Após aquele brinde, voltamos para o nosso local de trabalho e segui com as últimas tarefas do dia. Por volta das 16h, algumas pessoas começaram a ir embora. Enquanto esperava os meninos finalizarem suas atividades, fiquei mexendo no celular, distraída.
Foi quando percebi Miguel entrando no comitê acompanhado pelos outros membros da equipe sênior. Sua expressão estava fechada, séria, quase sombria. Francisco vinha logo atrás, falando ao telefone com uma urgência palpável, a testa franzida de preocupação.
Trocamos olhares, mas não foi como antes. Não houve sorrisos, nem aquela cumplicidade silenciosa. Apenas um olhar rápido antes de ele seguir para dentro de uma sala, onde todos se trancaram.
Voltei para a sala onde trabalhei ao longo do dia e percebi que os meninos estavam apreensivos.
— O que está acontecendo? — perguntei.
— Pascal está na cidade — Lucas respondeu, olhando para o computador. — E isso não estava na agenda dele.
— Mas isso é um grande problema? — franzi a testa.
— É raro candidatos se cruzarem na mesma cidade sem que isso esteja previamente alinhado. A menos que Pascal tenha algo em mente...
Meu estômago revirou. Mais cedo, as militantes de Pascal haviam começado a atacar Miguel nas redes sociais, criticando-o por ter faltado a um debate e chamando-o de irresponsável, insinuando que ele fugia de confrontos diretos.
— Isso não é verdade — murmurei, incomodada.
— Verdade ou não, a narrativa já foi criada — Lucas respondeu, balançando a cabeça. — E tem mais. Pascal passou Bonne nas pesquisas e, se continuar assim, pode ultrapassar Miguel.
Foi nesse momento que Nico passou correndo pela sala, o celular colado ao ouvido e a expressão de puro pânico. Algo claramente havia saído do controle.
Meu coração acelerou. Eu não queria ver Miguel perder tudo pelo que trabalhou tanto, ainda mais por um golpe político sujo. Mas o que eu poderia fazer? Eu era apenas uma estagiária.
A única coisa que me veio à mente foi recorrer a alguém que poderia me tirar dessa escuridão de incertezas.
Disquei o número e, para minha surpresa, André atendeu de imediato.
— Oi, Laura. Já sabe que Pascal está na cidade, né?
— Sim, André. Mas por quê? Você está aqui?
Ele suspirou antes de responder:
— Pelo que ouvi, ele tem uma bomba sobre os investimentos da campanha de Miguel. E não, estou na sede.
Minha respiração falhou por um segundo.
— Que tipo de bomba? Que documentos são esses?
— Não tenho essa informação — ele desconversou.
— André, por favor! Sei que você pode descobrir para mim.
— Laura, isso é só um estágio. Você não tem que se envolver nesse nível.
— Você me conhece — insisti. — Sabe que eu não consigo simplesmente ficar parada no meio do caos.
Houve um breve silêncio do outro lado da linha.
— Tá bom, vou ver o que consigo. Mas só porque acho Pascal um desgraçado sem escrúpulos. E você vai me prometer que nunca dirá de onde conseguiu essa informação.
Sorri, aliviada.
— Prometo. Obrigada, amigo.
Meia hora depois, meu celular vibrou. Era uma mensagem de André. Abri o e-mail que ele havia enviado para um endereço alternativo e comecei a ler os documentos anexados. O conteúdo era complexo, cheio de termos jurídicos e financeiros, mas uma coisa ficou clara: Pascal tinha em mãos uma denúncia sobre um esquema envolvendo o desvio de recursos públicos para financiamento de campanhas políticas.
— Meu Deus... — sussurrei.
André me ligou em seguida e explicou como Pascal pretendia usar a informação.
— Te amo, André! Mas agora preciso ir.
— Só você pra me fazer trabalhar para a oposição. Só te peço uma coisa, Laura... Assim como eu não acredito cegamente em Pascal, não acredite cegamente em Miguel. No fim, todos eles jogam o mesmo jogo.
Engoli em seco.
Estaria eu cega por Miguel?
Sacudi a cabeça, me levantando da cadeira com determinação. Peguei os documentos e segui direto para a sala de reuniões. Sem cerimônia, abri a porta.
Todos me olharam, surpresos. Francisco foi o primeiro a reagir:
— Agora não, Laura.
— Eu tenho algo — declarei, firme.
Caminhei até a mesa e joguei os papéis sobre ela.
— Como conseguiu isso? — Miguel perguntou, erguendo uma sobrancelha.
— Uma fonte segura me informou que Pascal está com esses documentos e pretende usá-los contra sua candidatura.
Francisco pegou os papéis e começou a folheá-los rapidamente.
— Laura, quem é essa fonte?
— Não posso revelar. Mas garanto que é confiável.
Miguel cruzou os braços.
— Você sabe do que se trata a Operação Monograma?
Assenti.
— A investigação da Polícia Federal sobre desvio de verbas para campanhas políticas. O dinheiro que deveria ir para educação e infraestrutura era desviado e lavado para financiar candidatos.
Francisco suspirou, passando as mãos pelo rosto.
— Pascal vai usar isso contra o partido. Ele vai soltar para a imprensa e transformar isso em um escândalo eleitoral.
— Então precisamos agir rápido — acrescentei.
Francisco não perdeu tempo.
— Todos em seus postos! — ordenou. — Quero contato imediato com a equipe de Pascal. Se não conseguirmos evitar a publicação, precisamos de uma bomba maior para jogar contra ele. Preparem notas de repúdio e chamem os advogados. E, pelo amor de Deus, descubram quem vazou isso!
A sala se esvaziou rapidamente, restando apenas eu e Miguel.
Ele suspirou, passando a mão pelos cabelos, apoiando-se na mesa.
Aproximando-me, toquei de leve seu ombro.
— Calma, senhor governador. Sua equipe está com você.
Ele me olhou, a tensão ainda evidente em seu rosto.
— Laura... você não entende. Se isso vazar, meses de trabalho duro e investimento vão para o lixo.
— Isso não vai acontecer. Seus advogados vão contornar a situação.
Ele segurou minhas mãos, os olhos mergulhando nos meus.
— Não me entenda mau mas vou te dizer algo que não deveria. Eu queria que minha esposa fosse como você. Que me apoiasse e estivesse ao meu lado.
Engoli em seco, sem saber o que responder.
— Eu... não sou ela. Mas te apoio. E estou aqui para o que precisar.
Ele suavizou a expressão, esboçando um sorriso. Seus dedos percorreram de leve meu rosto, descendo pelo meu braço até minhas costas, causando um arrepio.
— Obrigado por acreditar em mim.
Encostei minha cabeça em seu peito e ele me envolveu em um abraço apertado. O calor de seu corpo contrastava com o ar frio da sala.
— Eu juro que estou tentando ser apenas sua est...
A porta se abriu abruptamente.
Saltei para trás no mesmo instante. Francisco nos observava, o olhar cansado, mas atento.
— Miguel, precisamos de você no carro em dez minutos. Teremos uma reunião para entrar em acordo com Pascal.
Ele assentiu.
— Certo.
Francisco se retirou, fechando a porta atrás de si.
Olhei para Miguel, apreensiva.
— Tem certeza que está tudo bem?
Ele sorriu de canto.
— Francisco é de confiança.
— Se precisar de mim, estarei na minha salinha — tentei descontrair.
Ele riu.
— Obrigado, Laura.
Antes de sair, ele se inclinou e beijou minha bochecha, mas o gesto foi sutil o suficiente para que seus lábios roçassem o canto da minha boca.
— Você está vermelha — provocou.
— Assim fica difícil ser apenas sua estagiária — murmurei, sem filtro.
Ele riu e se afastou.
— Tchau, Laura.
— Tchau, senhor governador.
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Atualizado até capítulo 92
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