Verdades negadas

...André. ...

Vim parar aqui porque meu pai, um nobre influente na Europa, reagiu de forma inesperada quando revelei ser gay. Nem criticou, apenas falou:

— Se você tem certeza, tenho a faculdade perfeita para você.

Agora, enquanto caminho pelos corredores amplos e movimentados da universidade, meus pensamentos são interrompidos. Uma cabeleira loira passa rapidamente pelo corredor próximo aonde estou, e meu coração dá um salto.

—  Leo — murmurei. Jurei que aquela pessoa era minha primeira paixão. Só vi de relance, mas aqueles olhos azuis... não consegui esquecer.

— André! — escuto Jeremias me chamar, sua voz cortando o transe. Ele provavelmente percebeu que parei de andar de repente. — Você tá bem? Parece que viu um fantasma.

Forço um leve sorriso, tentando disfarçar o turbilhão em minha mente.

— Jurei ter visto uma pessoa aqui, mas é meio impossível, sabe?

Jeremias me encara curioso enquanto continuamos andando.

— Quem você jurou ter visto?

Solto um suspiro pesado antes de responder:

— Um cara que me fez perceber que sou gay. Há um tempo sou apaixonado por ele.

Jeremias ergue as sobrancelhas, quase em surpresa, mas logo balança a cabeça, como se juntasse as peças.

— Sei quem é. Você não se declarou pra ele do nada durante um jogo, há um ano? Não é esse?

Chegamos a um banco próximo, e me sento enquanto Jeremias permanece de pé, os braços cruzados. Olho para o chão antes de responder:

—  Esse mesmo cara. Mas é impossível, tô vendo coisas. Acho que ficou mal resolvido, sabe?

Ele solta uma risada breve, mas sem humor.

— Mal resolvido? Cara, ele saiu correndo de você e é hétero. Tá bem resolvido, foi um "não" bem grande.

Levanto o olhar , irritado pela insistência.

— Mas pra mim não tá! Poxa, só não falei com ele por meus motivos, tá legal? E depois fui embora. Fiquei com isso na cabeça. Só acho que seria minha chance, poxa!

Jeremias suspira, como se tentasse manter a paciência.

— Cara,você é o rei de paus da faculdade, o André Lacerda! Todo mundo te ama aqui. Tira esse homem  da cabeça.

Sei que ele fala querendo o meu bem, mas o tom me irrita.

— Não consigo, sabe? Ainda amo ele, poxa. Se eu conseguir falar com Leo de novo, quem sabe, né?

— Isso não é amor... — Jeremias  rebate firme, sem hesitar.—  É obsessão, André.

—  N...

—  Nem vem! Tô de saco cheio desse papo. Quer saber? Fica com quem não te quer enquanto eu tô indo embora!

Jeremias se vira e sai apressado, claramente chateado. Sei o motivo: ele é afim de mim.

Fico ali, observando-o se afastar, enquanto uma sensação amarga toma conta de mim. Respiro fundo, tentando organizar meus pensamentos. Poxa, ele não entende. Eu só queria saber se tenho chance.

Achar que vi Leo aqui nesta faculdade me acendeu uma esperança - boba, talvez, mas uma esperança - de ele gostar de mim agora.

Já é tarde demais, e talvez eu esteja perdendo a oportunidade de amar e ser amado por isso. Esse pensamento me acompanha enquanto caminho até meu apartamento. Um misto de culpa e vontade de encontrar Leo preenche minha mente.

...

...

...Lyan....

—  Ei, volta aqui, Leonardo, seu covarde! — gritei assim que ele saiu correndo. Que cara rápido para fugir.

Suspirei, irritado. Porra, deveria ter esperado mais antes de mostrar a foto .

— Você é mega burro... — murmurei, sentindo a frustração crescer. Quem sabe assim conseguiria tirá-lo da cabeça e seguir em frente. Nem sexo ando fazendo ultimamente, apenas por causa desse cara que dominou minha mente.

Passei a mão pelo cabelo, exasperado, enquanto repetia baixinho:

— Leonardo Montenegro, o que você tá escondendo, afinal de contas? Quantos segredos você tem? E por que, desgraçado, você mexe tanto comigo?

Antes que pudesse me perder ainda mais nos meus pensamentos, ouvi alguém chamar meu nome.

— Lyan!

Me virei rapidamente, mas o cara já estava sumindo no meio das pessoas.

"Pra chamar e sair correndo? Acho que queria sei lá... dar uns pegas." Olhei para a direção dele por um instante, curioso. Era bonito, um ruivo charmoso. Mas, para ser honesto, tinha outra coisa na cabeça. Ou melhor, outra pessoa: o nerd de óculos torto, Leonardo.

Mais tarde, voltei para o meu apartamento abri a porta e liguei o som imediatamente, colocando uma batida de rap animada. Precisava distrair a mente. A música preencheu o espaço enquanto esfregava o chão e arrumava os móveis, tentando não pensar nele.

Mas era inútil. Mesmo gostando de tudo organizado, minha cabeça estava um completo caos - e o culpado disso tinha nome e sobrenome.

Tomei decisão "Vou atrás desse filho da mãe desgraçado. Vou dar um fim a essa agonia."

Resoluto, repeti para mim mesmo enquanto limpava: Assim que descobrir tudo, vou ficar em paz. Ou... será que não?"

Um arrepio percorreu minha espinha. Pensar nisso me fez perceber o quanto minha vida tinha saído do controle. Nada neste ano estava indo como imaginava.

Assim que termino, percebo que o sol está se pondo. Guardo os itens de limpeza no armário e vou direto tomar um banho. A água quente ajuda a relaxar, mas minha mente continua inquieta.

Saio do banheiro, com a toalha presa na cintura, vou até o guarda-roupa. Escolho uma calça de moletom cinza e uma regata que destaca o trabalho duro na academia. Afinal, malho pra isso: para me exibir um pouco.

Na cozinha, decido preparar algo simples, mas que adoro: macarrão com carne moída. O cheiro delicioso toma conta do ambiente, e enquanto como, um plano começa a se formar na minha cabeça.

"Vou até a ala dele assim que o amigo sair, pego Leonardo sozinho."

Termino a refeição e lavo a louça, organizando a cozinha de forma quase automática. Tento me concentrar em qualquer coisa que não seja o loirinho, mas é impossível.

Quando olho para o relógio, minha tranquilidade desaparece.

— Merda— resmungo alto.— Já são onze horas da noite.

O plano será adiado? Não. Movido pela curiosidade e pela vontade de resolver logo esse problema, calço meus tênis rapidamente, tranco a porta e sigo até até  seu apartamento.

Quando chego lá, vejo que a porta está fechada, mas logo percebo a maçaneta se movendo lentamente. Me escondo rapidamente e observo o gordinho, o companheiro de casa de Leonardo, saindo de fininho. Descubi que o nome dele é Nathan. Ele está com uma cara de quem vai dar uns pegas em alguém, mas pouco me importa. Dou de ombros. Não estou nem aí para ele.

Assim que o Nathan sai, vejo que a porta não está trancada. Sorte minha, pensei. Entro na ponta dos pés, tentando fazer o mínimo de barulho possível, e vejo a porta de um dos quartos levemente aberta.

Me aproximo da cama, e sem pensar, acendo a luz de vez, soltando:

— Eu sabia que era você! Agora me explica por que disso tudo, Leonardo!

—  Quê? — ele resmunga , sonolento, tentando se ajeitar na cama.

— Acorda logo! —  falo, sacudindo-o com as mãos, meu coração acelerando pela proximidade.—  Anda, fala! Que merda é essa? Você é lindo, porra, por quê?!

— O que você tá fazendo no meu quarto? —  perguntou, com a voz rouca e sonolenta enquanto esfregava os olhos atordoado .—  Como você entrou aqui, inferno?

— Isso não importa. Você não me respondeu .

Leonardo  percebe que está sem o disfarce e me olha assustado.

— Merda! Por que você não me deixa em paz? Segue a sua vida, cara.

— Eu não consigo fazer isso. Você, seus segredos, tudo mexe comigo. Agora responde, por quê, caramba? —  falo, com a voz mais grave, tentando esconder o turbilhão de sentimentos que me consomem.

— Por favor, me deixa explica —  implorou, sentando-se na cama. Finalmente, o solto, sentindo um leve vazio com a distância entre nós. Ele suspira, abre e fecha a boca várias vezes, como se estivesse buscando as palavras certas.

— Anda, Leonardo, desembucha. Tô esperando. Por que você tá fazendo isso, afinal de contas?

—  Eu sou hétero—  ele fala rapidamente, sem me olhar, evitando meus olhos.

Fico em choque com a resposta. Aquilo não fazia sentido. Ele está numa faculdade LGBTQIA+... e mais, correspondeu aos meus beijos. Antes que eu consiga formular qualquer pergunta, outro longo suspiro escapa de seus lábios.

— Tô falando sério, cara. Acredite. Você conhece o Otávio Albuquerque?

—  Conhecer não é bem a palavra certa, mas já ouvi falar. O bilionário? Quem nunca ouviu falar dele? Mas o que ele tem a ver com isso tudo? Sua aparência, os beijos que você me deu, sua sexualidade... —  pergunto, já irritado, a mente ainda tentando entender o que ele acabou de dizer.

—  Bem, eu conheci Otávio porque meu pai, homofóbico ao extremo, ofendeu o namorado dele. Como retaliação, ele me obrigou a estudar aqui.

—  E o que isso tem a ver com o disfarce e todo o resto? Me explica!

— Quero sair daqui sem que ninguém me reconheça lá fora. Também não quero me envolver com ninguém de forma romântica, sem complicações. Só quero cumprir minha parte —  respondeu, olhando para baixo, as palavras saindo com dificuldade.

— Deixa eu ver se entendi. Você tá aqui por causa de uma ameaça do Otávio Albuquerque, usando um disfarce, e ainda nega sua verdade por causa do seu pai? Me diz, quando você vai viver algo por você mesmo, Leonardo?— questiono, olhando fixamente para ele, frustrado com a fuga que está criando.

— Não tem verdade nenhuma que eu tô deixando de lado, Lyan.

— Ah, "mega hétero". Você quer dizer que não sentiu nada nos beijos que demos? Que eu tô louco?— falo, me aproximando dele, o tom desafiador, querendo entender o que realmente se passa.

—  Do que você tá falando? Sobre o beijo? Eu fui enganado, você sabe disso! —  grita, com raiva nos olhos.—  De jeito nenhum eu gostaria de beijar um homem. Não sou gay...

Me inclino para ele, meu olhar profundo, e digo:—  Mente que nem sente.

—  Não é mentira!— Leonardo se afasta um pouco, visivelmente agitado.— O que você tá fazendo? Para, Lyan...

Me aproximo mais do rosto dele e digo, em um tom baixo e desafiador:

— Sabe, não acredito nenhum pouco . Quero que você prove o contrário. Se eu estiver errado...

—  Você tá errado! Não tenho que provar nada! —  rebate, nervoso, a respiração acelerada.

— Só quero saber o que você sentiria se eu te beijar aqui e agora.

— ameaço, enquanto o encurralo, mas sei que estou complicando tudo pra mim mesmo.

Ele vira o rosto e se levanta rápido, quase como se quisesse fugir de mim.

— Você é surdo?!  — Leonardo grita, frustrado. — Quantas vezes vou ter que dizer que sou hétero? Eu nunca vou gostar de beijar um homem na vida!

Levanto-me e caminho em sua  direção como um predador até a presa, minha presença o cercando, até que ele está contra a parede.

— Então prove que estou errado. Me beija de novo. Se você não sentir nada, aí sim acreditarei .

— Eu nunca vou te beijar de novo, entendeu?!— ele berra, mas sua voz vacila, quase como se estivesse gritando mais para si mesmo do que para mim.

— Nunca diga nunca.Sabe, Montenegro, no fundo você sente que está mexido com esses beijos. Só tá com medinho do papai homofóbico que você tem. Fala isso olhando nos meus olhos.— Seguro o queixo dele levemente, forçando-o a me encarar.

Ele tenta desviar o olhar, mas algo em seu corpo trai suas palavras.

— Por favor, Lyan, me deixa em paz. Você já sabe o meu segredo. Minha vida é complicada demais...—  implora, com lágrimas nos olhos, sua voz tremendo.

Fico parado, estudando seu rosto, a luta interna evidente.Solto seu rosto  antes de falar algo que possa resolver minha nova fixação ou piorar tudo de vez.

—  Eu até posso fazer isso.

Ele esboça um leve sorriso de alívio, mas eu complemento: — Lógico que com uma condição, é claro. Nada na vida é de graça, e você sabe disso, né?

— Sei, já aprendi isso. Qual a sua condição, afinal?—  ele pergunta, desconfiado.

— Durma comigo. —  Falo de forma casual, mas meu coração dispara a cada segundo.

— Você tá maluco? De jeito nenhum! Prefiro a morte a isso!—  berrou , o rosto ficando vermelho como um tomate.

—  Poxa...—  me inclino para o ouvido dele, deixando minha voz mais baixa e sedutora. — Achei que você iria querer provar uma novidade. E juro que jamais vou contar nada pra ninguém sobre seu segredo. Resolveria seu problema... e o meu também.

— Mas isso é pedir muito, Lyan! Eu nunca dormi com ninguém. Não pede isso... não tem outra condição? Não quero que minha primeira vez seja assim. Quero que seja especial —  responde, visivelmente constrangido, com o rosto ainda mais vermelho.

Me afasto do ouvido dele, quase sentindo pena. Mas só quero resolver logo essa situação.

— Bem, tenho outra opção.

— Qual é a sua outra condição? Fala logo!—  ele diz, olhando de relance para mim, nervoso.

— Seja meu namorado.

— O quê?!—  ele fala, chocado.— Isso só piora tudo! Assim vou ter que te ver ainda mais, e você vai querer beijar e transar comigo!

— Relaxa, Leonardo. Juro que não vou te obrigar a nada. Só se você quiser. Não sou de ferro, mas também não sou um monstro.

— Não sei... o que você ganha com isso, Lyan?

— Ganhar talvez nada. Mas isso pode me tirar algumas dúvidas. E, quem sabe, você descobre várias coisas sobre você mesmo.

— É loucura...— afirma, balançando a cabeça.

— Pensa bem. Se você concordar, ninguém mexeria com você aqui na faculdade. Você poderia até tirar esse disfarce e ser mais... você mesmo.

Ele hesita por um momento, considerando minhas palavras.

— Você tem um ponto... mesmo odiando admitir, seria uma vantagem. Mas, ainda assim...

— Relaxa, cara. Pensa no que eu disse. Não queremos que, por acaso, alguém descubra sua verdadeira aparência, não é? Imagina só... aqui o povo é bem superficial. Sem mim, não teria guaritas de segurança. Você é bonito demais, e isso pode ser um problema é para o seu próprio bem.

Sem esperar resposta, saio pela porta, deixando-o ali parado. Não sei por que fiz isso. Minha intenção era apenas descobrir  seu segredo e seguir em frente. Corro até minha ala, entro e me jogo no sofá, tentando me convencer.

— Isso é só pelo sexo. É isso. Mesmo que tenha que fingir um relacionamento, acaba ali. Ele não gosta de mim de verdade.— repito mentalmente tentando me convencer que somente isso.

A ideia de usá-lo para alcançar uma solução rápida começa a perder seu encanto. Sei o que estou fazendo, mas as dúvidas ainda rondam minha cabeça. Ele não gosta de mim. Isso é certo, certo?

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