo para comer para Luna com o pouco que tinha na geladeira e fazê-la dormir, sentei-me com o cartão que aquele homem me deu no hospital e, depois de pensar durante horas, tomei uma decisão. Por minha filha, faria o que fosse, até casar com um desconhecido por dinheiro, contanto que ela esteja bem.
Peguei o telefone e, com as mãos trêmulas, marquei o número que estava no cartão.
Depois de falar com aquele senhor, o qual parecia estar demasiado contente com minha decisão, deitei-me junto a Luna, embora não tenha conseguido dormir em toda a noite, pensando se tomei a decisão correta ou não...
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Atualizado até capítulo 55
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